TFG - Casa Abrigo para Mulheres em Situação de Violência

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CENTRO UNIVERSITÁRIO FUNDAÇÃO SANTO ANDRÉ

GABRIELA FERRONI DE OLIVEIRA

CASA ABRIGO PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA

SANTO ANDRÉ 2020


GABRIELA FERRONI DE OLIVEIRA

CASA ABRIGO PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA Trabalho final de graduação apresentado como exigência para obtenção do grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo, à Faculdade de Engenharia Celso Daniel do Centro Universitário Fundação Santo André.

Orientadora: Ma. Elaine Sarapka.

SANTO ANDRÉ 2020


FICHA CATALOGRÁFICA

CASA ABRIGO PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA

Oliveira, Gabriela Ferroni de Casa Abrigo para Mulheres em Situação de Violência / Gabriela Ferroni de Oliveira. - Santo André, 2020. – 101 f. Trabalho final de graduação – Centro Universitário Fundação9 Santo André. Curso de Arquitetura e Urbanismo Orientadora: Elaine Sarapka 1. Arquitetura e Urbanismo 2. Violência contra mulher 3. Casa abrigo 4. Mauá I. Título


GABRIELA FERRONI DE OLIVEIRA

CASA ABRIGO PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA

Trabalho Final de Graduação apresentado como exigência para obtenção do grau de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo, à Faculdade de Engenharia Celso Daniel do Centro Universitário Fundação Santo André. Santo André, 25 de novembro de 2020.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Profa. Ma. Elaine Sarapka Centro Universitário Fundação Santo André

________________________________________ Prof. Me. André Ribeiro Centro Universitário Fundação Santo André

________________________________________ Prof. Me. Roberto Marin Centro Universitário Belas Artes de São Paulo

Aprovado ( ) Nota: ______


Dedico este trabalho à minha mãe, in memorian, que nunca mediu esforços para que meus sonhos fossem concretizados.


AGRADECIMENTOS

A professora Elaine Sarapka, por ter sido minha orientadora e desempenhar tal função com dedicação e amizade, pelos ensinamentos que puderam fazer

com que este trabalho fosse desempenhado da melhor maneira possível. Aos professores, pelas correções e ensinamentos, ao longo do curso, que convergiram em meu processo de formação ao longo destes anos no Centro Universitário Fundação Santo André. A minha família, pelo companheirismo e apoio constante em todos os momentos. Ao meu noivo Lucas, que sempre acreditou em meu potencial, mesmo

quando eu duvidei e, foi meu porto seguro em momentos de fragilidade. E, em especial minha filha Alice, razão pela qual se faz mais presente a necessidade em acreditar e lutar por um mundo mais igualitário e melhor para todas as mulheres. Aos meus amigos Diana Roberti, Giovana Cristina e Vinicio Souza, que fizeram parte desta empreitada, dividindo angústias e felicitações em inúmeros trabalhos e projetos ao longo do curso, contribuindo, cada um a sua maneira, em cada experiência. A todas as mulheres presentes em minha vida, que de diversas maneiras, contribuíram direta ou indiretamente para a construção deste trabalho, por meio de diferentes pontos de vista e vivências.


“Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”. (Rosa Luxemburgo, 1917).


RESUMO

ABSTRACT

A violência contra mulher, mesmo na atualidade e com maior visibilidade para o tema, continua sendo uma das principais causas de mortes relacionada ao gênero, levando-se em consideração a fragilidade e dificuldades destas mulheres em conseguir se desvencilhar deste problema, é imprescindível que existam locais que possibilitem ajudá-las a superar e vencer este ciclo. É inegável a crescente demanda por estes espaços, uma vez que os índices de violência se mantêm ascendentes e o número de mulheres que conseguem procurar ajuda, por meio de mais informações, também cresceu. Por isso, é proposta a criação de uma casa abrigo para mulheres, acompanhadas ou não de seus filhos, em situação de violência na cidade de Mauá, buscando não somente atender a demanda presente na Região do ABC Paulista, como também oferecer um serviço de qualidade, que permita que estas vítimas readquiram a dignidade e empoderamento para dar seguimento as suas vidas, de maneira segura e autônoma. Para tanto, foram realizadas pesquisas acerca da contextualização do tema, do local onde se deseja inserir, dados que permitiram a identificação da carência do serviço na região e estudos de caso, nacionais e internacionais, que contribuíram para o entendimento e auxiliaram no desenvolvimento do projeto que atendesse todas as especificações e necessidades correlatas. Dessa forma, tais abrigos são importantes para salvaguardar não somente a integridade física das mulheres, mas também a saúde mental, além de oferecer a autonomia pessoal, item de suma importância para que o círculo da violência doméstica seja quebrado, tudo isso em um local acolhedor e seguro.

Violence against women, even today and with greater visibility for the topic, remains one of the main causes of deaths gender related, taking into account the fragility and difficulties of these women in getting rid of this problem, it is essential that there are to help them overcome and win this cycle. The growing demand for these spaces is undeniable, since the rates of violence continue to rise and the number of women who are able to seek help, through more information, has also grown. For this reason, it is proposed to create a shelter for women, with or without their children, in situations of violence in the city of Mauá, seeking not only to support the demand present in the ABC Paulista Region, but also to offer a quality service, which allows these victims to regain dignity and empowerment to continue their lives in a safe and autonomous way. Therefore, research was carried out on the contextualization of the theme, the place where it is desired to insert, data that allowed the identification of the lack of service in the region and case studies, national and international, which contributed to the understanding and helped in the development of the project that meets all specifications and related needs. Thus, such shelters are important to safeguard not only the physical integrity of women, but also mental health, in addition to offering personal autonomy, an item of paramount importance so that the circle of domestic violence is broken, all in a welcoming and safe place.

Palavras-chave: Violência contra mulher. Casa abrigo. Mulheres vítimas. Acolhimento. Segurança.

Keywords: Violence against women. Shelter house. Victim women. Reception. Safety.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 – Países que mais matam mulheres no mundo .................................................... 20

Figura 18 – Elevações: Edifício Projeto Viver ........................................................................... 42

Figura 02 – Taxa de feminicídios no Brasil ................................................................................ 23

Figura 19 – Tabela com programa de necessidades: Edifício Projeto Viver ..................... 43

Figura 03 – Relógio da violência no Brasil ............................................................................... 23

Figura 20– Fluxograma: Edifício Projeto Viver ......................................................................... 43

Figura 04 – Resumo dos dados pesquisados .......................................................................... 24

Figura 21 – Setorização pavimento térreo: Edifício Projeto Viver ....................................... 44

Figura 05 – Fluxo de atendimento ............................................................................................ 27

Figura 22 – Setorização segundo pavimento: Edifício Projeto Viver .................................. 44

Figura 06 – Principais diferenças entre casa-abrigo e casa de acolhimento .................. 30

Figura 23 – Circulação pavimento térreo: Edifício Projeto Viver ........................................ 45

Figura 07 – Mapa com índices de feminicídios no país (por 100 mil habitantes) e

Figura 24 – Circulação primeiro pavimento: Edifício Projeto Viver ..................................... 45

distribuição das casas abrigo ................................................................................................... 31 Figura 08 – Gráfico do aumento da violência contra mulher durante a pandemia em São Paulo. ..................................................................................................................................... 34 Figura 09 – Casa da Mulher Brasileira ...................................................................................... 38 Figura 10 – Elevação: Casa da Mulher Brasileira ................................................................... 38 Figura 11 – Elevação: Casa da Mulher Brasileira ................................................................... 38 Figura 12 – Tabela com programa de necessidades: Casa da Mulher Brasileira ............ 39 Figura 13 – Fluxograma: Casa da Mulher Brasileira ............................................................... 39

Figura 25 – Casa de acolhimento, Cebra Architecture ....................................................... 46 Figura 26 – Elevações: casa de acolhimento, Cebra Architecture ................................... 46 Figura 27 – Elevações: casa de acolhimento, Cebra Architecture ................................... 46 Figura 28 – Tabela com programa de necessidades: Casa de acolhimento, Cebra Architecture ................................................................................................................................. 47 Figura 29 – Fluxograma: Casa de acolhimento, Cebra ....................................................... 47 Figura 30 – Setorização pavimento térreo: Casa de acolhimento, Cebra Architecture 48 Figura 31 – Setorização primeiro pavimento: Casa de acolhimento, Cebra Architecture

Figura 14 – Setorização: Casa da Mulher Brasileira ............................................................... 40

....................................................................................................................................................... 48

Figura 15 – Circulação: Casa da Mulher Brasileira ................................................................ 41

Figura 32 – Circulação pavimento térreo: Casa de acolhimento, Cebra Architecture 49

Figura 16 – Edifício Projeto Viver ............................................................................................... 42

Figura 33 – Circulação primeiro pavimento: Casa de acolhimento, Cebra Architecture

Figura 17 – Elevações: Edifício Projeto Viver ........................................................................... 42

....................................................................................................................................................... 49


Figura 34 – Abrigo e entorno ..................................................................................................... 50

Figura 49 – Circulação: Casa albergue, KWEICO ................................................................. 57

Figura 35 – Elevações: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects .......... 50

Figura 50 – Taxas de violência registradas em 2014 ............................................................. 61

Figura 36 – Elevações: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects .......... 50

Figura 51 – Índices apontados pela pesquisa Jornal Metrô ................................................ 62

Figura 37 – Tabela com programa de necessidades: abrigo Goldreich Architecture e

Figura 52 – Mapa das redes de assistência à mulher na Região do ABC ........................ 63

Jacobs Yaniv Architects ............................................................................................................. 51 Figura 38 – Fluxograma: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects ....... 52 Figura 39 – Setorização pavimento térreo: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects ........................................................................................................................... 53 Figura 40 – Setorização primeiro pavimento: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects ........................................................................................................................... 53 Figura 41 – Circulação pavimento térreo: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects ........................................................................................................................... 54 Figura 42 – Circulação primeiro pavimento: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs

Figura 53 – Mapa do Estado de São Paulo destacando a cidade de Mauá ................. 64 Figura 54 – Mapa de localização das redes de assistência à mulher no município de Mauá............................................................................................................................................. 65 Figura 55 – Mapa de Mauá com destaque para o Bairro Matriz ....................................... 65 Figura 56 – Mapa de localização das redes de assistência à mulher no município de Mauá e do terreno ..................................................................................................................... 66 Figura 57 – Mapa de bairro Matriz com destaque para o terreno .................................... 67 Figura 58 – Terreno de intervenção ......................................................................................... 67

Yaniv Architects ........................................................................................................................... 54

Figura 59 – Terreno com referência a Avenida Dom José Gaspar. ................................... 68

Figura 43 – Casa albergue, KWEICO ........................................................................................ 55

Figura 60 – Terreno com referência a Avenida Dom José Gaspar. ................................... 68

Figura 44 – Elevação: Casa albergue, KWEICO ..................................................................... 55

Figura 61 – Terreno com referência a Avenida Capitão João ........................................... 68

Figura 45 – Elevação: Casa albergue, KWEICO ..................................................................... 55

Figura 62 – Terreno com referência a Avenida Capitão João ........................................... 68

Figura 46 – Tabela com programa de necessidades: Casa albergue, KWEICO ............. 56

Figura 63 – Vegetação de valor, mobiliários e platô............................................................ 68

Figura 47 – Fluxograma: Casa albergue, KWEICO ................................................................. 56

Figura 64 – Vegetação de valor, mobiliários e platô............................................................ 68

Figura 48 – Setorização: Casa albergue, KWEICO................................................................. 57

Figura 65 – Mapa das Macrozonas e Zoneamento .............................................................. 69


Figura 66 – Índices urbanísticos permitidos na ZUD1 ............................................................. 69

Figura 85 – Proposta final de estudo volumétrico do projeto ............................................. 80

Figura 67 – Mapa Uso do Solo ................................................................................................... 71

Figura 86 – Fluxograma do projeto .......................................................................................... 83

Figura 68 – Mapa Ocupação do Solo ..................................................................................... 71

Figura 87 – Setorização geral do projeto ................................................................................ 83

Figura 69 – Mapa Estado de Conservação ............................................................................ 72

Figura 88 – Circulação vertical do projeto ............................................................................. 84

Figura 70 – Mapa Sistema Viário ............................................................................................... 72

Figura 89 – Circulação geral do projeto ................................................................................. 84

Figura 71 – Vias de Acesso e Transportes ................................................................................ 73

Figura 90 – Taxas de uso e ocupação do solo aplicadas no projeto ................................ 85

Figura 72 – Análise da insolação incidente sobre o terreno ................................................ 74

Figura 91 – Rampa e entrada do auditório ............................................................................ 93

Figura 73 – Frequência de ocorrência e Velocidade dos ventos ...................................... 74

Figura 92 – Detalhes do paisagismo e praça ......................................................................... 93

Figura 74 – Índice pluviométrico São Paulo ............................................................................ 74

Figura 93 – Varandas e espaço de convivência .................................................................. 93

Figura 75 – Implantação do edifício paralelamente ao terreno ........................................ 76

Figura 94 – Lanchonete ............................................................................................................. 93

Figura 76 – Esquema de insolação do edifício ...................................................................... 76

Figura 95 – Praça coberta ......................................................................................................... 93

Figura 77 – Detalhes do paisagismo proposto – vista Capitão João ................................. 77

Figura 96 – Foyer do auditório................................................................................................... 93

Figura 78 – Detalhes do paisagismo proposto – vista Dom José Gaspar .......................... 77

Figura 97 – Detalhes do paisagismo praça superior ............................................................. 94

Figura 79 – Detalhes do paisagismo proposto – praça inferior ........................................... 77

Figura 98 – Painéis circulação .................................................................................................. 94

Figura 80 – Programa de necessidades básico da casa abrigo ........................................ 78

Figura 99 – Painéis externos e pátio interno............................................................................ 94

Figura 81 – Diagrama de bolhas............................................................................................... 79

Figura 100 – Circulação ............................................................................................................. 94

Figura 82 – Partido do projeto ................................................................................................... 79

Figura 101 – Hall da biblioteca ................................................................................................. 94

Figura 83 – Primeiro estudo volumétrico do projeto .............................................................. 80

Figura 102 – Praça superior ....................................................................................................... 94

Figura 84 – Proposta final de estudo volumétrico do anteprojeto ..................................... 80


LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABCDM

Cidades de Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul, Diadema e

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

Mauá

IPEA

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

AV.

Avenida

M

Metro

CA

Coeficiente de Aproveitamento

Metro quadrado

CEAM

Centro Especializado de Atendimento A Mulher

MIN

Minutos

MUNIC

Pesquisa de Informações Básicas Municipais

ODS

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

OEA

Organização dos Estados Americanos

OMS

Organização Mundial da Saúde

ONGS

Organizações Não Governamentais

ONU

Organização das Nações Unidas

RP1

Região de Planejamento 1

SPM

Secretaria de Políticas para Mulheres

TO

Taxa de Ocupação

ZUD

Zona de Uso diversificado

CIDH

Comissão Intramericana de Direitos Humanos

CMB

Casa da Mulher Brasileira

CNDM

Carta Nacional das Mulheres

CREAM

Centro de Referência de Atendimento à Mulher

CREAS

Centro de Referência Especializado de Assistência Social

CPTM

Companhia Paulista de Trens Metropolitanos

DEAM

Delegacia de Atendimento à Mulher

FAUUSP

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo

H

Horas


SUMÁRIO

2.16.1 Aumento da violência contra mulher durante a pandemia no Estado de

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 16

São Paulo ............................................................................................................... 34

2 CONCEITUAÇÃO DO TEMA ................................................................................................. 18

2.16.2 Diretrizes para atendimento em casos de violência de gênero contra

2.1 Contextualização histórica - Mundial ...................................................................... 19 2.2 Contextualização histórica - Brasil ........................................................................... 20 2.3 Violência contra mulher ............................................................................................ 21 2.4 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil ............................................. 24 2.5 Lei Maria da Penha ..................................................................................................... 25 2.6 Rede de atendimento à mulher e enfrentamento da violência ........................... 26 2.7 Fluxo do acolhimento institucional ........................................................................... 27 2.8 Diretrizes nacionais para abrigamento .................................................................... 28 2.9 Norma técnica de Padronização para Abrigamento e Funcionamento das Casas-abrigo ............................................................................................................... 28 2.10 Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher ....................... 29 2.11 Diretrizes Gerais e Protocolos de Atendimento – Programa Mulher, Viver sem Violência – Casa da Mulher Brasileira ....................................................................... 29

meninas e mulheres em tempos de pandemia de Covid-19 ...................... 35 3 ESTUDOS DE CASO................................................................................................................ 37 3.1

Estudo de caso nacional – Casa da Mulher Brasileira / Marcelo Pontes, Valéria Laval e Raul Holfiger / Brasil ....................................................................................... 38 3.1.1 Ficha técnica ......................................................................................................... 38 3.1.2 Programa de necessidades ................................................................................ 39 3.1.3 Fluxograma ............................................................................................................ 39 3.1.4 Setorização ............................................................................................................ 40 3.1.5 Circulação ............................................................................................................. 41

3.2 Estudo de caso nacional – Edifício Projeto Viver / Brasil ........................................ 42 3.2.1 Ficha técnica ......................................................................................................... 42 3.2.2 Programa de necessidades ................................................................................ 43 3.2.3 Fluxograma ............................................................................................................ 43

2.12 Casas abrigo ............................................................................................................... 29

3.2.4 Setorização ............................................................................................................ 44

2.13 Casas de acolhimento ............................................................................................... 30

3.2.5 Circulação ............................................................................................................. 45

2.14 Casas abrigo e índices de violência no Brasil ......................................................... 31

3.3 Estudo de caso internacional – Casa de acolhimento para menores / CEBRA /

2.15 Público alvo ................................................................................................................. 32

Dinamarca .................................................................................................................... 46

2.16 Violência contra mulher e relação com a Covid-19 ............................................. 32

3.3.1 Ficha técnica ......................................................................................................... 46 3.3.2 Programa de necessidades ................................................................................ 47


3.3.3 Fluxograma ............................................................................................................. 47

4.4 Cidade de Mauá ......................................................................................................... 64

3.3.4 Setorização............................................................................................................. 48

4.5 Violência e redes de assistência à mulher em Mauá............................................. 64

3.3.5 Circulação .............................................................................................................. 49

4.6 Localização da proposta: Bairro Matriz .................................................................... 65

3.4 Estudo de caso internacional – Abrigo para vítimas de violência doméstica /

4.7 Terreno .......................................................................................................................... 66

Amos Goldreich Architecture + Jacobs Yaniv Archtects / Israel ........................... 50

4.8 Levantamento fotográfico .......................................................................................... 67

3.4.1 Ficha técnica ......................................................................................................... 50

4.9 Legislação .................................................................................................................... 69

3.4.2 Programa de necessidades ................................................................................ 51

4.10 Índices urbanísticos .................................................................................................... 69

3.4.3 Fluxograma ............................................................................................................. 52

5 LEITURA URBANA ................................................................................................................... 70

3.4.4 Setorização............................................................................................................. 52

5.1 Uso do solo ................................................................................................................... 71

3.4.5 Circulação .............................................................................................................. 54

5.2 Ocupação do solo ...................................................................................................... 71

3.5 Estudo de caso internacional – Casa albergue KWEICO / Hollmén Reuter

5.3 Estado de conservação ............................................................................................. 72

Sandman Architects / Tanzânia ................................................................................ 55 3.5.1 Ficha técnica ......................................................................................................... 55 3.5.2 Programa de necessidades ................................................................................ 56 3.5.3 Fluxograma ............................................................................................................. 56 3.5.4 Setorização............................................................................................................. 57 3.5.5 Circulação .............................................................................................................. 57 3.6 Análise geral dos estudos de caso........................................................................... 58 4 ESTUDO DO LOCAL .............................................................................................................. 60 4.1 Estatísticas gerais do Estado de São Paulo .............................................................. 61 4.2 Violência contra mulher na Região do ABC ........................................................... 62 4.3 Redes de assistência à mulher na Região do ABC ................................................. 62

5.4 Sistema viário ............................................................................................................... 72 5.5 Transportes e vias de acesso ..................................................................................... 73 5.6 Insolação, ventos e pluviosidade ............................................................................. 73 6 PROJETO ................................................................................................................................ 75 6.1 Implantação ................................................................................................................ 76 6.2 Programa de necessidades ....................................................................................... 78 6.3 Diagrama de bolhas ................................................................................................... 79 6.4 Conceito e partido ...................................................................................................... 79 6.5 Fluxograma .................................................................................................................. 81 6.6 Setorização .................................................................................................................. 82 6.7 Circulação ................................................................................................................... 83


6.8 Conforto ambiental e sustentabilidade ................................................................... 85 6.9 Legislação de uso e ocupação do solo .................................................................. 85 6.10 Implantação ............................................................................................................... 86 6.11 Térreo Capitão João................................................................................................... 87 6.12 Térreo Dom José Gaspar ........................................................................................... 88 6.13 Primeiro Pavimento – Convívio, autonomia e empoderamento ........................... 89 6.14 Segundo Pavimento – Habitação ............................................................................. 90 6.15 Terceiro Pavimento – Habitação............................................................................... 91 6.16 Cortes ........................................................................................................................... 92 6.17 Elevação principal e Perspectivas – Capitão João ................................................ 93 6.18 Elevação principal e Perspectivas – Dom José Gaspar ......................................... 94 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 95 8 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 96


16

1

INTRODUÇÃO

projeto

Com isso, o trabalho trata de assuntos relacionados à violência

arquitetônico de uma casa abrigo para mulheres em situação de violência na

doméstica, apresentando dados de pesquisa para a contextualização da

cidade de Mauá, na Região ABCDM do estado de São Paulo. Abrangendo

realidade enfrentada por vítimas no país, instrumentos vigentes no Brasil para o

conceitos sociais, históricos, de direitos humanos, do serviço social e de como a

enfrentamento da violência doméstica, como a Lei Maria da Penha, as Redes

arquitetura pode contribuir para cessar o ciclo da violência, empoderar tais

de Atendimento à Mulher e enfrentamento da Violência, o Fluxo do

mulheres, proporcionando-lhes uma reestruturação econômica-social e novas

Acolhimento Institucional, as Diretrizes Nacionais de Abrigamento, o Pacto

oportunidades de maneira digna.

Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher e o Programa

O

presente

trabalho

tem

como

objetivo

elaborar

um

Em 1988, a Carta das Mulheres aos Constituintes (CNDM) foi apresentada, com uma série de reinvindicações à Assembleia Nacional. Entre as quais “a lei coibirá a violência na constância das relações familiares, bem como o abandono dos filhos menores” e, se tratando especificamente sobre a

Mulher, Viver sem Violência. Apresenta ainda o conceito de abrigamento, seu histórico no país e o que é oferecido pelo governo, dentro das necessidades que a assistência social deve ofertar às pessoas em situação de violência doméstica.

violência pediram a “criminalização de quaisquer atos que envolvam

Tendo em vista a crescente demanda presente na Região do ABC, os

agressões físicas, psicológicas ou sexuais à mulher, fora e dentro do lar”

dados levantados sobre a necessidade de ampliação de serviços oferecidos às

devendo ser “garantida pelo Estado a assistência médica, jurídica, social e

mulheres em situação de risco de morte e violência doméstica, a criação de

psicológica a todas as vítimas de violência” e ainda “será responsabilidade do

novos centros de acolhimento são fundamentais para ajudar mulheres a

Estado a criação e manutenção de albergues para mulheres ameaçadas de

quebrar o ciclo da violência. As elevadas taxas de violência contra mulheres,

morte, bem como o auxilio à sua subsistência e de seus filhos”. Todas essas

com que a sociedade brasileira convive, são estruturais e decorrentes das

reinvindicações buscavam, além de garantir a presença feminina no

desigualdades sociais, podendo ser agravadas em contextos de crises sociais,

Congresso, garantir os direitos das mulheres na nova constituição e, mesmo se

politicas, econômicas ou sanitárias – como a pandemia de covid – 19.

passando mais de trinta anos desde a Carta, é importante ter-se a ciência de

Podendo resultar em impactos imensuráveis para o futuro de meninas e

que ela ainda não é implementada como deveria, mesmo havendo esforços

mulheres, sendo de suma importância que os governos e a sociedade estejam

por parte de diferentes setores e alguns retrocessos. (CNDM, 1988).

atentos para os fatores que podem ser agravados na situação da pandemia e que resultem em mais violência, como medo de contaminação/adoecimento,


17

comprometimento da saúde mental, falta de autocuidado expondo a família

do terreno com principais ligações com as cidades vizinhas, facilidade de

ao risco, aumento do consumo de drogas ou álcool, desemprego ou

acesso por meio de transporte público e proximidade com outros elementos da

dificuldades financeiras, conflitos relacionados ao cotidiano doméstico, etc.

rede de enfrentamento da violência. Sendo importante correlacionar com a

Metodologicamente,

este

trabalho

foi

dividido

em

três

partes:

conceituação do tema, estudo do local e projeto. Na primeira parte, através

legislação municipal e índices urbanísticos, além da análise urbana. Por

fim,

a

terceira

parte

refere-se

à

fase

de

conceituação,

de processo de pesquisa, análise de informações obtidas em publicações

desenvolvimento do programa de necessidades, fluxograma, setorização,

semelhantes e estudo de caso nacionais – Casa da Mulher Brasileira (Marcelo

croquis e estudos de volumes que convergem para que o projeto atenda todas

Pontes, Valéria Laval e Raul Holfiger)

e Edifício Projeto Viver (FGMF) – e

as soluções do problema proposto, uma vez que, segundo Kowaltowski, 2011,

internacionais – Casa de Acolhimento para Menores (CEBRA), Abrigo para

para desenvolver, amadurecer e validar as soluções projetuais utilizam-se

Vítimas de Violência Doméstica (Amos Goldreich Architecture + Jacobs Yaniv

diferentes conhecimentos, que vão desde o saber empírico acumulados nas

Architects) e Casa albergue KWEICO (Hollmén Reuter Sandman Architects),

experiências passadas dos projetistas – marcando um saber de ofício – aos

visando o conhecimento de diferentes projetos inseridos em diferentes culturas

conhecimentos

e necessidades, acrescentando repertório, com intuito de compreender e

recentemente aos conhecimentos presentes em diversos algoritmos.

identificar os problemas que envolvem o tema, estabelecendo objetivos, critérios e restrições e assim contribuir para a formulação e desenvolvimento da segunda e terceira partes do trabalho.

acumulados

em

livros,

leis,

textos

normativos

e,

mais

Dessa maneira, o principal objetivo é resgatar e criar um espaço de segurança,

proteção

e

reconstrução

da

cidadania,

autoestima

e

empoderamento através de valores feministas. Revendo conceitos de violência

A segunda parte refere-se ao lugar escolhido para o desenvolvimento do

doméstica, mesmo sem risco de morte, para mulheres e seus filhos, podendo,

projeto, tomando como partido referências pertinentes ao tema para tal

assim proteger e prevenir a continuidade da violência, superação e

escolha.

desenvolvimento de oportunidades, propondo um novo modelo de casa-

Sendo que a compreensão e a interpretação do lugar podem

contribuir para a geração do espaço. Dessa forma, avaliou-se a proximidade

abrigo que mude o paradigma do acolhimento institucional na cidade.


18

2

CONCEITUAÇÃO DO TEMA

“Eu não sou livre enquanto alguma mulher não o for, mesmo quando as correntes dela forem muito diferentes das minhas. ” (Audre Lord, 1977).


19

2.1

Contextualização – Mundial

A história da violência contra as mulheres permanece vaga, parte porque muitos casos são subnotificados e, parte porque ainda são aceitos, submetidos a normas sociais, estigmas e a sensibilidade do assunto. Reconhece-se que, mesmo hoje, a falta de dados é um empecilho para formar uma imagem clara da violência contra as mulheres. (DAHLBERG et al., 2002). Grande parte da violência foi aceita, tolerada e até legalmente sancionada, estando intimamente

relacionada

com

a

visão

histórica

das

mulheres

como

propriedade e um papel de subserviência de gênero, as explicações sobre patriarcado e de um sistema mundial de desigualdades existem e são perpetuadas. (ZIMMERMAN E WATTS, 2002). De acordo com Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, Estudo a fundo sobre todas as formas de violência contra mulher, 2006, não existe uma região do mundo, nenhum país ou cultura em que a liberdade das mulheres da violência tenha sido assegurada. Várias formas de violência são mais prevalentes em algumas regiões do mundo, muitas vezes em países em desenvolvimento. A violência relacionada ao dote é associada à Índia, Bangladesh, Sri Lanka e Nepal; o ataque com ácido também está associado a estes países, bem como no sudoeste asiático; crimes de honra estão associados ao Oriente Médio e ao Sul da Ásia; mutilação genital feminina é encontrada principalmente na África, em menor medida no Oriente Médio e Ásia; rapto de noivas são encontrados em partes da África Subsaariana e Oceania. Certas partes do mundo não estão mais associadas a uma forma específica de

violência, mas esta era comum até recentemente, assim como os crimes de honra no Mediterrâneo e sul da Europa. (ZIMMERMAN E WATTS, 2002). A invocação da cultura para explicar formas específicas de violência contra mulher não pode legitimá-las, existem debates sobre como as tradições, costumes locais e expectativas sociais, bem como várias interpretações religiosas, interagem com práticas abusivas. Tais justificativas são questionáveis, uma vez que são defendidas por líderes políticos ou autoridades tradicionais e, não pelas partes afetadas. (ONU, 2006). Na década de 1870, os tribunais dos Estados Unidos deixaram de reconhecer o princípio de direito comum de que um marido tinha o direito de castigar fisicamente uma esposa errante. (CALVERT, 1974). No Reino Unido, o direito de um marido infligir um castigo corporal em sua esposa foi removido em 1891. (ENCYCLOPAEDIA BRITANNICA ELEVENTH EDITION, 1911). Nos séculos XX e XXI e, principalmente desde a década de 1990, houve uma maior atividade para pesquisar, conscientizar e defender a prevenção de todos os tipos de violência contra as mulheres. Tendo sido enquadrada como uma questão de saúde e violação dos direitos humanos. Entretanto, um estudo em 2002 estimou que pelo menos uma a cada cinco mulheres no mundo tinha passado por algum tipo de violência em algum momento da vida. Algumas características foram apontadas pelo estudo, por exemplo, os atos de violência geralmente não são episódios únicos, é perpetrada por alguém que a mulher conhece, sendo a violência contra a mulher um problema grave e


20

generalizado em todo o mundo, com efeitos devastadores sobre a saúde o

guerra. A maior parte desses assassinatos ocorreu no Brasil, um país com

bem estar de mulheres e crianças. (HORTON E VENIS, 2002).

legislação avançada, mas com uma estrutura de apoio que não dá conta da

Segundo El país, 2017, as regiões do mundo que menos garantem os

demanda. Os dados apontam somente uma parte do problema, já que as

direitos das mulheres continuam sendo a África Subsaariana, a Ásia Meridional

informações são difíceis de homologar, o documento também não inclui nem

e o Oriente Médio. Na Europa, continente que mais pune a violência de

o México nem a Colômbia. Na região, os países que concentram os índices

gênero, a Rússia se destaca como país menos seguro. A maioria das mulheres

mais altos de violência estão na América Central, El Salvador aparece com a

que denunciam está nos Estados Unidos e na Europa, onde a legislação é mais

maior taxa de feminicídios, seguido por Honduras, Guatemala e Nicarágua. O

garantista. Acerca da legislação sobre violência doméstica, dois terços dos

Brasil está em 14º lugar em relação aos países da América Latina analisado

países a punem, porém mais de quarenta não o fazem, propiciando a

pela ONU Mulheres. (REINA, et al., 2018).

violência e até o assassinato sem nenhuma punição. (CASTILLO, 2017).

Figura 01 – Países que mais matam mulheres no mundo.

2.2

Contextualização histórica – Brasil

O percurso entre os direitos das mulheres e as lutas por igualdade sempre caminharam juntamente, desde a época do Brasil Colônia (1500-1822), se traz uma cultura enraizada de repressão, desigualdade e do patriarcado, onde as mulheres eram propriedades de seus pais ou maridos. Nesse período, a luta das mulheres focava em carências como direito à política, educação e acesso ao mercado de trabalho. (FAHS, 2018). Já durante o período do Império (1822-1889), o direito a educação da Fonte: ONU Mulheres, 2017.

mulher passou a ser reconhecido e, não havia ainda de fato uma proibição à vida política das mulheres, tendo em vista que elas nem eram reconhecidas como possuidoras do direito pelos constituintes. (FAHS, 2018). Ainda segundo,

Já na América Latina, nove mulheres são assassinadas por dia, de acordo

Fahs, 2018, algumas mudanças começaram a ocorrer no mercado de trabalho

com a ONU Mulheres, é o local mais perigoso para elas, fora de uma zona de

durante as greves em 1907 e 1917, com inspiração anarco-sindicalistas, que


21

buscavam melhores condições de trabalho nas fábricas têxteis, onde o

possa resultar em danos ou sofrimentos físicos, sexuais ou mentais para as

trabalho feminino era predominante.

mulheres, inclusive ameaça de tais atos, coação ou privação de liberdade,

No século XX, as discussões sobre a participação das mulheres são retomadas, em 1922 é fundada a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino. Em 1928 é autorizado o primeiro voto feminino e a primeira prefeita é eleita no país, fatos que acabaram sendo anulados, mas que abriram um grande precedente. Em 1932, durante o governo Vargas, o sufrágio feminino é então garantido. (FAHS, 2018). Durante os anos que antecedem o Estado Novo, o feminismo ganha força por intermédio da divulgação de suas ideias em jornais, reuniões e arte. Entre os anos ditatoriais, o movimento perde força, mesmo assim destacase conquistas como a criação da Fundação das Mulheres do Brasil, aprovação

seja feito de maneira pública ou privada. Sendo que a violência por parte do parceiro se refere ao comportamento de um parceiro ou ex que causa danos físicos, sexuais ou psicológicos, incluindo agressão física, coerção sexual, abuso psicológico e comportamentos de controle. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 2017, cerca de 35% das mulheres do mundo já foram agredidas por seus parceiros. No Brasil, dados mais recentes apontam que maridos, ex-maridos e namorados são as pessoas que mais agridem as mulheres, sendo responsáveis por 70% das agressões praticadas. A violência pode afetar negativamente a saúde mental, física, sexual e reprodutiva das mulheres.

da lei do divórcio, e a criação do Movimento Feminino Pela Anistia no ano de

O feminicídio e a violência contra a mulher no Brasil são problemas

1975, considerado como o Ano Internacional da Mulher, realizando debates

urgentes e constantes. Em 2015, a Lei 13.104/2015¹, foi sancionada e aumentou

sobre a condição da mulher. Nos anos 80 foi criado o Conselho Nacional dos

a pena para autores de crimes de homicídios praticados contra mulheres,

Direitos da Mulher, que passaria a Secretaria de Estado dos Direitos da Mulher,

elevando a pena mínima de 6 para 12 anos e a máxima de 20 para 30 anos.

e passou a ter status ministerial como Secretaria de Política para as Mulheres.

Sendo que estes crimes geralmente são praticados por homens, parceiros ou

(FAHS, 2018).

ex-parceiros, em situação de abuso familiar, ameaças ou intimidação, violência sexual, ou situações em que a mulher tem menos poder ou recursos que o homem. (IPEA, 2012). A Lei Maria da Penha (Lei n° 11.340/2006)² tipifica a violência contra a mulher como violência doméstica ou familiar contra a

2.3

Violência contra mulher

mesma. Esta lei tratada a seguir, exemplifica em seus artigos 5° e 6º o que é a violência contra a mulher em ambiente doméstico:

A Organização das Nações Unidas (ONU), 2015, definem a violência contra as mulheres como qualquer ato de violência de gênero que resulte ou

¹ A Lei 13.104/2015 alterou em 9 de março de 2015 o artigo 121 do Código Penal Brasileiro passando a prever o feminicídio como circunstâncias qualificadoras do crime de homicídio e inserindo-o no rol de crimes hediondos. ² A Lei 11.340/2006 foi sancionada em 7 de agosto de 2006 e foi criada para combater a violência doméstica e familiar garantindo punição com maior rigor aos agressores e cria mecanismos para prevenir a violência e proteger a mulher agredida. Vide página 25.


22

2 - Violência psicológica é quando envolve agressão verbal, ameaças, gestos e posturas agressivas, juridicamente produzindo danos morais. Ou seja Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. Art. 6º. A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos.

qualquer conduta que cause à mulher dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças ou decisões; 3 - Violência sexual é qualquer conduta que constranja a mulher a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual que ela não queira, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força. Ou ainda que induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar métodos contraceptivos, que force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição; 4 - Violência patrimonial é entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades. Essa violência é utilizada, muitas vezes, para que a mulher passe a não ter controle sobre seus próprios bens, ficando cada vez mais dependente do

A lei enumera ainda em seu sétimo artigo quais são os tipos de violência no âmbito doméstico: 1 - Violência física é qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal. Comportamento que causa intencionalmente dano ou intimidação a outra pessoa. No âmbito doméstico, quando envolve agressão

parceiro. Existem parceiros que se apossam dos bens materiais da mulher. Alguns tentam impedir ou atrapalhar seu trabalho, outros destroem seus pertences; 5 - Violência moral é qualquer forma de agressão à dignidade da mulher por meio da calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006).

direta contra pessoas queridas do agredido ou destruição de objetos e pertences do mesmo. Tal comportamento pode invadir a autonomia, integridade física ou psicológica e até mesmo a vida de outro. A maioria das violências físicas causa danos psicológicos muitas vezes irreversíveis para a mulher;

Atualmente, a taxa de feminicídio no Brasil é a quinta mais alta do mundo e segundo o Mapa da Violência, 2015, o número de assassinatos chega a 4,8 para cada 100 mil mulheres. O mesmo Mapa afirma que entre 1980 e 2013, 106.093 pessoas morreram só por serem mulheres.


23

Figura 02 – Taxa de feminicídios no Brasil.

Fonte: Mapa da violência, 2015.

Figura 03 – Relógio da violência no Brasil.

Fonte: Dossiê feminicídio, 2015.

A Figura 02 sintetiza os dados obtidos na pesquisa do Mapa da Violência,

Segundo levantamento do DataSenado, 2015, a opinião das mulheres a

2015, onde foram aferidos que desde 1980, ano em que a pesquisa se iniciou,

respeito da violência estar aumentando cresceu entre os anos de 2009 à 2015,

houve um crescente aumento na taxa de homicídios contra as mulheres,

além disso, a pesquisa também mostra que a idade da primeira agressão

passando de 2,3 para 3,8 na década seguinte e chegando a 4,3 em 2000.

tende a ser entre os 20 aos 29 anos e é realizada 73% pelo próprio marido ou

Havendo um decréscimo nos cinco anos seguintes, um aumento significativo

companheiro e, dentro deste percentual de mulheres agredidas 26% ainda

em 2010, passando de 4,1 para 4,6, e mantendo-se constante nos anos

vivem com o agressor e 14% continuam sendo vítimas, os motivos apontados

conseguintes, chegando a 4,8 em 2013, levando-se sempre em consideração a

são principalmente o ciúmes e o uso de bebidas alcoólicas. Uma a cada cinco

proporção por 100 mil mulheres.

mulheres não faz nada quando agredida, por razões de preocupação com os

Já segundo dados compilados pelo Dossiê Feminicídio, 2015, acontecem 1 estupro a cada 11 minutos, 1 mulher assassinada a cada 2 horas, 503 mulheres vítimas de agressão a cada hora e 5 espancamentos a cada 2 minutos, resumidos na Figura 03.

filhos, medo da vingança do agressor, dependência financeira, crença de impunidade e vergonha. Na figura 04 ilustram-se as principais informações compiladas pela pesquisa acima citada.


24

2.4

Figura 04 – Resumo dos dados pesquisados.

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil

Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são um apelo ao mundo todo para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima, garantindo assim que todas as pessoas desfrutem de paz e prosperidade. Para o Brasil, as Nações Unidas, contribuem com 17 objetivos para que a agenda seja atendida em 2030. Entre os quais se encontram o Objetivo

de

Desenvolvimento

Sustentável

5:

Igualdade

de

gênero.

(ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2017). O principal intuito deste objetivo é alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas, acabando com todas as formas de discriminação; eliminando todas as formas de violência, tanto nas esferas públicas, quanto privadas; eliminando as práticas nocivas; reconhecendo e valorizando o trabalho doméstico e não remunerado, disponibilizando serviços públicos, infraestrutura e políticas sociais; garantindo a participação e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis, sejam eles políticos, econômicos ou públicos; assegurando o acesso universal à saúde

Fonte: DataSenado, 2015, adaptado pela autora, 2020.

sexual e reprodutiva das mulheres; realizando reformas para dar às mulheres direitos iguais aos recursos econômicos, acesso a propriedade e controle sobre Apesar de dados graves e impactantes, os mesmos podem ainda

a terra; uso de tecnologias de base, informação e comunicação para

representar apenas uma parte da realidade, já que uma parcela considerável

promover

dos crimes não é denunciada e, às vezes quando são, nem sempre são

fortalecendo politicas sólidas e legislação para promoção de igualdade de

reconhecidos

gênero e empoderamento de todas as mulheres e meninas. (ORGANIZAÇÃO

ou

registrados

pelos

agentes

de

segurança

e

perpetuando o ciclo da violência. (INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO, 2015).

justiça,

o

empoderamento

DAS NAÇÕES UNIDAS, 2017).

das

mulheres

e,

por

fim,

adotando

e


25

Para que isso seja possível, a Organização das Nações Unidas, 2017,

quatro meses depois, quando Maria da Penha voltou para casa após cirurgias

destaca a importância de se entender os conceitos de gênero, igualdade e

e tratamentos, foi mantida em cárcere privado durante quinze dias, quando

discriminação,

então ele tentou eletrocutá-la durante o banho. (PENHA, 2012).

compreendendo

suas

causas

atuais

e

históricas,

o

reconhecimento dos direitos fundamentais das mulheres, os benefícios proporcionados pela plena igualdade e pela participação da sociedade e governo, assim como a participação da tecnologia, educação e legislação para que isso seja proporcionado.

Somente depois, com ajuda familiar e apoio jurídico, sua saída de casa foi providenciada sem que fosse caracterizada como abandono de lar. Mesmo assim, no primeiro julgamento, que só ocorreu oito anos após o crime, o acusado saiu em liberdade. O segundo julgamento só foi realizado em 1996, no

Assim, a sociedade é capaz de reconhecer, questionar sobre o assunto e

qual o seu ex-marido foi condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Contudo,

denunciar todas as formas de discriminação. O individuo se torna apto a

sob a alegação de irregularidades processuais por parte dos advogados de

conectar-se com outras pessoas para que a violência e discriminação de

defesa, mais uma vez a sentença não foi cumprida. (PENHA, 2012).

gênero acabem, permitindo também o fortalecimento daqueles que estão em situação de impotência ou fragilidade, promovendo a empatia, respeito e solidariedade, sendo capaz de avaliar seu entorno e próprios comportamentos. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2017).

Em 1998 o caso ganhou dimensão internacional e foi denunciado para a Comissão Intramericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) e mesmo assim o Estado brasileiro se manteve omisso durante todo o processo, sendo responsabilizado em 2001 por negligencia, omissão e tolerância em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. A história da Maria da Penha exemplificava o que

2.5

Lei Maria da Penha

acontecia no país, onde os agressores nunca eram punidos. (INSTITUTO MARIA DA PENHA, 2018). Era necessário que o caso Maria da Penha fosse tratado como uma violência contra a mulher em razão do seu gênero, reforçando o padrão desta

Maria da Penha Fernandes é uma mulher cearense nascida em 1945 que

violência e acentuando a impunidade dos agressores. Em face da falta de

teve sua história conhecida nacionalmente e virou símbolo da luta contra a

medidas legais, como acesso a justiça, proteção e garantia de direitos as

violência doméstica sofrida pelas mulheres. Em 1983 ela foi vítima de dupla

vitimas,

tentativa de feminicídio, pelo seu então marido Marco Antônio Heredia Viveros,

Governamentais) feministas para a elaboração de uma lei de combate a

que primeiro deu um tiro em suas costas enquanto dormia o que ocasionou

violência doméstica e familiar contra a mulher. (INSTITUTO MARIA DA PENHA,

lesões irreversíveis, sua paraplegia e traumas psicológicos. Entretanto, Marco

2018).

Antônio declarou que tudo não havia passado de uma tentativa de assalto e

foi

formado

um

consórcio

de

ONGS

(Organizações

Não


26

A Lei 11.340/06: Maria da Penha foi sancionada em 2006 pelo presidente

Entretanto, de acordo com Garcia, 2013, a Lei Maria da Penha trouxe a

Luiz Inácio Lula da Silva, com 46 artigos distribuídos em sete títulos, criando

responsabilização da violência contra a mulher, mas ainda há a necessidade

mecanismos para prevenir e coibir a violência em conformidade com a

de uma mudança na sociedade brasileira, afirmando que nenhuma legislação

Constituição Federal e estabelece medidas de assistência e proteção às

por si só resolve o problema, uma vez que a desigualdade de gênero existente

mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

na sociedade alimenta a violência contra a mulher.

Entre seus títulos está determinada a quem a lei é direcionada, ressaltando a responsabilidade da família, sociedade e poder público, para que todas as mulheres tenham seus direitos assegurados. Configuram os diferentes tipos e formas de violência, a questão da assistência a mulher,

2.6

Rede de atendimento à mulher e enfrentamento da violência

medidas integradas de prevenção e atendimento social. Tratam ainda dos procedimentos processuais, jurídicos e atuação do Ministério Público e das medidas protetivas e urgentes. A criação de juizados especializados e

De acordo com dados do Governo Federal, o Brasil possuía, em 2014,

destinação de verba e, por fim, a integração com outros equipamentos

pouco mais de 1000 serviços especializados de atendimento à mulher em

públicos, destacando-se o artigo 35 da lei exemplifica algumas medidas que

situação de violência doméstica, formando a rede de atendimento à mulher

podem ser tomadas pelo poder público, entre elas estão a criação:

em busca do enfrentamento da violência. Oferecem políticas que garantam o empoderamento das mulheres e seus direitos humanos, a responsabilização

I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar;

dos agressores e assistência qualificada as mulheres.

II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar;

Mulher (CEAM), Casas Abrigos, Casas de Acolhimento Provisório, Delegacias

III - delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médico legal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar;

Mulher em delegacias comuns, Defensorias Públicas e Defensorias da Mulher,

IV - programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar; V - centros de educação e de reabilitação para os agressores. (BRASIL, Lei n° 11.340, 7 de agosto de 2006).

Fazem parte destes serviços os Centros Especializados de Atendimento a Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM), Postos de Atendimento à Juizados Especializados de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, Promotorias Especializadas, Casa da Mulher Brasileira (CMB), Serviço de Saúde Geral e Serviços de Saúde voltados para o atendimento dos casos de violência.


27

Segundo a pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica

Mulher (CREAM), quando em horário comercial ou diretamente para o plantão

Aplicada (IPEA), 2015, “A institucionalização das Políticas Públicas de

da Casa Abrigo, quando em horário não comercial. A vítima é avaliada por

Enfrentamento à Violência”, existia no Brasil, até 2013, 583 organismos de

uma equipe, composta por profissionais como psicólogos, assistentes sociais e é

políticas para as mulheres em 560 cidades; 70 cidades possuíam casas-abrigo e

orientada a registrar ocorrência na Polícia Civil. O CREAS faz um relatório sobre

77, casas de acolhimento; 37 municípios possuíam serviços de saúde

a situação da mulher e gera uma solicitação de abrigamento no município,

especializados; quanto às delegacias especializadas, 381 delegacias da mulher

onde o atendimento oferecido depende da demanda. (SPM, 2013).

e 125 núcleos em delegacias comuns. Observa-se que mesmo com o crescimento de 309%, entre os anos de 2004 e 2014, o número de serviços para enfrentamento da violência ainda é

Figura 05 – Fluxo de atendimento.

baixo e pouco distribuído pelo país, concentrando-se em macrorregiões e em grandes cidades. Ainda segundo o IPEA, 2015, a maior parte está localizada na região Sudeste e Sul.

2.7

Fluxo do Acolhimento Institucional

Atualmente, a mulher em situação de risco por causa da violência doméstica passa por etapas antes do abrigamento, sendo que o primeiro contato com a mulher pode ser realizado por serviços não especializados ou especializados de atendimento a mulher, vinculados aos organismos de políticas para as mulheres da Justiça, Segurança Pública, Assistência Social e Saúde. (SECRETÁRIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES, 2013). Ela será encaminhada para o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) ou para o Centro de Referência de Atendimento à

Fonte: SPM, 2013, adaptado pela autora, 2020.


28

2.8

Diretrizes nacionais para abrigamento

2.9

Norma

técnica

de

Padronização

para

Abrigamento

e

Funcionamento das Casas-abrigo

O abrigamento da mulher em situação de risco ou ameaça de morte em

Trata-se de um documento estabelecido por consenso, em 2011, que

virtude da violência doméstica e familiar não se resume a uma casa de

fornece

acolhimento, demandando inúmeros outros serviços, programas e benefícios

cumprimento não é obrigatório, mas visam a otimização de benefícios para a

para que o abrigamento seja acolhedor e recupere a vítima. Devendo priorizar

sociedade. Traz a concepção de que abrigamento consiste na gama de

o bem estar físico, psicológico e social das mulheres.

serviços, programas e benefícios de acolhimento destinados às mulheres em

Conforme conta nas Diretrizes Nacionais de Abrigamento às Mulheres em Situação de Risco e Violência, 2011, vale ressaltar que qualquer possibilidade de abrigamento requer o acompanhamento da mulher por um serviço especializado, pois muitas vezes trata-se de situações que a mulher está com sua rede de apoio primária comprometida. As Diretrizes Nacionais de Abrigamento tem como base os princípios propostos pelo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2004-2008), levando-se em consideração a igualdade e respeito à diversidade, autonomia

para

uso

comum,

regras,

diretrizes

ou

características,

cujo

situação de violência e que necessitem de proteção em ambiente acolhedor e seguro. Tendo como objetivos garantir a integridade e favorecendo o exercício da condição de cidadã e de seus direitos. Além disso, discorre sobre os pressupostos da violência doméstica e de gênero, que transpassa as fronteiras de classe, raça e etnia. Sendo o publico alvo mulheres sob risco de morte e em situação de violência doméstica, com período de permanência, triagem e fluxo do abrigamento. (SUPERINTENDÊNCIA DE DIREITOS DA MULHER, 2011).

das mulheres, laicidade do Estado e Universalidade das políticas. Onde homens

O sigilo e a segurança são condições essenciais para o funcionamento

e mulheres são iguais em seus direitos, o poder de decisão sobre suas vidas e

da casa abrigo, devendo seu endereço ser preservado. A situação de risco de

corpos deve ser assegurado às mulheres, as políticas públicas empregadas

morte em que se encontram as mulheres torna necessária a existência de um

devem ser implementadas independente dos princípios religiosos e as politicas

serviço de segurança 24h. É também muito importante que as casas trabalhem

devem garantir acesso aos direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais.

de forma articulada com a rede local de DEAM, CRAM, Hospitais, Defensorias, etc, visando o fortalecimento social, emocional e físico da mulher em questão. (SUPERINTENDÊNCIA recomendações

DE

DIREITOS

pragmáticas,

o

DA

MULHER,

documento

2011).

traz

o

Dentre padrão

outras mínimo

recomendado para implementação de recursos humanos, qualificação de


29

profissionais,

padrão

mínimo

do

espaço

físico,

regimento

interno,

violência. Definindo as premissas e as bases para implementação da Casa da

monitoramento do funcionamento, levantamento de informação e dados.

Mulher Brasileira e guiando os critérios e práticas unificadas para o

(SUPERINTENDÊNCIA DE DIREITOS DA MULHER, 2011).

abrigamento. O Programa Mulher, Viver sem Violência, possui seis estratégias de ação: criação da Casa da Mulher Brasileira, ampliação do atendimento do Ligue 180,

2.10 Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher

criação dos Centros de Atendimento às Mulheres, organização e humanização do atendimento às mulheres vítimas de violência sexual, implantação das unidades móveis de atendimento as mulheres e realização de campanhas continuadas de conscientização.

Lançado em 2007, pelo Governo Federal, consiste em um acordo entre os governos federal, estadual e municipal para o planejamento de ações que consolidassem o enfrentamento da violência contra a mulher por meio de políticas públicas. Organizando as ações em grandes eixos: garantia da aplicabilidade da Lei Maria da Penha, ampliação e fortalecimento da rede de

2.12 Casas-abrigo

serviços, garantia da segurança e acesso à justiça, garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, garantia da autonomia das mulheres em situação de violência e ampliação de seus direitos. Embora o Pacto tenha trazido importantes contribuições, ainda são muitos os desafios para a execução das ações previstas.

As primeiras casas-abrigo do mundo surgiram na década de 1970 na Inglaterra, Estados Unidos e Canadá, de acordo com Pense e Shepard, 1999, (apud. MAGALHÃES, MORAIS E CASTRO, 2011) e foram resultado de iniciativas individuais ou de grupos que não eram ligados ao Estado. Surgiram após lutas de movimentos feministas, em um contexto em que existiam poucos programas

2.11 Diretrizes Gerais e Protocolos de Atendimento – Programa Mulher, Viver sem Violência – Casa da Mulher Brasileira

e recursos voltados para o tema da violência contra a mulher, já que o Estado entendia que este tipo de violência possuía um caráter pessoal e privado, em que não podia intervir. (KRENKEL, 2017). Na década de 1980, houve uma profissionalização das casas-abrigo,

Esse documento, 2013, apresenta as medidas de forma a garantir à

devido à incorporação dos projetos pelo Estado, sendo incorporada como

humanização e integração da assistência as mulheres em situação de

uma política pública. Houve criticas quanto à perda de emancipação e


30

empoderamento, devido a uma visão assistencialista do problema e a não

mulheres, seu diagnóstico e encaminhamento. (SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA

participação das mulheres nos processos decisórios. (KRENKEL, 2017).

AS MULHERES, 2011).

A Lei Maria da Penha abriu um grande precedente para a assistência do Estado, onde a principal resposta foi a criação deste equipamento, em 2009 a casa abrigo passou a ser incluída na tipificação dos serviços socioassistenciais como serviço de proteção social especial de alta complexidade, sob a

Figura 06 – Principais diferenças entre casa-abrigo e casa de acolhimento.

denominação de “serviço de acolhimento institucional em situação de violência”. (RESOLUÇÃO CNAS Nº 109, de 11 de novembro de 2009). O Brasil teve sua primeira casa abrigo em 1986 na cidade de São Paulo (Centro de Convivência para Mulheres de Violência Doméstica/Convida), em 1992 foram criadas as casas abrigo Viva Maria (Rio Grande do Sul) e a Casa do Caminho (Ceará), o Distrito Federal recebeu sua primeira casa abrigo em 1996. (MAGALHÃES, 2018).

2.13 Casas de acolhimento Fonte: SPM, 2011.

As casas de acolhimento provisório constituem serviços de abrigamento

Ainda de acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2011,

temporário de curta duração, até quinze dias, não sigilosos, para mulheres em

durante mais de vinte anos, as casas-abrigo constituíram a única forma de

situação de violência, acompanhadas ou não de seus filhos, que não correm

abrigo especializado, restringindo-se somente às mulheres sob grave ameaça e

risco eminente de morte. Acolhendo não somente mulheres em situação de

risco de morte. Não dando conta das novas demandas e ao novo contexto de

violência doméstica e familiar, mas também mulheres que sofrem outros tipos

enfrentamento à violência contra as mulheres.

de violência.

Visam ainda garantir a essas mulheres o acesso a locais

seguros e protegidos, garantindo a integridade física e emocional das


31

2.14 Casas abrigo e índices de violência no Brasil

Segundo a Secretária de Políticas para as Mulheres, em 2011 eram 70 casas-abrigo distribuídas pelo país, sendo a maioria dos serviços governamental

Figura 07 – Mapa com índices de feminicídios no país (por 100 mil habitantes) e distribuição das casas abrigo.

e sigiloso. As casas-abrigo oferecem atendimento temporário para mulheres em risco, os endereços sigilosos garantem a segurança e integridade física da mulher, que permanece pelo menos por 90 dias no local. O intuito é oferecer subsídios para que a mulher consiga viver de forma autônoma. (SECRETARIA MUNICIPAL DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA, 2013). As casas abrigo, como se pode observar na Figura 07, estão em maior número na região Sudeste, totalizando 23 das 77 existentes no país, nesta região, existe também uma melhor distribuição desse tipo de assistência, tanto nas capitais como no interior dos estados. Sendo São Paulo o município com maior número (quatro unidades). Já nas nove unidades federativas do Nordeste,

assim

como

as

do

Norte,

estes

serviços

concentram-se

principalmente nas capitais. (IPEA, 2015). Mas, segundo Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC), 2013, apenas 2,5% das cidades brasileiras têm casas-abrigo. De acordo com o IBGE, em 2013, havia 155 casas-abrigo em 142 cidades brasileiras, sendo o problema especialmente preocupante nos municípios menos populosos. E ainda de acordo com a pesquisa, 35% das casas possuíam endereços que não eram sigilosos e em apenas 29,7% eram realizadas atividades profissionalizantes.

Fonte: IPEA, 2015 e SPM, 2011, adaptado pela autora, 2020.


32

2.15 Público alvo

O público alvo é composto por toda e qualquer mulher independente de

OMS, incluindo a quarentena, reconhecida como essencial para combater a

faixa etária, raça, classe social e orientação sexual. Mulheres vítimas de

rápida disseminação do vírus, o confinamento vem revelando diversos

violências dos mais diferentes tipos, física, psicológica, sexual, econômica, etc.

comportamentos sociais. (MAGALHÃES, 2020).

Mulheres acompanhadas ou não de filhos. Mulheres que vão para os abrigos são mais vulneráveis, pois em geral correm risco de morte ou de sofrer mais violência caso voltem para suas casas. (LIMA, 2018).

Com a chegada da covid-19, o lar – lugar para acolhimento, descanso e afeto – pode rapidamente se tornar um lugar hostil, inseguro e perigoso, se tornando ainda mais presente por conta do isolamento social, mais tempo em

As famílias ou mulheres permanecem na casa por no mínimo 90 dias,

casa, privação da liberdade, convívio mais próximo e duradouro, podendo

sendo que este período pode ser estendido mediante avaliação, durante a

ocorrer um aumento significativo na violência doméstica. (ANDRIAN E GOLFIERI,

moradia recebem tratamento psicológico, jurídico, saúde e participam de

2020).

oficinas e aulas profissionalizantes, buscando o resgate da autoestima, reorganização das defesas e constituição de autonomia. (LIMA, 2018).

Com isso, a ONU Mulheres elaborou um documento que pontua os possíveis impactos advindos da covid-19, para a América Latina:

“Os riscos aumentam devido ao aumento das tensões em

2.16 Violência contra mulher e relação com a Covid-19

casa, e também podem aumentar o isolamento das mulheres (...) as sobreviventes da violência podem enfrentar obstáculos adicionais para fugir das situações violentas ou acessar ordens de proteção que salvam vidas e serviços essenciais devido a fatores como restrições ao movimento em quarentena”.

A população mundial acompanha o aumento vertiginoso dos números de contaminações e mortes por covid-19³, o novo Coronavírus teve sua primeira confirmação no Brasil em fevereiro e rápido crescimento do número de mortes e infectados. Diante do cenário de incertezas, os governos adotaram medidas extremas recomendadas pelo Ministério da Saúde e pela

(ONU Mulheres, Gênero e Covid-19 na América Latina e Caribe, 2020). ³ A covid-19 é uma doença causada pelo Coronavírus SARS-Cov-2, que apresenta um quadro clínico que varia de infecções assintomáticas a quadros respiratórios graves. O novo agente do Coronavírus foi descoberto em 31/12/2019 após casos registrados na China. O número de casos no mundo é de 50.676.072 confirmados e 1.261.075 mortes de acordo com dados da OMS em 10 nov. 2020.


33

Eventos anteriores em outros países já demonstraram que a violência

no contexto da covid-19 e a realização de campanhas sobre a importância da

doméstica aumenta durante e após crises, desastres de grandes proporções e

denúncia nos casos de violência doméstica. Nos países vizinhos (Uruguai, Chile,

epidemias. Alguns países já registraram o aumento da violência contra as

Argentina) o governo decretou o serviço de atendimento à mulher como

mulheres, na China, o primeiro país a adotar o isolamento, o número de

serviço essencial para que não ocorresse paralização ou redução dos serviços.

denúncias dobrou durante o confinamento de janeiro a março, comparado com o mesmo período de 2019; na França, em uma semana de restrições, abusos domésticos subiram 36%. (TOKARSKI E ALVES, 2020).

Como já abordado, a Lei Maria da Penha descreve medidas protetivas e de urgência a serem solicitadas às autoridades policiais pelo Ministério Público, Defensoria Pública e outros órgãos, sobre as quais o juiz deve interceder no

As demandas das mulheres em situação de violência se agravam em

prazo de até 48 horas. Entretanto, durante a pandemia, os dados indicam uma

situações como a enfrentada atualmente, de privação, medo e insegurança.

diminuição dos números relacionados a concessão e a implementação de

Este aumento, entretanto, não surpreende, uma vez que a violência contra

medidas protetivas de urgência fundamentais para as mulheres, levantando o

mulher possui características próprias e a permanência por longos períodos de

questionamento se estas mulheres estão sendo impedidas de ter acesso a rede

tempo em casa é um fator fundamental para que o número de vítimas

de proteção e canais de denúncia, uma vez que a violência letal não pode ser

aumente. (MAGALHÃES, 2020).

escondida, mas os demais tipos de violência, por mais graves que sejam,

O Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, anunciou que houve um aumento de 9% no número de ligações no Disque 180 na primeira quinzena

podem ser encobertos, ainda mais nos casos em que as vitimas permanecem com os agressores no mesmo ambiente. (VENERAL, 2020).

de março, mas o número de ligações pode estar abaixo dos casos reais, uma

Mesmo após a decisão de denunciar, muitas mulheres tendem a se

vez que a presença do agressor em casa pode constranger e inibir a mulher. O

retratar, desta forma, se torna imprescindível o apoio na identificação do crime

governo brasileiro começou a se preparar no início de abril o lançamento de

e no ato de denunciar, quanto uma rede de apoio para que a mulher siga em

novos canais de atendimento onde as denúncias podem ser realizadas.

frente, suporte o processo e os fatos sejam apurados. Ocorre que o medo de

De acordo com a Prefeitura de São Paulo, os serviços de atendimento às

exposição ao covid-19 se torna mais um obstáculo à denúncia do crime, a

mulheres vítimas de violência, em especial as Delegacias de Defesa da Mulher

quarentena dificulta e muitas vezes impede que as mulheres consigam se

continuam funcionando 24 horas. Nesse período, os CRAM estão com horário

desvencilhar das situações de violência e tenham acesso à ajuda. Como

diferenciado, mas a Casa da Mulher Brasileira permanece com suas atividades

resultados disso, os índices de denúncia devem diminuir causando a

ininterruptas.

equivocada impressão de que está havendo uma redução dos crimes. Para

O ofício nº1/2020/DEV/SNPM/MMFHD recomenda entre outras medidas a implementação de comitês de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres

que isso não ocorra é preciso que as autoridades se mantenham disponíveis e em alerta, o Estado deve se organizar para o atendimento de urgências. Considerando o momento atual e o modo que a violência contra mulher ainda


34

está presente em todos os continentes, pode-se analogamente, considerá-la uma pandemia, pois se prolifera como um vírus, para o qual ainda não se encontrou uma resolução definitiva. (ASSUNÇÂO, 2020).

2.16.1 Aumento da violência contra mulher durante a pandemia no Estado de São Paulo

O estado de São Paulo registrou um aumento de 51,4% nos casos de violência doméstica em decorrência do confinamento em março de 2020.

Figura 08 – Gráfico do aumento da violência contra mulher durante a pandemia em São Paulo.

Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública o número total de socorros prestados passou de 6775 para 9817 na comparação entre março de 2019 e março de 2020, enquanto a taxa de feminicídio teve um aumento de 46,2%. Foram mais de 5500 boletins de ocorrência feitos pela internet, entre abril e junho deste ano, representando uma média de 62 registros por dia, que só foram possíveis a partir de abril, por meio da Delegacia Eletrônica, criada para ajudar vítimas que não conseguem sair de casa por conta da pandemia, para registrar queixa contra o agressor. Entretanto, este número de registros é ainda maior, totalizando 29117, entre presenciais e remotos. Outro fato relacionado aos casos de violência contra mulher é o crescimento dos pedidos de medidas protetivas

de

urgência,

que

apresentaram

uma

queda

de

32%

em

comparação com abril de 2019, fato resultante da dificuldade das mulheres em encaminhar queixas de violência em razão do confinamento, já em maio e junho, meses em que a Delegacia Eletrônica estava apta a registrar casos, o aumento foi retomado. Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020, adaptado pela autora.


35

2.16.2 Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero contra Meninas e Mulheres em tempos de Pandemia Covid – 19

presencial, são necessárias reorganizações para atender as medidas sanitárias, levando-se

em

consideração

a

adequação

do

espaço

físico

para

atendimento de forma segura, disponibilidade de equipamentos para profissionais e material de higiene para funcionários e população usuária. Especificamente nos serviços de abrigamento, os procedimentos devem Com o objetivo de embasar uma resposta ao enfrentamento à violência

ser revisados à luz das medidas de isolamento social e que podem agravar a

sofrida por meninas e mulheres neste período, a ONU Mulheres Brasil, divulgou

violência contra as mulheres, priorizando, dessa forma, a segurança das

em agosto, as Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero

mulheres, flexibilizando medidas do ingresso da mulher. Considerando a

contra Meninas e Mulheres em tempos de Pandemia COVID-19, apresentando

natureza do serviço, que pode trazer para o convívio pessoas que podem estar

recomendações para atendimento remoto e reorganização do atendimento

contaminadas pelo vírus, mesmo assintomáticas, é importante que as

presencial, considerando as redes de atendimento a mulheres em situação de

condições

violência e as especificações no acolhimento às vítimas nos serviços policiais,

recomendações sanitárias. Sendo os protocolos de abrigamento revisados,

de saúde, de abrigamento, entre outros. Visando ainda auxiliar e garantir o

tendo como perspectiva os princípios éticos da beneficência/maleficência.

acesso das mulheres às medidas cabíveis nas situações que estejam

(ONU Mulheres, Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero

vivenciando e salientando as medidas sanitárias necessárias para contenção

contra Meninas e Mulheres em tempos de Pandemia COVID-19, 2020).

da COVID-19, assim como as etapas de atendimento em tempos de pandemia e o armazenamento de casos atendidos. (ONU Mulheres, Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero contra Meninas e Mulheres em tempos de Pandemia COVID-19, 2020).

de

funcionamento

do

serviço

sigam

rigorosamente

as

Tal perspectiva tem como premissas a autonomia e consentimento das mulheres, garantindo que estejam informadas sobre os benefícios e riscos das medidas que poderão ser adotadas. O Planejamento do atendimento presencial ou remoto deve considerar todas as condicionantes da mulher, cor,

As Diretrizes são direcionadas a organismos de políticas para mulheres,

raça, condições socioeconômicas, visando garantir acesso e proteção para

conselhos de direitos das mulheres, profissionais de serviços especializados de

todas as mulheres durante o isolamento social. A beneficência trata da oferta

atendimento a mulheres em situação de violência, bem como qualquer

de atendimentos e procedimentos durante o período de quarentena levando

organização que atenda mulheres em situação de violência. Ainda segundo

em consideração os fatores estruturais e circunstanciais na manifestação da

tais Diretrizes, os serviços especializados de atendimento às mulheres foram

violência de gênero contra mulheres, avaliando os benefícios e formas de

incluídos entre os serviços essenciais e ainda enfrentam barreiras para se

mitigar riscos envolvidos nas medidas que venham a ser adotadas, já a

adaptarem ao atendimento não presencial, carecendo de recursos e

maleficência alerta sobre o dano que certos procedimentos podem causar

investimentos financeiros. Já se tratando da continuidade do atendimento

para as mulheres, atendimentos e procedimentos que possam gerar riscos


36

devem ser suspensos ou reorganizados de forma a mitigar os efeitos negativos para a vida das mulheres, nenhum procedimento que cause mais risco à vida das mulheres deverá ser aplicado, principalmente durante o período de isolamento social. (ONU Mulheres, Diretrizes para Atendimento em Casos de Violência de Gênero contra Meninas e Mulheres em tempos de Pandemia COVID-19, 2020). De acordo com a Nota Técnica SNAS nº 25/2020, Atendimento de Mulheres Vítimas de Violência na Rede de Atendimento Durante a Pandemia, é imprescindível

reduzir

a

aglomeração

de

pessoas

no

abrigamento,

reorganizando espaços e separando cômodos, para reduzir o contato entre as acolhidas, principalmente em áreas comuns e de uso coletivo; manter a distância das camas de pelo menos dois metros quando acomodados mulheres desconhecidas e, preferencialmente acomodar somente famílias em um mesmo quarto com uso de banheiro individual.


37

3

ESTUDOS

DE CASO

"Toda vez que uma mulher se defende, sem nem perceber que isso é possível, sem qualquer pretensão, ela defende todas as mulheres." (Maya Angelou, 1958).


38

3.1

Estudo de caso nacional – Casa da Mulher Brasileira / Marcelo Figura 10 e 11 – Elevação: Casa da

Pontes, Valéria Laval e Raul Holfiger / Brasil Figura 09 – Casa da Mulher Brasileira.

Mulher Brasileira.

3.1.1 Ficha técnica

     

Arquitetos: Marcelo Pontes, Valéria Laval e Raul Holfiger. Ano do projeto: 2013. Construção: 2015 (unidade Mato Grosso do Sul). Localização: Capitais do Brasil. Área construída: 3507,72m². Área do terreno: Variável.

Fonte: Cidade de São Paulo, 2016.

Fonte: Arcoweb, 2015.

Grosso do Sul. O intuito era de que houvesse 27 unidades distribuídas pelo país, mas, de acordo com Menezes, 2018, somente sete (Roraima, Maranhão, De acordo com o Governo Federal do Brasil, a Casa da Mulher Brasileira é

Ceará, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, São Paulo e Paraná) foram

uma inovação no atendimento humanizado às mulheres, que agrega em um

entregues e destas, três estão em funcionamento (Maranhão, Mato Grosso do

mesmo espaço serviços especializados, acolhimento, apoio psicológico, social

Sul e Paraná).

e econômico. Faz parte do programa “Mulher, viver sem violência”, coordenado pela Secretária de Políticas para as Mulheres, permitindo o enfrentamento da violência e o empoderamento feminino. (Secretária de Políticas para as Mulheres, 2015). O projeto conta com uma gestão compartilhada entre a União, Estado e as cidades. A primeira unidade foi inaugurada em 2015, no estado do Mato

De autoria dos arquitetos Marcelo Pontes, Valéria Laval e Raul Holfiger, o projeto básico do edifício é o mesmo para todas as cidades, variando somente quanto à implantação e características do terreno. O projeto apresenta uma cobertura levemente ondulada e as cores verde, amarelo e roxo, simbolizando a bandeira nacional e a ideia de acolhimento. Segundo os arquitetos, a forma e as cores devem ajudar as mulheres a identificar estes locais.


39

3.1.2 Programa de necessidades

3.1.3 Fluxograma

Com o intuito de que mulheres vítimas de agressão recebessem em um só

Como pode ser observado no fluxograma da Figura 13, o acesso principal

lugar atendimento nas áreas de saúde, justiça, segurança pública, assistência

leva a parte da recepção da casa, fazendo parte de um enorme eixo regular

social, autonomia financeira e acolhimento, o projeto conta com um vasto

que desmembra toda a circulação interna e funciona como um distribuidor de

programa que é subdividido em outras atividades diversas que servem de

fluxos do projeto, levando aos seis módulos laterais e à parte superior, onde fica

apoio às principais. Resultando em mais de 3500m² de área em um edifício

as principais áreas comuns, integradas a área verde. Pode-se observar

térreo. Onde as metragens totais dos ambientes são vistas na tabela abaixo:

também pelo tracejado do fluxograma que este possui diversos fluxos secundários por conta das inúmeras funções subdividas e repartidas.

Figura 12 – Tabela com programa de necessidades: Casa da Mulher Brasileira. Figura 13 – Fluxograma: Casa da Mulher Brasileira.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


40

3.1.4 Setorização

A casa possui módulos ao redor de um pátio/jardim central, nestes

Figura 14 – Setorização: Casa da Mulher Brasileira.

módulos quadrados ficam subdivididos as funções desempenhadas pelo Tribunal da Justiça, Defensoria Pública, Delegacia de Atendimento à Mulher (DEAM), Ministério Público, atendimento psicológico, áreas de alojamento e área comuns, como sala multiuso, refeitório, etc. separadas de acordo com a necessidade de proximidade entre as funções. Tal sistema modular apesar de ser um facilitador na obra é também um limitador, onde os ambientes, apesar de repartidos por divisórias, oferecendo certa flexibilidade, geraram alguns ambientes pequenos e sem janelas. O espaço central, apesar de grande, sugere um local residual, sendo um espaço aberto, mas ao mesmo tempo trazendo a sensação de proteção. A

área

comum onde as pessoas podem confraternizar fica a cargo da sala multiuso, destinada a realização de encontros, oficinas, cursos de capacitação, apresentações, entre outros.

Fonte: Banco do Brasil, 2013, adaptado pela autora, 2020.


41

3.1.5 Circulação

O acesso principal é feito pela parte central da planta, que leva também

Figura 15 – Circulação: Casa da Mulher Brasileira.

ao eixo principal público de circulação que permeia todas as áreas do projeto, passando sempre pelo pátio/jardim central, levando a circulação secundária das áreas restritas ou com acesso regulado. A circulação principal ou pública possui clareza, enquanto que o projeto modular fez com que algumas circulações restritas e internas ficassem prejudicadas e complicadas devido as constantes subdivisões dos ambientes. Os demais acessos ao edifício levam às áreas de descompressão da circulação principal, esta que possui cerca de 1300m², sendo bastante ampla. Já o acesso de serviço é responsável por facilitar o acesso à área de detenção da delegacia.

Fonte: Banco do Brasil, 2013, adaptado pela autora, 2020.


42

3.2

Estudo de caso nacional – Edifício Projeto Viver / FGMF / Brasil Figura 16 – Edifício Projeto Viver.

3.2.1 Ficha técnica

     

Arquitetos: Fernando Forte, Lourenço Gimenes e Rodrigo Ferraz. Ano do projeto: 2003. Construção: 2005. Localização: São Paulo, Brasil. Área construída: 400m² Área do terreno: 1500m²

Fonte: FGMF Arquitetos, 2005.

Figura 17 e 18 – Elevações: Edifício Projeto Viver.

Este projeto visa atender a população carente localizada no Morumbi, em São Paulo. O terreno onde o mesmo se insere servia de acesso às ruas internas da comunidade e era a única área de convívio da região. O projeto teve como premissa manter estas características, mantendo o acesso preexistente. Criaram-se espaços significativos, abertos e coletivos, contribuindo para a apropriação do espaço e a convivência da comunidade. (BARATTO,

Fonte: FGMF Arquitetos, 2005.

2014). A estrutura do edifício em concreto armado e as vedações em bloco de concreto, juntamente com as esquadrias em ferro e os brises de aço conferem

a escolha por materiais simples e recorrentemente utilizados em seu entorno, buscando a integração com o mesmo.


43

3.2.2 Programa de necessidades

3.2.3 Fluxograma

O programa de necessidades foi dividido em dois blocos, um disposto no

O fluxograma do projeto, representado na Figura 20, mostra que no térreo

limite do terreno e outro suspenso transversalmente, criando um espaço de

existe uma circulação principal que distribui os fluxos para os ambientes, assim

convivência no centro. De acordo com os próprios arquitetos, o projeto foi

como também para a parte externa e para a escada que leva ao primeiro

organizado em cinco praças contendo: praça esportiva (quadra de esportes),

pavimento. Neste pavimento ocorre além dos fluxos internos, simples e bem

praça coberta (salas de aula), praça plana (articuladora dos demais espaços),

distribuídos, uma passarela descoberta que leva ao segundo bloco do projeto,

praça em patamares (aproveitando a topografia) e uma praça elevada

permitindo que os ambientes sejam circundados por ela, além de levar à

(cobertura dos prédios).

cobertura, onde os dois blocos se complementam por meio do terraço jardim e passarelas que os conectam.

Figura 19 – Tabela com programa de necessidades: Edifício Projeto Viver.

Figura 20 – Fluxograma: Edifício Projeto Viver.

Fonte: FGMF, 2005, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


44

3.2.4 Setorização

O edifício principal abriga em seu térreo a recepção, casa do zelador e

Figura 21 – Setorização pavimento térreo: Edifício Projeto Viver.

oficina interdisciplinar. Já no pavimento superior estão a sala de espera, salas de atendimento médico e odontológico, psicológico, jurídico e outros. Além disso, possui também uma cozinha e uma loja. O bloco elevado abriga as salas de capacitação profissional, biblioteca, sala de informática, além de sanitários e depósitos. O subsolo abriga os vestiários e apoios da quadra. O espaço entre os blocos serve como palco para festas e as coberturas destes abrigam um terraço jardim, com brinquedoteca e equipamentos de lazer.

Fonte: FGMF, 2005, adaptado pela autora, 2020.

Figura 22 – Setorização segundo pavimento: Edifício Projeto Viver.

Fonte: FGMF, 2005, adaptado pela autora, 2020.


45

3.2.5 Circulação

A circulação do projeto em sua parte externa possui inúmeras

Figura 23 – Circulação pavimento térreo: Edifício Projeto Viver.

possibilidades por meio de suas rampas, passarelas e degraus, os desníveis do terreno propiciaram que grande parte do espaço fosse bem aproveitado, seus degraus funcionam tanto para descanso e contemplação quanto para brincadeiras de crianças e, em dias de eventos, se transformam em arquibancadas para shows e espetáculos ao ar livre. Já em sua parte interna, possui um acesso principal em seu centro e uma circulação curta e eficiente. Possuem ainda acessos diretos para as oficinas, vestiários e acesso de serviço para a área de reciclagem, sendo todos de caráter público. A casa do caseiro é a única parte com acesso restrito neste

Fonte: FGMF, 2005, adaptado pela autora, 2020.

pavimento. O primeiro pavimento, acessado pela escada, assim como o térreo,

Figura 24 – Circulação primeiro pavimento: Edifício Projeto Viver.

possui uma circulação curta e simples, com poucos corredores e mais amplitude nos ambientes, caracteriza-se por ser toda pública, possuindo um acesso direto da loja da cooperativa com a rua. Destacam-se ainda as passarelas que interligam um bloco ao outro.

Fonte: FGMF, 2005, adaptado pela autora, 2020.


46

3.3

Estudo de caso internacional – Casa de acolhimento para menores /

Figura 25 – Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

CEBRA / Dinamarca

3.3.1 Ficha técnica

     

Fonte: Cebra Architecture, 2014.

Arquitetos: CEBRA. Ano do projeto: 2012. Construção: 2014. Localização: Kerteminde, Dinamarca. Área construída: 1500m². Área do terreno: 1250m².

Figura 26 e 27 – Elevações: casa de acolhimento, Cebra Architecture.

O projeto desta casa de acolhimento está inserido em um bairro residencial tradicional da Dinamarca e tem o intuito de manter e agregar estas

Fonte: Archidailly, 2015.

características ao mesmo. O escritório trouxe a proposta de juntar as construções

tradicionais

com

a

contemporaneidade,

combinando

a

segurança de uma moradia com novas concepções acerca da pedagogia sobre o assunto. (CEBRA, 2014).

familiar. (PINOTI, 2017). Buscou-se trazer a parte lúdica ao projeto, combinando elementos básicos da arquitetura com o imaginário infantil da imagem de uma casa, sempre definida pela sua geometria simples e triangular. Estes dois

O objetivo principal do lar é implantar um centro que promova as

elementos tornam sua imagem facilmente reconhecível, transmitindo a

relações sociais e transmita o valor de sociedade e comunidade, não

inclusão e diversidade. Já os tamanhos e orientações diferentes entre si

deixando de atender as necessidades individuais também. O desenho dos

permitiram uma amplitude de usos, o ambiente físico reflete uma abordagem

prédios utiliza formas básicas, com telhado de duas águas e sótão aliados a

pedagógica orientada para a prática de modo que a arquitetura apoia

revestimento de madeira e cerâmica, trazendo um ambiente acolhedor e

ativamente o trabalho diário da equipe com as crianças. (CEBRA, 2014).


47

3.3.2 Programa de necessidades

3.3.3 Fluxograma

O programa de necessidades, relativamente simples e com ambientes de

Como pode ser observado no fluxograma da Figura 29, depois do acesso

uma casa comum, é distribuído em quatro residências conectadas, onde cada

ao edifício, existem diversos caminhos possíveis que levam a diferentes áreas,

uma delas é responsável por atender uma faixa etária. Além disso, contam

que estão interligadas a áreas comuns, sempre permeando as áreas técnicas e

também com sala para estudo, cinema e teatro, playground, quadra e

estando mais distantes das acomodações. Pode-se dizer também que não

espaços

existe um caminho linear que circunde ou distribua os fluxos, mas salientando

flexíveis.

Proporcionando,

desta

maneira,

o

sentimento

pertencimento e identidade além da própria moradia.

de

que isto não interfere ou atrapalhe os caminhos, só os tornam mais dinâmicos.

Figura 29 – Fluxograma: Casa de acolhimento, Cebra. Figura 28 – Tabela com programa de necessidades: Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


48

3.3.4 Setorização

No térreo, se concentra a maior parte das atividades e ambientes da

No primeiro pavimento, fica o restante das salas administrativas, incluindo

casa. A entrada principal cria uma visão geral de quem está chegando e

os dormitórios e espaço para os funcionários do complexo, estando elevados

saindo, mas sem caracterizar de fato uma recepção ou guarita, garantindo o

para que se obtenha uma visão do todo e dos residentes. Além do setor

aspecto de lar do projeto. As acomodações ficam localizadas nos extremos do

administrativo, ficam no primeiro pavimento também algumas áreas comuns e

mesmo, garantindo maior privacidade e são separadas de acordo com as

de recreação, tal como o cinema/teatro.

idades dos moradores. Conta ainda com diversas áreas comuns que completam o programa de necessidades e incentivam a convivência com os demais.

Figura 30 – Setorização pavimento térreo: Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

Figura 31 – Setorização primeiro pavimento: Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

Fonte: Archidailly, 2015, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Archidailly, 2015, adaptado pela autora, 2020.


49

3.3.5 Circulação

e

O primeiro pavimento é acessado pela escada e possui um caráter mais

proximidade entre as unidades, para que o pessoal esteja sempre perto de

restritivo nas áreas de acomodações dos funcionários e administrativo,

todos os residentes, incorporando os procedimentos de trabalho à rotina.

entretanto, conta também com áreas comuns, de caráter semi-restrito e áreas

Ademais, no térreo, conta-se com a entrada principal, além de diversos

livres.

A

organização

racional

do

edifício

garante

distâncias

curtas

acessos secundários e de serviços, estes últimos que levam sempre a áreas de serviço do projeto. Existem ainda, áreas que são e caráter restrito, principalmente nas áreas administrativas e das acomodações, sendo o restante e grande maioria de livre circulação.

Figura 32 – Circulação pavimento térreo: Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

Figura 33 – Circulação primeiro pavimento: Casa de acolhimento, Cebra Architecture.

Fonte: Archidailly, 2015, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Archidailly, 2015 adaptado pela autora, 2020.


50

3.4

Estudo de caso internacional – Abrigo para vítimas de violência

Figura 34 – Abrigo e entorno.

doméstica / Amos Goldreich Architecture + Jacobs Yaniv Architects / Israel

3.4.1 Ficha técnica

Fonte: Amos Goldreich Architecture, 2016.

     

Arquitetos: Amos Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects. Ano do projeto: 2015. Construção: 2018. Localização: Tel Aviv, Israel. Área construída: 1600m². Área do terreno: 800m².

Figura 35 e 36 – Elevações: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects.

O abrigo está localizado em um bairro tranquilo, de característica residencial, próximo a lojas, empregos, comércios, hospitais, escolas, parques e

Fonte: Archidailly, 2016.

toda infraestrutura necessária para que os abrigados consigam ter acesso facilmente. Foi projetado e construído de maneira participativa com a equipe que o administrará, liderada pela ativista em direitos humanos, Ruth Rasnic,

os arquitetos criaram um lar longe de casa, um lugar onde pessoas de diversas

proporcionando um refúgio necessário para mulheres e crianças vítimas de

origens podem lidar com seus traumas e reconstruir suas vidas.

violência. (AMOS GOLDREICH ARCHITECTURE, 2016).

De acordo com Amos Goldreich, o conceito principal do projeto foi a

Segundo Rasnic, o abrigo fornecerá um refúgio muito necessário para

analogia de uma pedra escavada, que possui duas superfícies, uma externa

mulheres vítimas de abuso, que chegam em um estado de sofrimento enorme,

rústica e uma interna lisa e delicada, igual ao edifício, que tem duas elevações,

devendo o abrigo oferecer uma sensação de calma, segurança e esperança.

a externa, segura e protetora e a interna, acolhedora.


51

3.4.2 Programa de necessidades

Foi estipulado pela equipe que o abrigo precisava acomodar até doze famílias, todas exigindo privacidade individual, mas que fosse possível a

Figura 37 – Tabela com programa de necessidades: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects.

coexistência entre si e com a equipe que cuida delas. Em média, cada família tem três filhos, portanto o edifício foi baseado para uma população flutuante de mais de 24 residentes ao mesmo tempo. Além disso, era necessário que houvesse a sensação de lar e proteção para os habitantes. (AMOS GOLDREICH ARCHITECTURE, 2016). Isto acabou resultando em um programa que distribuiu entre os 1600m² de área construída, as áreas restritas como, recepção, guarita, sala de reuniões, salas administrativas, áreas técnicas e depósitos e, as acomodações propriamente ditas. E, além disso, uma variedade de ambientes públicos, como cozinha e copa, berçário, sala de aula, enfermaria, refeitório, sala de televisão, playground, pátio jardim e áreas comuns. Estes ambientes complementam a estadia dos moradores e também servem como espaços de lazer e sociabilização. As metragens totais dos ambientes citados são vistas na tabela ao lado:

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


52

3.4.3 Fluxograma

3.4.4 Setorização

Como pode ser observado no fluxograma da Figura 38, depois do acesso

Segundo Gonzalez, 2018, cada família recebe ao chegar uma pequena

ao edifício, existem dois caminhos, um interno, passando pela recepção, que

casa, que é parte de uma edificação maior, permitindo uma rotina normal e

funciona como uma barreira, levando às áreas comuns ou às áreas

privativa, sendo estas casas separadas por funções comuns e conectadas por

administrativas e, outro externo, que leva ao playground e áreas comuns.

corredores internos.

O jardim central funciona como um distribuidor de fluxos, dando acesso a

O abrigo acomoda no pavimento térreo diversas funções, berçário, salas

diversas funções do abrigo e separando-as em grupos de acordo com sua

de aula, enfermaria, cozinha e refeitório, que ficam localizados em um núcleo

proximidade.

à esquerda do jardim central, que é o coração do edifício, e faz como que as acomodações, que se localizam à direita, fiquem mais reservadas, dando a tranquilidade e privacidade necessárias. Na mais acima da setorização, ficam

Figura 38 – Fluxograma: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects.

as salas administrativas, bem como a recepção e guarita que constituem a entrada principal do prédio. Já na parte externa, conta-se com um playground e várias partes comuns, além do jardim central, já citado, que desempenha um local de encontro entre os moradores e conexões visuais entre as famílias. No primeiro pavimento, ficam o restante das salas administrativas, que incluem os assistentes sociais, psicólogos, advogados, terapeutas, além de uma sala de reuniões e uma copa.

Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


53

Figura 39 – Setorização pavimento térreo: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv

Figura 40 – Setorização primeiro pavimento: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv

Architects.

Architects.

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020. Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020.


54

3.4.5 Circulação

Existem dois acessos principais ao abrigo, um comum e um de serviço, que leva as áreas comuns e as despensas da cozinha, respectivamente. A principal leva a uma circulação pública, das áreas comuns, e outra semi restrita e restrita, correspondentes ao setor administrativo, tanto no térreo, quanto do primeiro pavimento.

Figura 41 – Circulação pavimento térreo: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects.

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020.

O corredor interno que circunda o jardim conecta os espaços interno e externo e cria um espaço de fluxo livre no qual mulheres e crianças podem interagir. O primeiro pavimento é acessado pela escada e possui um caráter todo restrito, já que concentra as atividades administrativas.

Figura 42 – Circulação primeiro pavimento: abrigo Goldreich Architecture e Jacobs Yaniv Architects.

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020.


55

3.5

Estudo de caso internacional – Casa albergue KWEICO / Hollmén Reuter

Figura 43 – Casa albergue, KWEICO.

Sandman Architects / Tanzânia

3.5.1 Ficha técnica

     

Arquitetos: Hollmén Reuter Sandman Architects. Ano do projeto: 2012. Construção: 2015. Localização: Moshi Urban, Tanzânia. Área construída: 423,00m². Área do terreno: 1300,00m².

Fonte: Archidailly, 2016. Figura 44 e 45 – Elevação: Casa albergue, KWEICO.

A Organização da Consultoria e Intercâmbio de Informação de Mulheres de Kilimanjaro foi fundada em 1987, proporcionando a assessoria em questões judiciais, de saúde, sociais e econômicas às mulheres africanas, muito vulneráveis às violações de direito à vida, liberdade e segurança. Na África, muitas vezes a violência contra as mulheres é permitida socialmente e culturalmente, a lei não consegue proporcionar proteção contra isso, não sendo capaz de promover atitudes que favoreçam que as mulheres tenham seus direitos fundamentais. (ARCHITIZER, 2015).

Fonte: Archidailly, 2016.

O projeto buscou desenvolver o conceito de uma casa albergue, respeitando a cultura local e a hierarquia espacial, os materiais presentes na

conte com um planejamento participativo da sociedade almejando o

área, a energia renovável e mão de obra local, fazendo com que o projeto

pertencimento do abrigo com as pessoas. (ARCHITIZER, 2015).


56

3.5.2 Programa de necessidades

3.5.3 Fluxograma

O albergue conta com dormitórios para famílias, banheiros, banheiro PNE,

Como se observa no fluxograma do albergue, vários acessos levam ao

fraldário, refeitório, cozinha, lavanderia, salas de uso diverso, pátio interno e

pátio central que funciona como um direcionador de fluxos, levando tanto

espaços externos. Apesar de um programa não muito complexo e enxuto,

para as acomodações, como para áreas de serviço e técnica. Possui um fluxo

contempla as principais necessidades para acomodar e socializar. Resultando

racional e claro. Permeando espaços abertos e livres a espaços restritos.

em 430,00m² construídos, onde as metragens totais dos ambientes são vistas na tabela abaixo:

Figura 46 – Tabela com programa de necessidades: Casa albergue, KWEICO.

Figura 47 – Fluxograma: Casa albergue, KWEICO .

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020. Fonte: Adaptado pela autora, 2020.


57

3.5.4 Setorização

3.5.5 Circulação

A setorização do albergue se desenvolve em torno de um pátio central e

O acesso principal é feito diretamente para o pátio central, que se

interno, que funciona também para amenizar as condições climáticas, calor e

encarrega de distribuir os caminhos, possui ainda alguns acessos secundários

umidade, permitindo ainda a circulação livre das mulheres e crianças e a

que levam aos espaços cobertos e um espaço de serviço que fica próximo à

interação social. As acomodações são dispostas ao redor deste pátio, onde se

cozinha. A simplicidade da setorização permite que a maior parte da

intercalam ainda os banheiros. Possui grandes pátios cobertos, mas ao mesmo

circulação seja de caráter público, sendo somente o acesso aos quartos e

tempo abertos, que são utilizados para reuniões e seminários. As áreas comuns

depósitos restrita e semi-restrita, respectivamente.

e funcionais se fazem presentes na cozinha e lavanderia.

Figura 49 – Circulação: Casa albergue, KWEICO. Figura 48 – Setorização: Casa albergue, KWEICO.

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Archidailly, 2016, adaptado pela autora, 2020.


58

3.6

Análise geral dos estudos de caso

O estudo de projetos/obras semelhantes constitui um forte impulso para o entendimento do tema em pauta. Os estudos de casos guardam relação mais com a tipologia do que com a linguagem. Trata-se, tão somente, de avaliar o conjunto e não propriamente da cópia em si, vale se ressaltar que não só a apreciação positiva é proveitosa, saber o que evitar favorece igualmente a concepção. (GALBINSKI, 2008).

ambientes e como os mesmos são agrupados, permitindo a integração das vitimas e restringindo certos espaços quando necessário. Já o edifício do Projeto Viver, localizado em São Paulo, tem como principal uso ser um centro comunitário possui um programa reduzido, uma setorização clara e uma circulação quase sem corredores, permitindo fluxos integrados e amplos. Apesar do uso diferente do tema em questão, se torna

Levando-se isto em consideração, a escolha de tais estudos de caso

pertinente quando se tratam de sua implantação em um terreno com desníveis

propiciou e permitiu o levantamento de diferentes pontos, partindo de

acentuados, a integração, a apropriação do espaço interno/externo e o

referenciais e culturas diferentes que agregaram valor de formas distintas.

programa que abrange a capacitação das pessoas.

Foram averiguados diferentes programas de necessidades, setorizações, fluxogramas e circulações, comparando-se pontos comuns e distintos, moldando um senso crítico acerca do projeto a ser desenvolvido.

Em relação à Casa de Acolhimento para Menores, situada na Dinamarca, promove um lugar onde as relações interpessoais são valorizadas, com um programa de necessidades enxuto, com ambientes conectados com

A Casa da Mulher Brasileira abrange um projeto elaborado pelo próprio

as áreas comuns e separados por idade dos moradores. Quanto ao seu

Governo Federal, a fim de concentrar em um só lugar acolhimento, apoio e

fluxograma e circulação pode-se dizer que possui diversos caminhos não

serviços sociais e econômicos. Apresenta um programa de necessidades muito

lineares, mas que não deixam de ser racionais, aproveitando-se bem os

mais abrangente que uma casa abrigo, possui uma setorização modular e

espaços e garantindo que não existam corredores muito extensos. Possui ainda

flexível, permitindo futuras mudanças e usos, possui uma circulação com eixo

algumas características que são pertinentes ao clima e local onde se insere,

principal e distribuidora dos fluxos. Entretanto, o projeto base foi feito para ser

mas primordialmente preza pelo sentimento de pertencimento, noções

replicado em todas as capitais brasileiras, com modificações pertinentes

importantes para o projeto de uma casa de acolhimento.

somente quanto sua implantação, o que pode acabar causando problemas de conforto ambiental. Mas, apesar disto, o projeto é uma importante referência projetual, levando-se em consideração sua grande articulação de

O outro estudo internacional se trata propriamente de um abrigo para vítimas de violência doméstica, localizada em Israel, onde se priorizou a segurança e acolhimento. O programa foi feito de maneira que pudesse ser mantida a privacidade dos moradores, acolher as diferentes necessidades e


59

mesmo assim garantir espaços de convivência, assim como a setorização também leva em conta os mesmos princípios. A circulação e os fluxos partem de um ponto central de sociabilidade sendo distribuídos pelos demais setores. O último estudo internacional, localizado na Tanzânia, Casa albergue KWEICO, trouxe outra perspectiva acerca do tema, trazendo em um programa reduzido todas as necessidades primordiais para o acolhimento das mulheres, com uma circulação e setorização claras, e principalmente, a apropriação da cultura e métodos construtivos locais. Pode-se concluir que todos os estudos de caso, se tratando de usuários fragilizados, têm como premissa projetual alcançar um sentimento de pertencimento, segurança, acolhimento, tal sentimento que é alcançado por meio da disposição do programa de necessidades na setorização, permeando espaços que garantam a privacidade e individualidade necessárias, mas também o convívio e reintegração dos usuários.


60

4

ESTUDO DO LOCAL

"Todo mundo precisa de uma espécie de ninho para pousar”. (Herman Hertzberger, 1996).


61

4.1

Estatísticas gerais do Estado de São Paulo

Segundo pesquisa realizada pelo Panorama da Violência contra as

Funcionam no estado, 182 unidades especializadas de atendimento, o

Mulheres no Brasil, 2018, São Paulo apresentou uma taxa de 2,2 homicídios a

que representa uma taxa de 0,79 unidades para cada 100 mil mulheres

cada 100 mil habitantes, taxa inferior à média nacional de 4,8 homicídios por

residentes, taxa inferior a média nacional de 1,03 unidades. Entretanto, o

100 mil habitantes, quando estes dados são cruzados com o lugar de óbito,

município possui o maior número de casas abrigo do país, com quatro

27,44% destas mulheres morreram em seus domicílios, em sua maioria por

unidades e, o maior número de DEAM’s, totalizando nove unidades. (SPM,

alguém conhecido. Entretanto, verificou-se uma redução da violência letal

2013).

contra as mulheres de maneira geral, entre os anos de 2006 e 2014. No que diz respeito sobre as ocorrências de estupro, a pesquisa apurou que o estado apresentou um número inferior à taxa de estupros registrados no

Figura 50 – Taxas de violência registradas em 2014.

país. Já no que concerne ao serviço do Ligue−180, da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), cujos dados são consolidados no Balanço 2014, o Ligue−180, o número de relatos de violência por grupo de 100 mil mulheres registrado no estado de São Paulo mostrou-se similar à taxa de relatos de violência registrados no país. A Figura 50 sintetiza os dados trazidos pelo Mapa da Violência, comparando-os entre os níveis nacionais, regionais e estaduais. O estado é um dos poucos que disponibiliza dados consolidados acerca das ocorrências de violência contra as mulheres registradas pela Polícia Civil. Em 2014, foram 153.770 registros de ocorrência dentro do escopo da Lei Maria da Penha, o que equivale a uma taxa de 671,5 boletins de ocorrência por 100 mulheres.

Fonte: Mapa da violência, 2015, adaptado pela autora, 2020.


62

4.2

Violência contra a mulher na Região do ABC

Uma pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo, 2011, a pedido do Jornal Metro, 2011, afirmou que em média todos os meses 200 mulheres

62% física, somente 29% das mulheres possuíam emprego e somente 12% retornaram ao convívio com o agressor após o desabrigamento.

procuram pelos serviços municipais de ajuda no ABC. Sendo que este número é apenas uma parte do problema, já que a maioria das mulheres não

Figura 51 – Índices apontados pela pesquisa Jornal Metrô.

denuncia a violência doméstica, os números de agressões são muito maiores que os registrados. Segundo a coordenadora do grupo de gênero do Consórcio Intermunicipal, Dulce Xavier, quando uma mulher procura ajuda é porque a violência chegou ao limite. Ainda segundo a pesquisa, os números de atendimentos realizados passaram de 1093 para 1644, um aumento considerável de 50%. As coordenadoras das redes de apoio acreditam que o aumento também é motivado pela intensificação das campanhas sobre os direitos das mulheres. Dos 1181 homens entrevistados para a pesquisa 91% consideram bater

Fonte: Fundação Perseu Abramo, 2011.

em mulher errado, mas 48% disseram ter amigos ou conhecidos que batam na mulher, 8% afirmam já ter batido na mulher ou namorada e 14% destes homens acreditam ter agido bem e fariam novamente. Já das 2365 mulheres entrevistadas, 40% disseram ter sofrido algum tipo de violência, 16% já sofreram xingamentos ou ofensas, 15% foram controladas sobre onde iriam e 10% já

4.3

Redes de assistência à mulher na Região do ABC

foram espancadas uma vez na vida, 80% disseram que o agressor era o parceiro. Em seminário sobre enfrentamento da violência contra a mulher, Ohmori,

No ABC paulista, em 5 de dezembro de 2003, o Programa Casa Abrigo

2018, apresentou que, no perfil das mulheres abrigadas pelas casas, mais de

Regional foi criado pelo Consórcio Intermunicipal Grande ABC para garantir a

80% delas possuem entre 19 e 39 anos, 38% sofreram violência psicológica e


63

proteção a mulheres em situação de violência doméstica, sob risco de morte

possuem as cidades de São Bernardo, Diadema e Santo André. (PREFEITURA DE

iminente. Em 15 anos de funcionamento, as duas casas protegeram mais de

SÃO PAULO, 2017).

1200 mulheres e 2000 crianças e adolescentes das sete cidades da região. (MASSARI, 2019). A região conta com duas unidades de serviço de abrigamento, com acesso restrito e sigiloso, localizados nas cidades de Santo André e São Bernardo do Campo. O programa oferece moradia, saúde, emprego, renda e

Figura 52 – Mapa das redes de assistência à mulher na Região do ABC.

acompanhamento jurídico para o reestabelecimento da vítima. As duas unidades comportam, juntas, 40 pessoas. Assim como as outras casas-abrigo o período mínimo de permanência é de 90 dias e 180 no máximo. (MOTODA E RIBEIRO, 2017). A região possui Serviços de Saúde Especializados para o Atendimento dos Casos de Violência Contra a Mulher, localizados nos: Hospital Municipal Universitário, Centro de Atenção Integral a Saúde da Mulher (São Bernardo do Campo), Hospital Municipal de Emergência Albert Sabin, Centro de Prevenção e Assistência às Doenças Infecciosas e Centro de Atenção Integral a Saúde da Mulher (São Caetano do Sul), Hospital e Maternidade São Lucas (Ribeirão Pires), Centro Hospitalar Santo André e Hospital da Mulher Maria José dos Santos Stein (Santo André) e Hospital de Clínicas Doutor Radamés Nardini (Mauá). (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2017). Compõem as estruturas da Polícia Civil, as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM) nas cidades de Mauá, Diadema, São Bernardo do Campo e Santo André. E os Centros Especializados de Atendimento à Mulher (CRAM) se fazem presentes nas cidades de Santo André, Diadema e São Bernardo do Campo. Possuem ainda Conselhos Estaduais e Municipais de Direitos das Mulheres os municípios de Diadema, Rio Grande da Serra, São Caetano do Sul, Mauá e Santo André. Se tratando de Defensorias Públicas, as

Fonte: Prefeitura do Estado de São Paulo, 2017, adaptado pela autora, 2020.


64

4.4

Cidade de Mauá

De acordo com a Prefeitura Municipal de Mauá, as primeiras referências

Entretanto, ainda segundo a Prefeitura de Mauá, a captação de recursos

sobre o atual território datam do início do século XVIII. Tal região abrigava um

foi difícil e foi preciso buscá-los fora do país. A participação do Barão de Mauá

povoamento bastante disperso e que estava relacionado diretamente ao

foi intensa, fato ilustrado pela sua presença frequente nas obras, e, portanto, foi

caminho que ligava a então Vila de São Paulo ao litoral. Em 1856 foi aprovado

por esta razão que ele adquiriu uma fazenda localizada no município de

um decreto que permitiu a formação de uma companhia para a construção

Mauá, casa que hoje abriga a Casa da Cultura e Museu Barão de Mauá.

da estrada de ferro que ligasse à Santos, que concedeu ao Barão de Mauá o direito de construir e explorar a ferrovia por noventa anos.

O crescimento do povoado motivou a instalação de uma ferrovia na cidade, inaugurada em 1883 e intitulada Estação do Pilar, vindo a representar uma importante parte do processo de industrialização do futuro munícipio. Em

Figura 53 – Mapa do Estado de São Paulo destacando a cidade de Mauá.

1926 a estação passou-se a chamar Estação Mauá. Em 1938, Mauá foi integrada ao município de Santo André, e desde 1943 já se desejava a emancipação, que acabou por ocorrer em 1953, surgindo assim de fato a cidade como se conhece hoje.

4.5

Violência e redes de assistência à mulher em Mauá

Segundo Lopes, 2018, nos primeiros sete meses de 2018, o CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), responsável por atender casos de todos os gêneros e idades do munícipio, receberam 242 mulheres em Fonte: Geoprocessamento, adaptado pela autora, 2020.

situação de violência.


65

Já em concordância com Jacinto, 2018, Mauá registrou 565 casos de

Figura 54 – Mapa de localização das redes de assistência à mulher no município de Mauá.

violência contra a mulher (lesões corporais e ameaças, crimes sexuais, ofensas morais e feminicídios), durante o primeiro semestre deste mesmo ano. A cidade de Mauá possui Serviços de Saúde Especializados para o Atendimento dos Casos de Violência Contra a Mulher localizado no Hospital de Clínicas Doutor Radamés Nardini; Centro de Referência Especializado de Assistência Social; Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM); Secretaria de Politicas Públicas para Mulheres; Patrulha Maria da Penha e Conselho Municipal de Direitos das Mulheres . (PREFEITURA MUNICIPAL DE MAUÁ, 2016).

4.6

Localização da proposta: Bairro Matriz

Fonte: Geoprocessamento de Mauá, adaptado pela autora, 2020. Figura 55 – Mapa de Mauá com destaque para o Bairro Matriz.

O bairro Matriz surgiu quando a família Pedroso decidiu lotear suas terras, com terrenos que mediam entre 400 e 500 m², nas décadas de 40 e 50. Atualmente, o bairro faz parte da região central da cidade, passando por uma valorização e adensamento nos últimos anos, mesclando em suas quadras edifícios residenciais, comerciais e serviços. (DIAS, 2010). Mauá possui 14 Regiões de Planejamento, o bairro se encontra na RP1, com o total de 11.893 habitantes, resultando em cerca de 2,85% da população correspondente à cidade. Conforme o Censo 2010, a população é dividida entre homens e mulheres, com 5687 e 6206, respectivamente. Dessa população, 69,8% tem faixa etária entre 15 e 64 anos, sendo em sua maioria composta por jovens.

Fonte: Plano Diretor do Município de Mauá, 2007, adaptado pela autora, 2020.


66

4.7

Terreno

A região é composta por uma rede de equipamentos de grande importância para a casa abrigo, como se destaca na Figura 56, tais como a

Figura 56 – Mapa de localização das redes de assistência à mulher no município de Mauá e do terreno.

Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, o Conselho Municipal de Direito das Mulheres e o Serviço de Saúde Especializado presente no Hospital de Clínicas Doutor Radamés Nardini, além disso, ressalta-se ainda a proximidade com os demais hospitais da cidade, Santa Casa de Mauá, Hospital Vital e Hospital América que por vezes podem servir de primeiro contato da vítima. Destaca-se ainda o perímetro do bairro Matriz, a localização do terreno e proximidade da Estação Mauá da CPTM e principal Terminal Rodoviário. O local onde se deseja inserir o projeto está localizado na Avenida Dom José Gaspar, na altura do número 131, no bairro Matriz, na cidade de Mauá. Este terreno, atualmente desocupado, abrigava anteriormente uma repartição da Prefeitura da cidade que foi demolido e atualmente, encontra-se sem uso.

Fonte: Geoprocessamento de Mauá, adaptado pela autora, 2020.


67

Figura 57 – Mapa de bairro Matriz com destaque para o terreno.

Ribeirão Pires e faz parte da centralidade da cidade. A acessibilidade ao lote foi um dos pontos determinantes para a localização, uma vez que qualquer dificuldade imposta afasta a mulher do rompimento do ciclo de violência.

Figura 58 – Terreno de intervenção.

Fonte: Prefeitura de Mauá, 2007, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Geoprocessamento do Município de Mauá, adaptado pela autora, 2020.

4.8

Levantamento fotográfico

Apresenta uma área de aproximadamente 3830,50m² e está localizado

Como pode ser observado nas Figuras 59 e 60, o terreno tendo como

em uma parte de fácil acesso tanto dentro da cidade, quanto para as cidades

referência a Avenida Dom José Gaspar, apresenta uma declividade

ao redor, já que fica ao lado do principal Terminal Rodoviário e Estação Mauá

acentuada. Este lado do mesmo pode ser considerado o mais importante, uma

da CPTM. Também está localizado próximo a uma importante rua arterial –

vez que é o único com acesso direto de veículos. Pode-se ressaltar ainda uma

Avenida Capitão João – que conecta as cidades de Mauá, Santo André e


68

vegetação de grande porte presente no mesmo, assim como alguns vestígios

Figura 61 e 62 – Terreno com referência a Avenida Capitão João.

de construções passadas. Evidencia-se também o estacionamento rotativo de automóveis, a rua de mão única e o fluxo menor de veículos.

Figura 59 e 60 – Terreno com referência a Avenida Dom José Gaspar.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

Em relação ao seu interior, averiguou-se a presença de vegetação de valor, de platôs intermediários, resquícios de mobiliários e construções e o abandono recorrente do espaço.

Fonte: Acervo pessoal, 2020.

Figura 63 e 64 – Vegetação de valor, mobiliários e platô.

Oposto a este lado, observa-se o aclive presente e salienta-se o outro acesso ao terreno mostrado nas Figuras 61 e 62, entretanto, este acesso permite somente a entrada de pedestres por meio do calçadão, que se liga ao boulevard, a estação de trem, ao terminal rodoviário. Apesar da barreira presente por meio dos gradis, essa entrada está conjugada a uma avenida de maior fluxo de veículos e mesmo de transeuntes. Fonte: Acervo pessoal, 2020.


69

4.9

Legislação

4.10 Índices urbanísticos

O terreno está localizado na Macrozona Adensável, onde se propicia a requalificação, o ordenamento e o direcionamento da urbanização do

Quanto aos índices estabelecidos pela Lei de Uso e Parcelamento do Solo da cidade de Mauá, tem-se que:

território, em áreas onde a infraestrutura está implantada e suporta maior adensamento, nos termos da legislação específica dentro da Zona de Uso Diversificado 1, que corresponde às áreas com infraestrutura considerada

Figura 66 – Índices urbanísticos permitidos na ZUD1.

satisfatória para o adensamento populacional, permitindo, desta maneira, a implantação de políticas de desenvolvimento urbano. (PLANO DIRETOR MAUÁ, 2007). Figura 65 – Mapa das Macrozonas e Zoneamento.

Fonte: Lei de uso e ocupação do solo Município de Mauá, 2014, adaptado pela autora, 2020.

Fonte: Plano Diretor do Município de Mauá, 2007, adaptado pela autora, 2020.


70

5

LEITURA

URBANA

“Nós percebemos a importância da nossa voz quando somos silenciadas”.

(Malala Yousafzai, 2014).


71

5.1

Uso do solo

Figura 67 – Mapa Uso do Solo.

Segundo a Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo, 2011, o uso do solo é o conjunto de atividades de uma sociedade por sobre uma aglomeração urbana assentada sobre localização, combinadas por seus padrões do ponto de vista da regulação espacial. Em suma, o uso do solo é uma combinação de um tipo de uso (atividade) e de um tipo de assentamento (edificação). Como pode ser observado na área destacada abaixo, por se tratar de uma localização próxima ao centro da cidade, apresenta acima da linha ferroviária, característica principalmente comercial, enquanto, que a parte debaixo apresenta uma variedade de usos, se tornando cada vez mais residencial à medida que se adentra mais no bairro. A quadra do terreno em questão possui predominantemente uso comercial.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

Figura 68 – Mapa Ocupação do Solo.

5.2

Ocupação do solo

Já a ocupação do solo, de acordo com Takeda, 2013, por sua vez é a maneira pela qual a edificação pode ocupar o terreno, em função dos índices urbanísticos incidentes sobre o mesmo, resultando no número de pavimentos das construções. Observa-se que a área apresenta uma característica predominantemente horizontal, tendo poucos exemplares que sejam mais verticalizados, que acabam se destacando na paisagem.

, Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


72

5.3

Estado de conservação

O estado de conservação diz respeito a como os edifícios se encontram,

Figura 69 – Mapa Estado de Conservação.

levando-se em consideração principalmente a estética e estrutura do mesmo. Predominantemente, a área apresenta um bom estado de conservação das construções, salvo algumas construções que não estão bem mantidas e outras que se destacam pelo bom cuidado e beleza.

5.4

Sistema viário Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

O sistema viário que circunda o terreno, composto pelas avenidas Dom

Figura 70 – Mapa Sistema Viário.

José Gaspar e Capitão João, são caracterizadas por vias arteriais, que de acordo com o Detran, são vias caracterizadas por possibilitar o trânsito entre as regiões da cidade, ligando a área central da cidade de Mauá com os bairros da região oeste e sendo a principal ligação entre as cidades de Mauá, Ribeirão Pires e Santo André, respectivamente. Já a Avenida Portugal e ruas Queiroz Pedroso e Rio Branco são consideradas coletoras, sendo vias de bairro, de trânsito secundário, coletando e distribuindo o fluxo para as vias principais. Possui ainda um boulevard, de trânsito restrito à pedestres, bem como a rua comercial que liga o mesmo a estação de trem. As demais ruas, não demarcadas, apresentam caráter local.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


73

5.5

Transportes e vias de acesso

5.6

As principais vias de acesso ao terreno são as já citadas avenidas Dom José

Gaspar

e

Avenida

Capitão

João,

sendo

que

a

primeira

Insolação, ventos e pluviosidade

Com base no estudo da carta solar da cidade de São Paulo no software

traz

Analysis SOL-AR, têm-se a relação de insolação nas quatro faces: Noroeste,

principalmente o fluxo interno da cidade e a segunda, além disso, traz também

Nordeste, Sudeste e Sudoeste em relação ao norte do terreno analisado,

o acesso e fluxo das cidades vizinhas. Ademais, o terreno em questão fica

levando-se em consideração o entorno do terreno pouco verticalizado,

próximo ao principal Terminal Rodoviário de Mauá, à Estação Mauá da CPTM e

contendo somente um exemplar com mais de 10 pavimentos, sendo sua

ponto de ônibus intermunicipal, que saem de São Paulo (Terminal Sacomã),

influência considerada, mas não uma condicionante negativa.

São Caetano do Sul (Bairro Santo Antônio) e Santo André (Terminal Urbano Prefeito Saladino). Facilitando, dessa forma, o acesso das mulheres.  Noroeste: Recebe iluminação natural a partir das 8h da manhã e se estende até o final da tarde, durante o inverno e primavera. Já durante o Figura 71 – Vias de Acesso e Transportes.

verão e outono, recebe iluminação a partir das 13h até o final da tarde.  Nordeste: Recebe iluminação natural durante todo o período da manhã até às 16h da tarde, durante o verão e outono. Durante o inverno e primavera, recebe iluminação até às 14h.  Sudoeste: Recebe iluminação natural somente no período da tarde, durante o inverno e primavera, começando a partir das 14:30h e durante o verão e outono a partir do meio dia.  Sudeste: Recebe iluminação natural somente no período da manhã,

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

durante o verão e outono e, por um curto período, até as 8h, durante o inverno e primavera.


74

Figura 72 – Análise da insolação incidente sobre o terreno

Figura 73 – Frequência de ocorrência e Velocidade dos ventos.

Fonte: Analysis SOL-AR, adaptado pela autora, 2020.

Se tratando do regime pluviométrico, São Paulo, apresenta um regime de chuvas significativo durante todo o ano, sendo maior no verão, com períodos de estiagem no inverno.

Figura 74 – Índice pluviométrico São Paulo.

Fonte: Analysis SOL-AR, adaptado pela autora, 2020.

Quanto ao estudo dos ventos incidentes no terreno, a frequência de ocorrência é maior nas direções Nordeste e Sudeste, principalmente na primavera e na direção Sul, durante o outono. Já em relação às velocidades, estas são praticamente iguais, sendo um pouco maiores na primavera, nas direções Sudeste e Sul e, no inverno, na direção Nordeste. Fonte: Climatempo, adaptado pela autora, 2020.


75

6

PROJETO

"Cada abrigo é uma caixa de ressonância, onde toda a história de uma mulher, os seus caminhos, o seu sofrimento e os seus medos são ouvidos e sua voz é ampliada em diálogo com cada uma das pessoas que trabalham na casa. Juntos, eles constroem uma música que fala por si mesma em ações cotidianas, em passos precisos, sempre que uma mulher, um menino ou menina se atreve a recomeçar a sua melodia, a reescrever a sua história e, especialmente, o seu novo horizonte." (Margarita Guille, 2014).


76

6.1

Implantação

A insolação foi levada em consideração, a elevação nordeste é

O terreno em que foi desenvolvido o projeto apresenta um grande diferentes

caracterizada por receber iluminação natural durante todo o período da

encontradas nas faces longitudinais, as quais estão voltadas para o nordeste

manhã até às 16h da tarde, durante o verão e outono, já durante o inverno e

(acesso Avenida Capitão João) e sudoeste (acesso Avenida Dom José

primavera, recebe iluminação até às 14h. Por conta desse período, durante as

Gaspar). Levando-se isso em consideração, a implantação do edifício se deu

estações mais quentes, optou-se pela utilização de brises verticais que

de forma paralela a estas principais faces, aproveitando os desníveis presentes

propiciassem maior conforto para seus usuários. Além disso, para melhor

e os diferentes modais de acesso, fazendo com que houvesse duas propostas

aproveitamento dessa luz natural incidente, todos os dormitórios do edifício

distintas para as duas cotas, uma pública (770) - restrita a pedestres e

ficaram voltados para este lado. Já a elevação sudoeste é a principal do

esporádicos veículos de serviços - e, outra restrita (775) com acesso direto à

edifício, trazendo a continuidade dos materiais e padrões utilizados, fazendo

rua, permitindo acesso de veículos, pedestres e veículos de serviços específicos

uso de um painel Ductal que transpassa leveza e feminilidade, resguardando a

(ambulância e proteção). O edifício manteve a paisagem urbana circundante,

segurança dos usuários e ajudando no conforto térmico do edifício que recebe

composta em sua maioria de construções horizontais.

iluminação natural somente no período da tarde, durante o inverno e

comprimento

e

pequena

largura,

dois

acessos

em

cotas

primavera, a partir das 14h30min e, durante o verão e outono, a partir do meio dia. Figura 75 – Implantação do edifício paralelamente ao terreno.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

Figura 76 – Esquema de insolação do edifício.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


77

Quanto ao paisagismo existente, foi mantido o máximo de vegetação de grande porte dentro do terreno, que foram somadas a proposta paisagística,

demarcar os espaços de permanência, tanto interno, quanto externo do projeto.

de maneira que privilegiasse espécies nacionais ou que se adaptassem bem ao clima tropical. Espécies que agregassem tanto valor estético, quanto servissem para diferentes sensações.

Figura 77 – Detalhes do paisagismo proposto – vista Capitão João.

As árvores de grande e médio porte trazem sombra para as áreas de permanência. Além disso, o Ipê roxo traz uma simbologia agregada, já que este floresce no mês de agosto, mês da Campanha “agosto lilás” de combate da violência contra a mulher, demarcando um processo de renascimento e perseverança para as mulheres e também um reconhecimento singelo para o edifício. Já a Dracena e o Pinheiro de buda formam uma cerca viva junto ao

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020. Figura 78 – Detalhes do paisagismo proposto – vista Dom José Gaspar.

muro do acesso Dom José Gaspar, trazendo maior privacidade ao seu interior, que não necessariamente necessitasse ser feita por meio de muros e uma negação do exterior. A Barba de serpente utilizada em floreiras próximas ao estacionamento e bancos também convergem para este fim e ainda contrastam com os materiais da elevação. A Murta de cheiro, em arbustos bem tutorados, trazem sensações olfativas e também afastam os usuários diretamente dos brises do estacionamento, trazendo maior privacidade para o espaço, além de somarem esteticamente com os contrastes próprios.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020. Figura 79 – Detalhes do paisagismo proposto – Praça inferior.

A escolha da Palmeira rápis nas floreiras tem o mesmo principio de servir com uma barreira e impedir, mesmo que de maneira indireta, a visualização do interior de determinadas áreas do edifício, já a Camélia também acomodadas em floreiras delimitam e trazem beleza para as áreas das praças. A grama Esmeralda foi utilizada por desempenhar bem o papel de contensão de erosão e o não desmoronamento dos taludes. Já a grama Amendoim foi utilizada para Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


78

6.2

Programa de necessidades

Figura 80 – Programa de necessidades básico da casa abrigo.

De acordo com a Norma Técnica de Padronização para Abrigamento e Funcionamento das Casas abrigo do Governo Federal, 2011, o recomendado para implantação do espaço físico é de que a localização deve ser de fácil acesso, não contando com a presença aparente de guaritas, placas de identificação, oferecendo um lugar discreto. Devendo ainda conter espaço para dormitórios onde a mulher possa ficar junto de seus filhos, acomodar seus pertencer pessoais, contando com sua privacidade. Sendo importante que tenha espaços de convivência coletiva (salas de reuniões, grupos e oficinas), espaço para refeitório e cozinha coletiva, espaço de recreação para crianças, áreas externas, espaço para lavanderia coletiva, dependências sanitárias compatíveis com a capacidade de pessoas a serem abrigadas, acessibilidade, espaço adequado para equipe técnica e administrativa, infraestrutura para transporte. Tendo isso em vista, e levando-se em consideração do percurso realizado pela mulher até chegar ao abrigamento, o programa foi desenvolvido pensando na incorporação de algumas instituições e da infraestrutura capaz de auxiliar as mulheres ao enfrentamento da violência com dignidade. Sendo desenvolvido com base na especificação do público alvo, capacidade de atendimento e em acordo com a Norma técnica de Padronização para Abrigamento e Funcionamento das Casas-abrigo (2011), Pacto Nacional pelo Enfrentamento a Violência contra a Mulher (2007), Diretrizes Gerais e Protocolo de Atendimento CMB (2013), Diretrizes Nacionais para Abrigamento (2011) e referências análogas presentes nos estudos de caso. Fonte: Desenvolvido pela autora.


79

6.3

Diagrama de bolhas

6.4

Conceito e partido

A partir do programa de necessidades, foi criado um diagrama de

O conceito geral que se buscou trazer para o projeto foi de transformar o

bolhas que representasse a interação entre os núcleos das principais

espaço em um local seguro para mulheres fragilizadas, sem transparecer a

atividades. Explicitando as atividades predominantes e a principal circulação.

sensação de confinamento, remetendo uma noção de lar, estabelecendo

Representando um aumento gradual de relevância, sendo o coração do

segurança e promovendo recursos para o restabelecimento por meio de uma

programa seu interior, concentrando as principais atividades.

interação multidisciplinar, um senso de comunidade e ao mesmo tempo respeitando a individualidade e identidade de cada pessoa.

Figura 81 – Diagrama de bolhas.

Já o partido considerou o terreno, de grande comprimento e pouca largura, assim como a declividade entre os dois possíveis acessos, uma condicionante para o desenvolvimento e acomodação dos espaços. Os primeiros estudos volumétricos foram desenvolvidos baseados na forma regular e na hierarquia dos ambientes a serem posicionados.

Figura 82 – Partido do projeto.

Fonte: Desenvolvido pela autora.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


80

O que resultou em formas quadradas e retangulares, que representam o

Figura 84 – Proposta final de estudo volumétrico do anteprojeto.

puro, estático e neutro, sendo uma forma estável, que preserva sua regularidade mesmo sofrendo adições e subtrações de alguns elementos. A transformação da forma ocorreu por meio de adições, de maneira subordinada e conectadas a um volume principal, através do contato das arestas e faces, sendo caracterizada por formas secundárias agrupadas ao redor de uma principal, dominante e centralizada. Possuindo ainda uma organização aglomerada, com base geométrica para a ordenação de suas

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

formas, agrupando-as de acordo com condicionantes funcionais, tamanho, formato ou proximidade. A movimentação de alguns sólidos, fazendo com que houvesse o reforço de determinadas quinas, enfatizaram o desenho do volume como um todo. (CHING, 2013). Já o projeto final, seguiu a mesma linha de pensamento do partido e

Figura 85 – Proposta final de estudo volumétrico do projeto.

volumes iniciais, mas através de uma nova configuração dos ambientes foi possível que o mesmo se adaptasse melhor a paisagem urbana que o envolve, transformando-o em um volume mais horizontal, mas ainda com prevalência de formas quadradas e retangulares, conexões entre as mesmas e melhor aproveitamento do espaço total do terreno.

Figura 83 – Primeiro estudo volumétrico do projeto.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


81

6.5

Fluxograma

Como pode observar-se no fluxograma da Figura 86, existem dois acessos

maior para o acesso aos demais pavimentos. A circulação vertical funciona

que levam para o interior do edifício, o acesso feito pela praça pública da

como um eixo que distribui a circulação para os dois lados do projeto, sendo

Avenida Capitão João fica salvaguardado por controles de entradas,

uma distribuidora de fluxos e ordenando suas funções. Em sua grande maioria

impedindo que o público em geral adentre aos demais pavimentos e áreas

os fluxos são lineares, terminando em um ambiente importante e de clara

restritas do prédio. O acesso superior também é feito de forma controlada e

percepção, facilitando a circulação dos usuários.

restrita, resguardando esta ligação, fazendo com que exista uma segurança Figura 86 – Fluxograma do projeto

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


82

6.6

Setorização

Quanto à organização e setorização, pode-se considerar que existem

social, como também acrescentando um espaço de encontro para a cidade.

espaços dentro de outros, onde um espaço pode envolver e conter outro

Reforçando, que apesar do uso sigiloso que o edifício necessita, ele não

espaço menor dentro de seu volume; espaços adjacentes, sendo o mais

precisa ser um espaço que nega a cidade. Foram resguardados todos os

comum tipo de relação entre os espaços, onde cada espaço é claramente

acessos para o restante do edifício, permitido inclusive pelo uso da topografia

definido e responde as suas funções, existindo ainda um plano de separação

presente no terreno, garantindo a segurança para as moradoras e criando

que limita o contato físico e visual entre os dois espaços, reforçando sua

fluxos diferentes para os diferentes acessos.

individualidade; espaços conectados por um terceiro espaço, relacionando-se à distância e por meio deste terceiro. Possui ainda uma organização destes ambientes, aglomerada, se baseando na proximidade física para relacionar os espaços entre si, com diferentes tamanhos, formatos e funções, relacionados entre si pela proximidade ou uma ordenação. (CHING, 2013). A área de solo reduzida do terreno fez com que a setorização do projeto fosse verticalizada para melhor acomodação dos espaços definidos no programa de necessidades, resultando ao todo em cinco pavimentos. A diferença entre as cotas de níveis entre as duas entradas ao terreno possibilitaram a existência de dois térreos. O térreo Capitão João, na cota inferior, traz uma proposta que se diferencia do restante do edifício, apesar de parecer controverso, o projeto buscou trazer o público em geral para este nível, com o intuito de conscientizar, agregar conhecimento, ou mesmo aproximar possíveis vítimas por meio de um contato mais sutil. Desse modo, foram propostas salas de palestra, convivência e até mesmo uma lanchonete, fazendo com que este espaço se tornasse uma continuação do calçadão, servindo tanto para o fim

O térreo Dom José Gaspar, com ligação direta para a rua, traz o outro acesso para o edifício, acessos restritos e direcionados às vítimas e aos funcionários. Sua setorização abrange as áreas de Recepção, Segurança e Monitoramento, Atendimento e Administração. Sendo o pavimento com mais usos e com mais acessos. Estes que proporcionam fluxos restritos, públicos e de serviços, garantindo o funcionamento e a privacidade de todas as áreas e atividades relacionadas. Já o Primeiro pavimento comporta as partes voltadas para a Autonomia e Empoderamento das mulheres, com atividades e serviços que proporcionem a retomada de suas vidas após o período de abrigamento. Ainda possui áreas de convívio, trazendo o sentimento de lar, no desenvolvimento de atividades comuns e a socialização das pessoas, importante para a reintegração. O Segundo e Terceiro pavimentos são destinados exclusivamente para as habitações, mantendo a privacidade necessária das vítimas. O edifício pode comportar até trinta e sete moradoras, acompanhadas ou não de seus filhos, acomodadas em diferentes tipologias de habitação.


83

3 Habitações Família Tipo 1 - 5 pessoas (cada);

6.7

Circulação

4 Habitações Família Tipo 2 - 3 pessoas (cada); 2 Habitações Família Tipo 3 - 2 pessoas (cada); 4 Habitações Individuais; 1 Habitação adaptada PNE - 2 pessoas.

Existem no projeto diversos acessos, sendo o principal deles, o acesso de pedestres pela cota superior do terreno, sendo um acesso frontal que leva diretamente à entrada de um prédio por meio de um percurso reto,

Além de permitir que as mulheres, mesmo em período de abrigamento

proporcionando um foco evidente à entrada. (CHING, 2013). Além disso, os

não sejam separadas de seus filhos, as habitações buscaram com que cada

demais acessos que ocorrem pela cota superior, única parte do terreno onde

unidade permitisse a autonomia dessas pessoas, trazendo além do espaço de

se é possível o acesso de veículos, são: o acesso de transporte e ambulância,

dormitório em si, espaço de convivência e copa, além de banheiros individuais.

acesso do ambulatório, acesso da segurança, acesso à administração e acesso para retirada de lixo. Já na cota inferior, existe o acesso ao auditório – pensado de maneira segregada do acesso principal, para garantir versatilidade em seu uso, mas restrições de entrada – e acesso de serviço do auditório.

Figura 87 – Setorização geral do projeto.

Se tratando da circulação interna do edifício, pode-se considerá-la uma circulação composta, onde os pontos importantes são centros de atividades, entradas para os ambientes e núcleos de circulação vertical, que funcionam também como distribuidora e condicionante de fluxos. Relacionam ainda a circulação propriamente dita com os espaços, existindo no projeto, circulações que passam ao lado dos espaços, garantindo a privacidade; circulações que passam através dos espaços, criando áreas de repouso e movimento; e circulações que terminam em um espaço. (CHING, 2013). O térreo da cota inferior possui uma circulação semi e restrita, já que concentra pontos em que somente moradores ou funcionários do edifício

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

podem ter acesso, e pública, nos locais da praça, sala de palestras e afins. Enquanto que o térreo da cota superior apresenta uma circulação restrita nos


84

locais como vestiários e monitoramento, semi restrita nas salas de atendimento e pública nas áreas de circulação, levando-se em consideração que o caráter público, neste caso, refere-se a livre circulação dos usuários e funcionários da casa abrigo e não, de uma maneira geral. O primeiro pavimento apresenta uma circulação pública em sua maioria, nos espaços comuns e semi restrita nos ambientes controlados, como creche, brinquedoteca, salas de aula, cozinha e vestiário.

O segundo e terceiro

pavimentos apresentam um caráter semi restrito, destinado aos habitantes da casa abrigo. Portanto, observa-se que a restrição de circulação cresce com os

Figura 89 – Circulação geral do projeto.

pavimentos, trazendo nos primeiros, uma integração social dos moradores e ascendendo para a privacidade dos mesmos nos últimos.

Figura 88 – Circulação vertical do projeto.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


85

6.8

Conforto ambiental e sustentabilidade

6.9

Legislação de uso e ocupação do solo

O conforto ambiental está presente desde a concepção inicial do

Por fim, a legislação foi atendida, como pode ser verificado na Imagem

projeto, buscando por meio de sua implantação otimizar o uso de luz e

90 abaixo, onde se compara as taxas impostas pela legislação municipal e as

ventilação natural, propiciando o conforto térmico e acústico com auxílio de

taxas obtidas pelo projeto.

brises, fachadas ventiladas, isolantes e forro absorventes. A escolha dos materiais empregados na construção também está

Figura 90 – Taxas de uso e ocupação do solo aplicadas no projeto.

atrelada à sustentabilidade, uma vez que, segundo o relatório Brundtland (1987),

produzido

pela

Comissão

Mundial

sobre

Meio

Ambiente

e

Desenvolvimento da ONU, sustentabilidade é o desenvolvimento que atinge as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações de atingirem as suas próprias necessidades. Portanto, não apenas questões como a redução dos desperdícios, diminuição dos níveis de ruído, utilização de processos energeticamente mais eficientes, saúde e segurança do

trabalhador,

como

também

questões

econômicas

e

ambientais

evidentemente devem corresponder as principais preocupações. O uso de lajes alveolares e pré-moldados diminui a quantidade de material, resíduos e uso de mão de obra no local. A produção dessas peças em escala gera vantagens que não são possíveis nos processos artesanais de outros métodos, aproveitam-se melhor as características mecânicas da laje, elas exigem menos volume de concreto do que uma laje maciça de mesma espessura, em função dos alvéolos. (PEREIRA, 2019).

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


86

6.10 Implantação


87

6.11 Térreo Capitão João


88

6.12 Térreo Dom José Gaspar


89

6.13 Primeiro Pavimento – Convívio, autonomia e empoderamento


90

6.14 Segundo Pavimento – Habitação


91

6.15 Terceiro Pavimento – Habitação


92

6.16 Cortes


93

6.17 Elevação principal e Perspectivas – Capitão João

Figura 91 – Rampa e entrada do auditório

Figura 92 – Detalhes do paisagismo e praça

Figura 93 – Varandas e espaço de convivência

Figura 94 – Lanchonete

Figura 95 – Praça coberta

Figura 96 – Foyer do auditório

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


94

6.18 Elevação principal e Perspectivas – Dom José Gaspar

Figura 97 – Detalhes paisagismo praça superior

Figura 98 – Painéis circulação

Figura 99 – Painéis externos e pátio interno

Figura 100 – Circulação

Figura 101 –Hall da biblioteca

Figura 102 – Praça superior

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2020.


95

7

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando o tema abordado, um tema social do acolhimento

sigiloso, enquanto os demais órgãos da rede e fluxo de acolhimento e

institucional de mulheres vítimas de violência doméstica, foi necessária a

proteção

compreensão de como se estruturam dois pontos antagônicos, mas que

posteriormente, ser reinserida na sociedade e no convívio familiar sem correr

permeiam esta questão, a violência e a proteção, visando proporcionar um

riscos. Sendo ainda mais importante no momento de pandemia atual,

ambiente que recuperasse estas vítimas em todos os sentidos. Os resultados

possibilitando uma outra saída para as vítimas, que não seja continuar vivendo

obtidos por meio de pesquisas vieram ao encontro dessa necessidade,

com seu agressor.

proposta em um edifício que pudesse transpassar a sensação de proteção, permitisse a recuperação e dignidade das mulheres e por vezes, filhos, sem permear o sentimento de enclausuramento.

tentam

afastar

o

agressor

para

que

esta

mulher

possa,

O projeto desenvolvido atentou-se para que não fosse transpassada a sensação de confinamento das vítimas, enquanto seus agressores estão soltos, para que pudesse ofertar instrumentos e meios para o empoderamento destas

A bibliografia estudada acerca do assunto, assim como os estudos de

mulheres e que as instigasse a cessar o ciclo de violência e buscar ajuda em

caso permitiram maior conhecimento sobre essa concepção de abrigamento,

um lugar acolhedor, com capacitação e autonomia, proporcionando além de

sobre a atual rede de proteção à mulher em situação de violência, que conta

um abrigo propriamente, um suporte e local de respeito, fazendo com que a

com diversas políticas públicas, englobando delegacias especializadas, centros

arquitetura disponibilize espaços para a mudança, crescimento e esperança

de referência, juizados especiais, casas de acolhimento, casas abrigo, entre

de uma vida melhor.

outras. Sendo percebido que esta rede ainda é precária no país, além de mal distribuída, o que dificulta que se alcance os resultados pretendidos. A importante Casa da Mulher Brasileira, incorporado no programa Mulher, Viver sem Violência, é um avanço nesse quesito, ao concentrar inúmeras atividades em um mesmo espaço, entretanto, sua implantação e funcionamento pelos estados brasileiros ainda é lenta.

O combate à violência requer um investimento em todas as etapas do processo, incluindo desde a prevenção das agressões, denúncias, julgamentos e punições dos agressores e medidas de proteção às vítimas, além de um aprofundamento sobre os casos registrados para que possam contribuir com dados para a correta implementação de políticas públicas de acordo com a demanda. É uma reforma que deve ser tomada em nível nacional, mas

Constatou-se também que uma casa abrigo é destinada a fornecer

adequando-se as particularidades regionais, revelando o desafio e as

abrigamento às mulheres que chegaram ao ápice do ciclo da violência,

limitações acerca do abrigamento, tendo a arquitetura um papel fundamental

quando há risco eminente de morte, proporcionando um espaço seguro e

para

o

sucesso

desconsiderada.

do

acolhimento

e

atendimento,

não

podendo

ser


96

8

REFERÊNCIAS

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