N° 8
antologia poĂŠtica
Fevereiro 2020
Capa: Tóia Azevedo. Autorretrato. S/d.
Ficha Técnica Galeria das Minas Edição 8 - Ano II Fevereiro de 2020 Edição e Diagramação: Kamila Oliveira.
Contracapa: Jaq Braum, Sem título, 2019. Colagem.
DEIA PINAFI
18
4
TÓIA AZEVEDO
JAQ BRAUM
32
POEMEZE
46
56 LUA CARVALHO CAROL ALVES E CLARA COSTA
74
4
DÉIA PINAFI
(Minha) Balbúrdia Feminina Sou balbúrdia feminina , Ainda péssima menina, Sou alma sem destino, Vago por onde quero E por onde sinto vontade, Sou dor intensa, Sofro constantemente Com os pré-conceitos , Pensamentos de antigamente, De outrora Primitivos E estúpidos, Onde Eu era apenas , Boneca na estante, Onde o silêncio Era minha fala, Minha conduta constante E meu pior castigo Chamava - se submissão, Minha postura Sempre delicada Leve e flor viva, Frágil e pouco inteligente Pois, Desejavam meu corpo E não minha mente, Proibiam - me, De rechea-lá E preenche-lá Dos conhecimentos dos homens, Dos quais e me privaram muito tempo, Destes tais saberes , Mas hoje , Não mais E digo jamais Me tiraram Do meu lugar De fala, luta e revolta De liberdade E ousadia Terão de ouvir A minha glória , Mas presentemente Nem dou ouvidos Pra essa gente , Por que se eles preferem Viver no passado Eu prefiro , É fazer revolução (no) presente... *** GALERIA DASMINAS
5
6
DÉIA PINAFI
Véus de Mona Lisa O que esconde a Mona Lisa ? Por entre teus véus De mistério? Por entre a fumaça fria? Por vezes escura , Outras sombria, Por entre teus olhos de melancolia, Cheios dos segredos E fantasias Exageras , Até mesmo em suas vírgulas, Que colocas sempre nas histórias, Que parecem nunca ter um fim , Que permanecem em nossa memória A multidão Também deseja saber, O que a mona lisa Tem tanto a esconder, Mil segredos a visto em suas janelas , Teu olhar de pânico e ódio, Performance da tragédia Será essa sua sina ? Ou mais uma de sua celas? Mona Lisa , Mais misteriosa que ela, Ninguém jamais viste, Ninguém jamais vê, É mais segredo do que corpo, Não cabe em qualquer copo , Não cabe em qualquer gosto , É mais coração E intensidade, Ela é mais sentir , Do que sua carga psíquica aguenta , Ela é encanto , Mal resolvido, Indefinido, É algo que ninguém Jamais saberá ser ...
***
GALERIA DAS MINAS
7
Revolução de Vênus Ela é o impossível Dança em meio , Ao acaso Do destino É inefável, É indescritível, Pois , Seus defeitos São plausíveis , Sua rebeldia impetulante É politicamente militante Ela é maravilha, É filósofa É artista, É ela quem brinca Que respira arte e poesia, Em meio às pinceladas Ela quem pintou os céus , Quem pincelou Com todas as cores, Da sua própria vida Ela é, A mais bela A mais linda, Quebra Os olhares preconceituosos E malditos, Quando passa Todos reparam E ela só quer ser A revolução , Da sua vida ...
***
8
DÉIA PINAFI
GALERIA DAS MINAS
9
Libertando-se com loucura Minha melhor ação, Ato de salvação, Sinto que minha alma Tem atitudes diferentes, A arte de rebelar-se E fazer intervenção, Minha doce libertação Com loucura e tesão, Pela vida E pela verdade, Aquela que busco Intensamente, Durante Esses dias normais e inacabados, Habitados, Pelas más línguas Que tanto opinam e falam, As falas Repetitivas e desnecessárias, Que me incham os ouvidos De tanto senso comum, Essa doença sem cura, Os padrões se prostituem E assim nascem , Múltiplos filhos Da ignorância, Essas tais pequenas ignorâncias, Que crescem Cheias das tais moralidades, Preconceitos enraizados, Mentes alienadas, Que as imperfeições Sejam (Re)vistas E exaltadas Aceitadas E valorizadas, Pois , Não aguento mais Viver em uma sociedade Onde perfeição tem que ser alcançada, Custe o que custar E as feridas narcisicas Tendem a se multiplicar Cada vez mais ...
***
10
DÉIA PINAFI
GALERIA DAS MINAS
11
Silenciem me com cultura Silenciem-me Mas com cultura Que assim Eu ficarei muda Será Que assim, Me calo, Me tardo Com minha crítica? E o abalo Que ela terá Seu eco, Eu escutarei voltar, Não será só minha voz Mas tantas e tantas, Que não se controlarão, Ao ver o golpe de estado, Elaborado Tão bem, Esquematizada, Desde Roma antiga, Até idade média Agora, Século 21 E ainda passamos, Por esse Falso, Fraude, Impostor O entreterimento Que faz, Com que o conhecimento Não chegue, Em minha mente E a revolta Não seja, Tão frequente... ***
12
DÉIA PINAFI
GALERIA DAS MINAS
13
A comédia de Floralice Floralice, É eterna graça E cheia das manias, Estranhezas da flor Que jamais morre, Peculiaridades da tua essência, Tua presença forte, Sensitiva e selvagem, Nos teus olhos castanhos Eu vejo, O mundo e a verdade, Os risos e as maldades Floralice, Ela quem Vive e atua, Em meio ao caos E as comédias Da vida, Ela quem não resiste, A arte E seus artifícios, Que lhe possibilita, O impossível , A sensação De viver e morrer, Todos os dias Floralice, Veste e desveste Quem e o que ela quiser, Provocativa, A pequena artista, Que sempre tem resposta pra tudo, Seja na ponta da língua Ou mesmo No disparo da mente, O pensamento sem medo E a coragem em seu peito, E com ela não tem censura É cheia de atrevimentos, Por isso tão agitada, ela dança descalça, Pelas calçadas das ruas, Mares ,campos e avenidas, Gosta de sentir diferentes texturas Do mundo, Gosta de se sentir livre, Ela não liga, 14
DÉIA PINAFI
GALERIA DAS MINAS
15
Prós que os outros falam, Só liga para o que pensa de si, A arte da performance, A personagem, O enredo e suas glórias, A comédia de Floralice, Está longe de terminar aqui ... ***
16
DÉIA PINAFI
Deia Pinafi (Andreia C.), é uma bruxinha de 16 anos, estudante, cursando o ensino médio, mora em Santo André - SP, é poetisa, escritora e artista, ama fazer colagens, performances, poesias e fotografias.
GALERIA DAS MINAS
17
18
CAPA
Ofélia
meu corpo não é mais meu e nunca o foi -
meu corpo adornado em guirlanda de flores minha boca aberta a cantar canções de ninar não são meus. nunca os foram e ainda assim pensei que se deixasse meu longo vestido se encharcar e me juntasse, casada ao lodo do fundo do mar talvez eu teria algo para chamar de meu.
meus pés e mãos são os primeiros a afundar mais um tempo logo se vão braços pescoço, tronco -
GALERIA DASMINAS
19
as árvores balançam e o sol reflete pontilhado no rio esverdeado através das copas
ouço os pássaros assoviarem como coral para minha melodia descompassada
e por último minha cabeça resolve se juntar ao resto embaixo d'agua
20
TÓIA AZEVEDO
รณ deus รณ deusa quantas vezes mais terei que morrer para o deleite dos espectadores que me observam vorazes das bordas, das bordas...
nem a minha morte pertence a mim.
***
GALERIA DAS MINAS
21
22
TÓIA AZEVEDO
Francesca
Como você pode? seu nome veio de um lugar e seu corpo de outro-
Como você pode? ir embora assim de repente sem me dar adeusComo você pode? deixou seu laboratório bagunçado fotos por revelar marcas de dedos por todos os lados-
Como você pode? Como você pode? Você teria hoje a idade do meu pai. E tudo o que você deixou para trás ainda se desdobra em mim quarenta anos depoisVocê resolveu se tornar vento e eu não a culpo por não saber que esse mundo era sim feito para alguém tão linda quanto você.
***
GALERIA DAS MINAS
23
na
a última dança
da
da
da Ainda guardo a bandeja de
prata que serviu sua cabeça decepada.
fr o
eu
os
en Ainda guardo os véus e as jóias que naquela noite
en
pe e
me adornavam.
Ho Se fechar os olhos por um instante posso sentir o cheiro de carne em decomposição e lembrar das suas íris dilatadas. Se fechar os olhos por um breve momento sou capaz de evocar a festa os músicos incensos o grande rei, devorando-me, inteira.
24
TÓIA AZEVEDO
aquela noite
ancei
ancei
ancei como nunca antes –
renesi mundo acabando-se aos meus pés
u giro e giro
s rostos se misturam
ntre si
ntre tecido
ele mármore –
oje, teu busto decora o meu quarto.
***
Deusa da morte Ó querido por que o amedronto? Quero sua devoção nada mais nada menos apenas. Por obséquio! Se obssesse em mim em meu corpo redondo em meu espírito triangular. Peço
me exponha em um altar ofereça vinho e sexo e dor reze reze reze por minha benção.
24 26
Preciso ser cultuada por você. Preciso ser adorada enterrada posta de cabeça para baixo num copinho d'água quebrada reconstruída finalizada. Sou feita de madeira e osso e gesso e carne e mármore sou transcrita em tudo quanto é idioma línguas e bocas só não a sua. Sou uma deusa
que o quer fiel sou Lilith sou Perséfone sou o Diabo cuidado com meus olhos castanhos cuidado com meus olhos castanhos. Um dia você não passará de mais um punhado de sangue
na tigela cerimonial. ***
GALERIA DAS MINAS
27 25
Manifesto
Não diga-me que estou a sonhar não diga que cometi novamente o pecado jurado e enterrado; não, meu amor por favor aguente todo
o pesar de ser como eu respirar como eu viver como eu. se quiser posso lhe dar um pedaço de pele ou de minhas roupas desorganizadas; quem sabe uns fios soltos de cabelo ou pedaços de unhas carbonizadas. Tomaria-me perfeitamente o lugar! Sou mulher um saco de ossos envolto em carne tecido adiposo e sangue.
meus sapatos não servem mais e o vestido que usava aos 15 também não. venha, pegue tudo o que desejar: o porão está cheio quinquilharias velhas inúteis 28
TÓIA AZEVEDO
albúm de família
primeiro dente de leite jogo de pratos da bisa o livrinho da bela adormecida que meu pai deu-me aos 6 anos. Leve embora ou os ratos ou o fogo ou o tempo
os consumirão; só se lembre por favor de desligar a luz ao sair. dentro de mim há um turbilhão fora de mim há um furacão.
escrever não é mais escolha é necessidade questão de vida ou morte, praticidade. melhor escrever do que abrir feridas com as mesmas mãos ou dormir dormir dormir
sem ter hora para acordar. veja a literatura nunca me traiu e ainda assim seu gosto, por vezes é forte demais como gengibre. GALERIA DAS MINAS
29
sou prisioneira sou livre: uma mulher que sabe o que não quer. rios, eles correm mas nem sempre desaguam em águas calmas. insana danço pelo meu quarto; serena escrevo meus versos. poeira, vento, sujeira: minhas células não são as mesmas de sete anos atrás. chuva, tempestade ácida: derreto e escorro feito mel entornado. do alto dos meus vinte e dois anos com um lado da cabeça raspado e inúmeras marcas pelo corpo eu sei bem o que desejo.
***
Imagens cedidas pela artista 30
TÓIA AZEVEDO
Tóia Azevedo vive em São Paulo e cursa Artes Visuais na Unesp. Apesar de trabalhar com pintura, cerâmica, bordado, poesia (dentre outras) sua produção consiste principalmente em autorretratos fotográficos nos quais explora as temáticas do sagrado feminino, deusas e o seu próprio corpo como lugar no mundo.
GALERIA DAS MINAS
31
Trabalho da série “Caixa d’água”, 2017. 32
GALERIA DAS MINAS
33
Sem título, 2018. Fotografia analógica. 34
“Nós, poetas e amantes o que sabemos do amor? Temos o espanto na retina diante da morte e da beleza. Somos humanos e frágeis mas antes de tudo, sós.”
Hilda Hilst, trecho de “XX” (Balada do festival)
GALERIA DAS MINAS
35
36
ENTREVISTA
Sem título, 2018. Fotografia analógica.
GALERIA DAS MINAS
37
38
JAQ BRAUM
Marina, 2019. Fotografia analógica, 35mm (Salvador, BA)
Sem título, 2018. Fotografia analógica
GALERIA DAS MINAS
39
Sem título, 2019. Colagem analógica para a exposição "Linhas de conforto Redes de Confronto". 29x21 cm.
Acima: Sem título, 2018. Abaixo: Sem título, 2019. Fotografia analógica
42
JAQ BRAUM
Acima: Sem título, 2019. Abaixo: Sem título, 2019. Fotografia analógica
GALERIA DAS MINAS
43
Abaixo e à direita: Ciclo, 2018. Tríptico. Fotografia analógica
42
JAQ BRAUM
GALERIA DAS MINAS
43
Abaixo: Ciclo, 2018. Tríptico. Fotografia analógica.
44
JAQ BRAUM
Jaqueline Viana dos Santos (Jaq Braum), tem 27 anos e nasceu em São Paulo. É artista visual, fotógrafa, zineira, poeta. cursa bacharelado e licenciatura em artes visuais na UNESP. desenvolve uma pesquisa na qual busca investigar os espaços do cotidiano através da fotografia.
GALERIA DAS MINAS
45
Vou precisar chorar, Depois de tudo que aconteceu. Acho que vai demorar um pouco. -Hora de sentir Morro aos poucos, Todos os dias, lentamente. Sem anestesista para a alma -Dor
46
POEMEZE
Eu carregava meu coração com cuidado. Não o entregava a qualquer um. Mas você apareceu. Não raciocinei. Eu o arremessei para o alto e ele flutuou, mesmo sendo de vidro. Eu tinha confiança o suficiente, para deixa-lo com você o tempo que fosse. Infelizmente, você não quis cuidar dele Você se foi. Como uma cena de um filme, em câmera lenta, a lei da gravidade agiu. E meu coração foi partido em milhares de pedaços. E você me deixou aos prantos. Tentando juntar o que sobrou. Algo estava errado, por mais que eu tentasse encaixa-los, não conseguia. Estava faltando uma parte. Sorri triste. Você levou uma parte de mim sem pensar nas consequências. E foi egoísta o bastante para não me deixar uma parte sua. - O que sobrou de mim
GALERIA DAS MINAS
47
Suspirei pela quinta vez Ă quela hora Lavei o rosto pela sexta Parecia que o choro estava em seu fim Alonguei a coluna E girei os ombros, tentando me livrar da culpa do mundo Mesmo sabendo que ela permaneceria ali para sempre. Mas ela sabia que a tristeza ficaria em seu peito NĂŁo importa o que fizesse NĂŁo importa como agisse Ela te atormentaria. -Fardo
48
POEMEZE
As vezes nรฃo aguento Te olhar. Mas as vezes te olho sรณ para sentir a dor. Para ter a certeza que ainda sinto alguma coisa. Mesmo que me faรงa mal. -Tortura-me
GALERIA DAS MINAS
49
"Imagine uma criança que passa a vida toda com um bicho-papão a acompanhando aonde quer que ela vá. Por mais assustador que isso possa parecer para os outros Essa criança simplesmente deixa-o ali. E esse monstro fica grudada em seus ombros por toda a vida, a assustando e a diminuindo, E mesmo sofrendo, ninguém percebe que essa criança esta sendo mantida prisioneira Enquanto ele a mata lentamente. -Depressão"
50
POEMEZE
"Acho bom você não vir. Não chegue perto. Ainda estou... tentando, arrumar a sua bagunça.! - Caos"
GALERIA DAS MINAS
51
Eu não sou um pedaço de carne,
Para você me "COMER".
Eu não sou amostra grátis, Para você me "PROVAR". Eu não sou um carro, Para você fazer um "TESTE DRIVE".
Eu NÃO estou à venda.
- (Des)necessário
52
POEMEZE
Sou papel. VocĂŞ escritor. Vamos fazer poesia juntos? -Toque
GALERIA DAS MINAS
53
No meio da aula Senti uma dor no estomago... Acho que as borboletas Finalmente morreram, Uma Ă uma. - Dor que alivia
54
POEMEZE
POEMEZE é aspirante a escritora, desenhista e fotógrafa.
GALERIA DAS MINAS
55
56
Quando questionada sobre meu trabalho, procuro esclarecer que se trata de conversar sobre o som da minha voz.
Adaptando uma citação que amo, deixo claro:
“Não gosto de falar. Então, quando crio, procuro deixar a porta aberta para os meus sentimentos. Pra deixar falar meu coração. [...] Quem aprecia minha arte me ama. Porque é a emoção falando a emoção. Comunicação direta! Quando alguém olha minha arte não é preciso falar.”
Quote adaptado de Four Adventures of Reinette and Mirabelle, por Éric Rohmer.
GALERIA DAS MINAS
57
58
POESIA
Essa necessidade enorme de fala, presa em mim por culpa do medo de meu próprio som, foi o que me fez dar início a busca da intensificação do meu relacionamento com a escrita. Inicialmente somente através de poemas até, em Outubro de 2017, evoluir para colagens.
Meu processo é o exorcismo explícito do meu íntimo, cada palavra e elemento visual tem um propósito que parte de um pedaço de mim. Por essa razão, iniciei meu trabalho com uma série denominada “Fragmentos” e enquadro cada etapa de minhas criações em pequenas séries que estampam meu sentir.
Crua é aquele instante que resume. É a tentativa de explicar o que sou, a evidência da minha tristeza e confusão...um retrato claro da crise constante que assombra meu existir. Porque me questiono, reinvento, me desconheço. Sou.
À esquerda: “Crua”. Série Fragmentos. GALERIA DAS MINAS
59
É grito de medo abafado no peito.
Tenho medo que a minha fome do mundo assuste. Medo porque devoro tudo e tudo me devora rapidamente. Tenho medo que não saibam aceitar meu silêncio (e o julguem). Medo porque é o que todo mundo faz quando, na verdade, meu silêncio é um compilado de tudo que não consigo dizer. E engulo. Tenho medo que não entendam as coisas que falo. Medo porque quase sempre são coisas do meu coração que cansei de guardar da boca pra dentro Tenho medo de querer caber nas pessoas e nos lugares e por isso me falte formato ou pedaços. Medo porque já não sou completa e talvez a falta construa um vazio ainda maior. Tenho medo de não poder tocar, sentir e amar. Medo porque eu quero poder. Tenho medo que notem a minha tristeza diária. Medo porque sempre fui triste e ninguém entende. Nem eu. Tenho medo da minha imagem e do som da minha voz. Medo porque entregam tudo que eu tento esconder. Tenho medo que de passe depressa e me olhe como contorno daquilo que sou. Medo porque eu quero ser vista. Quero ser notada.
À direita: "Vulto". Série Tempos de tormenta.
60
LUA CARVALHO
GALERIA DAS MINAS
61
Atualmente trabalho na série “Ressignificar”. Cujo objetivo é quebrar cadeias que construí através desse mesmo medo que me moveu a criar, mas que infelizmente também me paralisa, expondo o significado pessoal que determinadas palavras ou expressões tem no meu peito e mente.
Ressignificado substantivo masculino
1. método utilizado em neurolinguística para fazer com que pessoas possam atribuir novo significado a acontecimentos através da mudança de sua visão de mundo. 2.m.q. RESSIGNIFICAÇÃO ('representação mental').
TEU CORPO
"Dentro de ti há uma expansão distinta a minha, estrelas singulares, a leitura e releitura de um universo extremamente particular que se encontra inexplicavelmente conectado ao meu por culpa dessa energia linda que existe entre a gente. Energia que flui e liga minha mente a tua, energia que cresce e que permite que tua imensidão plante coisas no peito. Energia que vem da tua intensidade, que dança dentro de mim, que é alimento constante para minha curiosidade e desejo... ...E não acaba."
Texto de minha autoria (28.03.2018)
À direita: Teu corpo, 2018. Colagem analógica.
62
LUA CARVALHO
GALERIA DAS MINAS
63
64
LUA CARVALHO
MEDO me.do Sentimento voraz que me corrói 1. Tela onde se projeta o meu exílio 2.sombra mediadora do meu jeito de ser artista e gente 3. O que me afasta de mim Pós definição, fica constatado aqui: Se eu continuo a criar é porque luto diariamente contra isso.
À esquerda: Medo, 2019. Colagem analógica.
GALERIA DAS MINAS
65
ANSIEDADE "Os santos, os profetas, os artistas e os iconoclastas. Tudo existe lado a lado. É como se fossem desenhos gigantes mudando o tempo inteiro Da mesma maneira devem existir inúmeras realidades, não apenas a realidade que percebemos com nossas obtusas sensibilidades. Mas, um tumulto de realidades arqueando-se uma por cima da outra, por dentro e por fora. É só o medo e o puritanismo que nos leva a acreditar em limites. Não existem limites. Nem para pensamentos, nem para sentimentos. A ansiedade é que estabelece limites. Deve-se sentir que se está vivendo num mundo sem limitações. Numa atividade, nunca se poderá perceber tudo, nem explorar tudo” Autumn Sonata (1978), dir. Ingmar Bergman
À direita: Ansiedade, 2019. Colagem analógica.
66
LUA CARVALHO
GALERIA DAS MINAS
67
68
LUA CARVALHO
MEMÓRIA
O fechar dos meus olhos abre cortina de pensamento que invoca entre papéis amassados, tinta e linha memória tua, memória minha ensurdecedor relembrar da poesia que já nos percorreu em desencontro com sabor da seiva do que se tornou antigas vestimentas daquilo que já fui cravadas em linhas do que nem sei retrato de nostalgia que redecora minha mente em meio a poeira e mofo e evidencia em angústia as marcas de tudo aquilo que formou aqui
Poema de minha autoria (em 28.11.2019)
À esquerda: Memória, 2019. Colagem analógica.
GALERIA DAS MINAS
69
AMOR “O AMOR ocorre além do BEM e do MAL. O amor é uma necessidade genética. O amor é um estado alterado de consciência. O amor é um medicamento difícil. O amor é uma doença mental. O amor é um jogo de poder. O amor é superar o ego de alguém. O amor é uma luz ofuscante. O amor é esperma, fluidos e lágrimas." Sinopse do filme Love (2015), Dir. Gaspar Noé
À direita: Amor, 2019. Colagem analógica.
70
LUA CARVALHO
GALERIA DAS MINAS
71
Foi criando e fortalecendo meu amor pelas artes que redescobri que não foi por acaso que Louise disse que "arte é garantia de sanidade". Ou que Clarice afirmou que escrevia pra salvar si própria, porque cada sentimento que flui tornandose colagem foi e é meu remédio diário. Sou imensamente grata pela possibilidade de recuperação e oportunidades que a arte (e as pessoas que entraram em minha vida por ela) me acrescentam e proporcionam sempre.
Agradeço a atenção e carinho comigo e meu trabalho. Agradeço também cada pessoa que abriu seu sensível para o que produzo e fez possível eu estar aqui.
72
LUA CARVALHO
Fotos por Pedro Ramos. Instagram: @sendmefl0wers
Lua (Luana Carvalho), 21 anos. Artista independente. De Rio Bonito (interior do estado do Rio).
GALERIA DAS MINAS
73
74
não somente viver mas durante a vida
escondi rápido o absorvente com os dedos depois que o encontrei na prateleira,
observo à minha volta e sinto meu segredo descoberto eles sabem que sangro. na espreita dos noticiários, o corpo encharcado à vista os olhos entreabertos não notam os olhares ou os números que compartilham cabeças falecidas despojadas no vocabulário: a morte compensa o grande erro de se chocar com o sofrimento. na memória falha, retiram-me o direito de sangrar em silêncio. eu mesma, como se registra, nasci no país que me corta filetes, mas registra. nacionalidade brasileira. letícia parente, também brasileira, sentia dores, assim como eu, no mínimo uma vez ao mês abaixo do ventre. entretanto, em 1975 quando costurou seu pé com os dizeres mádi ín brázil, sua carne está seca, sua pele está mole. o sangue não vaza em nenhum dos lados enquanto a linha corta o Z no pé que também poderia ser meu. quando assisti pela primeira vez, fechei as duas mãos em forma de concha, GALERIA DAS MINAS
75
descobri o ímpeto violento e erradiquei a covardia, se chutarem a lombar e recolherem as flores dos nossos mortos, a felicidade do sangue é ser brasileiro. minha bizavó, assim como eu, suas filhas e suas netas, brasileira, não sangra mais todo mês porém
esquece sua idade com frequência e demora mais que o habitual para fazer o percurso da colher no prato para colher na boca.
76
CAROL ALVES E CLARA COSTA
entre todos os pecados, não prevê mais nascimentos. como presentear uma mulher que não pode ter filhos? como presentear uma mulher que apesar de poder, não quer ter filhos? trago em lembrança o primeiro dia
que sujei minha calcinha e parte de minhas coxas, sem entender fui conjugada de criança para mocinha. se meu idioma for uma fronteira, falo em imagens cinco pedaços de coágulos deslizam da minha vagina para a água do vaso sanitário, uma mancha cobre parte do tecido e minha boca se contorce. minha mãe com olhos de espanto, cedo demais, tarde demais.
GALERIA DAS MINAS
77
78
CAROL ALVES E CLARA COSTA
GALERIA DAS MINAS
79
agora eu poderia me tornar mais um pedaço dela mesma - mãe. quando o céu não for encontrado ao anoitecer, ainda terei um nome, sangrarei todos os dias e minha que vó que xinga em palavrões da língua portuguesa.
agora eu poderia sangrar como ela mesma sem medo da morte. em qualquer lugar do mundo, existe o sangue estrangeiro.
80
CAROL ALVES E CLARA COSTA
GALERIA DAS MINAS
81
este marco em que a linguagem não alcança o corpo, onde a dor possa ser vista em dissílabos de sons: partir, matar, morder, gritar, chorar, sangrar, criar, morrer, parir.
onde somente no português conhece a palavra saudade: dormir dentro de casa. nada continua como está, e mesmo se não houver como voltar atrás, cometerei os piores desvios: se me derem festa, não saberei dançar. que meu corpo descanse ao lado de minha mãe.
***
82
CAROL ALVES E CLARA COSTA
GALERIA DAS MINAS
83
84
CAROL ALVES E CLARA COSTA
GALERIA DAS MINAS
85
86
CAROL ALVES E CLARA COSTA
GALERIA DAS MINAS
87
88
CAROL ALVES E CLARA COSTA
FICHA TÉCNICA: Poema: Carolina Alves Ensaio: - Fotografias por Clara Costa @a.na.cla.ra - Direção de arte por Carolina Alves @amescarolalves - Assistência de arte por Lucas Tirelli @ace.lilli.rust - Modelo: Tharciana Goulart @tharcianagoulart Agradecimentos: Rodrigo de Freitas Fotografias digitais, 33x50.
GALERIA DAS MINAS
89
ARTISTAS DESTA EDIÇÃO
Déia Pinafi @___deiap___ @clubepoetico
Tóia Azevedo @vie_in_rose @toiaaz
Jaq Braum @jaq.braum @jaqbraum @mulheresqueadmiromuito @itancoletiva
Poemeze @poemeze
Luana Carvalho @lua.nacrvlh @innocencelost.artofficial
Clara Costa @a.na.cla.ra hiclaracosta.wixsite.com/portfolio
Carol Alves @amesmacarolalves quenaocabenagaveta.blogspot.com
90
GALERIA DAS MINAS
79
Entre em contato
galeriadasminasart@gmail.com galeriasdasminas.com.br galeriadasminas galeriadasminas