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e O VESTIDO
3.
aProfUNDaMeNto: ParaLeLo eNtre CaSo Do VeStIDo e o VeStIDo
Nesta seção, dedicada sobretudo a vocês, professores de língua portuguesa, achamos que vale a pena trazer para seus alunos o poema que deu origem ao romance e ver como se deu a transformação de um poema de 150 versos em um romance de 40 capítulos, nesta edição, com 177 páginas, já excluídas as páginas que não constituem a história.
michel tournier, grande escritor francês, afirma que podemos avaliar a qualidade e o significado de uma obra pelo número de vezes que ela foi reescrita ou reinterpretada. pois Carlos Herculano vai mais longe, no caso da reescrita de Caso do Vestido: ele o reescreveu, para roteiro do filme de paulo thiago; e o reescreveu como romance. esse fato já diz da importância do poema de drummond.
É fundamental que os alunos leiam o poema, que está disponível no site:
http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet194.htm
a primeira atividade que cabe a vocês, sem dúvida, é uma bela leitura em voz alta do poema, que é extraordinário, reunindo um alto grau de poesia num texto narrativo, mas que tem uma grande teatralidade. Nós mesmos já tivemos oportunidade de apresentar o poema como uma cena dramática, e vocês poderão fazer, depois, a mesma experiência com seus alunos.
• leitura de Caso do Vestido
depois da leitura, distribuam o texto aos alunos, para falarem da composição de todo o poema em estrofes de dois versos, o chamado “dístico”, que permite a troca rápida de falas, muitas pausas rápidas, que sugerem um ritmo acelerado (talvez porque o pai pode chegar), quase ofegante, ditado pela emoção.
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o vestido
ainda explorando o poema, mostrem que há nele o mesmo expediente do flash-back do romance, uma narrativa dentro de outra narrativa.
A primeira narrativa, curtíssima, é constituída dos oito primeiros dísticos, que trazem o diálogo entre mãe e filhas, e a pergunta insistente delas sobre aquele vestido sempre pendurado no prego da parede, e que vai ensejar o Ela é retomada no último dístico, com a chegada do pai, prevista em alguns versos — o que nos antecipa um “final feliz”, ou razoavelmente bem-resolvido.
• a volta ao passado – uma história completa, em flash-back
o flash-back, que vai do nono dístico até o penúltimo, que tem o segundo verso já no presente, terminando a volta ao passado, terá a organização típica de qualquer texto narrativo, com introdução, desenvolvimento (com complicação e clímax), resolução e desfecho.
— peçam que eles procurem essa estrutura narrativa em flash-back no poema, comentando o mais interessante em cada passagem.
Introdução: 2 dísticos – 9 e 10: a dona de longe, e o pai enamorado. Complicação: dísticos de 11 a 23: de o transtorno do pai, até o pedido da mãe à mulher. Clímax: dísticos de 24 a 32: o sofrimento da mãe, o sumiço do pai. Resolução: dísticos de 33 a 47: volta e confissão da dona de longe. Desfecho: dísticos de 48 a 74: volta do marido. Volta à primeira cena: último dístico: mãe alerta as filhas da chegada do pai.
Deixem que eles falem de sua percepção, quanto à expressividade dos versos, frases de impacto – “O mundo é grande e pequeno”; um paralelo entre os sofrimentos, feito pelas duas mulheres, e terminando nos dois casos com o sumiço do marido. A resposta terá muito de pessoal, porque o poema possivelmente suscitará emoções distintas neles.
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o vestido
— façam com os alunos a análise dos versos do desfecho, que apresenta uma descrição comovente feita pela mãe, dos gestos e das feições do marido.
Depois da frase seca do marido [Mulher, põe mais um prato na mesa], ela “obedece”, ela o observa em silêncio: “ele se assentou,/comeu, limpou o suor,/era sempre o mesmo homem/comia meio de lado e nem estava mais velho.” Notem os verbos passando do pretérito perfeito para o imperfeito, até o penúltimo dístico, em que a sensação de sonho ruim acabado volta a perfeito, para passar, finalmente para o presente: “vestido não há… nem nada.”
— Vejam, ainda, com a turma a oposição entre a solenidade dramática do pronome de tratamento “vosso”, e do pronome possessivo “nossa”, como se as filhas falassem juntas, e os traços da linguagem oral (“vosso pai evém chegando”, mistura de pronomes, na conversa da “dona” com a mãe, por exemplo).
— depois dessa breve análise de alguns dados do poema, perguntem sobre proximidades e diferenças percebidas entre as duas narrativas: a de drummond e a de Carlos Herculano.
No próprio romance há muitos versos extraídos do poema, e eles certamente vão identificá-los com facilidade. Em geral, são os mais expressivos. Há, ainda, além das situações mais evidentes, de desespero da mãe, da confissão da “dona Soberba”, por exemplo, há detalhes do poema que viraram muitas cenas: as visitas à sogra (“visitei vossos parentes”, “tive uma febre terçã”.
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mas, além de toda a história paralela da sociedade de serra dourada, nome que substitui o da cidade de diamantina, no próprio caso do vestido há diferenças, como a própria localização da história, que não é feita no poema, podendo ocorrer em quase todo o Brasil: afinal, a sociedade patriarcal dominava (e ainda domina, em muitas questões).
outra distinção importante diz respeito às filhas que, no poema, aparecem com suas perguntas e algumas interferências. sua introdução, como vimos, é um diálogo cada vez mais intrigado, e até aflito, das filhas com a mãe, até ela decidir contar a história do
o vestido
vestido. No romance, a mãe retoma a última frase delas, abrindo a narrativa, e sempre é ela que repete a fala que as meninas teriam.
releiam esse momento para os alunos e mostrem-lhes o crescendo das emoções delas.
outra diferença é a do próprio vestido: no poema, era da própria “dona ruim”, desconhecida enquanto no romance foi dado pela mãe a Bárbara. de todo modo, ele é o símbolo de sedução, a ponto de Ângela não o achar adequado e não usá-lo.
o que podemos assegurar mesmo é a grande dramaticidade das suas criações, ambas de grande valor humano e literário.
• propostas de produção escrita
1. sugiram aos alunos a produção de um texto em que apresentem sua posição sobre o amor incondicional — de mãe ou pai, de filho, de mulher ou marido, namorados: deve existir?; ele não tem limites? 2. sugiram aos alunos a produção de uma carta a alguém, desculpando-se por uma indelicadeza ou falha séria em que tenham incorrido. 3. sugiram que escolham alguma cena do romance de Carlos Herculano que tenham considerado especialmente generosa e que a descrevam.
importante!
Vale a pena lembrar que vocês possivelmente terão alunos vocacionados para a escrita literária, mas não podemos esperar isso de todos eles. então, cabe, sempre orientar esses alunos talentosos na escrita literária. para os outros, é necessário valorizar e buscar a produção escrita bem feita, coerente, adequada ao tema, com argumentos e ideias bem amarrados, correta, do ponto de vista linguístico, mas não demandar deles a escrita literária.