» EDITORIAL
O supermercado do futuro sabe exatamente o que anda a comer por M. Oliveira
Se, para a maioria dos mortais, no mundo ocidental, ir ao supermercado não passa de uma experiencia banal, mais ou menos, encarada como um ato instrumental de sobrevivência, atenção, a partir de agora as coisas vão mudar. Já se imaginou a passar horas de prazer dentro de um supermercado com dinheiro e com vontade de comprar tudo? É uma imagem virtual, dirá o leitor, mas atenção, os fazedores de futuro querem torna-la realidade, ou seja, apostam na inspiração. Pode ser estranho, mas o resultado é surpreendente e incrivelmente bonito. Escolher um vinho com a ajuda de robô, ver as suas laranjas serem acondicionadas pela mãos gentis de um robô ou, por exemplo, pegar numa embalagem de ossobuco e o monitor de vidro à sua frente apresentar-lhe em tempo real, informações de rastreabilidade, raça, características organolépticas, modo de preparação, conservação, tenrura, textura, sabor e até a origem do nome deste chambão. É uma imagem de futuro, é verdade. Mas uma coisa é certa, ou melhor, duas: primeira, o futuro está aí à porta, segunda, o supermercado de futuro estará de olho em si. Estamos perante um novo Big Brother alimentar? Antes de passarmos ao tema seguinte e porque falamos no ossobuco que particularmente aprecio, e antes que sejam os robôs 4 | CARNE
a fazê-lo, não quero deixar passar esta oportunidade sem deixar de lhe falar desta conhecida iguaria italiana. O ossobuco é um prato tradicional italiano da região da Lombardia, em especial da cidade de Milão. O nome deste chambão de vaca, significa (tradução livre) “Osso com buraco”, que deriva de “oss bus” no dialeto milanês. O ossobuco, nem é mais nem menos que o chambão traseiro cortado em rodelas grossas, com osso, e depois congelado. No centro dos discos a parte óssea é recheada de tutano uma iguaria rica em sabor e textura. A carne magra, textura fina e fibrosa torna-se privilegiada ao ladear o osso. Fica muito saborosa em preparos caldosos como cosidos, guisados, ensopados, sopas e consommés. O tutano, quando submetido a cozedura lenta, proporciona molhos riquíssimos, untuosos e encorpados. As peças de ossobuco devem ter no máximo três centímetros de altura e cerca de 200 gramas. Pedaços maiores dificilmente cozinharão o tempo suficiente para que fiquem com a consistência ideal. Aliás, a pressa é inimiga do ossobuco. Necessita de um cozedura vagarosa para amaciar as fibras e preservar a textura e todo o sabor natural da carne.
SAÚDE E CONSUMO «
O ossobuco, nem é mais nem “menos que o chambão traseiro cortado em rodelas grossas, com osso, e depois congelado. No centro dos discos a parte óssea é recheada de tutano uma iguaria rica em sabor e textura...
”
Não é por acaso que em Milão é um dos pratos seculares mais apreciados pelo seu sabor forte e intenso. Há registo, em Milão, desta iguaria desde 1700, enriquecido com azeite, vinho e temperos. Os milaneses costumam servi-lo acompanhado de risoto milanês com açafrão. Mas também não dispensam a gremolata, uma pasta de salsa, alho e raspas de limão que destaca ainda mais os sabores e aromas da carne. Subtende-se que para um ossobuco estar ao melhor nível é essencial matéria-prima de qualidade. Nesta edição, falamos disso mesmo, de qualidade e criação de gado em extensivo, de forma natural e sem pressas. Fomos até Monforte, à Herdade Torre de Frades ver como a “Carne Alentejana” nasce e cresce de forma tão natural, como o alecrimdo-campo. Ainda nesta edição, abordamos, com a máxima seriedade, o tema da Alimentação do Futuro e mostramos-lhe uma empresa familiar de sucesso, “Talhos Ernesto”, que desenvolve a sua atividade entre Mealhada e Coimbra. O novo mercado de Abrantes desenhado pelos arquitetos José e Nuno Mateus também é tema de conversa nas nossas páginas. Destaco ainda o milenar processo de maturação de carne a seco (dry aged) utilizado, de novo, pelo maiores Chefes de cozinha do mundo, e como não há bela sem senão, um tema áspero mas bastante atual: a ortorexia. As preocupações excessivas com a alimentação podem dar origem à ortorexia, um distúrbio caracterizado por comportamentos obsessivos que conduzem à desnutrição e isolamento social. Boa leitura revistacarneportugal@gmail.com CARNE | 5
SUMÁRIO Revista bimestral nº 166 março/abril 2016 Revista Carne. não dispensam 4 EDITORIAL
O supermercado do futuro sabe exactamente o que anda a comer
8 BREVES
Bizerba, Avisilva e outros
16 REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE Carnalentejana, o espelho da qualidade nacional
32 CARNALENTEJANA RESTAURANTES Carnalentejana no prato
36 TALHOS ERNESTO
Mais que um talho, uma família.
47 SAÚDE E CONSUMO
Quando comer saudável se torna perigoso
50 MATURAÇÃO DE CARNE
Carne maturada a seco. Já ouviu falar em dry aged meat?
60 MERCADO MUNICIPAL DE ABRANTES Simultaneamente edifício e rua
62 IFFA 2016
Grandes expectativas para o maior evento do setor das carnes
N.º166 março/abril 2016
FICHA TÉCNICA Revista Carne Revista bimestral Propriedade: Azitania Global Expedition S.L. C.I.F. b8662786 Calle Génova 15 Piso 3 Derecha 28014 Madrid e. revistacarneportugal@gmail. com Assinatura, artigos e publicidade: e. aglobalexpedition@gmail.com Versão em português Isenta de registo a ERC ao abrigo do Decreto-Lei 8/99 de 9/06 artº12 nº1 A
Redação: Diretor: Manolo Oliveira Chefe de redação: Glória Oliveira Gestão de conteúdos: Luis Almeida e Alberto Pascual Design Gráfico e paginação: Patrícia Machado Impressão: Azitania Global Expedition S.L.U. Tiragem 10.000 exemplares Revista Carne é associado de: Maitre - Open Plataform for journalists and Researchers e SPJ Society of Professional Journalists
ASSINATURA REVISTA CARNE 6 números 30€ 12 números 50€
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Bizerba na IFFA 2016: 150 anos de inovação Automação, individualização, diferenciação, automatização, segurança, higiene e eficiência energética são os temas principais da presença da Bizerba na IFFA deste ano, no Hall 11.1, Stand A11, de 7 a 12 maio. A empresa alemã que vai comemorar o seu 150º aniversário este ano, demonstra o impacto do software e máquinas na cadeia de valor desde a produção, passando pelas grandes superfícies até ao mais pequeno estabelecimento de produtos alimentares. Nas duas cozinhas de demonstração, a Bizerba ilustra como o processamento de carnes em empresas industriais e empresas artesanais é transformado pela procura de alimentos individualizados. A industria 4.0 (que assenta na automatização e na tecnologia digital) torna-se cada vez mais importante na produção de alimentos. Usando um modelo em miniatura apresentado na IFFA, a Bizerba demonstra o processo das etapas em operações que podem beneficiar de novas tecnologias e metodologias de trabalho de processamento de carne – da entrega de matériasprimas e pesagem inicial, rastreamento e identificação, baseado em software de controlo de peso antes e após acondicionamento. Estes processos, são cada vez mais
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automatizados. Máquinas interligadas, também desempenham um papel crucial para embalagem, rotulagem, verificação de peso de enchimento e inspeção final de contaminantes ou selagens defeituosas, assim como as suas capacidades de comunicação aperfeiçoadas levam a uma melhor flexibilidade de produção, qualidade e eficácia.
// AUTO ANÁLISE DE PRODUÇÃO Para aumentar a eficácia dos fluxos de produção, as empresas podem avaliar os dados das etapas de um processo especifico para tirar conclusões sobre o processo da operação. Até agora, empresas de processamento de carne só poderiam medir a diminuição ou as perdas quando os produtos eram embalados. Usando o software industrial BRAIN2, agora, é possível
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A empresa alemã que vai comemorar o seu 150º aniversário este ano, demonstra o impacto do software e máquinas na cadeia de valor desde a produção, passando pelas grandes superfícies até ao mais pequeno estabelecimento de produtos alimentares.
analisar a eficácia geral dos equipamentos, incluindo desempenho, qualidade e disponibilidade. Além disso, um novo módulo de software calcula informações adicionais importantes, incluindo a quantidade de carne processada por empregado. Individualização do produto é outro aspeto no contexto da industria 4.0. Embora seja ainda uma visão de futuro em operações diárias, a Bizerba demonstra este conceito na IFFA como um cenário simbólico, mas paredes-meias com a realidade: usando o interface de um smartphone, os clientes podem enviar sua preferência de comida para uma cozinha de demonstração, que irá de uma forma direta preparar e embalar a refeição e anexar uma etiqueta personalizada. Etiquetas e consumíveis que desempenham um papel importante nas unidades industriais e empresas artesanais, são contempladas bem no centro do stand da Bizerba. A empresa produz etiquetas de alta qualidade em lotes pequenos ou grande volumes para uso industrial. A gama de produtos varia desde papéis especializados e filmes com matérias térmicos reativos a etiquetas linerless sem papel de suporte. Bizerba desenvolve e produz exclusivamente, há mais de 30 anos, os seus próprios laminados. Papel, cola e suporte de papel são adicionados internamente.
// TRANSPARÊNCIA CRIA FIDELIDADE DO CLIENTE Em empresas artesanais, as balanças PC fornecem funcionalidadeschave quando se trata de comunicação. Informação relevante é exibida na tela do cliente no momento certo. Alternativamente, as informações podem ser impressas nas etiquetas. Aqui, o foco está em atender o Regulamento de Informação Alimentar da UE que obriga que a informação nutricional seja indicada em alimentos pré-embalados a partir de dezembro de 2016. Todas as informações necessárias nos estabelecimentos de venda de carne para pesagem e etiquetagem podem ser controladas centralmente usando um sistema de gestão de dados. Além disso, é possível inserir informações sobre artigos, produtos alérgenos e valor nutricional no software da industria e transferi-los para os sistemas de pesagem individuais. Os consumidores também podem obter informações sobre a origem dos seus produtos e detalhes sobre o armazenamento correto da sua alimentação.
// HIGIENE É A CHAVE PARA SATISFAÇÃO DO CLIENTE Além do transporte e armazenamento deficiente, a higiene inadequada durante as etapas subsequentes de processamento é, na maioria dos casos, a causa de deterioração prematura dos produtos de carne. As segmentações de dados apresentadas pela Bizerba na IFFA para os balcões de vendas, salas de preparação e transformação industrial de produtos alimentares, atendem às mais altas normas mundiais de higiene. A máquina de fatiar frios, Validoline VSC280, por exemplo, possui uma superfície de fácil limpeza Ceraclean, uma máquina de peça única incluindo uma borda ligeiramente elevada. Qualquer liquido fluirá através de um canal de drenagem para o centro do equipamento em vez de cair para o balcão ou para o chão. Além disso, as máquinas estão em conformidade com a recente norma DIN para determinar o consumo de energia de máquinas de fatiar frios. Graças á tecnologia de movimentação Emotion contribuem de forma sustentável para a redução de consumo de energia e custos. A empresa também demonstra sistemas de fatiar com balança integrada para controlo de peso ou venda de balcão, para uma utilização manual ou automática de corte e pesagem de frios, carnes e outros alimentos numa única etapa. Os operadores podem assim atingir exatamente o peso pretendido pelo cliente, sem que nenhum excesso tenha que ser retirado, resultando num serviço mais rápido e eficiente. Para operações industriais de transformação de produtos alimentares: picadoras, serras-de-ossos e soluções para fatiar, totalmente automáticas, para uma infinidade de produtos que podem ser fatiados e com um volume de pequena a média produção também marcam presença no stand da Bizerba. Estará presente também o equipamento vertical industrial A400 openWorld para demonstrar a implementação de soluções de linha personalizada para fatiar, embalar e etiquetar.
// OLHAR PARA O PASSADO Por ocasião deste ano de aniversário, a Bizerba fará, na IFFA, uma retrospetiva da sua história de 150 anos. Fundada por Andreas Bizer em Baligen, Swabian Alb, em 1866, a Bizerba transformouse de um fabricante exclusivo de balanças num player global, especializando-se em pesagem, corte e tecnologia de etiquetagem. A Bizerba apresentará no seu stand os passos mais significativos da sua história em torno do valor central, o “Peso”. CARNE | 9
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Bizerba volta a ser uma empresa 100% familiar A 1 de janeiro de 2016, a Bizerba adquiriu de volta as ações da companhia Zurich Herold Deutscher Lebensversicherung AG. Após quase duas décadas, a empresa está de novo sob a posse da fundadora, Kraut. Em outubro de 2013, a Bizerba já tinha adquirido de volta as ações que estavam na posse da empresa de investimento de capital própria, a BKW. “A recuperação de todas as ações na posse de empresas externas ao grupo não poderia ter acontecido em melhor altura, uma vez que coincide com o nosso 150º aniversário que celebramos no corrente ano”, sublinhou Andreas Wilheim Kraut, sócio-gerente da empresa, familiar de quinta geração e homem forte do leme, desde 2011, com resultados extraordinários. “ Perante o desenvolvimento positivo do negócio nos últimos anos, agora estão reunidas todas as condições e a força para abandonar o apoio financeiro externo”, conclui o gestor. “Estamos muito felizes da nossa estratégia ter dado os seus frutos” referiu o Dr. Michael Leinwand, diretor de investimentos do Zurich Group Germany. “Juntos fomos capazes de aumentar potencialmente o valor da Bizerba nos últimos 20 anos de forma sustentável e de desenvolver positivamente a empresa”. Desde a década de 1920 do século passado, a Bizerba rumou no sentido de se tornar no maior fabricante alemão de balanças. Desde então, o leque de produtos e soluções expandiu-se continuamente e, hoje, a gama inclui balanças de retalho, serviços e soluções industriais, etiquetagem e máquinas de corte. A Bizerba em 2014 alcançou um volume de negócios de 503,8 milhões de euros.
// SOBRE A BIZERBA A Bizerba oferece aos clientes do sector do comércio, industria e logística de todo o mundo um portfólio de soluções hardware e software centralizadas à volta do valor “Peso”. Esta proposta abrange produtos e soluções para fatiados, processamento, pesagem, registo, controlo, acondicionamento e etiquetagem. Uma gama abrangente de serviços de consultadoria, passando pelo serviço de assistência, etiquetas e consumíveis até ao Leasing, numa completa gama de soluções. 10 | CARNE
Desde 1866 que a Bizerba impulsionou de forma determinante o desenvolvimento tecnológico, no sector da tecnologia de pesagem, marcando atualmente presença em 120 países. A carteira de clientes vai desde a empresa mais global da industria e do comércio, passando pelo comerciante individual, desde a pequena padaria ao mais típico talho. A sede deste grupo empresarial que é gerido há cinco gerações pela mesma família emprega em todo o mundo cerca de 3.700 colaboradores e a sua matriz está situada em Balingen, no estado de Baden-Wurttemberg. Os restantes locais de produção encontram-se na Alemanha, Áustria, Suíça, Itália, Espanha, China, bem como nos EUA. Além disso, a Bizerba detém uma rede mundial de locais de distribuição e serviço.
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Avisilva reforça confiança no futuro Após um período de restruturação que envolveu uma negociação com entidades e credores, alicerçada no seu profundo know-how e carteira de encomendas, o qual foi aprovado com mais de 90% dos votos favoráveis, a Administração da AVISILVA – Equipamentos para a Industria Alimentar, S.A. congratula-se com a confiança manifestada pelos seus credores e reforça a sua confiança no futuro. A empresa encontra-se a laborar em pleno, com uma agenda de obras considerável, continuando como sempre disponível para oferecer os seus serviços e soluções técnicas junto dos seus clientes, como reforço da confiança e credibilidade ao cabo de quase 30 anos. A Equipa Avisilva continua profundamente empenhada em acrescentar mais valias ao negócio dos seus clientes, como aliás é 12 | CARNE
apanágio do fabricante português de equipamentos para centros de produção, matadouros, salas de desmancha, entrepostos frigoríficos, talhos e outros estabelecimentos de produtos alimentares, quer a nível nacional quer a nível internacional, reforçando o facto que está preparada para enfrentar todos os desafios. “Estamos muito felizes com esta restruturação que a par da carteira de encomendas, faz-nos olhar para o futuro com confiança.” Miguel Silva – Presidente do Concelho de Administração. Por sua vez, João Silva, Vice-Presidente do Concelho de Administração sublinhou: “A restruturação e o desenvolvimento sustentáveis de soluções para os nossos clientes são a nossa prioridade”.
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» REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE
Carnalentejana, o espelho da qualidade nacional Parece-nos que se perdem de vista as imagens que se observa ao longe. Os caminhos rurais dividem numa lógica desordenada ou numa ordenada ilógica os campos que se estendem até aos outeiros distantes. Estamos em pleno Alto Alentejo. As terras quase desertas de homens e mulheres, mas repletas de animais selvagens e domésticos. Estes últimos em pachorrentos rebanhos e manadas. Os primeiros deambulando pelos ares, como abetarda, o sisão, o alcaravão ou o rolieiro, sempre prontos a dar excelentes espetáculos de graciosidade natural. Um Alentejo profundo, sereno, calmo e repousante. 16 | CARNE
O Alentejo é noite, é dia, é romance, é história, é gastronomia, é verde, é azul, é céu. Um património natural que oferece uma imensidão de ofertas para serem vividas e saboreadas, minuto-a-minuto, com calma, como o Alentejo com toda a sua dinâmica e vida o exige. Mas, o Alentejo não é só turismo; é trabalho, é cultura, é desenvolvimento sócio económico. Faz parte integrante do tecido produtivo do nosso país. Os amplos campos de trigo e o famoso montado de azinheiras e sobreiros que tranquilamente pintam a paisagem, escondem um património surpreendente
mas, ao mesmo tempo, revelam uma dinâmica produtiva peculiar e essencial no desenvolvimento agrícola, produção agroalimentar e desenvolvimento rural. O asfalto rasga com rigor o verdejante da planície que passa por nós, em contramão, ao ritmo da brisa. À passagem por Santo Aleixo, aldeia bafejada pela história do tempo, surge, num caminho de terra, a placa “Carnalentejana” que nos leva até à Exploração Torre do Frade, onde temos encontro marcado com Fernando Carpinteiro Albino, sócio-fundador com um papel preponderante na formação da Carnalentejana.
REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE «
No início dos anos 90, com a adesão à CEE, surge a necessidade de alguns Agricultores/ Criadores de bovinos de Raça Alentejana comercializarem em conjunto os seus produtos, já que os produtores isolados tinham dificuldade em escoar o seu gado. É nesta altura que Fernando Carpinteiro Albino, com outros Criadores de bovinos da Raça Alentejana, sente a necessidade de comercializar os produtos de forma concentrada, para ganhar dimensão e poder negocial. Hoje, a Carnalentejana é um exemplo para o mercado agrícola em Portugal. Internacionalizou-se e é o maior agrupamento nacional de produtores em produção extensiva. A Torre do Frade está situado em pleno Alto Alentejo, no concelho de Monforte. Esta propriedade foi um convento de 1384 a 1834 tendo sido comprada pelos antepassados da família no ano de 1839. É conhecida pelos seus vinhos mas a verdadeira riqueza vem da integração das diversas áreas de negócio. Vinha, pecuária, floresta e produção de cereais andam de mão dada criando um negócio integrado e sustentável.
é noite, é “dia,O é Alentejo romance, é história, é gastronomia, é verde, é azul, é céu. Um património natural que oferece uma imensidão de ofertas para serem vividas e saboreadas, minuto-a-minuto, com calma, como o Alentejo com toda a sua dinâmica e vida o exige.
”
// RAÇA ALENTEJANA, A ORIGEM. Os bovinos autóctones da região alentejana representam de uma forma primitiva e milenar da espécie bovina e disso são prova os fosseis existentes no museu
dos Serviços Geológicos de Lisboa, pelas semelhanças que apresentam com peças correspondentes aos atuais bovinos (Andrade, 1948). O mesmo autor refere que o gado bovino alentejano é derivado de uma forma meridional dos Bos Primigenius, que se terá desenvolvido no sul da península Ibérica e que terá emigrado para África, tendo regressado à Península Ibérica depois da última glaciação. O nome desta raça sofreu algumas alterações ao longo dos anos, consoante diferentes autores que a referenciaram, tendo, contudo, ficado associado á região solar de origem, onde é atualmente explorada e à sua principal zona de dispersão, o Alentejo. Miranda do Vale em 1949 e Fernando Andrade em 1952 fazem ambos referencia à Raça Bovina Transtagana e ás suas sub-raças, entre elas a Alentejana, sendo ainda consideradas por estes autores as variedades “do Alentejo” e “do Algarve” ou do “Baixo Alentejo” e do “Alto Alentejo”. A primeira descrição morfológica da raça bovina Alentejana foi da autoria do Professor Silvestre
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» REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE
... património inestimável da agropecuária nacional. Irrefutável. ... A qualidade “inegável da carne alentejana chega-nos ao prato com imagem de marca, certificado de qualidade, D.O.P. Denominação de Origem Protegida, produção 100% em extensivo e uma interação entre sabor e textura única...
”
Bernardo Lima em duas publicações sobre o Recenseamento Pecuário de 1871 e 1873. A raça bovina Transtagana, segundo o Professor Paulo Nogueira, citado por Andrade (1952), era caracterizada como uma “raça flava que povoa o território português ao sul do Tejo”. No entanto, este autor, seguindo o critério de Cornervin (1871) define a raça transtagana como, “de pelagem vermelha e desenvolvida corneamente, grande volume de corpo, aberturas naturais almaradas, pontas dos chifres loiras e unhas da mesma cor” . Esta última definição corresponde ao padrão atual da raça bovina Alentejana. O livro Genealógico da raça bovina Alentejana foi constituído em 1968, pela 18 | CARNE
Direção Geral dos Serviços Veterinários, passando em 1981 para a responsabilidade da Associação de Criadores de Bovinos de Raça Alentejana (ACBRA). A raça bovina Alentejana, extremamente bem adaptada ao meio onde se insere, teve durante anos a função principal de produzir trabalho. A sua evolução esteve ligada à revolução industrial, à mecanização da agricultura e ao crescimento populacional. Desde então novas técnicas agrícolas emergiram, com o objetivo de aumentar a produtividade, do mesmo modo que se iniciaram atividades relacionadas com o melhoramento animal, com o intuito de aumentar a produção de carne em detrimento da produção de trabalho. Em
toda a Europa as raças bovinas foram submetidas a programas de seleção, sendo a sua vocação natural redirecionada do trabalho para a produção de leite, carne e, em alguns casos, para ambos. A partir da segunda metade do século XX, apresar da oposição de algumas entidades oficiais, professores e técnicos de destaque da altura, muitos criadores, na tentativa de quebrar a tendência de perda de rendimento com a atividade pecuária, nalgumas situações iludidos com a possibilidade de melhorar a rentabilidade das suas explorações, optaram por copiar modelos de produção de outros países e recorrer à importação de raças exóticas (Carolino, 2006). Naquela altura, verificou-
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se uma tendência clara para o aumento da exploração da raça exótica ou para a realização de cruzamentos com estas raças, na tentativa de se obterem animais melhor conformados e com uma velocidade de crescimento mais elevada (Ralo, 1972). Este procedimento, porém, não tendo conduzido aos resultados esperados e ameaçando o desaparecimento do património genético autóctone , viria a ser corrigido, através de programas específicos. Nos últimos anos, a execução de alguns programas, apenas de carácter nacional e, posteriormente, comunitário (e.g. Novagri, PAMAF e AGRO), com a convicção de que o trabalho de conservação e utilização sustentável dos recursos genéticos animais seria da competência das Associações de Criadores, com o apoio e fiscalização dos serviços oficiais, acabou por constituir um contributo decisivo para travar a regressão dos efetivos de raças autóctones que se vinha observando em Portugal desde meados do século XX. Esta tendência não é alheia ao facto de, atualmente, haver uma maior exigência por parte dos consumidores. Para dar resposta a esta exigência de qualidade e de segurança alimentar no consumo, em 1992, os produtores organizaramse num Agrupamento responsável pela comercialização da carne e produtos D.O.P. “Denominação de Origem Protegida”: CARNALENTEJANA S.A., entidade responsável pela comercialização da linha pura de bovinos da Raça Alentejana.
da terra. Em termos organizacionais atuais é o CEO da Exploração mas, segundo apuramos, esta nomenclatura ainda não chegou à Torre do Frade. Informal, espontâneo, até popular, Fernando é formado em Direito, mas todos no meio agrícola o tratam por Engenheiro devido ao seu elevado grau de conhecimentos
berço do projeto Carnalentejana que começou com 33 criadores e, que hoje, passados quase 25 anos, já são mais de 140 e o número não passa de crescer. A visita guiada pelo Monte é feita numa pickup VW Amarok com Fernando Carpinteiro Albino ao volante, não fosse ele
// Fernando Carpinteiro Albino, homem do campo, acérrimo defensor das raças autóctones é o grande “culpado” do êxito do projeto CARNALENTEJANA, o espelho da qualidade nacional.
A nível internacional está oficialmente reconhecida pela União Europeia , pela FAO e pela European Association Of Animal Production (FAO,2000) e encontra-se descrita na Lista dos Recursos Genéticos Animais a nível mundial (World Wacth List for Domestic Animal Diversity).
// CARNALENTEJANA, DO MONTADO AO PRATO, COM MAIS VALIA A Carnalentejana é, hoje, um património inestimável da agropecuária nacional. Irrefutável. Não só pelo desenvolvimento da raça autóctone em si, em termos de grandeza a mais importante do país, como pela mais valia no prato do consumidor. A qualidade inegável da carne alentejana chega-nos ao prato com imagem de marca, certificado de qualidade, D.O.P. Denominação de Origem Protegida, produção 100% em extensivo e uma interação entre sabor e textura única. Fernando Carpinteiro Albino é um homem
// Gonçalo Bagulho Albino, veterinário, integra a equipa que tem a cargo a responsabilidade sanitária e veterinária da exploração bovina constituída, exclusivamente, por bovinos da raça alentejana em linha pura.
técnicos das diversas culturas e agricultura em geral. Atualmente desempenha as funções de Presidente do Conselho de Administração da Carnalentejana. E foi nesta condição que a equipa de reportagem se deslocou à Exploração Torre do Frade,
um ex-piloto de todo-o-terreno, com um palmarés invejável. O dia está soalheiro, os prados estão verdejantes, há nuvens no céu e o gado refastela-se indiferente à nossa passagem.
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Fernando Carpinteiro Albino foi o grande impulsionador deste projeto que abraçou como se tratasse de um desígnio pessoal. “Fui, mais ou menos, uma espécie de mola, neste projeto. Nessa altura já engordava novilhos alentejanos, sempre em linha pura” começa por dizer o nosso interlocutor. A linha pura é o cerne da questão. A Carnalentejana não admite no seu Caderno de Encargos, no seu conceito de produção, na sua maneira de estar, animais que não sejam de linha pura. Não resisto à tentação: Mas não comercializam animais de cruzamento? “Mas não tem nada a ver com a Carnalentejana. Também comercializamos animais cruzados mas vão para mercados 22 | CARNE
completamente distintos do mercado da Carnalentejana. O grosso do nosso mercado, a maioria das encomendas são animais filhos de pai e mãe inscritos no Livro Genealógico da Raça Alentejana. Temos 140 acionistas/ produtores (uma vaca equivale a um titulo representativo na parte do capital) em linha pura. Esses criadores de linha pura também tem vacas cruzadas e vendem novilhos cruzados, mas é uma atividade à parte da Carnalentejana”. O Alentejo é o solar de origem desta raça, como o seu nome sugere, sendo a sua representatividade bastante grande nesta zona do país. Representa cerca de 13.000 vacas de linha pura que são a razão da existência da Carnalentejana. O sucesso do projeto extravasou as “fronteiras” do Alentejo
e estendeu-se pelos concelhos limítrofes abrangendo os concelhos de Castelo Branco, Idanha-a-Nova, entre outros.
// NOVILHO O novilho Carnalentejana representa o grosso da coluna das vendas. Apresenta 300 quilos de carcaça (média dos últimos vinte anos), de filhos de pai e mãe inscritos no Livro Genealógico da Raça Alentejana. Os bezerros são desmamados entre 6 a 8 meses, perdem o período de carência da mama durante 3 semanas. Após esse período são colocados nas pastagens, em extensivo, tranquilamente, alimentandose da riqueza alimentar que o montado proporciona.
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O conceito de produção de um bezerro até chegar a novilho de carcaça é completamente natural: os bezerros deambulam pelos prados, sejam de sequeiro, sejam de regadio e, geralmente, acampam até aos últimos 3 meses antes do sacrifício. O que acontece por volta do 17/ 18 meses. Os pesos são controlados mês-amês. Após esse período os animais entram na fase de acabamento e a sua alimentação é, por obrigatoriedade do Caderno de Encargos, enriquecida com um composto concentrado sob fórmula aberta fornecido por cinco fábricas de ração, que são os fornecedores oficiais da Carnalentejana. Cada criador é livre de optar por uma desta cinco fábricas de rações, segundo o seus critérios de escolha, de proximidade, hábitos de consumo, conhecimento, etc.
// VITELAS Normalmente não chegam ao abate. São animais muito novos e os hábitos de maneio dos criadores Carnalentejana são diferentes do que as vitelas de outro tipo autóctone.
nossos hamburguers diferenciam-se entre os seus pares porque? Nós metemos nos hamburguers aquilo que normalmente não se mete: os pojadouros, as rabadilhas, as vazias, e um hambúrguer feito com estas peças é um hambúrguer diferente”.
// VITELÕES E VACAS É um mercado muito interessante para a Carnalentejana. É um animal que é vendido com uma carcaça de 13 meses. Além disso, a Carnalentejana está a implantar no mercado a chamada Vaca de Reforma. “ Nós conseguimos valorizar bem as nossas vacas porque os nossos picados, sejam hamburguers, almôndegas e todos os restantes produtos de carne picada deste tipo de animais, são excepcionais. Os
Não se torna seco? “Não, porque nós metemos o conjunto da vaca. Metemos as abas, os peitos, os cachaços, mas é essa mistura rica que faz dos nossos hamburguers produtos de eleição. O hambúrguer da Carnalentejana tem as características que o consumidor prefere: saboroso, suculento, com uma textura fina mas consistente. Neste sentido, os hamburguers são excelentes e o negocio é bem valorizado para o criador da vaca”. A qualidade não é incomensurável. Além dos CARNE | 23
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consumidor é que manda nos produtos. Se o consumidor não entendesse “que...Oé uma carne necessariamente mais cara, o consumidor não comprava. A Carnalentejana faz no próximo ano, 25 anos, isto quer dizer que o consumidor gosta. O consumidor compra. Estamos no bom caminho...
”
tramites de qualidade ambiental, não podemos esquecer o sabor. O sabor da Carnalentejana advém da alimentação. Um animal em regime extensivo, 100% extensivo. Uma alimentação diversificada com pastos naturais, enriquecida durante 3/ 4 meses com bolota ou landes porque por baixo dos sobreiros existe lande e por debaixo das azinheiras existem bolotas que são frutos muito similares, ambos, riquíssimos em Ómega-3. E, esta alimentação, aliada às características organolépticas da raça Alentejana, proporciona uma excelente carne “Quando fazemos um bife da Carnalentejana o que sai não é água é o suco de uma carne de qualidade, mais saboroso e com uma textura ótima”
O consumidor reconhece? “O consumidor é que manda nos produtos. Se o consumidor não entendesse que é uma carne necessariamente mais cara, o consumidor não comprava. A Carnalentejana faz no próximo ano, 25 anos, isto quer dizer que o consumidor gosta. O consumidor compra. Estamos no bom caminho. Enveredamos por este caminho há quase 25 anos e para além destas características naturais também lutamos contra as características não naturais, que foi o que nos levou a criar o Agrupamento de Criadores de Raça Alentejana de Linha Pura. Foi uma luta contra alguns produtos que não são admitidos na alimentação de bovinos. Nós estivemos na linha da frente, como você bem
se recorda, na luta contra esses produtos, essas modas que existiam e, após muitas batalhas, ganhamos a guerra. Nos nossos Cadernos de Encargos, nas nossas certificações e auditorias que fazemos através de duas empresas de auditoria independentes, todos os anos e por diversas vezes, são completamente banidos do nosso caderno de certificações qualquer produto proibido para alimentação animal.” Está-me a dizer que se continua a utilizar produtos proibidos na alimentação animal? “Eu não lhe estou a dizer que continua acontecer. O que eu digo é que há muitos
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» REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE
animais que, julgo eu, não são engordados como os da Carnalentejana. Como é que são, como é que não são, não sei. Aliás, não é só em Portugal que isto acontece, acontece no mundo inteiro. Algumas potências até se dão ao luxo, nomeadamente, os EUA de utilizar todo o tipo de hormonas, uma prática permitida naquele país e ai de nós que a globalização permita que o consumidor compre carne engordada com os tais fatores de crescimento. Será o fim da carne boa, da carne certificada, e da carne que não faz mal a ninguém, antes pelo contrário.”
// INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL Na Exploração da Torre do Frade o núcleo de raça Alentejana de linha pura reproduz-se naturalmente. Gonçalo Albino, veterinário, é responsável sanitário e veterinário da Exploração, sublinha: “Temos tudo muito bem controlado, não fazemos inseminação artificial, a manada reproduz-se naturalmente. Agora, temos é muito cuidado com a qualidade do sémen dos animais. Há quase uma década que uma equipa especializada vem à exploração fazer testes andrológicos que são, ao fim e ao cabo, para ver se os animais têm os espermatozoides necessários e suficientes 26 | CARNE
para cobrir as vacas e, portanto, este controlo acaba por ser um êxito porque as nossas vacadas estão perto dos 100% de fertilidade, na casa dos 98, 99%, um índice de fertilidade a todos os níveis espetacular.” A exploração Torre do Frade, constituída por diversos prédios rústicos, próprios ou arrendados, estende-se por uma área superior a 3000 hectares. O índice de ocupação bovina é de 0,4 cabeças por hectare, cumprindo generosamente as regras de produção integrada ou de agricultura biológica que são, em média, duas cabeças por hectares. “Nós somos adeptos de encabeçamentos mais baixos. As nossas terras têm as suas limitações, são terras pobres, no verão secam-se os pastos e os pastos secos são uma carga de trabalhos se não tivermos cereais para que as vacas durante o verão comam restolhos. Tudo isto são características das nossas vacas que são rústicas, de porte grande, em parte, devido aos alimentos rústicos que consomem.” Refere Gonçalo Bagulho Albino.
// IMPORTAÇÃO COM O OBJETIVO DE CRESCER Num país deficitário em carne de bovino,
a Carnalentejana, vive uma experiencia muito dinâmica de exportação. A cada ano, a participação da empresa no comércio internacional vem crescendo e as perspectivas são bastante animadoras. Neste momento, a Carnalentejana exporta os seus produtos para os mercados de Angola e Macau e prepara-se para iniciar o envio dos primeiros contentores para Moçambique.
“Estamos a exportar para Angola e vamos iniciar a exportação para Moçambique. Também estamos a vender contentores para Macau, inclusive, de borrego. O mercado de Macau é muito bom para o nosso borrego. Neste momento, temos sócios que também têm ovelhas, cada dez ovelhas, é equivalente a uma vaca, dando direito a uma Ação na Carnalentejana. Por isso também comercializamos os ovinos dos nossos acionistas. E, portanto, a exportação é um dos nossos objetivos, porque o nosso objetivo é crescer. Não há nenhuma empresa, nenhuma organização, que não tenha esse objetivo. Neste sentido, estamos sempre a inovar e, neste momento, estamos a desenvolver salsichas à base, exclusivamente, de carne bovino, muito importante para os países
» REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE
do Magreb. Por outro lado, a exportação, também foi importante para enfrentar a crise dos últimos anos.” Explica Fernando Carpinteiro Albino. Como analisa a importação de carne de bovino? “A necessidade existe. Não somos auto suficientes com excepção na carne de porco mas aqui a coisa ainda está mais confusa apesar de estarmos muito bem como produção e muito bem integrados. Em relação à produção de carne de bovino, temos área, temos condições para crescer. Portanto, é ai que eu entendo que a Carnalentejana pode crescer, tem que crescer, temos que criar condições para isso.” Quais são as condições? “São os preços. Quanto melhor se pagar à produção mais possibilidades os criadores têm de aumentar a produção e termos menos necessidade de importação, muitas vezes, de qualidade suspeita.” Em termos pessoais o que significa a Carnalentejana para si? “Significa um meio de combate à erosão em várias vertentes, sobretudo à erosão demográfica. Faz-me muita confusão, ver cada vez menos gente no interior do país e ver cada vez mais gente em lugares de governação mostrarem muito pouco interesse pelo interior do país. Fala-se disso há muito anos mas pratica-se muito pouco, é como os católicos, há muitos mas praticantes há poucos.”
// “Não posso, não posso passar sem isto. Tenho 72 anos, já fiz outras coisas, gosto, dá-me prazer estar aqui no campo e tenho o prazer acrescido de ver a minha família toda empenhada nos negócios da família...” - Fernando Carpinteiro Albino
A Carnalentejana é um projeto contra essa erosão? “Entendo que o interior do país é tão bom, é tão rico, é tão importante, ou mais importante que as periferias e as grandes cidades. Entendo que a Carnalentejana tem sido essencial no combate à erosão e à travagem do êxodo do campo. O que é um facto é que passamos de 33 para 140 criadores, todos eles tem pessoas a trabalhar nas suas explorações e é sem
dúvida uma forma de combater a erosão demográfica. Tenho a consciência tranquila que tenho feito aquilo que serve o pais em toda a sua plenitude. E como tal, vivo no interior, vivo no campo, não obstante de ter um escritório de advogados em Lisboa, é o meu modo-vivendi...” Não pode passar sem isto? Não posso, não posso. Tenho 72 anos, já fiz outras coisas, gosto, dá-me prazer estar aqui no campo e tenho o prazer acrescido de ver a minha família toda empenhada nos negócios da família. Tenho três filhos, um deles, o Bernardo, é licenciado em Direito, trabalha comigo no escritório de advocacia. Nas horas vagas, que não são muitas - tem quatro filhos - tirou Viticultura, no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa e é o responsável pelas nossas vinhas. Tenho outro, o Gonçalo, que é veterinário, integra a equipa que tem a cargo a responsabilidade sanitária e veterinária da exploração bovina constituída, exclusivamente, por bovinos da raça alentejana em linha pura. Além disso, é responsável pelo setor comercial da Carnalentejana.
E tenho o mais novo, o Diogo, que tirou Marketing. É responsável do marketing da organização e é o único responsável pela distribuição dos nosso vinhos que temos vindo a fazer desde 2004. 28 | CARNE
» REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE
// COM OU SEM CHIFRES Fernando Carpinteiro Albino é um incorrigível defensor das raças autóctones. Durante a nossa visita à Exploração da Torre do Frade a certo momento a conversa convergiu, até com algum sentido de humor, para um tema muito curioso: vacas, com ou sem cornos. “Não concordo com as vacas sem cornos. Admito que possa existir, os criadores são livres de fazer aquilo que entenderem com respeito a serrarem ou não os cornos da vaca. Nós deixamos os cornos porque fazem parte das características da nossa raça autóctone, faz parte de nomenclatura da raça alentejana. Queremos ter raças autóctones ou não? Eu entendo que é puramente obrigatório termos as vacas na sua plenitude e os cornos fazem parte essencial da vaca, para além de que, e admito que seja altamente discutível se é melhor ter as vacas com cornos ou 30 | CARNE
descornadas. Mas, enfim, isto daria uma grande discussão. Por exemplo, meto uma vaca na manga para fazer um tratamento sanitário e, se calhar, vejo-me mais aflito lidar com o animal sem cornos, são mais
difíceis de manusear. Sem cornos tem que se meter a corda no pescoço e elas metem a cabeça debaixo das outras. E depois há a questão estética, o animal fica muito mais bonito com os cornos, não concorda?”
REPORTAGEM À EXPLORAÇÃO TORRE DO FRADE «
Bibliografia: Rede AniDOP
// ALIMENTAÇÃO NO REGIME DE INVERNO Na Herdade da Torre do Frade, as azinheiras e os sobreiros são limpos frequentemente de acordo com as normas, numa operação indispensável para a saúde do arvoredo.
“Ao mesmo tempo que estamos a rejuvenescer um arvoredo bom e são, as vacas aproveitam, comem a ramagem e só lá ficam os troncos. É uma ração “gourmet”, excelente e muito barata. Os animais devoram. Na minha casa a lenha
não é a receita, a receita é a rama. Aqui, muita gente a troco de limpar as árvores e levar a lenha, deixam a rama para os animais comerem e fazem a chapota, ou seja, queimam os restos que ficam.”
A propriedade Torre do Frade tem 2 núcleos de 300 vacas cada um, instalados em mais de 3000 hectares, em que a vaca é parte importante de utilização de mão dada com os cereais: trigos moles, trigos duros, milhos e girassóis além de uma outra vertente muito importante da exploração que é a das uvas e do vinho.
Tudo isto, em plena simbiose de interesses e tudo sem excepção em produção integrada há décadas, desde que há produção integrada da qual Fernando Carpinteiro Albino e família se declaram acérrimos defensores.
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» CARNALENTEJANA RESTAURANTES
Carnalentejana, no prato. Apesar da longa costa atlântica de Portugal e da abundância de excelente peixe e marisco, a carne é um ingrediente essencial da gastronomia portuguesa. Apesar da grande qualidade do seu peixe, os portugueses gostam muito de carne. O tipo de alimentação característico das pastagens alentejanas confere aos pratos de carne CARNALENTEJA, D.O.P., uma qualidade e sabor genuínos. Uma experiência sensitiva e emocional muito agradável. CARNALENTEJANA dispõe, em Lisboa, de três espaços muito interessantes, onde pode apreciar os atributos mais relevantes da qualidade da carne produzida pelos produtores associados à Carnalentejana: restaurante Carnalentejana sito no edifício Praça de Touros do Campo Pequeno (loja 601); no restaurante Vicente by Carnalentejana, na rua das Flores nº6, perto do Cais do Sodré e na hamburgueria no Mercado de Campo de Ourique.
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// RESTAURANTE CARNALENTEJANA CAMPO PEQUENO O espaço é muito interessante e o ambiente tem uma envolvência “clean rustic” muito acolhedora com paredes em betão e detalhes interessantes como mobiliário em madeira e ainda pequenos toques coquetes com candelabros com pendentes em “cristal” vidro e espelhos tipo barroco a predominaram numa decoração “no ponto” que se distingue pelo esplendor exuberante. Os motivos de madeira e as acrobacias da luz fazem o resto. O restaurante Carnalentejana Campo Pequeno, apesar das limitações arquitectónicas de um edifício construído em 1831, com galerias sobrepostas, consegue proporcionar espaços para refeições intimistas tête-à-tête e, ao mesmo tempo, oferece espaços generosos para refeições familiares ou grupos de amigos e festas de aniversário. No prato, as carnes de linha pura da raça alentejana são as estrelas da companhia. Entre as especialidades destacamos: o bife do
CARNALENTEJANA RESTAURANTES «
O tipo de alimentação característico das pastagens alentejanas confere aos pratos de carne CARNALENTEJA, D.O.P., uma qualidade e sabor genuínos. Uma experiência sensitiva e emocional muito agradável.
acém redondo (o chamado bife à cortador), o bife tártaralentejana, o hambúrguer de rabo de boi, as bochechas de novilho, os bifes do lombo e da vazia, saladas com rosbife e as incontornáveis espetadas. No couvert e nas entradas destaque para o carpaccio de novilho, o escabeche de rabo de boi ou os pimentos padrón. Preço médio da carta: 25€
// RESTAURANTE VICENTE BY CARNALENTEJANA Antes de passarmos ao restaurante propriamente dito, debrucemo-nos sobre o seu nome: Vicente. Os mais antigos, sobretudo, os nascidos na capital sabem que Jacó era nome de papagaio e Vicente nome de corvo. Normalmente, os bichanos estavam presos por uma corrente à pata, num poleiro, colocado estrategicamente à porta das tabernas que na sua grande maioria eram exploradas por Galegos. Os clientes, de copo-de-três na mão, descarregavam as suas frustrações ou ensinavam-lhes os mais diversos palavrões que os bichos reproduziam para gáudio da clientela e motivo para beber mais um copo. Ora, no número 6 da Rua da Flores, onde agora é o restaurante funcionou uma das últimas e castiças tabernas com carvoaria da cidade de Lisboa, que obviamente, era de uma galego e tinha um corvo chamado Vicente. O restaurante mantém o interior abobadado em alvenaria e serve refeições á média luz. CARNE | 33
» CARNALENTEJANA RESTAURANTES
Os pratos principais, como não podia deixar de ser, são de Carnalentejana e oferece uma grande variedade de entradas, inclusive pratos vegetarianos e ainda a opção de hambúrgueres ou pregos. A excelência da carne, os petiscos variados, as sobremesas e os vinhos, numa oferta que realça os produtos nacionais e, em particular, os alentejanos, combinam com o espaço sofisticado mas descontraído de ambiente urbano e eclético. Preço médio da carta: 25€
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// HAMBURGUERIA CARNALENTEJANA NO MERCADO DE CAMPO DE OURIQUE A carne é 100 por cento de bovino de origem alentejana. Todas as opções vêm com um hambúrguer de 120 gramas de Carnalentejana D.O.P. 8Denominação de Origem Protegida), num ambiente descontraído.
»TALHOS ERNESTO
Mais que um talho, uma família. Estima-se que 80% das empresas mundiais assentam em estruturas familiares. No contexto social e económico, a importância deste tipo de empresas é primordial e alguns especialistas económicos de renome internacional defendem que o mundo seria uma catástrofe sem elas. Devotam mais horas não renumeradas ao serviço, fazem mais sacrifícios mas partilham de um objetivo comum em prol da total transparência, da concentração económica, na preservação da identidade da empresa e na definição de estratégias de sucessão para as gerações seguintes.
um iguaria conhecida de norte a sul e dispensa apresentações, assado inteiro no forno a lenha, amarelo e fumegante, acompanha com bata frita às rodelas e salada, molho de pimenta e rodelas de laranja, assim deve ser visto na mesa, para ser saboreado no prato. Iguaria que se completa se for acompanhado por um espumante Reserva Tinto Bruto, a minha preferência, ou por um vinho selecionado, entre os muito bons Bairrada, amadurecido nas encostas do concelho, pisado e produzido pelos vinhateiros locais, com o enlevo e a sabedoria secular da experiencia.
Talhos Ernesto é um caso típico desses, de uma empresa familiar com êxito e que constitui um pilar essencial para a estabilidade do tecido empresarial, na sua região. Contudo, a sobreposição das duas instituições, Família e Empresa, confere-lhe características especificas, que a torna única. Fomos até à Mealhada saber porquê. Falar no concelho da Mealhada pode começar pela referência ao primeiro recurso gastronómico da região, o leitão assado, precisamente, como é conhecido: “à moda da Mealhada”. É
Podíamos falar das Termas do Luso em plena encosta da Serra ou na Mata Nacional do Buçaco. Património histórico religioso e militar, a Mata nacional é, sobretudo, um património botânico de incalculável valor e, talvez, a mais importante referência turística do concelho. Mas, não. Vamos falar da organização Talhos Ernesto que há 30 anos serve a região com carne e enchidos tradicionais de produção própria, com uma visão de futuro mas também com uma postura de missão.
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// Vista parcial do Talho Novo ou Talho da Estação, como é conhecido.
A história de uma vida não se resume em três ou quatro páginas de uma revista. A história de Ernesto Novo não foge à regra. Uma revista seria pouco para transcrever a sua história de vida. Nasceu, há 62 anos, na freguesia de Calde, na margem direita do rio Vouga, na encosta da Serra da Arada, no concelho de Viseu. Desde menino que se habituou a olhar para o gado bovino por inerência de seu pai que era negociante de gado, na região. Desde muito novo apanhou-lhe o jeito, aprendeu a “ler” a conformação de um bovino e a separar o trigo do joio. Acompanhava o pai nos negócios de gado e concluiu a 4ª classe. Tornou-se um conhecedor de tenra idade. Para ele, a produção de bovinos não tem segredos. Pouco depois de concluir a instrução primária, foi trabalhar para um talho na Mealhada, propriedade de um cliente de seu pai. A entrega, esmero e profissionalismo com que Ernesto se entregava à profissão valeu-lhe a ascensão a sócio no talho. Mais tarde, viria a comprar a quota do sócio e a estabelecer-se definitivamente como proprietário, conjuntamente com a esposa, Cidália Novo, do talho situado na Avenida 25 de abril, no centro da Mealhada. Quase 30 anos depois, a nossa equipa de reportagem visitou o talho-génese da epopeia empresarial de Ernesto Novo. Um espaço renovado pelo designers da CNI (Carlos Nunes & Irmãos), onde predomina o branco, o preto e o vermelho numa simbiose perfeita com as prateleiras em madeira. Como uma tela em branco, o ponto de partida foi espalhar o vermelho em vários pontos do estabelecimento, inclusive numa das paredes, para que a vitrina não ficasse perdida e sem sentido no contexto. Diz-se que o branco e o preto não são cores mas nós vemo-las como tal. São opostas. O branco é luz e a soma de todas as cores. O preto é a ausência de luz. Assim, e partindo do principio, cá para nós, que são cores, o preto e branco, foram doseadas e dispostas pelo espaço criando uma base homogénea, composta pela madeira, pelo branco e com toques de
»TALHOS ERNESTO
Talhos Ernesto é um caso típico desses, de uma “empresa familiar com êxito e que constitui um pilar essencial para a estabilidade do tecido empresarial, na sua região.
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preto, na quantidade certa para não pesar com o vermelho que tem uma tonalidade viva, tipo vermelho Ferrari, fazendo sobressair os detalhes em madeira clara, que equilibra o ambiente transmitindo uma sensação de conforto ao cliente. A parede que está do lado do operador, o chamado painel do talho está revestido com azulejos pretos e vermelhos numa simetria ilógica ou numa assimetria pouco lógica, quase artística, onde sobressai naturalmente o logo e a assinatura do estabelecimento assumindo um função estrutural. A decoração de um ambiente afeta o humor e as nossas sensações de maneira consciente e inconsciente. Podemo-nos sentir de uma ou de outra forma dependendo do espaço onde estamos, e esse sentimento irá determinar parte das nossas ações. Por isso planejar bem um ambiente comercial, é importante, tendo em conta os seguintes pontos: Materiais Os diferentes materiais possuem características distintas quanto à textura, aspecto e à temperatura, podendo então deixar os espaços mais frios ou mais aconchegantes, mais imponentes ou acolhedores. 40 | CARNE
Cores Além de combinarem entre si ou não, podendo criar uma composição agradável ou então poluir o visual a ponto de fazer com que as pessoas se sintam mal no ambiente, cada cor tem também diferentes impactos psicológicos sobre nós, remetendo o nosso subconsciente para pensamentos e estados de espírito variados como a alegria, tranquilidade, agitação, entre outros. Organização No Talho Ernesto, o ambiente organizado deixa a energia dos ambientes mais fluida, pois o excesso de informações confunde e pesa visualmente, impedindo que o cliente perceba os espaços como um todo e se sinta mais tranquilo. O excesso de informação deixa a mente agitada, com muitos pensamentos. E para gerir e manter a organização, foram tomados cuidados na hora de projetar e de utilização criando um ambiente minimalista onde o que mais sobressai são os produtos para venda. “Este talho trabalha muito bem. E a partir do momento em que fizemos obras ainda trabalha melhor. Parece que não, mas era uma
»TALHOS ERNESTO
// Sala de desmancha do Talho da Estação.
casa com quase trinta anos e já era merecida esta remodelação. Comparando com outros talhos que a gente vê em Coimbra ou em Aveiro, se calhar, ainda estava melhor, mas em termos das nossas necessidades face aos nossos clientes já estava um pouco aquém. Nós temos ali um talho (Talho Novo, também conhecido pelo Talho da Estação) feito há oito anos, imponente, e as pessoas chegavam aqui e até parecia que a carne era outra. Esta remodelação foi uma mais-valia para realçar a qualidade dos nossos produtos” – Humberto Rodrigues, responsável pelo estabelecimento e genro de Ernesto Novo. José Novo, o filho mais novo de Ernesto Novo, seguiu as peugadas do pai. Formado em ciências da comunicação no Instituto Superior Miguel Torga, em Coimbra, desde muito cedo que a sua dedicação aos negócios da família se revelaram evidentes. “ Nas férias e ao sábados, ajudava os meus pais de forma voluntária. Sempre tive consciência que devia ajudar os meus pais. Sempre tive muito
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// Enchidos tradicionais de fumeiro. Uma iguaria peculiar dos Talhos Ernesto.
orgulho no nome da minha família.” Refere José Novo que desde miúdo aprendeu a desmanchar e a cortar, peça-a-peça e a fatiar bifes. Hoje, com 31 anos, é um elemento essencial da estratégia de desenvolvimento dos Talhos Ernesto. Com a simpatia que o caracteriza, aplica todos os seus conhecimentos quer no atendimento ao público, quer no apoio administrativo e promocional da empresa. “A forma como a informação chega ao consumidor é muito importante. A qualidade da nossa carne e dos produtos de fabrico próprio são o Ex-Libris dos Talhos Ernesto mas, é importante comunica-lo da forma correta aos consumidores. Assim como achamos importante a renovação das lojas, de forma apelativa, moderna e elegante, onde o consumidor se sente bem, com um atendimento personalizado, simpático e profissional, também a comunicação é muito importante. O cliente gosta de estar informado e de fazer do seu ato de compra um momento agradável e criativo”, concluiu José
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... A forma como a informação “chega ao consumidor é muito importante. A qualidade da nossa carne e dos produtos de fabrico próprio são o Ex-Libris dos Talhos Ernesto...
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// Hernesto Novo, uma vida dedicada ao setor das carnes.
Novo, que é coadjuvado por Daniela Gomes, a sua mulher, formada em Turismo, que também participa em todas as actividades da loja. A curto prazo, Ernesto Novo, vai realizar um sonho antigo e vai poder contar com a colaboração da sua filha mais velha, Maria de Lurdes Novo, formada em gestão e especialista em recursos humanos, congregando assim toda a família, no seu negocio e preparando a sucessão com toda a tranquilidade e solidez. A funcionalidade do espaço, ou seja, as medidas adequadas de circulação, de ergonomia e de mobilidade quer para os operadores quer para clientes foi devidamente consagrada. O talho é apoiado por uma pequena sala de desmancha e duas câmara frigorificas. Os equipamento revelam os critérios de escolha: vitrina Jordão, balanças Ipesa, vitrina de congelados Fricon. A pouco mais de 500 metros dali, na Av. Dr. Manuel Lousada situa-se o Talho Novo ou Talho da Estação, como é conhecido. Foi idealizado de raiz pela CNI, há cerca de oito anos. É um estabelecimento multiproduto, moderno, amplo, muito agradável, apoiado por uma sala de desmancha e quatro câmara frigorificas. Congelados, produtos avícolas, carne por grosso (carcaças) e carne desmanchada. Além destes dois estabelecimento, a organização Talhos Ernesto, tem um talho no mercado aberto ao sábado (Praça da Mealhada), um na Cúria, outro em Carqueijo, a norte de Coimbra, onde também fica situada a salsicharia própria de produtos tradicionais de fumeiro e uma exploração agropecuária, com cerca de 40 cabeças de gado. Talhos Ernesto fornece as mais importantes unidades de hotelaria e restauração da região assim como fundações, colégios, estruturas
// José Novo, filho de Cidália e Ernesto Novo.
// “Só vendo carne nacional, crio e compro animais vivos nascidos e engordados em Portugal, e não há um único animal que vá para abate que não seja visto por mim.” – Ernesto Novo
sociais e escolas. Grande parte das entregas são embaladas a vácuo. A experiencia de Ernesto Novo, que também passou por lugares de chefia na Manutenção Militar quando do cumprimento do seus serviço militar, é aplicada na gestão da sua organização familiar, por delegar responsabilidades e desafios aos seus familiares e colaboradores. Com cerca de dezena e meia de colaboradores diretos, vende em média 7 a 8 bovinos e 30 a 35 porcos, por semana, acompanha o dia-a-dia das suas lojas e encarrega-se diretamente da produção e compra de bovinos, sobretudo, na região do Alentejo. Região que faz parte dos sonhos legítimos deste viseense “ Gostava de comprar uma herdade no Alentejo e ter produção de gado bovino em extensivo, é um sonho”, confessa.
// Daniela Gomes, a nora do casal fundador.
// Humberto Rodrigues, genro de Ernesto Novo.
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// PRODUÇÃO DE BOVINOS Ernesto Novo orgulha-se da sua produção de gado bovino e da qualidade da carne que vende aos seus balcões. “ Só vendo carne nacional, crio e compro animais vivos nascidos e engordados em Portugal, e não há um único animal que vá para abate que não seja visto por mim”, começa por referir o nosso interlocutor. “Prefiro novilhos, cruzados, com cerca de 13 a 14 meses que dão uma carcaça com cerca de 350 quilos. Primo pela qualidade e mantenho-a homogénea e constante. É o segredo deste negócio: a qualidade. Orgulho-me de ter os mesmos fornecedores, quer no Alentejo, quer aqui na região, há mais de 30 anos, como é o caso de um senhor aqui da Tocha. O mesmo acontece com os porcos, compro-os diretamente ao lavradores (suinicultores) e utilizo os serviços do Matadouro da Beira Litoral S.A..”
... Prefiro novilhos, cruzados, com cerca de 13 a 14 meses que dão uma carcaça com cerca de 350 quilos. Primo pela qualidade e mantenho-a homogénea e constante...
// “FUMEIRO DA CIDÁLIA” Cidália, a sua mulher, ocupa-se da salsicharia onde os produtos tradicionais ganham forma de iguaria ao ritmo do fumeiro controlado, pela experiencia e saber, na arte do fumeiro, da “matriarca” da família. “Fumeiro da Cidália” (talvez seja uma ótima sugestão para uma marca), pela sua natureza e indiscutível excelência desenvolvida ao longo dos tempos detém um importante relevo no panorama do desenvolvimento agrário, gastronómico e cultural da região. Preparado e curado em condições naturais, pelas suas excepcionais qualidades organolépticas de aspeto, cor, textura, aroma e paladar, tem pergaminhos firmados na região. Antigamente, o homem do campo via na matança do porco a garantia do seu sustento para o ano inteiro. Eram necessárias muitas economias para que se pudesse adquirir o leitão para engorda, destinado ao abate. A carne conservada na salgadeira e os enchidos de fumeiro eram a subsistência das famílias rurais. Foi esta excelente tradição, que a salsicharia de Cidália e Ernesto transportaram para os dias de hoje. Embora não constituam nenhuma originalidade, na medida em que estes já são produzidos há muito séculos, a peculiaridade dos temperos e a mão da Cidália para o fumeiro faz destes enchidos, nomeadamente, o negrito, um chouriço fino onde se identifica um trago suave a cominhos, uma delicia, o chouriço tradicional enriquecido com um pouco de vinho
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tinto, a farinheira suculenta com carácter forte, a morcela divinal e a salsicha, ao alcance de todos e apreciado por conhecedores e consumidores e por todos os que realmente apreciam a qualidade e a diferença. Antes, estas especialidades, eram confecionados de forma rudimentar e consumido num circulo muito restrito de familiares e amigos, hoje, estão no circulo da nossa sociedade de consumo, passiveis de serem adquiridos por qualquer apreciador.
As boas características organolépticas dos enchidos de fumeiro da salsicharia de Talhos Ernesto, ainda se mantêm ligadas ao fabrico artesanal e à influencia da família rural. São raízes às quais não nos podemos deixar de aliar porque são a base dos nossos produtos e são o elo de ligação entre um passado pleno de história e um futuro alimentar que se quer saudável e natural.
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»TALHOS ERNESTO
na pastorícia e o animal mais resistente seria a cabra que se defendia mantendose em zonas altas e áridas. Durante a batalha do Buçaco, o medo de usar a água de qualquer nascente e a quantidade de cabras velhas aliadas à quantidade de vinho armazenado teria levado à criação deste prato que poderia ser escondido nas caves por tempo prolongado.
// DE CHANFANA A NEGALHOS. Embora o leitão assado seja, digamos, o Ex-Libris gastronómico da região da Mealhada, um dos pratos de carne que se consome mais na região, inclusive, nas rotas turísticas e gastronómicos é a Chanfana de cabra, conhecida por Chanfana à Bairrada. Conhecida por ser um prato típico das Beiras e há, pelo menos duas povoações que defendem intransigentemente ser a origem desta iguaria: Miranda do Corvo que se auto domina Capital da Chanfana e Vila Nova de Poiares que, por sua vez, se auto domina Capital Universal da Chanfana. Bairrismos à parte, onde nós nem por sombras queremos meter a colher, não podemos ignorar a lenda, ou melhor, as lendas que envolvem a presumível origem da chanfana em Miranda do Corvo, mais precisamente no convento de Semide. Até finais do século XIX, o Convento recebia dos moradores do seu couto – agricultores e rendeiros – o pagamento dos chamados foros. A maior parte das vezes esses pagamentos eram feitos com galinhas, azeite, ovelhas, cabras, vinho, entre outros. E ao que parece seria feito , mais ou menos, pelo mês de agosto até finais de setembro o que ocasionava uma entrada excessiva de animais num curto período de tempo. As freiras teriam resolvido então cozinhar a carne de cabra que seria a mais comum , mergulhadas em vinho (que também recebiam em grandes quantidades), nos fornos a lenha. As carnes cozidas assim ficavam cobertas por um molho espesso e gorduroso que solidificava e mantinha-as em condições de comer por muitos meses. Outra lenda refere que durante as invasões francesas, alguém se teria lembrado de envenenar as fontes (não se sabe se o portugueses para matar os franceses ou vice-versa). Na impossibilidade de usar a água das fontes, ter-se-ia inventado cozinhar com vinho. O facto das águas estarem impróprias para consumo teria dado origem a uma enorme mortandade 46 | CARNE
Os negalhos, por sua vez, é outro prato típico derivado da chanfana. É o bucho da cabra recheado com carne, tripas da cabra; vinho tinto; cabeças de alho inteiras, hortelã; sal; colorau; louro; piripiri e água, que segundo apuramos também tem origem na época da terceira invasão francesa. Estando a rarear a carne porque os franceses roubavam os rebanhos, a população teve que fazer um aproveitamento engenhoso de todos os produtos disponíveis, inclusivamente das tripas dos animais cuja carne utilizava habitualmente na sua alimentação. Experimentaram, então, cozinhar as tripas segundo a receita da chanfana, com sucesso. Esta dissertação sobre a chanfana de cabra e os negalhos vem a lume porque durante a nossa reportagem, quer no talho da avenida 25 de abril, quer no talho da Estação , foram muitos os cliente que encomendavam carne de cabra velha para fazer chanfana, o que despertou a nossa curiosidade jornalística.
SAÚDE E CONSUMO «
Quando comer saudável se torna perigoso Texto: Glória Oliveira
O excesso de preocupações alimentares podem levar à ortorexia, um novo tipo de desordem alimentar que tem vindo a emergir, em que as pessoas ficam com a obsessão com a comida de forma a melhorar a sua saúde. Este comportamento conduzem à desnutrição e isolamento social. De acordo com a Associação Suiça de Alimentação, esta nova onde de obsessão nutricional conhecida por “Ortorexia” ou “Ortorexia Nervosa”, nome com origem no grego “orthos” que significa direito e correto e “orexis” que significa apetite, ganha no mundo moderno proporções preocupantes.
Net a devorar informação sobre nutrição e a conspirar contra o consumo carne, já não é um excêntrico, nem um defensor de uma alimentação saudável: está doente. Realmente, são cada vez mais as pessoas que se preocupam com a sua alimentação de forma obsessiva. Preocupam-se de tal forma com a alimentação, peso, saúde,
Aquela amiga ou amigo que nunca quer sair para jantar fora e crítica todos os alimentos - até mesmo a fruta e os vegetais! – de veneno, passa horas a ler os rótulos no supermercado e os fins-de-semana na CARNE | 51
» SAÚDE E CONSUMO estética, os ortoréxicos desenvolvem as suas próprias regras alimentares, cada vez mais especificas. Vão para onde for, em trabalho ou em lazer, gastam cada vez mais tempo a resolver como cumprir o auto-plano dietético obrigando-se a planear as suas refeições com dias de antecedência. Inclusive, tendem a ter consigo um “Kit de sobrevivência” da sua própria alimentação para quando saem e que não podem comer os alimentos disponíveis por medo das gorduras, das substâncias químicas ou por qualquer outro ingrediente que tenham fobia. Cumprir um regime destes é prova, irrefutável, de uma grande força de vontade, motivada pela obsessão por uma alimentação que se acredita ser saudável. Estudos recentes revelam uma prevalência deste tipo de obsessão em 7% da população em geral, no mundo ocidental, sendo os mais vulneráveis os desportistas, profissionais de saúde, figuras públicas e artistas. “Quem passa muito tempo a comer bolachas de quinoa ou de tofu às tantas considera-se um santo como se tivesse dedicado toda a sua vida ajudar crianças famintas em África”, referiu Steve Bratman, o médico, que foi o primeiro investigador a descrever a ortorexia em 1997. Pelo contrário, se a ortorexia quebra os seus votos de alimentação/saúde e se não resiste à tentação, embora limitadamente, de alimentos “proibidos”, o ortoréxico sente-se e corrompido, o que leva a auto flagelar-se com regras dietéticas ainda mais duras, restritas ou mesmo de abstinência. O seu comportamento alimentar é semelhante aos que sofrem de anorexia ou bulimia nervosa, com a diferença que os anoréticos e bulímicos estão preocupados com a quantidade de alimentos consumidos, os ortoréxicos estão mais preocupados com a qualidade dos alimentos. O distúrbio acontece quando comer corretamente deixa de ser uma opção para passar a ser uma obsessão e se provoca uma rejeição peremptória a alimentos que embora sejam saudáveis, não são considerados como tal, com um objetivo de atingir um estado de saúde utópico, prevenir doenças ou alcançar uma imagem corporal perfeita. Resultado: a saúde acaba por ser posta em causa. Mudanças 52 | CARNE
drásticas e radicais, como por exemplo, a eliminação de todas as gorduras, leva a que certas vitaminas deixem de ser absorvidas pelo organismo. Na Europa somos constantemente bombardeados com informação, muitas vezes, com origem em lobbies poderosíssimos acerca do que é “bom” e do que é “mau” para todos, em qualquer momento. Os temores relacionados com a alimentação e os movimentos de defesa de alimentação orgânica acrescentaram ainda mais complexidades às decisões que os indivíduos têm que tomar quanto ao que devem ou não comer. Bettina Isenchmid, especialista em distúrbios alimentares no L’Hospital de I’sle em Berna, defende que esta obsessão por alimentos bons e maus é um problema e provoca uma relação cada vez mais neurótica entre os consumidores da sociedade moderna e a alimentação. A saúde é obviamente muito importante para muitos europeus, na hora das suas
Estudos recentes revelam uma prevalência deste tipo de obsessão em 7% da população em geral, no mundo ocidental, sendo os mais vulneráveis os desportistas, profissionais de saúde, figuras públicas e artistas. escolhas alimentares. Como é que se pode alcançar um equilíbrio correto de alimentação, saudável, sem cair no fosso da obsessão? “Apesar de a ortorexia não ser ainda considerada uma doença de comportamento alimentar, tal como a anorexia e bulimia nervosas, têm surgido cada vez mais estudos que a aproximam dessas doenças psiquiátricas” quem o diz é Ana Rita Lopes, coordenadora da Unidade de Nutrição Cínica do Hospital Lusíadas Lisboa. “Esta preocupação desmesurada com a alimentação leva a que os indivíduos afetados dediquem cada vez mais tempo a planear as suas refeições e menos tempo
de lazer, podendo ter um impacto negativo na sua vida social”, acrescenta. Os vários sintomas comuns a quem sofre de ortorexia: isolamento social; demora de horas nos supermercados, dado fazem uma análise exaustiva ao detalhe de todos ingredientes de cada rótulo, alguns até têm guias de ingredientes que transportam sempre consigo; recusa em participar em festas e reuniões de amigos e família e denotam uma sensação de angustia ao mesmo tempo que estão constantemente a reprovar os outros por ingerirem alimentos que consideram “maus”. “Da mesma maneira que não se engorda de um dia para o outro, também não se emagrece de o dia para a noite. Uma dieta deve ser feita de forma gradual, sem dispensar carne, para não gerar sentimentos de frustração e ansiedade que, em último caso, podem degenerar em comportamentos compulsivos. Muitas vezes quem passa por longos períodos de privação, ao ceder acaba por cometer enormes excessos alimentares, não só recuperando o peso perdido como, inclusivamente, acumulando mais algum. São as chamadas dietas ioiô. Os estudos mais atuais sugerem que a ortorexia pode ser tratada em equipa, pois para além do apoio de um dietista ou nutricionista para que o individuo possa aprender a comer bem, sem se tornar escravo de uma alimentação saudável, é fundamental procurar apoio psicológico nomeadamente a terapia comportamental cognitiva. A saúde não se mede através da balança, mas sim através do estilo de vida. Comer é também um prazer que dever ser partilhado, como também é defendido pela Dieta Mediterrânica, Património da Humanidade e que ao cabo de mais de 20 anos a revista Carne tem defendido intransigentemente, em prol de um dieta saudável, que inclui carne Tal como em muitos outros aspetos da dieta. A chave é a moderação. Uma alteração nas escolhas alimentares deve ser gradual e de uma forma que motive, tendo em conta os gostos e o estilo de vida do individuo. Comer saudavelmente tem efeitos positivos na saúde, não há margem para dúvidas, exceto deixar de desfrutar da vida ou afetar o relacionamento com os mais próximos.
» MATURAÇÃO DE CARNE
Carne maturada a seco. Já ouviu falar em dry aged meat? Nos Estados Unidos, Austrália, Argentina, e alguns dos melhores restaurantes de Paris e Londres, é o processo preferido dos Chefes. A carne maturada “dry aged” ou, se preferir, envelhecida a seco, é a menina-bonita na mesa dos melhores restaurantes, Chefs e gourmets. Conhecemos carne maturada embalada a vácuo, o que muito particularmente me deixa muitas dúvidas quanto à eficácia do processo, vendidas por algumas empresas, embora não seja muito usual em Portugal este tipo de fornecimento. A maturação da carne não é nada mais que um processo enzimático natural de tenrura em condições de temperatura controlada, que se inicia após o abate e cujo tempo de maturação pode variar conforme o corte e o resultado pretendido. O objetivo da maturação é melhorar o sabor, a suculência e, sobretudo, a tenrura da carne. Os operários deste processo todo são os enzimas endógenos – calpaínas e as catepsinas – presentes na própria carne do animal. 54 | CARNE
O comércio retalhista e, sobretudo, os restaurantes mais exigentes, exigem dos seus fornecedores, carne com características qualitativas , sendo a tenrura uma das características organolépticas mais apreciadas pelo consumidor. Sugere-se que há vários fatores e mecanismos de natureza muito variada que atuam na maciez da carne, entre eles: fatores físicos-químicos, enzimas sem atividade peptidásica e peptidases. Embora o mecanismo exato seja pouco esclarecido, é aceite pela comunidade científica que a hidrólise de proteínas miofibriliares por proteínas endógenas é o principal mecanismo responsável pela aumento da maciez post-mortem.
MATURAÇÃO DE CARNE «
Durante o período post-mortem, o processo de tenrura da carne depende da espécie animal, do tipo de massa muscular, de várias tecnologias aplicadas nos músculos post-mortem, entre outros aspetos. O amaciamento ocorre devido à alteração de componentes estruturais do músculo, devido à atuação de enzimas durante e após o rigor mortis. As enzimas calpaína e calpastatina são conhecidas como as grandes responsáveis pelo mecanismo de amaciamento da carne, sendo dependentes de íons cálcio para a sua ativação. Existem duas formas de calpaínas, denominadas, microcalpaína e milicalpaína, que são as responsáveis pela proteólise muscular. A enzima calpastatina regula o processo de amaciamento da carne, pois atua de forma a inibir a atividade da calpaína. O amaciamento da carne é um processo que merece muita atenção, pois hoje faz parte das exigências mais pertinentes do consumidor de carne. Vamos aos processos... O dry aged é a maturação a seco, que cria as condições propícias para que os enzimas atuem sobre o colagénio da carne, mesmo
em ambientes caseiros. Para que isso aconteça, as peças de carne envelhecem em ambiente de temperatura e humidade cuidadosamente controladas (ambiente refrigerado), de 0º a -2ºC, por período indeterminado, deixando a carne muito mais macia e com sabor concentrado, muito interessante, sobretudo, para saborear a consistência, a suculência e a textura das chamadas raças exóticas e autóctones, de linha pura. Neste processo há uma diminuição do peso, quer causado pela perca de humidade, quer pela limpeza antes da preparação. Chefs de renome internacional norte-americanos, argentinos, franceses, ingleses, entre outros, costumam envolver as peças em tecido de algodão, pois este permite que a carne respire e perca água durante o processo de maturação e mantêm a gordura. A câmara de refrigeração, deve ser exclusiva para este processo, pois o cheiro da carne pode ser incomoda fixando-se noutros alimentos. Existem restaurantes em Londres, por exemplo, que têm câmara de refrigeração, exclusivas para maturação de carne, revestidas com placas de sal dos Himalaias. Deve-se abrir e fechar
só quando necessário para prevenir contaminações com bactérias. No mínimo as peças de carne permanecem entre 15 a 30 dias na maturação. Mas alguns restaurantes norte-americanos chegam a deixar até 60 dias para obterem sabores mais intensos.
// PREPARAÇÃO Deve-se remover a camada externa: a carne desidratada tem uma cor mais escura e o seu exterior é resistente, criando uma espécie de crosta. Deve-se remover a camada externa e o mofo. A carne interna é macia e de cor bordeaux. Ao fatiar a carne apercebe-se de imediato a ação da maturação. Quer pelo controlo de temperatura, humidade e ventilação, os sabores estarão concentrados e a carne extremamente macia. É verdade que toda a carne que se consome é maturada. É um fenómeno natural post-mortem – caso contrário seria impossível mastiga-la. O chamado dry-aged ganha espaço, por exemplo nas
grandes Steakhouses do mundo mas também levanta a questão e a discussão em torno do qual é o melhor método de maturação, o húmido ou a seco? Estragada, não. Melhorada. Pela aparência, é difícil imaginar que essa capa de mal aspeto esconde uma carne macia, de sabor intenso. Nos Estados Unidos, já faz alguns anos que o dry-aged virou moda. Stekhouses, e restaurante, de leste a oeste do país, exibem no menu a idade avançada dos cortes que servem. Em Portugal, o processo é residual com alguns, muito poucos, Chefs a testarem a maturação a seco na própria cozinha. É um nicho de mercado a explorar, diz o Chefe Kiko Martins que serve e vende carne maturada no seu talho restaurante. Alguns fornecedores de restauração e hotelaria estudam a forma de dar escala ao processo, que envolve cuidados especiais. A questão é que o preço de um bife ou uma costeleta de novilho maturada, entre 20 a 30 dias, não pode ter o mesmo preço que um bife, digamos, normal, ou seja, com a maturação normal, que são aqueles três, quatro dias entre o abate e a venda ao público. CARNE | 55
» MATURAÇÃO DE CARNE
Toda a carne matura naturalmente após o abate – é o que a torna possível mastiga-la, já que nas primeiras 24 horas, o estágio de rigor mortis deixa as fibras tensas.
// DISCUSSÃO SOBRE CARNE MATURADA Toda a carne matura naturalmente após o abate – é o que a torna possível mastiga-la, já que nas primeiras 24 horas, o estágio de rigor mortis deixa as fibras tensas. O que a industria percebeu, há algumas décadas, é que essa maturação natural poderia ser conduzida e controlada, basicamente de duas maneiras: seca e húmida. Na maturação a seco, a carne é posta em ambiente e temperatura controlados. Na maturação húmida, a carne é embalada a vácuo pouco de pois do abate. Sem contacto com o ar, retém os líquidos, gera menos perdas, sabor mais ácido, sanguíneo e carne com mais suco. Praticamente, muita da carne vendida em Portugal passa pela chamada wet-age. Faz algum tempo, que a industria ligada a universidades, restauração, Chefs de cozinha e pesquisadores tentam perceber de forma definitiva se existe diferença relevantes entre a maturação a seco ou a húmido. “Não gosto do sabor da carne maturada a vácuo. Nem da textura, parece que vai esfarelar”. O dry-aged mantém a firmeza e a carne fica menos ácida”, disse Ferran Adrià, o Chef espanhol que se tornou um expoente máximo da gastronomia molecular. Ferran matura as suas carnes a seco, mas não faz alarde disso: “Como carne maturada a seco, tem menos liquido e no momento de grelhar, facilita a reação Maillard, que dá aquele aspeto bonito à carne.”
Reação Maillard: é uma reação química entre um aminoácido ou proteína e um carboidratos redutor, obtendo-se produtos que dão sabor, “perfume” (leia-se: aroma) e cor aos alimentos. Aquele aspeto dourado dos assados resulta desta reação Maillard. Outra inspiração sobre carnes maturadas é Magnus Nilson, que no celebérrimo restaurante Faviken, na Suécia, trabalha à muito tempo com carnes maturadas a seco. O Chef sueco serve pratos de carne de borrego com 5 meses de maturação. Outro dos grandes entusiastas da carne maturada a seco é Jefferson Rueda, argentino, ex-talhante que dirige um restaurante italiano em S. Paulo: “Quando provei nos Estados unidos fiquei completamente fora de mim. É muito bom. Só que a carne tem que ter qualidade.” No entanto no seu restaurante, confessa, que não espaço para o fazer e teme a confusão legal sobre o conceito. 56 | CARNE
» MATURAÇÃO DE CARNE
Nem todos veem com bons olhos as carnes maturadas a seco. Em Nova Iorque, Paris ou Londres o consumidor olha para aquela carne maturada e baba-se. Em Portugal, a maioria, prefere carne vermelha e suculenta.
nem comunitária sobre este assunto. Nós não trabalhamos com carnes maturadas a seco porque não há procura no mercado e seria, obviamente, muito mais cara, no entanto, se eu tiver uma câmara só para carne maturada a seco, devidamente identificada como câmara para carne maturada a seco, demonstrando que os binómios tempo/temperatura que estou a utilizar são os corretos para que o produto não constitua perigo para a saúde pública, penso que não terei qualquer problema, no entanto, repito, não trabalho com carnes maturadas a seco”, conclui.
Por sua vez, Manolo Gonzalez, Sócio-gerente de Carnes Portal, empresa especializada no fornecimento de carnes e cortes para a industria hoteleira, sublinhou: Não há legislação nacional
A própria ASAE é ambígua sobre este assunto “Não há legislação e em termos de rotulagem a denominação de venda deve referir o que é o produto bem como o estado físico em que se encontra, que no fundo
“É uma área nebulosa” refere um fornecedor de carnes nacional que preferiu manter o anonimato, fornecedor de carnes maturadas a vácuo e de carnes maturadas a seco sob encomenda. “A lei não que não se pode, mas também não diz que se pode. É ambígua.”
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MATURAÇÃO DE CARNE «
é o que diz a lei, ou seja, “Carne Maturada Congelada” ou “Carne Maturada Refrigerada.” Obviamente, esta premissa não se adapta à carne maturada a seco. Ninguém embala carne maturada a seco.
Carne seca: é uma forma de conservação. A carne, salgada, é empilhada e seca ao sol. É um processo milenar que nada tem a ver com a maturação a seco em câmara frigorifica ventilada.
De facto, a exposição da carne permite a proliferação microbiana, porém a temperatura - entre os 0º e -2º - previne a contaminação. A própria “crosta” que se forma impede a entrada de bactérias nocivas.
Maior parte dos fornecedores de carnes em Portugal, não acredita que o este conceito de maturação vingue no nosso país. “As pessoas não vão querer paga mais pela maturação a seco e o custo é bastante alto” referiu um conhecido importador de carne congelada. “Pode ter muito interesse mas é preciso equalizar a procura com o preço da oferta. Em alguns países, com maior poder de compra já é mais fácil, aqui em Portugal não sei se será viável, se o consumidor vai querer pagar mais 30 ou 40% a mais pela carne maturada a seco.”, conclui.
A carne maturada a seco perde volume. É incorreto maturar, por exemplo, uma costeleta, o mais correto é maturar um vão de costeletas, porque perde volume e perde líquidos. Além disso, é necessário descartar a casca ressecada. No fundo, a parte externa acaba por funcionar como uma embalagem: protege a carne de bactérias indesejadas. Com esses dois aspetos, no processo de maturação a seca, perde-se cerca de 30% do volume original da carne. É por isso que a faz chegar ao prato muito mais cara.
// CARNE MATURADA A SECO NÃO É CARNE SECA Dry-aged: maturação a seco sob temperatura controlada (de preferência entre 0º C e -2º) em câmara ventilada. Wet-age: maturação húmida, a carne é embalada a vácuo e descansa durante três semanas em ambiente refrigerado.
// NÃO É UM PROCESSO FÁCIL Existem restaurantes que fazem ou já tentaram maturar a carne de forma meio-artesanal. Outros, poderão ensaiar fazê-lo em casa. Afinal de contas, a oferta de peças de carne maturada é muito escassa. Mas, atenção, é uma aventura e aconselho vivamente a deixar esta matéria para os especialistas. Maturar a carne a seco com segurança exige um controlo de temperatura que os frigoríficos domésticos não têm. O risco é ter carne poder em vez de carne maturada.
// A MATURAÇÃO É A QUEBRA DAS PROTEÍNAS POR ENZIMAS A PUTREFAÇÃO É A QUEBRA DAS PROTEÍNAS POR BACTÉRIAS Jeffrey Steingarten, escritor gastronómico, norte-americano, escreveu o Best-Seller “O Homem que comeu de tudo: feitos gastronómicos, e critico gastronómico da Vogue desde 1989, obsessivo com testes com alimentos, relatou a sua tentativa de maturar carne a seco em casa. Não foi fácil: teve que esvaziar o frigorifico, adaptar um ventilador, introduzir um medidor de humidade. A grande novidade é que graças à divulgação que Jeffrey, deu à sua experiencia, uma empresa da especialidade resolveu investir no fabrico do “The Steaklocker” um pequeno frigorifico estudados exclusivamente para maturar carne a seco. Escusado será dizer que a experiencia de Jeffrey maturar carne a seco em casa foi um desastre. A experiencia foi tão boa ou tão má, que o relato da sua experiencia está no seu livro “Deve ter sido alguma coisa que eu comi”.
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» MERCADO MUNICIPAL DE ABRANTES
“Simultaneamente edifício e rua.”
O mercado municipal de Abrantes comemorou, este ano, o seu primeiro aniversário. Localizado no coração da cidade ribatejana, em pleno centro histórico, foi edificado no espaço das antigas oficinas da Rodoviária Tejo e apresenta, em termos de construção, “uma nova linguagem contemporânea”. A arquitetura agrada aos comerciantes instalados, no entanto, têm dúvidas quanto à sua funcionalidade. Uns, queixam-se da concepção, outros, da falta de clientes. 60 | CARNE
Postas assim as coisas, fomos ao mercado de Abrantes que é assim, e o leitor que me perdoe a falta de jeito que tenho para analogias, como ir às Galerias do El Corte inglês: tem vários pisos. Tem que subir e descer. não tem escadas rolantes mas tem elevador. O edifício foi construído e liga duas ruas, de cotas substancialmente diferentes, através de escadarias e passagens pedonais. É composto por vários pisos, com uma área
coberta de 1280 m2, com elevador interno, escadaria exterior e ligação pedonal entre o Largo 1º de Maio (parque de estacionamento) e a Rua Nossa Senhora da Conceição. É um edifício de aspeto minimalista, dominado pela cor branca, de linhas retas e onde a luz é o denominador comum. À primeira vista parece que estamos perante um edifício com outras funções, diria uma casa da cultura, e rompe “abruptamente”
MERCADO MUNICIPAL DE ABRANTES «
com o estereótipo da construção daquela zona histórica.
e uma peixaria. O espaço ainda contempla vestiários e instalações sanitárias.
Num dos piso térreos, porque existem dois, encontramos o parque de estacionamento e um Welcome Center, uma loja de turismo e produtos locais. No pisos superior as bancas, cerca de 3 dezenas, para venda de frutas, legumes, secos e peixe. No quarto piso, que também é térreo para uma das ruas e onde se situa a entrada principal, apresenta uma florista, uma padaria, um café e dois talhos. No último piso, um talho
Tratou-se de um investimento de 1,5 milhões de euros, financiado em 85% por fundos comunitários, no âmbito de uma candidatura ao programa “Mais Centro”. Para Maria do Céu Albuquerque, Presidente da Câmara, a obra do novo mercado devolveu à cidade o seu mercado diário num novo formato e criou condições de regeneração urbana, tal como vai acontecer
com o novo Centro de Saúde, já em fase de finalização e que está situado do outro lado da rua. Os comerciantes locais não gostam de ver o mercado vazio e depositam grandes esperanças nos utentes do novo Centro de Saúde, para aumentar a frequência no mercado. Há males que vêm por bem... O projeto tem assinatura do atelier ARX, dos irmãos Nuno e José Mateus, o Mercado Municipal de Abrantes é na opinião dos
... É um edifício de aspeto minimalista, dominado pela cor branca, de linhas retas e onde a luz é o denominador comum. À primeira vista parece que estamos perante um edifício com outras funções, diria uma casa da cultura ...
arquitetos, um projeto onde o mercado é um edifício onde a ideia de espaço público é levado ao extremo. “No limite, como ainda acontece em diversas civilizações, o mercado acontece na própria rua onde os comerciantes vendem a quem passa os seus produtos em bancas e coberturas improvisadas, numa diluição ou coincidência total do espaço ‘mercado’ no espaço urbano. O novo Mercado de Abrantes é simultaneamente
edifício e rua. Através dele passa-se de uma rua para outra, seja de forma direta através da escada que se abre no limite norte, ou deambulando entre bancas e a escada em espiral situada no limite sul. No fundo, trata-se fundamentalmente de uma rua conformada e coberta por uma casca de betão aparente pintada a branco. No coroamento do edifício dois volumes captam a luz solar que flui para aos pisos inferiores através de aberturas nas lajes
dos vários andares, iluminando suavemente os espaços, sublinhando a textura do betão e marcando a cadência temporal dos dias”, referem os arquitetos. “A população não vem ao mercado” Começa por nos dizer Guilherme Tomé, talhante há mais de 40 anos e proprietário de um dos três talhos do mercado. “Devia de estar tudo mais concentrado. Devia de ser tudo num piso só, como como no mercado antigo”. CARNE | 61
» MERCADO MUNICIPAL DE ABRANTES Fernando Vieira, um açoriano de 43 anos instalou-se no mercado, há cerca de 4 meses, com um talho e uma peixaria. O sócio-gerente da Chama da Terra começou por nos dizer: “O negócio está a crescer devagarinho. Às quartas-feiras tenho uma volta de distribuição por Lisboa, de carne e peixe oriundos do arquipélago dos Açores.” Vai aos domingos para a Ilha Terceira e regressa à terça-feira. Sobre o mercado, Fernando Vieira é pragmático “Gosto do mercado, é diferente e o negócio vai-se fazendo”. É do conhecimento geral que a obra atrasou-se cerca de dois anos, dado que a empresa que venceu o concurso entrou em
colapso financeiro, tendo sido alvo de um processo de insolvência, e deixou a obra inacabada. O processo de construção do novo mercado remonta a março de 2010, quando o antigo edifício, datado de 1933, foi encerrado pela Autoridade de segurança Alimentar e Económica (ASAE), tendo os comerciantes sido realojados temporariamente em diverso espaços da cidade. Luís Moreira, comerciante, com mais de 30 anos de experiencia em carnes, é menos contido e aponta o dedo à concepção do mercado: “Ficou bonito mas é muito desconfortável e pouco funcional. É muito
desagradável com o frio, chuva e vento e, sobretudo, com as correntes de ar. Depois, quer se queira quer não, Abrantes é uma cidade de província e as pessoas não gostam de elevadores. As escadas, são um problema para os mais idosos. Nunca tiveram em conta a nossa opinião, nunca fomos ouvidos, nem sequer para definir os horários que deviam ser alargados.” No dia que visitamos o mercado, numa terça-feira, estava a meio gás, havia muitas bancas vazias, o Welcome Center estava fechado e revelava algum desmazelo. Não querendo pôr em causa a arquitetura do edifício, até porque o tempo no seu
Gosto do mercado, é diferente e o negócio vai-se fazendo...
// Luís Moreira, comerciante, com mais de 30 anos de experiência, queixa-se da concepção do mercado.
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» MERCADO MUNICIPAL DE ABRANTES devido tempo ajuizará, parece-nos que a autarquia partiu para esta obra, por um lado com uma ideia avançada (em termos de construção), por outro, com uma ideia muito conservadora do que é a atual dinâmica de um mercado. Ou seja, independentemente se goste ou não, que hajam detratores da obra ou não, não estivéssemos nós em Portugal, o novo mercado de Abrantes, em termos arquitectónicos, agrada-nos bastante mas tememos que corra o sério risco de pisar a linha sempre ténue que separa, neste caso, um edifício que deve ser de utilidade pública e transformá-lo, utilizando uma expressão idiomática, num autentico elefante branco.
O novo mercado de Abrantes é uma obra que pode satisfazer da melhor maneira o consumidor, tem condições para isso. Não tem é oferta. Talhos, peixarias e padarias, por si só, já não garantem o bom funcionamento de um mercado. E, não me estou a referir ao conceito, mais ou menos europeu, de transformar, em simultâneo com a atividade comercial, os velhos mercados em locais de lazer com uma panóplia de restaurantes para todos os gostos. Falo de serviços. O mercado novo de Abrantes devia contemplar uma Loja do Cidadão, por exemplo. Seria ouro sobre azul para os comerciantes que veriam mais
público junto dos seus produtos e uma vantagem para a autarquia que veria frutos do seu investimento sem correr o risco de uma eventual acusação de delapidar o erário público. O problema dos mercados diários tradicionais não são os preços nem a qualidade dos seus produtos, na sua grande maioria de origem nacional e de qualidade reconhecida. O problema dos mercados é a falta de clientes. Precisa de estratégias para levar as famílias modernas ao mercado. E, neste sentido, as grandes superfícies, com o seu grande poder de negociação, com uma relação preço/qualidade de correlação,
// Fernando Vieira, proprietário de “A Terra da Chama”, veio da ilha Terceira para se instalar no mercado. “O negocio vai devagarinho”
// Guilherme Tomé, nas carnes há mais de 40 anos, queixa-se da falta de clientes: “Na maior parte dos dias o mercado está vazio”
por vezes, bastante fraca mas, sobretudo, com uma máquina publicitária muito forte, levam vantagem. Daí que o trabalho das autarquias não deve terminar no dia da inauguração de um mercado. Neste caso, a obra idealizada pelos arquitetos albicastrenses reflete potencial para diversas iniciativas para dinamizar o mercado municipal de Abrantes, desde a implantação de novos serviços, passando, por exemplo, por promover exposições de jovens fotógrafos ou jovens artistas plásticos, peças de teatro de rua para crianças para atrair jovens casais, apoiar 64 | CARNE
degustações, até à organização de feirinhas de objetos usados, artesanato e outras manifestações culturais, entre as quais, workshops temáticos. Já para não falar de marketing de guerrilha que é um conjunto de técnicas originais e fora do comum usadas pelos pequenos comerciantes para combater as grandes empresas: distribuir publicidade junto aos supermercados com promoções. Mas como é óbvio, este trabalho não é nem pode ser da exclusividade das autarquia. Os próprios comerciantes têm responsabilidade a sua cota-parte na promoção do seu espaço comercial no
seu todo. Seduzir clientes ao mercado também passa pela atitude dos próprios comerciantes. Não pode haver bancas desmazeladas nem talhos com jornais amontoados ou objetos estranhos à atividade comercial. A imagem é muito importante e a promoção do negocio é essencial.
» IFFA 2016
NA IFFA PAVILHÃO 11.1 STAND A 11
IFFA 2016: GRANDES EXPECTATIVAS PARA O MAIOR EVENTO DO SETOR DAS CARNES 7 A 12 DE MAIO 2016 IFFA é há muito o ponto de encontro do profissionais do sector das carnes. Este ano, a feira de Frankfurt garante a presença de mais de 1000 expositores de meia de meia centena de países, incluindo os líderes de mercado, para apresentar as suas principais inovações, na feira. Nos pavilhões completamente esgotados, empresas de todo o globo desenvolvido apresentarão novos produtos, tecnologias e soluções para todas as fases da cadeia de processamento de carne em cerca de 110.000 metros quadrados de espaço de exposição. A organização deste colosso profissional para o sector das carnes espera mais de 70.000 visitantes oriundos de mais de 140 países. Wolfgang Marzin, CEO da “Messe Frankfurt”, na conferencia de 66 | CARNE
imprensa da IFFA sublinhou: “A IIFA já se realiza em Frankfurt há 45 anos e, desde então, tornou-se a principal feira para o sector. É e continuará a ser a plataforma de inovação mais importante de bens de investimento ao longo de toda a cadeia do processo. A maioria dos nossos expositores, que incluem todos os líderes do mercado mundial, esperam pela IFFA para lançar as suas inovações. E é neste contexto, junto com nossos parceiros, que tenho o prazer de anunciar mais uma vez o principal evento para o sector de carne." Por sua vez, Richard Clemens, Secretário-geral da Associação das Empresas de Processamento de Alimentos e Equipamento Packaging, sócio conceitual da IFFA, referiu: “ Para os fabricantes de máquinas, IFFA é sem sombra de dúvidas a feira mais
IFFA 2016 «
importante. Com o seu foco claramente apontado à carne, a IFFA oferece não só um espectro inigualável de soluções, mas também uma grande concentração de especialistas. Na IFFA, os holofotes estão todos apontados para as inovações e tendências orientadas para as necessidades de mercado, que geram impulsos decisivos para moldar o futuro do sector das carnes, em todo o mundo. O alto grau de internacionalidade na IFFA mostra que Frankfurt é o ponto de encontro firmemente estabelecido para a rede global da industria de carne.”
IFFA é há muito o ponto de encontro do profissionais do sector das carnes...
IFFA reflete os melhores índices de internacionalidade, no que diz respeito a expositores e visitantes. Os números confirmam 57% das empresas presentes na última edição, em 2013, eram empresas estrangeiras. O maior contingente de expositores excluindo a Alemanha são: Itália, Holanda, Espanha, EUA, França, Dinamarca, Áustria, Reino Unido, China e Polónia. A proporção de visitantes (dados da última edição) foi de 61% de visitantes profissionais da industria, comércio a retalho, aproveitando a ampla gama de produtos e serviços da IFFA. Cerca de um em cada dois visitantes são europeus. Depois da Alemanha, as dez principais nações a visitar o certame inclui Rússia, Itália, Holanda, Espanha, Polónia, Áustria, França e EUA.
// UM DOS MAIS IMPORTANTES GRUPOS DE VISITANTES... ...da IFFA são os comerciantes de carnes, talhantes por conta própria. Heinz-Werner Suss, Presidente da Associação Alemã de Comerciantes de Carne (Deutscher Fleischer-Verband – DFV)
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disse: “ IFFA 2016 é um evento sem igual para o sector de carnes, sobretudo, para os comerciantes de carne. É de vital importância para nós a todos os níveis. Naturalmente, é uma fonte abrangente de informação para os nossos membros - em nenhum outro lugar é possível encontrar tanta informação sobre os últimos desenvolvimentos tecnológicos e profissionais. Com todos os seus eventos para o comércio de talhos, com as suas competições importantes e com os seus inúmeros novos produtos desta edição IFFA, nunca é demais sublinhar a sua posição como principal feira do mundo para o sector da carne. Estamos muito ansiosos por isso.” // DISPOSIÇÃO COMPACTA E TRANSPARENTE O layout reestruturado e ampliado na IFFA 2013, incluindo, pela primeira vez, o Pavilhão 11, foi um grande sucesso e será mantido em 2016. Assim os visitantes poderão ver toda a gama de máquinas e equipamentos na parte oeste da feira, abrangendo os pavilhões 8, 9 e 11. Os “players” da embalagem e toda a tecnologia envolvente ocuparão todos os pisos do pavilhão 11. Os principais expositores do segmento de processamento e de corte estarão localizados no pavilhões 9.0 e 9.1 enquanto que o foco principal no pavilhão 8 será o processamento. No pavilhão, na parte leste do centro de exposições, os visitantes poderão encontrar todos os materiais de embalagem, vendas e tudo para talhos bem como os principais expositores de ingredientes, especiarias, aditivos e embalagens.
// PRINCIPAIS TEMAS NA IFFA 2016 A industria mundial de carne é um mercado com crescimento dinâmico. Países populosos da Ásia, América Latina, Europa Oriental e África são caracterizados por um aumento do poder de compra e, me muitos casos, com um consumo de carne correspondente. Portanto, existe uma procura crescente destes países para a tecnologia moderna e eficiente para o processamento de carnes e derivados. Além da quantidade, a qualidade está a desempenhar um papel cada vez mais importante com as exigências sobre segurança alimentar qualidade e aumento da rastreabilidade. Nos países ocidentais, o foco está na otimização da produtividade, alto rendimento, processos de limpeza diretos, maior automação e sustentabilidade. O comércio tradicional não está fora dos planos estratégicos da IFFA 2016. No comércio de carnes, a chave para o sucesso futuro é a adaptação aos novos hábitos alimentares do consumidor e tendências, tais como alimentos de conveniência. Além disso, cada vez mais, o regionalismo desempenha um papel importante na decisão da compra. Investimentos em eficiência energética e simplificação dos processos de trabalho, bem como as melhorias na higiene em ambos os lados de vendas e produção, são também temas importantes na edição da IFFA. CARNE | 69
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// PROCESSOS TRANSPARENTES PROPORCIONAM SEGURANÇA O sabor e a qualidade do produto são determinados, em grande medida, pela regulação e controlo de fatores como a câmara, produtos e as temperaturas do núcleo humidade, densidade da fumagem ou fluxo preciso do ar. O uso de sensores de alto desempenho e controladores de processo, programas inteligentes para os auto diagnósticos de máquinas e sistemas, juntamente com a opção de otimização de processos com base em manutenção remota para garantir a máxima disponibilidade dos sistemas e tornar as unidades eficientes para fazer face aos prazos apertados. Os ecrã táctil com interfaces intuitivos, multilingue, que são, acima de tudo, fáceis de usar, facilitam a vida aos operadores e proporcionam informações vitais e continuamente em ralação aos processos que decorrem e ás condições de sistema. Um aspeto cada vez mais importante é ser capaz de fornecer informação para fins de controlo e rastreabilidade end-to-end (de ponta-a-ponta). // AUTOMAÇÃO E UNIDADES DE FUMAGEM As soluções inovadoras para fumagem, maturação, cozedura, arrefecimento e tecnologia de aquecimento estarão patentes na IFFA 2016. A tendência atual é para sistemas multifuncionais com controlos programáveis, funções de memória de seleção do programa inteligente e recolha contínua de dados dos procedimentos. Também estarão nas bocas do mundo os novos sistemas de maturação e fumagem para grandes quantidades de produto de forma consistente, de lata qualidade, com base em custos baixos e eficiência energética. Outras exigências da industria moderna compreendem o menos possível de perda de peso, tempos curtos de processo, baixos custos de manutenção e de utilização de trabalho mínimo. Há também o requisito da limpeza automática, a capacidade de escolher entre os diversos tipos de aquecimento, os tipos de clima a secagem/ maturação e outras funcionalidades. Estes requisitos só podem ser satisfeitos se os sistemas forem inteiramente automatizados.
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As crescentes exigências no que diz respeito à higiene, qualidade dos produtos e eficiência económica e produtividade, além de saúde e segurança dos trabalhadores, são os principais fatores que impulsionam a substituição do trabalho manual por processos automatizados.
// REDUÇÃO DO TRABALHO MANUAL As crescentes exigências no que diz respeito à higiene, qualidade dos produtos e eficiência económica e produtividade, além de saúde e segurança dos trabalhadores, são os principais fatores que impulsionam a substituição do trabalho manual por processos automatizados. Um exemplo disso, é a maneira loop como as salsichas são penduradas nos carrinhos de fumagem. As possibilidades atuais incluem máquinas sob medida para robôs articulados de seis eixos. Este robôs operam com excecional velocidade e com grande precisão e também são extremamente cuidadosos na maneira como lidam com o produto. Em comparação com colocação manual, os robôs atingem rendimentos mais elevados e, ao mesmo tempo, proporcionam densidade de cargas mais elevadas.
// MATURAÇÃO O processo de maturação requer fundamentalmente um ambiente estável. Os sensores monitorizam continuamente a temperatura e a humidade da câmara de maturação conjuntamente com o funcionamento do vaporizador e do condensador, informando o computador de todos os dados de forma que o processo se ajusta automaticamente às necessidades. Este sistema de controlo de maturação permite controlar a circulação do ar, o nível de humidade e o tempo necessário de maturação. Os sistemas de esterilização UV são cada vez mais usados para tratar o ar circulante e a entrada de ar fresco. A radiação UV pode ser usada para tratamento do e tratamento de água. Substitui o cloro, o ozônio e outros oxidantes na desinfecção da água. A radiação ultravioleta é usada para desinfecção de água potável, de efluentes tratados, águas de torre de resfriamento, aquicultura, aquários, lagos, água engarrafada, água de piscinas, desinfecção de caldo e açúcar liquido, desinfecção de ar e superfícies e ar condicionados. CARNE | 73
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// HIGIENE, UM CRITÉRIO OBRIGATÓRIO Através da integração do sistema de limpeza no local CIP (cleaning in place) a limpeza de uma câmara de fumagem pode ser assegurada com rapidez , eficiência e de forma económica e ambientalmente favorável. Sistemas de drenagem aplicados no chão, permitem a remoção de toda a água da lavagem inclusivamente os agentes de limpeza para a estação de águas residuais.
O sistema de esterilização por ultravioleta (UV) tem sido utilizado com segurança em hospitais, clínicas, laboratórios e indústrias alimentícias, farmacêuticas, cosméticas, de laticínios e outras, há mais de cinquenta anos. Aparelhos domésticos de radiação ultravioleta (UV), na Europa e EUA, se tornaram populares devido à tendência do uso em piscinas substituindo o cloro formador de cloraminas (THMs).Desinfeccao-Ultravioleta-UV-Agua.html. Quando penetra no corpo dos micro-organismos a seu código genético e impossibilita a reprodução.
// SISTEMAS DE COZEDURA EFICIENTES A transferência de calor extremamente eficiente é essencial para o uso económico da energia, nas cozeduras e pasteurização. Ela é alcançada através de fluxos intensivos, forçados de ar quente/ vapor em unidades que são completamente isolados contra influências externas. Os sistemas controlados por computador garantem que a temperatura de cozimento dentro das câmaras de cozedura não sejam superiores a 1º Celsius e assim garantir uma temperatura uniforme em todo o lote e, portanto, proporcionar as mesmas condições por toda a parte. Na IFFA 2016 também poderá ver como é possível prolongar a vida de prateleira dos seus produtos, através de câmaras de arrefecimento rápido. 74 | CARNE