www.revistacultivar.com.br
/revistacultivar
Destaques
26
Diretas
04
Cochonilha-branca em café
06
Sobrevivência de percevejos em milho/trigo
08
Informe Spraytec
12
Especial Cesb - Os campeões
14
Especial Cesb - Eficiência climática x agrícola 18
Como anda a eficiência de controle dos produtos liberados para uso contra a lagarta
H. armigera após o ingresso da praga no Brasil
Ataque imprevisível
Os desafios da cochonilha-branca, uma praga difícil de ser notada e ao mesmo tempo agressiva em cafeeiro
46
@RevistaCultivar
Índice
Efeito de inseticidas
06
/revistacultivar
Praga em alta
O que fazer diante das elevadas infestações de tripes Frankliniella schultzei em lavouras
Cultivar Grandes Culturas • Ano XX • Nº 255 Agosto 2020 • ISSN - 1516-358X Crédito de Capa: Cecília Czepack
Diretor Newton Peter www.grupocultivar.com contato@grupocultivar.com Assinatura anual (11 edições*): R$ 269,90 (*10 edições mensais + 1 edição conjunta em Dez/Jan)
Capa - Efeito de inseticidas em H. armigera
26
Controle biológico no Brasil
30
Os 35 anos da Ubyfol
36
Controle da mosca-branca em soja
38
Reflexos da ILP em nematoides
42
Tripes em soja e algodão
46
Coluna Agronegócios
48
Coluna Mercado Agrícola
49
Coluna ANPII
50
Expediente Fundadores: Milton Sousa Guerra, Newton Peter e Schubert Peter
de soja e de algodão
Grupo Cultivar de Publicações Ltda. CNPJ : 02783227/0001-86 Insc. Est. 093/0309480 Rua Sete de Setembro, 160, sala 702 Pelotas – RS • 96015-300
Especial Cesb - Produzir com sustentabilidade 22
Números atrasados: R$ 22,00 Assinatura Internacional: US$ 150,00 Euros 130,00 Nossos Telefones: (53) • Geral 3028.2000 • Comercial: • Assinaturas: 3028.2065 3028.2070 3028.2066 • Redação: 3028.2067 3028.2060
Por falta de espaço não publicamos as referências bibliográficas citadas pelos autores dos artigos que integram esta edição. Os interessados podem solicitá-las à redação pelo e-mail: contato@grupocultivar.com Os artigos em Cultivar não representam nenhum consenso. Não esperamos que todos os leitores simpatizem ou concordem com o que encontrarem aqui. Muitos irão, fatalmente, discordar. Mas todos os colaboradores serão mantidos. Eles foram selecionados entre os melhores do país em cada área. Acreditamos que podemos fazer mais pelo entendimento dos assuntos quando expomos diferentes opiniões, para que o leitor julgue. Não aceitamos a responsabilidade por conceitos emitidos nos artigos. Aceitamos, apenas, a responsabilidade por ter dado aos autores a oportunidade de divulgar seus conhecimentos e expressar suas opiniões.
REDAÇÃO • Editor Gilvan Dutra Quevedo
COMERCIAL • Coordenação Charles Ricardo Echer
• Redação Rocheli Wachholz Karine Gobbi Cassiane Fonseca
• Vendas Sedeli Feijó José Geraldo Caetano
• Design Gráfico e Diagramação Cristiano Ceia
CIRCULAÇÃO • Coordenação Simone Lopes
• Revisão Aline Partzsch de Almeida
• Assinaturas Natália Rodrigues
GRÁFICA: Kunde Indústrias Gráficas Ltda.
• Expedição Edson Krause
Diretas Participação
A Basf apresentou, em formato on-line, na Coopercitus Expo 2020, o fungicida Aumenax, focado no manejo de resistência de doenças como a ferrugem-asiática da soja. Em cana-de-açúcar a empresa levou a solução Muneo BioKit, desenvolvida em parceria com a Embrapa e que alia químico (inseticida e fungicida) e biológico (inoculante Aprinza). "Participar do evento é uma grande oportunidade de poder contribuir e estar ao lado do agricultor, mesmo que distante fisicamente neste momento de pandemia. O nosso objetivo é mostrar e levar soluções que contribuem para o legado do agricultor cooperado”, explicou o gerente sênior de Marketing da Basf, Eduardo Eugenio. A empresa também levou soluções para os cultivos de café, citros e hortifrúti.
Hamilton Ramos
Segurança
Eduardo Eugênio
O programa IAC-Quepia de Qualidade de Equipamentos de Proteção Individual na Agricultura conduz ensaios com ênfase na resistência e na durabilidade de vestimentas protetivas agrícolas. O trabalho ocorre na Estação Experimental da Syngenta, parceira da iniciativa de pesquisa, em Paulínia, no interior de São Paulo, supervisionado pelo pesquisador científico Hamilton Ramos, coordenador do IAC-Quepia. Os ensaios envolvem três tipos de vestimentas protetivas, todas recomendadas por fabricantes associados ao IAC-Quepia. Ao final de um determinado número de lavagens desses produtos, executadas por duas lavanderias industriais, com emprego de processos diferentes, Syngenta e IAC-Quepia pretendem apresentar dados seguros para subsidiar a formulação de uma política de recomendação e utilização de EPIs agrícolas, ação que beneficiará a segurança de pesquisadores e trabalhadores. O ensaio tem como base a Norma Reguladora NR 31.8.
Cooperação
A Embrapa e a Bayer estabeleceram uma cooperação técnica para apoiar a consolidação de um mercado de carbono específico para a agricultura brasileira. O objetivo da parceria público-privada é investir em ações de pesquisa científica para reduzir as incertezas e o custo na quantificação do balanço de carbono pelos produtores de soja e de milho, de modo a tornar possível a remuneração desses agricultores pelos benefícios ambientais produzidos. “Os produtores podem realmente contribuir muito para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, otimizando a captura e o armazenamento de carbono no solo e sendo recompensados pela ação. É por isso que a Bayer está atuando em parceria com eles para trabalhar em prol de um futuro de baixo carbono na agricultura a partir da Iniciativa Carbono Bayer”, explicou o presidente da Divisão Agrícola da Bayer para a América Latina, Rodrigo Santos.
04
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Rodrigo Santos
Liderança
Diogênes Panchoni
Vice-líder no mercado de sementes de milho no País, a Morgan já ocupa a liderança em vendas de híbridos para segunda safra nos mercados do Paraná, Minas Gerais e São Paulo, e está entre as cinco principais nos estados do Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul, Maranhão e no Distrito Federal, segundo pesquisa da Spark. “Os dados revelam o trabalho de nossas equipes que não medem esforços para compreender a realidade do produtor, buscando e fornecendo soluções eficientes que atendam e superem expectativas em produtividade, qualidade e rentabilidade no campo”, opina a líder de Marketing da Morgan, Diogênes Panchoni.
Manejo
A FMC participou da versão on-line da Coopercitrus Expo com a apresentação de soluções para manejo de pragas, doenças e plantas daninhas nas culturas de soja, cana, citros e café. Os participantes puderam conhecer um pouco mais sobre a companhia e conferir as ações e campanhas especiais de cada cultivo. “A parceria que realizamos com a Coopercitrus é de extrema importância para estarmos mais próximos dos produtores. Nosso objetivo é compreender a demanda do campo e contribuir para o desenvolvimento sustentável das lavouras, possibilitando conveniência para o produtor com desenvolvimento de inovações tecnológicas”, explicou o gerente de Marketing Regional da FMC, Vinicius Batista.
Fabiano Romero
Mercado
Vinicius Batista
A Forseed, com seu portfólio de mais de 20 híbridos de milho, completa dois anos e ocupa a 6ª posição entre as dez maiores marcas de sementes no Brasil na safrinha 2019/20, de acordo com o último levantamento da Spark. “A consultoria de nosso time e o contínuo investimento em pesquisa e desenvolvimento de híbridos para atender de forma bastante específica diversas microrregiões têm proporcionado uma gama de soluções aos produtores rurais, bem como ajudado a fortalecer a cadeia de valor e a competitividade da agricultura brasileira”, avalia o Líder de Marketing da Forseed, Fabiano Romero.
Curso
A Elevagro e o Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) lançaram o curso de pós-graduação a distância, MTA Master em Tecnologia Agrícola. Com 389 horas de duração, a previsão de início da turma ocorre neste mês de agosto. O curso será realizado na plataforma da Elevagro, que possui conteúdos específicos para agronegócio. Mais informações podem ser obtidas pelos telefones (55) 3217-8223 e (55) 3028-4001, e-mail relacionamento@ elevagro.com ou na página https://pages.elevagro.com/ pos-graduacao-soja.
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
05
Café
Ataque imprevisível
Capaz de ser transportada pelo vento, por formigas ou caminhamento, a cochonilha-branca é uma praga difícil de ser notada e ao mesmo tempo agressiva, responsável em situações extremas por queda de até 100% de flores e frutos ou seca das rosetas em café. Mesmo com as dificuldades de identificação, o monitoramento de sinais da presença do inseto é indispensável para a adoção do manejo adequado
D
entre as diversas espécies de cochonilhas que ocorrem em cafeeiros no Brasil destacam-se as cochonilhas-farinhentas (Hemiptera: Pseudococcidae), assim conhecidas por apresentarem o corpo coberto com uma fina camada de secreção cerosa branca, como se tivessem sido envolvidas em farinha. Em cafeeiro no Brasil, podem ser encontradas 16 espécies dessas cochonilhas, sendo sete nas raízes e nove na parte aérea (Santa-Cecilia et al., 2020). Destacam-se as espécies Planococcus citri (Risso) (Hemiptera: Pseudococcidae) (Figura 1A) e Planococcus minor (Maskel) (Hemiptera: Pseudococcidae) (Figura 1B), também conhecidas como cochonilhas-brancas ou cochonilhas-das-rosetas, por se alojarem preferencialmente nas rosetas com botões florais e frutos, onde sugam a seiva. Podem também infestar mudas, onde as ninfas se alojam nas nervuras das folhas e juntamente com as fêmeas adultas, quando em altas infestações, formam aglomerações em toda a planta. Embora essas cochonilhas sejam de ocorrência imprevisível nas lavouras, o monitoramento periódico é necessário e deve ser integrado às práticas de manejo de outras pragas na lavoura cafeeira. O exame das plantas deve ser realizado principalmente no interior da folhagem, nas brotações, em rosetas com flores ou frutos, locais onde esses insetos se alojam e formam colônias.
DESCRIÇÃO
Essas cochonilhas são muito semelhantes morfologicamente, sendo difíceis de serem distinguidas. Em ambas as espécies, as ninfas de primeiro instar apresentam pouca cerosidade, um par de filamentos na extremidade do abdome e grande mobilidade; as de segundo instar são maiores e possuem dois pares de filamentos caudais. Já no terceiro instar, apresentam 17 pares de filamentos cerosos ao redor do corpo e um par posterior, assemelhando-se à fêmea adulta. As fêmeas adultas dessas espécies possuem o corpo em formato oval e coloração castanho-amarelada, recoberto por uma pulverulência de cera branca. Medem entre 2,5mm e 4mm de
06
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Julio Cesar Freitas Santos
B
A
comprimento e possuem 18 pares de filamentos cerosos ao redor do corpo.
OUTROS HOSPEDEIROS
As cochonilhas-brancas são polífagas, ou seja, colonizam diversas plantas silvestres ou cultivadas, tanto em campo como em cultivos protegidos. No Brasil, P. citri está relatada para cafeeiro, abacateiro, macadâmia, soja, batateira, cacaueiro, cana-de-açúcar, algodoeiro, citros, goiabeira, videira, bananeira, abacaxizeiro, carambola, coco, mangueira, figueira, aboboreira e algumas espécies ornamentais. Já a espécie P. minor está registrada para cafeeiro, bananeira, algodoeiro, abacateiro, cacaueiro, paineira, aboboreira, jambo, dentre outros.
OCORRÊNCIA E DANOS
Há registros dessas cochonilhas em diversas regiões cafeicultoras do Brasil, tanto em cafés Conilon, quanto Arábica, o que recomenda constante alerta aos surtos esporádicos que podem atingir níveis populacionais severos. Essas cochonilhas vivem em colônias constituídas por indivíduos em vários estágios de desenvolvimento e se alojam no interior das rosetas, sugando a seiva do pedúnculo e a base dos frutos, ocasionando o secamento ou a queda dos botões florais e frutos, dano conhecido como roseta banguela. Em plantas altamente infestadas podem apresentar queda de 100% de flores e frutos ou seca das rosetas. No inverno migram para as raízes, em decorrência das baixas temperaturas.
MONITORAMENTO E CONTROLE
O ataque dessas cochonilhas é imprevisível, pois a praga pode ser transportada pelo vento, pelas formigas que se alimentam da secreção açucarada que expelem (honeydew), e também através do caminhamento. A infestação ocorre em reboleiras, onde alguns talhões podem sofrer ataques mais intensos enquanto em outros não se nota a presença. É importante que se faça o monitoramento periódico da cultura para detectar a infestação desta praga ainda no início. A presença de filamentos lanuginosos brancos nos ramos e rosetas, bem co-
Figura 1 - A) Fêmea da cochonilha Planococcus citri; B) Fêmea e ninfas da cochonilha Planococcus minor
mo a presença de formigas na planta e de melaço nas folhas (honeydew), que depois de algum tempo tornam-se escuros (fungo da fumagina que se desenvolve nessas excreções açucaradas eliminadas pelas cochonilhas), são indícios da infestação da cochonilha na planta. Constatada sua presença na lavoura, deve-se identificar as reboleiras atacadas e, caso seja necessário, consultar um técnico especializado para avaliar a necessidade e qual o método de controle mais apropriado. Cochonilhas possuem um grande conjunto de inimigos naturais: predadores, parasitoides e fungos entomopatogênicos. Joaninhas (Cryptolaemus montrouzieri Mulsant, Hyperaspis sp. e Scymnus sp.) (Coleoptera: Coccinellidae), crisopídeos (Neuroptera: Chrysopidae) e parasitoides (Leptomastix dactylopii Howard (Hymenoptera: Encyrtidae), p.ex.) são muito importantes no controle natural da cochonilha-branca, P. citri, muitas vezes impedindo que causem danos econômicos em cafezais. Em infestações com P. minor foram observadas larvas de joaninhas e crisopídeos. Porém, em algumas ocasiões, os inimigos naturais não são capazes de manter a densidade populacional da praga abaixo do nível de dano econômico, sendo necessário intervir com outras medidas de controle, como o uso de inseticidas, por exemplo. Contudo, as táticas de controle devem sempre favorecer a preservação desses agentes de controle biológico na lavoura. Existem poucos inseticidas registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para o controle das cochonilhas-das-rosetas na cultura do cafeeiro, porém a lista não contempla a espécie P. citri para essa cultura. Ainda há uma grande demanda por mais estudos desses organismos para desenvolver um manejo mais sustentáC vel da lavoura cafeeira.
Presença da secreção açucarada (honeydew) e do fungo da fumagina em muda de café infestada com a cochonilha P. minor
Dano na roseta ocasionado pela cochonilha-branca
Lara Sales Nathan Jhon Silva Lopes Universidade Federal de Lavras Lenira V. C. Santa-Cecília IMA/Epamig/Lavras Mauricio Sergio Zacarias Embrapa Café
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
07
Pragas
Sobreviver ou reproduzir
Assis, J. M.T
Para o correto manejo, alguns questionamentos precisam ainda ser respondidos em relação à real capacidade de sobrevivência dos percevejos marrom e barriga-verde em milho e trigo e se a reserva de lipídeos provenientes da soja ou de outra leguminosa permite também sua multiplicação nesses hospedeiros de segunda safra
A
adoção de sistemas de produção caracterizados pela sucessão e rotação de culturas e a intensificação dos cultivos durante todo o ano aumentam a oferta de plantas hospedeiras no campo, que servem como fonte de alimento e abrigo para diferentes insetos-praga. Neste cenário, a multiplicação de pragas polífagas, como os percevejos marrom, Euschisthus heros, e barriga-verde, Dichelops sp., é favorecida com impactos iniciais negativos nas culturas em sucessão à soja, como o milho e o trigo de segunda safra. Tradicionalmente, estas espécies colonizam a cultura da soja ainda no período vegetativo, atingindo maiores densidades no início da maturação, estádio R3, ocasionando danos que afetam diretamente a produtividade e a qualidade da soja como perda de peso dos grãos e suscetibilidade à entrada de patógenos. Po08
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
rém, na entressafra, estes percevejos passam por um período de oligopausa (outono-inverno), caracterizado por baixa mobilidade, vivendo às custas de uma reserva de lipídeos que permite sua sobrevivência até que novas lavouras de soja sejam implantadas. Na cultura do milho, as injúrias causadas pelos percevejos são severas e restritas ao colo das plântulas, podendo levar ao murchamento, ao secamento ou até à morte. No caso de plantas maiores, os sintomas de ataque são caracterizados por perfurações simétricas nas folhas abertas envoltas por um halo amarelado, devido à injeção de toxina durante a alimentação. Pode ocorrer perfilhamento, o que torna a planta improdutiva, e com isso, ocorre um comprometimento da produção devido à redução do estande da lavoura. As injúrias no trigo são semelhantes às do milho, pois ocorre o perfilhamento aliado a perfurações nas folhas das plantas.
fêmeas e 95 dias para machos e na vagem 108 dias para fêmeas e 103 para machos (Figuras 1 e 2).
REPRODUÇÃO DOS PERCEVEJOS EM MILHO E TRIGO
A fonte alimentar oferecida aos adultos influenciou na reprodução do percevejo barriga-verde durante o período de oligopausa, sendo o número de posturas superior na vagem (12,53) em relação ao milho (2,38) e trigo (3,15), assim como o número total de ovos: 118, 21 e 25, respectivamente em vagem, milho e trigo (Figura 3). Assim, mesmo a sobrevivência das fêmeas que se alimentaram da vagem sendo baixa (19%), sua capacidade
Vitorino, M. A. D
viventes, que foi 38%, 35% e 19% em vagem, milho e trigo, respectivamente. No entanto, os machos tiveram menor tempo de vida quando alimentados no milho (55 dias) em relação à alimentação no trigo (76 dias) e na vagem (72 dias) (Figuras 1 e 2). Já para o percevejo-marrom, E. heros, a fonte alimentar não interferiu na taxa de sobrevivência de machos e fêmeas e na duração do tempo de vida. As taxas de sobrevivência de machos e fêmeas foram 73% e 58%, 58% e 54%, 35% e 23% para alimentação na vagem, milho e trigo, respectivamente. Para os percevejos alimentados no milho, a duração de vida foi de 95 dias para fêmeas e 103 dias para machos, no trigo 100 dias para
Casais de barriga-verde alimentando-se em vagem de feijão Marucci, R.C.
A partir da migração dos percevejos remanescentes da soja para outras culturas são necessárias a adoção de medidas preventivas, como o uso de inseticidas durante o período de dessecação pré-plantio da segunda safra e o emprego de sementes tratadas. Acredita-se que o segredo do sucesso desses percevejos depende do sistema de sucessão soja/cultura de inverno, que permite a sobrevivência na entressafra, mas não se sabe se estes percevejos adultos em oligopausa conseguem se reproduzir, uma vez que resultados experimentais e observações de campo indicam que as formas jovens dos percevejos marrom e barriga-verde não completam o ciclo na ausência da soja. Assim, para o correto manejo destes insetos alguns questionamentos precisam ainda ser respondidos em relação à real capacidade de sobrevivência dos percevejos marrom e barriga-verde em milho e trigo e se a reserva de lipídeos provenientes da soja ou de outra leguminosa permite também sua multiplicação nos hospedeiros de segunda safra, milho e trigo, principalmente. Para responder a estes questionamentos foram confinados 26 casais dos percevejos marrom e barriga-verde em plântulas de milho e trigo em estádio V2, em condições de semicampo durante 120 dias (junho a outubro de 2019), e para simular a alimentação em grãos de soja, mantidos casais dos mesmos percevejos em vagem fresca de feijão. Os insetos foram obtidos de criação de manutenção, sendo que todos apresentavam até sete dias de emergência.
SOBREVIVÊNCIA DOS PERCEVEJOS EM PLÂNTULAS MILHO E TRIGO
A alimentação do percevejo barriga-verde, Dichelops melachanthus, no milho por 120 dias permitiu a sobrevivência de uma maior porcentagem de fêmeas (54%) quando comparado com as que se alimentaram no trigo (23%) e na vagem (19%). Além disso, as fêmeas sobreviveram mais tempo no milho (87 dias) que no trigo (70 dias) e vagem (60 dias). Para os machos não houve diferença significativa quanto à porcentagem de sobre-
Injúrias foliares causadas pelos percevejos em milho
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
09
Vitorino, M. A. D
Figura 1 - Porcentagem de sobrevivência de machos e fêmeas dos percevejos marrom e barriga-verde mantidos em plântulas de milho e trigo e vagem de feijão. Porcentagens seguidas de mesma letra por categoria não diferem entre si
Adulto e ninfa do percevejo barriga-verde na palhada da soja
de produzir descendentes foi cinco vezes maior na vagem em relação à alimentação em milho e trigo. Resultado similar foi encontrado para o percevejo-marrom em relação ao número de posturas, as quais foram superiores na vagem (23,61) em relação ao milho (1,07) e ao trigo (0,69). Assim, a fecundidade média do percevejo-marrom foi de 141, 13 e sete ovos, respectivamente em vagem, milho e trigo, durante os 120 dias de confinamento (Figura 3). Estes resultados indicam que o tipo de alimento ofertado para o adulto do percevejo-marrom não afeta a longevidade e a sobrevivência de machos e fêmeas, mas em contrapartida, parece afetar a taxa de reprodução, que foi 14 vezes superior na vagem.
Estes resultados confirmam que o milho e o trigo são fontes alternativas de alimento para esses percevejos no campo. Esse pode ser um fator que determina o início do período de oligopausa, pois provavelmente o milho e o trigo não possuem os nutrientes essenciais para a reprodução no campo. No entanto, essas culturas de entressafra propiciam a manutenção da população de percevejos por um período relativamente longo, de cerca de 100 dias. A extensão da longevidade durante o período de oligopausa é mais evidente para o percevejo-marrom e talvez seja uma das razões desta ser uma das espécies mais abundantes na cultura da soja. Além disso, provavelmente as fêmeas
Figura 2 - Duração do tempo de vida de fêmeas e machos dos percevejos marrom e barriga-verde mantidos em plântulas de milho e trigo e vagem de feijão por 120 dias. Longevidades seguidas de mesma letra por categoria não diferem entre si
10
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
do percevejo somente investem na prole se seus descendentes tiverem condições de completarem o ciclo, gerando adultos que irão reproduzir no ambiente, perpetuando a sua espécie. Estes dados reforçam a importância do manejo pré-semeadura e da proteção das plântulas de milho e trigo por meio do tratamento de sementes como estratégias para reduzir a presença desses C percevejos na entressafra da soja. Rosangela C. Marucci, Letícia P. Silva, Josélia C. O. França, João Marcos T. Assis e Marco Antônio das D. Vitorino, Universidade Federal de Lavras (Ufla)
Figura 3 - Fecundidade média das fêmeas dos percevejos marrom e barriga-verde mantidos em plântulas de milho e trigo e vagem de feijão por 120 dias. Fecundidades seguidas de mesma letra para cada espécie de percevejo não diferem entre si
Wenderson Araújo/CNA
Informe
Efeito positivo Uso de fertilizantes multielementares como complemento à adubação NPK em soja resulta em aumento da produtividade e em redução no número de nematoides
O
Tractus Smart associado ao adubo de base aumentou a produtividade da soja em 4,2 sc/ha quando aplicado a lanço e em 3,5 sc/ha quando aplicado no sulco de semeadura e reduziu, em média (sulco e lanço), em 21% o número de nematoides nas raízes de soja. Nesse contexto, a Spraytec desenvolveu o Tractus Smart, que significa nutrição e correção na medida certa, em uma única operação, melhorando as propriedades químicas e biológicas do solo. Produto de alta tecnologia e biodegradável, é um fertilizante multielementar para ser aplicado como complemento associado ao adubo de
12
base, no sulco ou a lanço. A estrutura do material caracteriza-se por possuir grande quantidade de microporos em seus grânulos. Um único grânulo contém quantidades equilibradas de alguns macros e micronutrientes, ácidos húmicos e aminoácidos de alta solubilidade e prontamente disponíveis às plantas, sem salinizar o solo, possibilitando maior crescimento radicular e estabelecimento inicial da cultura. Assim, as plantas têm condições de suportar melhor a seca e os veranicos, aumentar a absorção de água e nutrientes, incrementando a produtividade. Outra característica diferencial do produto está relacionada à sanidade. Em
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
resposta à aplicação de Tractus Smart, os mecanismos de defesa são ativados, induzindo a planta a sintetizar altas concentrações de metabólicos secundários, que atuam como verdadeiras barreiras físicas e químicas, dificultando a entrada e desenvolvimento de patógenos, como os nematoides. A utilização de cultivares de alto potencial genético associado ao desenvolvimento sustentável exige produtos inovadores como o Tractus Smart.
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho foi o de verificar o efeito do uso do fertilizante sólido Tractus Smart associado à aduba-
Marcelo Madalosso/Phytus Club
ção de base NPK na produtividade e no manejo de nematoides na cultura da soja.
MATERIAIS E MÉTODOS
O experimento foi implantado no município de Campo Mourão, Paraná, em um Latossolo Vermelho Distroférrico de textura muito argilosa e altitude de 630m. Os tratamentos foram: Tratamento 1 - 300kg/ha de 02-20-18, Tratamento 2 – 270kg/ha de 02-20-18 mais 30kg/ha de Tractus Smart no sulco de semeadura, Tratamento 3 – 240kg/ha de 02-20-18 mais 60kg/ha de Tractus Smart aplicado a lanço. A semeadura foi realizada em novembro de 2019 e a colheita em março de 2020. O material vegetal cultivado foi a cultivar Brevant 5D6215IPRO. Previamente à instalação do experimento, amostras de solo foram coletadas na profundidade de 0cm – 20cm. pH em CaCl2 = 5,2, P = 22mg dm-3, K = 0,50cmolc dm-3, Ca = 3,73cmolc dm-3, Mg = 1,59cmolc dm-3, matéria orgânica = 4,1%, saturação por bases (V%) = 51% e argila = 80%. Foram avaliadas massa de mil grãos (g), produtividade (sc/ha) e o número total de nematoides nas raízes (10g) da soja. Os dados coletados foram submetidos à análise de variância pelo teste F (p > 0,10) e suas médias comparadas em nível de 10% de probabilidade pelo teste Scott-Knott utilizando-se o programa estatístico Sisvar (Ferreira, 2011).
Ataque de nematoides às raízes de soja é um dos grandes desafios enfrentados pelos produtores
RESULTADOS
Para a massa de mil grãos (MMG) de soja, o valor médio observado foi de 132,4g na testemunha. A aplicação no sulco de Tractus Smart proporcionou MMG de 136,5g, já a aplicação a lanço proporcionou MMG de 135,7g (Figura 1). Comparando os tratamentos que receberam Tractus Smart com o tratamento que não recebeu, as produtividades médias obtidas foram de 59,3 sc/ ha e 60,1 sc/ha, no sulco e a lanço, respectivamente, enquanto o que não recebeu foi de 55,8 sc/ha, demonstrando incremento médio de produtividade de 3,5 sc/ha e 4,2 sc/ha, respectivamente (Figura 1). O Tractus Smart também aumentou o número de vagens com dois e três grãos. O número total de nematoides por 10g de raízes de soja foi maior na testemunha (1.347), a aplicação do Tractus Smart no sulco reduziu o número total de nematoides para 886 e a lanço para 1.239. O uso de Tratus Smart no sulco e a Figura 1 - Produtividade e massa de mil grãos (MMG) com e sem o uso de Tractus Smart aplicado no sulco ou a lanço, na cultura da soja
lanço, diminuiu a incidência de nematoides nas raízes de soja em 21 % (Figura 2).
CONCLUSÃO
O uso de Tractus Smart no sulco ou a lanço, mostrou maior eficiência agronômica quando comparado ao tratamento padrão (NPK). Os dois tratamentos com Tractus Smart aumentaram a massa de mil grãos e a produtividade, além de reduzir o número C total de nematoides nas raízes de soja. Bruno Maia Abdo Rahmen Cassim e Marcelo Augusto Batista, Universidade Estadual de Maringá Figura 2 - Número de nematoides nas raízes com e sem o uso de Tractus Smart aplicado no sulco ou a lanço na cultura da soja
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
13
Especial Cesb
Produtividade desafiada Vencedor do concurso do Cesb obteve 118,82 sacas de soja por hectare, no Paraná, mais que o dobro da média nacional. Segundo colocado, em Minas Gerais, produziu 118,63 sacas em uma edição em que todos os participantes bateram a marca de 100 sacas por hectare
O
mais novo vencedor do Desafio de Máxima Produtividade do Comitê Estratégico Soja (Cesb) é do estado do Paraná. O produtor Laercio Dalla Vechia colheu 118,82 sacas da oleaginosa por hectare em um talhão de 10,6 hectares, dos quais pouco mais de 2,5 hectares foram destinados ao concurso. A marca, atingida em um ano marcado por desafios climáticos, supera o dobro da média brasileira, estimada pela Companhia 14
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Nacional de Abastecimento (Conab) em 54,5 sacas por hectare. Descendente de italianos e apaixonado por agricultura, Dalla Vechia cultiva 100 hectares de soja, no município de Mangueirinha, no Sudoeste do Paraná. “Separei um pequeno pedaço para o concurso, mas o objetivo era transpor a experiência para a área total”, conta o agricultor, que participa pela quinta vez do concurso e tinha como meta anterior alcançar 100 sacas de soja por hectare.
PRODUZIR COM SUSTENTABILIDADE
Entusiasta do monitoramento da área de cultivo e do manejo integrado, Dalla Vechia não poupa elogios. “É possível fazer em grandes áreas, preservar o potencial dos produtos químicos e é muito lucrativo. Sinto muito orgulho de não aplicar produto químico sem necessidade, de ter responsabilidade ambiental.” Dalla Vechia lembra que é indispensável, neste caso, ter equipamento disponível para fazer as aplicações quando precisa. “Produto químico é ferramenta excelente, mas que tem que ser usada quando preciso e no momento correto. Se tiver assistência técnica de qualidade, equipamento bem dimensionado, vai ter sucesso”, opina. Balardin lembra que além do manejo integrado, a época de semeadura, o clima e outros fatores contribuíram para os índices de produtividade alcançados por Dalla Vechia. “O resultado não é extrapolável para o País inteiro”, alerta.
COMO PRODUZIR MAIS
A receita para produzir mais, de acordo com Dalla Vechia, passa sempre por atenção ao básico. “Nós produtores precisamos caprichar mais, fazer com amor, bem feito. Usar corretamente o plantio direto, plantas de cobertura, rotação. Nem sempre é gastar mais, mas fazer com capricho”, ensina, do alto dos longos anos de experiência com
agricultura e mais de 118 sacas por hectare colhidas. Balardin lembra que metas em agricultura são alcançadas através de investimento de longo prazo, que implica antes de mais nada conhecer o ambiente em que se está inserido. “A produtividade é construída ao longo dos anos, com conhecimento, sabedoria. Se dá com informações e distribuição dessas informações. Não é algo eventual, mas construído”, comenta. “Esse índice alcançado pelo campeão do Desafio é uma amostra do potencial que a produção brasileira de soja possui, o que vem fazendo com que o País cresça no setor e se firme como o principal produtor e exportador de soja do mundo”, avalia o presidente do Cesb, Leonardo Sologuren. Nesta safra os produtores de soja enfrentaram algumas dificuldades. Análises feitas pelo sistema de precisão meteorológica Agrymax, levantadas pelo Cesb, demonstraram que os sojicultores tiveram quebras de produtividade de até 63%. “Porém vemos o ótimo trabalho que os produtores tiveram para contornar essa situação, alcançando altos níveis de produtividade. Nessa safra tivemos 284 sojicultores chegando a resultados acima de 90sc/ha”, comemora Sologuren.
CAMPEÕES REGIONAIS
O segundo maior patamar de produtividade foi registrado pelo produtor Antonio Quedes de Oliveira Neto, de Patrocínio, Minas Gerais, com o índice de 118,63sc/ha,
Fotos Cesb
Dalla Vechia faz parte da quarta geração da família, na atividade agrícola desde 1980. “Sou filho e neto de produtor rural”, orgulha-se. Na propriedade de 250 hectares destina 200 hectares a culturas que incluem, além da soja, trigo, milho, cevada, azevém, ervilha e feijão. O restante da terra é utilizado para reflorestamento. Fazer o básico bem feito é lema na propriedade de Dalla Vechia. “Preciso caprichar. É meu ganha-pão, o que vou deixar de herança para meus filhos e netos”, explica. O agricultor conta que passa o ano planejando a produção e que para plantar em setembro, ao colher a soja lá por fevereiro ou março já começa o preparo da terra, análise de solo, correção de calcário, gesso, cama de aviária... O manejo integrado, tanto para pragas como doenças, é palavra de ordem para o produtor, bem como rotação de culturas e monitoramento criterioso da área. Conhecimento e assistência técnica embasam as decisões quando o assunto é controle químico. “Aplico quando realmente precisa”, conta o produtor, que nesta safra não precisou realizar nenhuma pulverização de inseticida. O custo para a área do concurso foi de aproximadamente R$ 1 mil por hectare, com retorno de R$ 2,80 para cada real investido. O pesquisador Ricardo Balardin, que acompanhou de perto o case, atribui o resultado obtido por Dalla Vechia a um conjunto de medidas, o que inclui, por exemplo, o porte mais baixo das plantas, capaz de facilitar que a luz e a fotossíntese ocorressem e funcionassem adequadamente. O clima também foi um grande aliado do produtor na safra. Balardin explica que na região a alta temperatura não chegou a alcançar o limite que causa danos à soja. “Colaboraram a altitude (919m) e a boa distribuição das chuvas, que não ocorreram em grande volume, mas foram bem distribuídas”, detalha o pesquisador. “A condição climática foi muito boa. Nossa microrregião é abençoada. Foi um ano espetacular, onde a ferrugem chegou mais tarde”, lembra o agricultor, que conta com um coletor de esporos para monitorar a doença. Manchas foliares também não foram um grande problema para Dalla Vechia na safra.
Diversos aspectos influenciam na produtividade da soja e precisam ser observados com atenção para que o manejo correto permita a obtenção de melhores resultados
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
15
Tratamentos fitossanitários utilizados pelo campeão nacional do Desafio de Máxima Produtividade do Cesb
estamos trabalhando na construção de um solo saudável e unificado. Tivemos bastante trabalho, mas buscamos informação e respaldo na tecnologia para atingir o nosso objetivo de elevar a produtividade”, informa. Schaedler destaca os problemas com o clima nessa safra, em que houve bastante seca na região. “Porém, sempre procuramos usar as tecnologias disponíveis, em todas as áreas, análise de solo, plantio, pulverização, colheita e monitoramento da lavoura, para contornar essa situação”, explica. No Centro-Oeste, quem se destacou foi o produtor Elton Zanella, de Campos
Fotos Cesb
campeão da região Sudeste. “O que me levou a chegar a essa produtividade foi a aplicação da tecnologia no campo, agregando conhecimento, e também a ajuda dos nossos consultores”, relata Neto. Além disso, o sojicultor destaca a questão da criação do perfil de solo. “Tivemos um trabalho muito forte na agricultura de precisão, chegando a uma excelente estrutura de solo para plantar, o que fez a diferença”, ressaltou. Já o produtor Eliseu José Schaedler, de Boa Vista das Missões, Rio Grande do Sul, conseguiu a produção de 111,93 sacas por hectare e sagrou-se campeão da categoria irrigada e do Sul. “Há 11 anos
de Júlio, Mato Grosso. Em sua fazenda foram produzidas 103,19 sacas de soja por hectare, garantindo o prêmio naquela região. O que mais o ajudou a chegar a esse resultado foram a construção do perfil de solo em profundidade, o manejo de nematoides com planos de cobertura para auxiliar no combate a pragas e a escolha de uma semente com alto potencial produtivo. “Ganhar o Desafio veio para efetivar o trabalho de toda a equipe, que está sempre engajada no propósito de bater recordes de produtividade. Descobrimos muitos aprendizados que são aplicados em outros talhões da fazenda, para alcançarmos altas produtividades como um todo”, declarou. Completando o time de campeões do Desafio Cesb está o condomínio Milla, administrado pelos produtores Ernest e Robert Milla, de Baixa Grande do Ribeiro, Piauí, com a marca de 101,79 sc/ha, campeão do Norte/Nordeste. Os produtores contam que enfrentaram irregularidades com as chuvas nessa safra, mas conseguiram contornar o empecilho com um bom manejo químico e físico do solo. “É uma área que estamos trabalhando há 15 anos e vemos que deu resultado. A equipe está engajada em atingir esses altos níveis, por isso conquistar esse prêmio é muito gratificante”, avaliou Ernest.
ALTOS ÍNDICES
Mesmo com os obstáculos que ocorreram durante a safra, produtividade dos participantes foi elevada
16
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Todos os resultados são auditados de forma independente. Nessa edição do Desafio, o Cesb registrou um número recorde de auditorias realizadas, chegando
OS CAMPEÕES GRANDE CAMPEÃO 19/20 – Sul Nacional
Mangueirinha - Paraná Produtor: Laercio Dalla Vechia Consultor: Jose Ricardo Pedron Romani Produtividade: 118,82 sc/ha
CAMPEÃO 19/20
CAMPEÃO 19/20 Categoria Irrigado
Centro-Oeste – Categoria Sequeiro
Boa Vista das Missões Rio Grande do Sul Produtor: Eliseu Jose Schaedler Consultor: Felipe Arthur Baron Produtividade: 111,93 sc/ha
Campos de Julio Mato Grosso Produtor: Elton Zanella Consultor: Alfeu Volf Jr. Produtividade: 103,19 sc/ha
CAMPEÃO 19/20 – Sudeste – Categoria Sequeiro Patrocínio – Minas Gerais Produtor: Antônio Guedes de Oliveira Neto Consultor: Clovis Ney da Silva Produtividade: 118,63 sc/ha
a 909 propriedades de sojicultores visitadas pela equipe técnica em todo o Brasil. O diretor executivo do Cesb, Luiz Antonio da Silva, ressalta os altos índices de produtividade que os sojicultores vêm apresentando ao longo dos anos no Desafio. Nesta safra de 2019/2020, a média de produtividade alcançada pelos participantes do concurso foi de 83,1 sc/ha, enquanto a nacional, de acordo com a Conab, foi de 54,5 sc/ha. Na safra passada (2018/2019), o comitê registrou a média de 80 sc/ha, e a
CAMPEÃO 19/20 – Norte/Nordeste – Categoria Sequeiro Baixa Grande do Ribeiro – Piauí Produtor: Condomínio Milla Consultor: Luis Gabriel de Moraes Jr. Produtividade: 101,79 sc/ha
nacional foi de 53 sc/ha. Já na safra de 2017/2018, o Cesb registrou média de 83 sacas/ha e a nacional foi de 53 sacas/ hectare. “Nesta edição do Desafio vemos que todos os campeões bateram a marca de 100 sacas por hectare, o que é algo a ser comemorado, diante de tantos obstáculos que apareceram. Portanto, seguimos com o objetivo de compartilhar informações, para que o Brasil continue se destacando ainda mais, mundialmente no C cultivo de soja”, conclui. www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
17
Especial Cesb
Lições do des O que aprender com os campeões do Cesb da safra 2019/20 quanto à eficiência climática x eficiência agrícola no aumento da produtividade da soja
A
pós mais uma safra de soja brasileira, o Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) divulgou os campeões do Desafio Nacional de Máxima Produtividade. Todos, mais uma vez, superaram a marca de 100 sacas por hectare (Tabela 1), sendo a média dos campeões da ordem de 110,9 sacas por hectare, praticamente o dobro da produtividade média nacional, de 54,5 sacas por hectare, divulgada no último Boletim da Safra de Grãos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de julho de 2020. Ainda considerando-se as produtividades de soja do levantamento da Conab, os dados mostram que nesta última safra os valores alcançados pelo produtores brasileiros superaram as expectativas em muitos estados. Tomando-se como referência os estados dos campeões do Cesb, no Paraná a média estadual atingiu 63 sacas por hectare, enquanto no estado de Minas Gerais a média foi de 61 sacas por hectare e no Mato Grosso aproximadamente 59 sacas por hectare. Já no Piauí, de onde saiu o campeão da região Nordeste, a produtividade média ficou ligeiramente abaixo da média nacional, com 52 sacas por hectare, ao passo que no estado do Rio Grande do Sul, onde as chuvas ao longo da safra foram de baixo volume e muito irregulares, a produtividade média ficou por volta de 31 sacas por hectare, porém havendo expressivas variações entre as regiões produtoras, sendo as mais afetadas pela estiagem as regiões da Campanha, Missões e Planalto Médio, ao passo que no extremo Noroeste do estado a situação foi menos crítica.
18
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Apesar dos campeões do Cesb estarem mostrando ano após ano que é possível se atingir produtividades de soja elevadas, havendo muitos produtores que já estão alcançando patamares de produtividade média de 70 sacas por hectare a 90 sacas por hectare em suas propriedades, as médias nacionais nas últimas safras continuam oscilando entre as 50 sacas por hectare e 55 sacas por hectare, o que se tornou um paradigma para a sojicultura brasileira. Diante disso, surgem muitas questões e especulações. Uma delas é: quais são os fatores efetivamente responsáveis por esse patamar nacional de produtividade da soja? São as condições climáticas que as lavouras enfrentam nas diferentes regiões brasileiras e épocas de semeadura ou as ações de manejo empregadas pelos agricultores? Somente é possível responder essa questão ao se lançar mão de análises das produtividades por meio do emprego de modelos de simulação de culturas. Esses modelos são um conjunto de algoritmos que simulam o funcionamento das plantas de uma cultura, ou seja, como se desenvolvem, crescem e produzem, sob os efeitos das condições de solo, clima e manejo, neste último caso associadas à cultivar empregada (grupo de maturação), à data de semeadura e ao sistema de cultivos (sequeiro ou irrigado). Com esses modelos, desde que bem calibrados para a realidade local, pode-se estimar os valores das produtividades potencial (PP) e atingível (PA). A PP representa o máximo que uma cultura poderia produzir quando influenciada apenas pela interação entre o genótipo e as condições energéticas do ambiente (radiação solar, fotoperíodo
safio e temperatura do ar), considerando-se que não há efeitos depreciadores da produtividade causados pelo déficit hídrico ou pela ocorrência de pragas, doenças, plantas daninhas ou manejo nutricional inadequado. Assim, a PP varia entre locais de produção, entre as diferentes safras e, também, entre as épocas de semeadura. Já a PA é aquela influenciada pelos mesmos fatores que afetam a PP, porém considerando-se também o efeito dos déficits hídricos que ocorrem ao longo do ciclo da cultura, decorrentes do balanço entre as chuvas e a evapotranspiração. Neste caso, a PA irá variar entre locais, safras e épocas de semeadura, mas também com as características do solo e seu perfil. Neste caso, lavouras com solos de textura mais arenosa e/ou com perfil raso estarão mais sujeitas aos déficits hídricos que aquelas em solos de textura argilosa e/ ou com perfil profundo, nos quais as raízes crescem abundantemente explorando um volume maior de solo e, portanto, de água. Para a PA também se consideram condições ótimas de manejo. Uma vez definidos, para uma dada safra, o local de cultivo, a época de semeadura, o genótipo e a condição do solo da área, estimam-se os valores de PP e PA e com eles é possível determinar a perda de
Fotos Cesb
Eficiências climáticas e agrícolas foram avaliadas durante o concurso
produtividade (yield gap) por déficit hídrico, dada pela diferença entre PP e PA, e a eficiência climática, que consiste na relação entre PA e PP, expressa em porcentagem. Uma vez que se conheça, ao final do ciclo da cultura, a produtividade real (PR), seja de sequeiro ou irrigada, a qual, além dos fatores listados para PP e PA, também é afetada pelas condições de manejo agrícola, determinam-se a perda de produtividade (yield gap) por déficit manejo, dada pela diferença entre PA e PR, e a eficiência agrícola, fruto da relação entre PR e PA, expressa em porcentagem.
Os dados apresentados na Tabela 2, provenientes do Cesb, da Conab e do Sistema Agrymax, da empresa Agrymet, permitem avaliar o que ocorreu nesta última safra em termos das eficiências climática e agrícola nas áreas campeãs e nos seus respectivos estados. Observa-se que para as áreas campeãs as ECs foram sempre superiores a 70%, o que indica que o ambiente, juntamente com a irrigação no caso do campeão irrigado em Boa Vista das Missões, Rio Grande do Sul, proporcionou pelo menos 70% do que a cultura necessitou ao longo do ciclo. A pior situação em termos da EC
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
19
Cesb
Dados foram observados nas diversas regiões onde os participantes do Desafio cultivam suas áreas de soja
campeãs apresentam uma EA de aproximadamente 82%, a média dos produtores brasileiros, representados pelos estados do Paraná, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Piauí não chega a 45%. Isso representa uma diferença da ordem de 57,8 sacas por hectare. Mesmo que apenas parte dessa diferença possa ser obtida com a melhoria do manejo das lavouras de soja, isso indicaria um ganho de quase 29 sacas por hectare, elevando a média nacional a aproximadamente 82 sacas por hectare. Como isso poderia ser alcançado? Observando-se os manejos adotados pelos agricultores das áreas campeãs. Ao se analisar os dados do Cesb observa-se que todos os campeões de produtividade, não apenas deste ano, mas de todos os demais, foram aqueles que investiram em perfil de solo, alicerçando-o nos aspectos químicos, físicos e biológicos mais adequados, ajustando o genótipo e o manejo nutricional de acordo com os ambientes de produção (clima e solo), empregando insumos (sementes, adubos e defensivos) de qualidade garantida e posicionando-os, no caso dos herbicidas, inseticidas e fungicidas, nos momentos mais adequados e quando necessário. Assim, as lições que os resultados do Desafio de Máxima Produtividade do Cesb da safra 2019/20 deixam são de que apenas fazer o básico não trará resultados diferentes daqueles já observados no cenário nacional, mantendo as EAs em torno de 40%. É preciso ir além disso, quebrar o paradigma da média nacional ficar nas 50-55 sacas por hectare. É necessário entender os ambientes de produção e adequar-se de modo a extrairmos o que proporcionam. É preciso se desafiar a cada safra para fazer da sojicultura naC cional a campeã mundial de produtividade.
foi em Baixa Grande do Ribeiro, Piauí, com EC = 71,4%, enquanto a situação mais favorável ocorreu em Patrocínio, Minas Gerais, onde a EC atingiu mais de 96%, indicando que, nessa região, a cultura da soja praticamente não sofreu com déficit hídrico. Na área do campeão irrigado, a EC foi da ordem de 84%, o que se deveu aos 129mm de água fornecidos ao longo do ciclo, o que resultou em ganho de aproximadamente 4,5kg/ha de soja por milímetro de água aplicada. No caso das EAs, todas as regiões apresentaram elevados valores, acima de 66%, o que indica condições de manejo muito boas, já que é muito difícil se atingir uma EC de 100% em condições operacionais. A maior EA (91,2%) foi observada na região de Baixa Grande do Ribeiro, Piauí, seguida do campeão nacional em Mangueirinha, Paraná, com 89,8%, e do campeão do Centro-Oeste, em Campos de Júlio, Mato Grosso, Paulo Cesar Sentelhas com 88,1%. Nas áreas dos campeões das regiões Sul e Sudeste, Esalq/USP – Agrometeorologia as EAs foram um pouco menores, respectivamente, 66,8% e 73%. Membro Efetivo do Cesb Quando se analisam os dados provenientes da Conab, conclui-se que a realidade nacional ainda é bastante diferente do que se observa para os Tabela 1 - Dados das áreas campeãs do Desafio Nacional de Máxima Produtividade do Cesb e campeões do Cesb. As maiores diferenças produtividades médias estaduais de acordo com o relatório da Conab de julho de 2020 estão nos valores das EAs, com exceção para Ciclo (dias) Prod. Estadual (sc/ha) Prod. CESB (sc/ha) Local e Estado Data semeadura Data colheita o estado do Rio Grande do Sul, onde a es130 62,91 118,82 Mangueirinha, PR 14/10/2019 21/02/2020 tiagem ocorrida neste ano afetou também 130 60,57 118,63 Patrocínio, MG 28/11/2019 06/04/2020 os valores de EC. Na Tabela 2, observa-se 146 30,65 111,93 B.V. das Missões, RS* 19/10/2019 13/03/2020 116 59,03 103,19 Campos de Júlio, MT 25/10/2019 18/02/2020 que as EAs dos estados em que se encon120 52,15 101,79 B. G. do Ribeiro, PI 18/11/2019 17/03/2020 tram as áreas campeãs são bem menores 53,06 110,87 Médias que os valores obtidos pelos agricultores campeões, considerando-se que no estado * Essa localidade corresponde à área do Campeão irrigado. haja condições similares de clima e solo. Tabela 2 - Produtividades potencial (PP), atingível (PA) e real (PR) para os campeões do Desafio Mesmo sabendo-se das limitações dessa Nacional de Máxima Produtividade do Cesb e para seus respectivos estados, com PR proveniente do análise mais generalizada, pode-se ver que relatório da Conab de julho de 2020, e as eficiências climática (EC) e agrícola (EA) para cada situação as EAs médias dos estados oscilam entre ESTADO CESB 34% e 51%, muito aquém do observado Local e Estado PP2 PR PA2 EC EA PA2 PR EC EA Sacas/ha % Sacas/ha % nas áreas campeãs, entre 66% e 91%. Isso Mangueirinha, PR 176,2 118,8 132,3 75,1 89,8 132,3 62,9 75,1 47,5 indica que dentre as variáveis que afetam Patrocínio, MG 168,8 118,6 162,4 96,3 73,0 162,4 60,6 96,3 37,3 a produtividade da soja nas diferentes regiB.V. das Missões, RS 199,1 111,9 167,6 84,2 66,8 90,0 30,7 45,2 34,1 ões brasileiras, o manejo agrícola vem senCampos de Júlio, MT 130,8 103,2 117,1 89,6 88,1 117,1 59,0 89,6 50,4 do aquele que mais tem limitado a cultura, B. G. do Ribeiro, PI 156,2 101,8 111,6 71,4 91,2 111,6 52,1 71,4 46,7 dadas as grandes diferenças apresentadas 1 Os valores de PP e a PA estaduais foram admitidos como sendo iguais aos obtidos nas áreas campeãs, com exceção do estado do Rio Grande do Sul, na Tabela 2. Enquanto, na média, as áreas onde a estiagem reduziu a PA em grande parte do estado. 2 Os valores de PP e PA foram obtidos do Sistema Agrymax da empresa Agrymet. 20
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Especial Cesb Fotos Tony Oliveira/CNA
Resultado sustentável Para ser campeão não basta produzir, tem que ser sustentável. Análises do Desafio Cesb mostram que vencedores diminuíram o impacto ambiental e aumentaram a sua rentabilidade
E
m julho passado, durante o Fórum Nacional de Máxima Produtividade de Soja realizado pelo Comitê Estratégico Soja Brasil (Cesb) foram apresentados os campeões regionais e o campeão nacional de produtividade de soja, da safra 2019/20. As condições de inscrição no Desafio Cesb sempre exigiram do produtor o compromisso de respeito à legislação ambiental e trabalhista. De outra parte, a importância da sustentabilidade financeira sempre foi um mote importante e um estímulo para todo o participante do Desafio. Anualmente, junto com a descrição do sistema de produção dos campeões, o Cesb apresenta a taxa de retorno financeiro, representada pela relação entre renda líquida e custo de produção. Para facilitar a compreensão, o índice é expresso em reais retornados para cada real investido. Este número sempre foi positivo, elevado e superior ao retorno confrontado com um comparador, que pode ser o restante da propriedade do agricultor ou o retorno de um produtor representativo da região. Para tanto, o Cesb conta com o apoio do Cepea/Esalq/USP. A partir deste ano o Cesb contará com mais uma ferramenta, para aquilatar a sustentabilidade dos campeões de produtividade de soja. Trata-se do índice de ecoeficiência, que leva em consideração a temática ambiental - baseada em 11 critérios - e a sustentabilidade econômica, utilizando o índice de retorno sobre o capital investido na lavoura.
22
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
OS CAMPEÕES
Entendemos que a produtividade obtida em campo é o resultado do potencial genético da cultivar de soja, descontados os efeitos dos estresses bióticos e abióticos, otimizando-se o sistema de produção para cada caso. Obter um pico de produtividade exige uma conjunção de fatores agronômicos e climáticos. Além de um sistema de produção adequado- que se fundamenta em seguir, rigorosamente, as recomendações técnicas- é necessário contar com a conjunção de temperatura adequada e chuva suficiente e bem distribuída. Por óbvio, o produtor não pode moldar o clima às suas necessidades, mas pode utilizar tecnologias que eliminem ou mitiguem os efeitos adversos. Um caso típico é o cultivo em um perfil de solo profundo, sem compactação, com fertilidade e acidez adequadas, com bom teor de matéria orgânica, arejado e com alta capacidade de retenção de água. Isto permite suportar diver-
sos dias de estiagem, valendo-se do suprimento de água do solo. Mas, são os detalhes e os cuidados do sistema de produção que fazem a diferença. Solos com perfil profundo, sem compactação, sem problemas de acidez ou fertilidade, arejados, com bom teor de matéria orgânica. O plantio direto é fundamental. Seguir, rigorosamente, as recomendações técnicas, utilizar os insumos na quantidade adequada e no momento correto, selecionar a cultivar apropriada ao local, valendo-se de semente de alta qualidade, semeando-a no período recomendado, com espaçamento e densidade compatíveis. Segue-se um bom manejo da cultura, em especial
cuidados com o manejo fitossanitário – nem falta nem excesso – até a colheita, onde evitar as perdas é a recomendação final.
ALTA PRODUTIVIDADE É ESFORÇO CONJUNTO
O Desafio Cesb é uma construção conjunta, que envolve produtores, consultores, pesquisadores e demais profissionais que pugnam por um incremento na produtividade sustentável da soja, no Brasil. Houve um avanço enorme neste tema durante os 12 anos de existência do Cesb. A comprovação dos avanços é verificável por números. Lá no início, na safra 2008/09, a maior produtividade obti-
Tabela 1 - Resultados do Desafio Cesb de Máxima Produtividade - 2019/20 Produtor Laércio Dalla Vechia Antônio de Oliveira Neto Elizeu José Schaedler Elton Zanella Condomínio Milla
Região S SE S* CO N-NE
Produtividade kg/ha 7.129 7.118 6.716 6.191 6.107
Média 1,50:1 1,80:1 1,20:1 1,40:1 1,40:1
Campeão 2,80:1 2,70:1 2,10:1 1,80:1 3,20:1
Retorno Econômica 46% 31% 41% 10% 58%
Ambiental 24% 48% 22% -94% 55%
* Lavoura irrigada
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
23
um entusiasta de tecnologias adequadas e sustentáveis. Para a mesma região, porém na soja irrigada, o Elizeu José Schaedler chama a atenção para todos esses fatores, mais a plantabilidade e o capricho na execução das práticas agrícolas. Na região Sudeste, o Antonio de Oliveira Neto lembra de todos os fatores anteriores, mas destaca que, além da tecnologia, o clima adequado é fundamental, se faltar água na quantidade adequada e na hora certa, a soja sofre. No caso do Centro-Oeste, o Elton Zanella lembra também da qualidade das sementes (vigor e poder germinativo), além do que os outros campeões mencionaram. E o campeão do Nordeste, lá do Piauí, reconhece todas as questões colocadas pelos anteriores, lembrando que a prática contínua e o aprendizado acumulado a cada ano ajudam a construir um sistema de produção de soja de alta produtividade. Em conclusão, mais do que os números frios da produtividade, o que nos entusiasma nos resultados do Desafio são os ganhos de ecoeficiência, pois as análises mostram que os campeões diminuem o impacto ambiental e aumentam a sua rentabilidade. Isto é o que denominamos de incremento sustentável da produtividade, absolutamente em linha com as demandas do mercado. Ou seja, para ser um campeão não basta ter alta produtividade, é preciso ser sustentável. C
da foi de 4.968kg/ha. Neste ano foram 7.129kg/ha e o recorde nacional é de 8.946kg/ha. Considerados os dez produtores com produtividade mais alta, a média passou de 4.668kg/ha (2008/09) para 7.116kg/ha (2018/19). Porém, é interessante confrontar os números obtidos pelos participantes do desafio com a média brasileira, aferida pela Conab. Considerada a média dos primeiros colocados no Desafio, ao longo de 12 anos, ela se situa 133% acima da média brasileira do período. Mas, ser campeão de produtividade é um evento que exige conjugação de diversos fatores. Então consideremos os dez melhores participantes: ao longo de 12 anos, eles produziram, em média, 107% acima da média brasileira. Podemos até considerar que estes dez produtores sejam uma elite, então olhemos para a média dos 100 primeiros colocados, ao longo das edições do Desafio: eles produziram 75% acima da média brasileira. Permitimo-nos concluir que, se esta centena de produtores conseguiu repetir anualmente o feito, utilizando tecnologia comercial disponível a todos. Qualquer produtor brasileiro pode ambicionar o mesmo fato. Se não forem os 75%, que seja metade disto, 37,5% já nos confeririam um índice de sustentabilidade ímpar no mundo. E sustentabilidade é sinônimo de passaporte para a abertura de novos mercados e de consolidação dos já existentes.
DIFERENCIAIS
Não existe bala de prata que permita obter altas produtividades. Nas palavras dos próprios campeões, manejo do solo, rotação de culturas, plantio direto, calcário e gesso, características adequadas do solo fizeram a diferença. Esta é a opinião do campeão do Sul, o Laércio Dalla Vechia, Cesb
Divulgação
Décio Luiz Gazzoni Embrapa Membro fundador do Cesb
Índice de ecoeficiência passou a ser medido pelo Cesb a partir deste ano
24
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Gazzoni chama a atenção para a importância da sustentabilidade ambiental e econômica na produção de soja
Capa
A
s lagartas do gênero Helicoverpa abrangem pragas que atacam diversas culturas de importância econômica. Dentre elas, a espécie Helicoverpa armigera é considerada a de maior relevância, por ser extremamente polífaga e se alimentar tanto de órgãos vegetativos quanto reprodutivos de seus hospedeiros. Para o controle de lagartas de H. armigera, existem disponíveis no mercado várias moléculas químicas, que podem ser utilizadas em diferentes cultivos. No entanto, vale destacar que para o manejo dessa praga no Brasil, existe uma carência de produtos registrados para o seu controle, bem como são poucos os trabalhos de controle desenvolvidos, em razão de sua recente constatação no País. Como essa praga foi detectada na região do Cerrado, causando grandes prejuízos econômicos, vários produtos foram disponibilizados pelo Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em caráter emergencial, para o seu manejo. No entanto, a recomendação destes produtos a campo somente será segura através da comprovação experimental de sua eficiência de controle dessa praga. Além dos ingredientes químicos disponíveis no mercado, os inseticidas biológicos consti-
Efeito de inseticidas A urgência em estabelecer estratégias rápidas de manejo levou à liberação emergencial de vários produtos para conter os prejuízos agressivos da lagarta Helicoverpa armigera logo após o ingresso da praga no Brasil. A medida foi necessária, mas estudos para a comprovação experimental de eficiência a campo precisam ser realizados para validar a recomendação segura contra este inseto
tuem uma alternativa promissora para o manejo de H. armigera, principalmente devido ao baixo impacto no ambiente, à seletividade para organismos não alvos, como também pelo apelo da população
para o desenvolvimento de uma agricultura mais sustentável e ecologicamente correta. Conduziu-se uma pesquisa no laboratório de Entomologia da Embrapa
Cecília Czepak
26
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Dirceu Gassen
Agropecuária Oeste, em Dourados, Mato Grosso do Sul, que teve como objetivo avaliar a eficiência de controle de sete inseticidas químicos e um biológico no controle de lagartas, pequenas e grandes, de H. armigera em condições de laboratório. Como substrato para alimentação das lagartas de H. armigera, a cultivar de feijão Phaseolus vulgaris L., "BRS Estilo", foi semeada em vasos plásticos contendo uma mistura de terra, areia e substrato orgânico em casa de vegetação. Quando o feijoeiro apresentava a 3ª folha trifoliada completamente desdobrada, essas folhas foram retiradas das plantas, higienizadas e cortadas em discos foliares com área de 12,56cm², utilizando-se para isso um vazador metálico. Em seguida, os discos foliares foram imersos na calda inseticida contendo os diferentes tratamentos e suas respectivas doses a serem testadas (Tabela 1), por aproximadamente cinco segundos e depois retirados e dispostos para secagem sobre papel-toalha. Posteriormente, esses discos foram oferecidos às lagartas, pequenas (<1,5cm) e grandes (>1,5cm) de H. armigera mantidas em placas de Petri (6cm diâmetro x 1,3cm altura) por um período de sete dias, sendo a reposição dos discos foliares na placa de Petri realizada sempre que necessário, em função do grau de consumo das lagartas. As lagartas de H. armigera, utilizadas no bioensaio, foram provenientes da criação em dieta artificial do Laboratório de Entomologia da Embrapa Agropecuária Oeste. O ensaio foi conduzido no delineamento inteiramente casualizado, com nove tratamentos (sete inseticidas químicos, um biológico e a testemunha) em quatro repetições. Cada unidade experimental (repetição) foi constituída pelo agrupamento de cinco lagartas, pequenas ou grandes, de H. armigera. As avaliações de mortalidade de lagartas foram realizadas aos um, três, cinco, e sete dias após a imersão (DAI) dos discos foliares nos diferentes tratamentos, determinando-se o número de lagartas mortas (N) após o contato com os discos foliares tratados ou não. A eficiência de controle (E%), em cada tratamento, foi calculada empregando-se a fórmula de Abbott (1925). Os dados de mortalidade obtidos foram submetidos à análise de
Ainda existem poucos produtos registrados contra H. armigera no Brasil
variância e as médias dos tratamentos comparados pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. Os resultados obtidos no primeiro dia após o contato das lagartas com os discos foliares de feijão imersos nos inseticidas (1 DAI) mostraram que os tratamentos químicos clorfenapir (288g i.a./ha) e indoxacarbe (120g i.a./ha), seguidos pelo benzoato de emamectina (10g i.a./ha), foram os que apresentaram os maiores valores de efeito de choque para o controle de lagartas pequenas de H. armigera, em comparação à testemunha e a alguns dos tratamentos químicos avaliados no ensaio (Tabela 2 e Figura 2). Aos 3 DAI, apenas os tratamentos flubendiamida (72g i.a./ha), clorantraniliprole + lambda-cialotrina (30 + 15 g i.a./ha) e B. thuringiensis (500g i.a./ha) não apresentaram controle significativo de lagartas pequenas quando comparados ao tratamento testemunha, enquanto os demais tratamentos químicos proporcionaram, relativamente, altos níveis de controle de lagartas pequenas, com destaque para o tratamento clorfenapir (288g i.a./ha), que apresentou 100% de controle (Tabela 2 e Figura 2). Já aos cinco e sete DAI todos os tratamentos químicos apresentaram controle significativo de lagartas pequenas em relação ao tratamento testemunha, sem diferirem entre si. Aos sete DAI não havia nenhuma lagarta pequena sobrevivente na placa de Petri dos diferentes tratamentos químicos e biológico testa-
dos (Tabela 2 e Figura 3). Com relação à eficiência de controle de lagartas grandes, verificou-se que na primeira avaliação (1 DAI), os tratamentos químicos clorfenapir (288g i.a./ha), indoxacarbe (120g i.a./ha) e benzoato de emamectina (10g i.a.) apresentaram os menores números de lagartas sobreviventes, quando comparados à testemunha (Tabela 3), à semelhança do observado para lagartas pequenas, proporcionando porcentagens de controle de 60%, 55% e 70%, respectivamente (Figura 4). Já os demais tratamentos químicos ou biológicos avaliados apresentaram níveis de sobrevivência de lagartas grandes semelhantes ao observado no tratamento testemunha, nesta época de avaliação. Aos três DAI, os tratamentos flubendiamida (72g i.a./ha), clorantraniliprole + lambda-cialotrina (30 + 15 g i.a./ha) e B. thuringiensis (500g i.a./ha) não apresentaram controle significativo de lagartas grandes em comparação ao tratamento testemunha, à semelhança do também observado para lagartas pequenas com estes mesmos tratamentos (Figuras 2 e 4). Nos demais tratamentos químicos foram observados maiores níveis de redução populacional de lagartas grandes, com destaque novamente para os tratamentos clorfenapir (288g i.a./ha) e benzoato de emamectina (10g i.a./ha) que apresentaram as maiores eficiências de controle de lagartas grandes (Figura 3). Aos cinco DAI, todos os tratamentos
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
27
Figura 2 - Percentagens médias de controle de lagartas pequenas (<1,5cm) de H. armigera aos 1 e 3 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os diferentes inseticidas químicos e biológico (em g i.a./ ha). Dourados/MS, 2019
Figura 3 - Percentagens médias de controle de lagartas pequenas (<1,5cm) de H. armigera aos 5 e 7 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os diferentes inseticidas químicos e biológico (em g i.a./ ha). Dourados/MS, 2019
Nas colunas seguidas de mesma letra, as médias não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (p < 0,05).
Nas colunas seguidas de mesma letra, as médias não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (p < 0,05).
químicos ou biológicos avaliados no ensaio reduziram significativamente a população de lagartas grandes de H. armigera, em relação ao tratamento testemunha (Tabela 3), sendo observados níveis de controle variando entre 77,8% e 100% (Figura 5). Na última avaliação de mortalidade, realizada no ensaio (sete DAI), todas as lagartas grandes de H. armigera já tinham morrido em função da ação dos inseticidas, proporcionando 100% de mortalidade em todos os tratamentos químicos ou biológico testados (Figura 5). O uso de inseticidas químicos e/ou biológicos tem se apresentado como uma importante ferramenta para ser empregada no manejo de diversos insetos-praga nos diferentes cultivos em que ocorrem. De acordo com as normas de recomendação de produtos do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa),
os inseticidas químicos ou biológicos, liberados no Brasil, precisam apresentar um nível médio de controle superior ou igual a 80% das pragas alvos para que os produtos possam ser considerados eficientes do ponto de vista agronômico. Diante dos resultados obtidos neste trabalho, pode-se inferir que os tratamentos químicos ou o biológico testados foram eficientes para o controle de lagartas pequenas e grandes de H. armigera, visto que, de modo geral, na última avaliação de mortalidade, realizada aos sete DAI, todas as lagartas de H. armigera (de ambos os tamanhos) já tinham morrido em função da ação dos inseticidas testados. O grau de eficiência de controle de um produto é de extrema importância no manejo de lagartas logo no início da ocorrência da praga na cultura, ou seja, quando predominam ainda lagartas pe-
Figura 4 - Percentagens médias de controle de lagartas grandes (>1,5cm) de H. armigera aos 1 e 3 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os diferentes inseticidas químicos e biológico (em g i.a./ha). Dourados/MS, 2019
Figura 5 - Percentagens médias de controle de lagartas grandes (>1,5cm) de H. armigera aos 5 e 7 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os diferentes inseticidas químicos e biológico (em g i.a./ha). Dourados/MS, 2019
Nas colunas seguidas de mesma letra, as médias não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (p < 0,05).
Nas colunas seguidas de mesma letra, as médias não diferem estatisticamente pelo teste de Tukey (p < 0,05).
28
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
quenas, com o objetivo de evitar maiores danos às lavouras causados pelas lagartas grandes. Todavia, neste trabalho, em que foi avaliada a eficiência de controle sobre lagartas pequenas e grandes de H. armigera, o tamanho da lagarta aparentemente não foi influenciado quanto à suscetibilidade aos ingredientes ativos testados. Dentre os produtos testados nas quatro avaliações de controle realizadas, os que apresentaram menor efeito de choque foram a flubendiamida, ciantraniliprole + lambdacialotrina e o B. thuringiensis. Os inseticidas químicos do grupo das diamidas (flubendiamida e clorantraniliprole), quando em contato com o inseto, ligam-se aos receptores de rianodina nas células dos músculos, provocando a abertura dos canais de cálcio, causando inicialmente cessação da alimentação, paralisia e somente após algum tempo é que ocorre a morte do inseto. Esse modo de ação específico das diamidas explica o efeito retardado de choque observado tanto para lagartas pequenas quanto grandes neste trabalho. É de conhecimento que o inseticida biológico B. thuringiensis somente apresenta eficiência satisfatória no controle de lagartas após uma semana da sua aplicação, o que explica a reduzida mortalidade observada, para ambos os tamanhos de lagartas, nas primeiras avaliações para o controle de H. armigera. Esse baixo efeito de choque do B. thuringiensis, após sua exposição às lagartas, está relacionado ao seu mecanismo de ação, uma vez que este produto atua no epitélio intestinal da lagarta, interrompendo a sua ali-
mentação em poucas horas após o início da exposição, não causando a sua morte imediata na fase inicial da contaminação, como foi também observado para os inseticidas testados do grupo das diamidas. De um modo geral, os resultados aqui obtidos evidenciam que os inseticidas químicos e o biológico testados apresentam potencial de uso para o controle de lagartas de H. armigera, não somente na fase inicial do desenvolvimento das lagartas, mas também naquelas mais desenvolvidas. Todavia, cabe ressaltar que os resultados desta pesquisa foram decorrentes de um trabalho conduzido em condições de laboratório e que necessita ser reproduzido em condições de campo para garantir uma recomendação mais segura. Em adição, é importante ressaltar que para o sucesso no controle de qualquer tipo de praga, é necessário realizar antecipadamente o seu monitoramento adequado na área, bem como selecionar inseticidas que preservam os inimigos naturais e o meio ambiente, princípios esses fundamentados nos preceitos do C Manejo Integrado de Pragas.
Crébio José Ávila, Embrapa Agropecuária Oeste Marizete Cavalcante de Souza Vieira, Elizete Cavalcante de Souza Vieira, Paula Gregori Silva e Ivana Fernandes da Silva, Universidade Federal da Grande Dourados Nátaly Diane Rocha da Silva, Instituto Federal de Mato Grosso do Sul Izabela Carla Vessoni e Giovane Franco Rodrigues, Centro Universitário da Grande Dourados Tabela 1 - Inseticidas químicos e biológicos (g i.a./ ha) utilizados no controle de lagartas pequenas e grandes de Helicoverpa armigera, em condições de laboratório. Dourados/MS, 2019 Tratamento Flubendiamida Clorantraniliprole + lambda-cialotrina Clorfenapir Espinetoram Indoxacarbe Benzoato de emamectina Metomil Bacillus thuringiensis Testemunha
Dose (g i.a./ha) 72,0 30,0 + 15,0 288,0 18,0 120,0 10,0 322,5 500,0 ---
Tabela 2 - Número médio de lagartas pequenas (<1,5cm) sobreviventes (N) de H. armigera nas avaliações de 1, 3, 5 e 7 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os inseticidas químicos e o biológico. Dourados/MS, 2019 Tratamentos (dose em g i.a./ha)
1 DAT
3 DAT
5 DAT
7 DAT
0,3 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 3,8 a 53,0
0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 3,8 a 40,0
N
Flubendiamida (72,0) Clorantraniliprole + lambda-cialotrina (30,0 + 15,0) Clorfenapir (288,0) Espinetoram (18,0) Indoxacarbe (120,0) Benzoato de emamectina (10,0) Metomil (322,5) Bacillus thuringiensis (500,0) Testemunha CV(%)
4,5 abc 4,5 abc 1,3 d 2,5 bcd 1,5 d 2,3 cd 2,8 bcd 4,8 ab 5,0 a 29,9
4,5 a 3,8 a 0,0 b 0,8 b 1,0 b 0,5 b 0,3 b 4,8 a 5,0 a 30,5
Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem estatisticamente, entre si, pelo teste de Tukey (p < 0,05).
Tabela 3 - Número médio de lagartas grandes (>1,5cm) sobreviventes (N) de H. armigera nas avaliações de 1, 3, 5 e 7 dias após o tratamento (DAT) com os discos foliares do feijoeiro contendo os inseticidas químicos e o biológico. Dourados/MS, 2019 Tratamentos (dose em g i.a./ha)
1 DAT
3 DAT
5 DAT
7 DAT
1,0 b 0,8 b 0,0 b 0,0 b 0,5 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 4,5 a 66,7
0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 0,0 b 4,3 a 35,3
N
Ávila aponta para a necessidade de novos estudos em condições de campo
Flubendiamida (72,0) Clorantraniliprole + lambda-cialotrina (30,0 + 15,0) Clorfenapir (288,0) Espinetoram (18,0) Indoxacarbe (120,0) Benzoato de emamectina (10,0) Metomil (322,5) Bacillus thuringiensis (500,0) Testemunha CV(%)
5,0 a 5,0 a 2,0 b 3,5 ab 2,3 b 1,5 b 3,3 ab 5,0 a 5,0 a 25,8
4,8 ab 3,8 abc 0,0 e 2,5 bcd 1,5 cde 0,5 de 1,8 cde 4,8 ab 5,0 a 36,0
Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem estatisticamente, entre si, pelo teste de Tukey (p < 0,05).
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
29
José Roberto Parra
Pragas
Avanço biológico Tendência mundial, o controle biológico tem crescido ao longo dos anos no Brasil, especialmente como parte do manejo integrado de pragas. Contudo, um dos grandes desafios consiste em desenvolver um modelo específico para regiões tropicais, alicerçado em critérios científicos sólidos e que respeitem particularidades e diferenças de outras partes do mundo
Q
uando se fala em controle de pragas no Brasil, o agricultor, de um modo geral, pensa em agroquímicos. É uma “cultura” arraigada no brasileiro que sempre foi difícil de mudar. É um tipo de controle que vem sendo utilizado desde 1939, após a descoberta das propriedades inseticidas do DDT por Paul Müller, pesquisa que lhe rendeu um prêmio Nobel. A partir daí, criou-se uma “cultura familiar” de que todos os problemas agrícolas seriam resolvidos com o uso de agroquímicos. Por mais que se fale em alternativas de controle, o agricultor brasileiro gosta de aplicar um produto químico e ver a praga morta no solo. A Entomologia Econômica brasileira nasceu e cresceu com base em métodos químicos. Entretanto, são claros os resultados negativos decorrentes de uma aplicação inadequada de produtos químicos. Devido à ocorrência crescente de problemas, começaram a surgir pesquisadores preocupados em resolvê-
30
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
-los; entre eles, destacou-se a bióloga Rachel Carson, que em 1962 publicou o livro Primavera Silenciosa (Silent Spring) que chamava, de forma contundente, a atenção para as consequências da utilização incorreta dos produtos químicos. Seguiram-se outros trabalhos e no final da década de 1960 surgiram pesquisas com a filosofia de Manejo Integrado de Pragas (MIP), que previa a utilização de um conjunto de medidas para manter a população das pragas abaixo do nível de dano econômico, levando-se em conta critérios econômicos, ecológicos e sociais. Alguns pesquisadores americanos se destacaram, dentre eles Marcos Kogan, brasileiro radicado na Universidade de Illinois, EUA, que transferiu a tecnologia para a soja, que estava em plena expansão no Brasil, o que fez com que esta cultura fosse uma das primeiras a utilizar o MIP no País.
SENASA
Como parte do conjunto de medidas que compõe o MIP, o Controle Biológico, ocupa, ao lado de feromônios, métodos culturais, plantas transgênicas etc., lugar de destaque, sendo que os químicos, desde que adequadamente utilizados, podem ser incluídos, como produtos seletivos que matam as pragas, mas não os inimigos naturais. O Controle Biológico como técnica aplicada teve seu início com a introdução da joaninha australiana (Rodolia cardinalis) para controlar o “pulgão branco” do citros em pomares na Califórnia. Os estudos que culminaram com essa introdução foram desenvolvidos na universidade da-
quele estado americano, considerado o berço do Controle Biológico moderno. Esta mesma universidade realizou em 1989, em Riverside, um simpósio para comemoração do centenário da primeira introdução bem-sucedida de um inimigo natural para controle de uma praga. No entanto, a ação de inimigos naturais para controle de pragas já é conhecida desde a antiguidade, pois antes de Cristo, os chineses transportavam colônias de formigas predadoras para controle de lagartas em citros. Controle Biológico (CB) pode ser tecnicamente definido como “fenômeno natural que consiste na regulação de plantas e animais por organismos vivos, chamados agentes de mortalidade biótica”. Toda planta e todo animal possuem seu agente de Controle Biológico. Mas o homem, nos primórdios das humanidade, desequilibrou o sistema, que estava todo em harmonia, para obtenção de alimentos em larga escala, fazendo com que, atualmente, por exemplo, grandes áreas contínuas de soja, arroz, feijão etc. fossem plantadas. Ao lado disso começaram as aplicações indiscriminadas de produtos químicos, intensificando o desequilíbrio. O que preconiza atualmente é utilizar o CB, não necessariamente isolado, mas em muitas culturas, como parte do MIP, para reequilibrar o sistema. Existem diferentes agentes de Controle Biológico, que podem ser divididos em macro e micro-organismos. Didaticamente pode-se dizer que o primeiro grupo corresponde àqueles que podem ser vistos a olho nu, como insetos e ácaros. Já os micro são aqueles visíveis apenas em microscópios e são compostos por fungos, vírus, bactérias, nematoides etc. Todos, sejam macro ou micro-organismos, demandam tecnologia para sua produção com qualidade e em larga escala. No caso dos macros, o maior gargalo é a automação de produção do agente de
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
31
Fotos José Roberto Parra
Assim como as plantas, todo animal possui seu agente de controle biológico
controle biológico, pois, atualmente, de 70% a 80% do custo de produção destes agentes de controle se deve à mão de obra. Já no caso dos micros, o fator de maior importância é a formulação. Na prática, o agricultor dá preferência aos micro-organismos, pois são mais semelhantes, na aplicação, aos químicos, tendo ainda um “tempo de prateleira” (shelf-life), ou seja, você pode comprar uma caixa de um produto contendo um fungo e utilizá-lo dentro de alguns meses. Isto não ocorre para macro-organismos, pois devem ser produzidos e liberados, caso contrário, os agentes biológicos morrem em pouco tempo. O Brasil é um produtor de “commodities” e, portanto, um grande exportador. Para continuidade deste “status” é fundamental a adoção de práticas como o Controle Biológico, pois os mercados internacionais vêm exigindo, cada vez mais, produtos sem resíduos. Sustentabilidade é a palavra “mágica” hoje em dia. E restrições, inclusive políticas, tendem a aumentar cada vez mais para atender a essa sustentabilidade. O Brasil tem um tipo de agricultura que não é fácil para se fazer Controle Biológico, pois são grandes áreas e com plantios sucessivos de diferentes culturas. As pragas se sucedem e aumentam sua população local sem precisar migrar para outras culturas. Então, assim como o País é líder em Agricultura Tropical, pode se tornar líder em Controle Biológico para regiões tropicais. Este é o grande desafio: desenvolver um modelo de CB adequado às condições tropicais, pois grande 32
parte das estratégias de CB foi desenvolvida para cultivos protegidos, como na Europa. Portanto, não dá para, simplesmente, copiar modelos de outros países. É preciso desenvolver um programa próprio para a agricultura brasileira em campos abertos (open fields), em que um único agricultor planta milhares de hectares de uma única cultura (milho, soja etc.). É preciso para aumentar a utilização do CB, mudar a “cultura do agricultor”. E para isto, é necessário divulgar o que realmente é o Controle Biológico. Existem ainda muitos mitos (Parra, 2019). O principal deles é que essa “cultura” do agricultor não pode ser mudada; outro é de que o CB é “coisa fácil”; que o custo deve ser mais barato que o controle químico (sem considerar as vantagens ecológicas e sociais); que é um método a longo prazo (baseando-se no início do CB,
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
onde não existiam técnicas de criações massais de insetos e que, portanto, os insetos tinham de se multiplicar na cultura, pois eram liberados em pequenas quantidades e desse modo só serviriam para culturas perenes ou semiperenes) e que o CB seria a solução única e não parte de um programa de MIP, atualmente preconizado. A facilidade mencionada como mito pode levar a fracassos, principalmente para micro-organismos, cuja produção, se não realizada de forma criteriosa, tende a levar a problemas de contaminação do produto e a uma baixa eficiência. A “cultura” felizmente está mudando, pois no ano passado o CB movimentou cerca de R$ 500 milhões no mercado brasileiro, valor ainda pequeno se comparado aos químicos. Mas o aumento desta movimentação virá com a mudança da “cultura”. E há um marco para esta grande mudança. Em 2013, foi encontrada, pela primeira vez no Brasil, Helicoverpa armigera, praga com mais de 200 hospedeiros que ataca algodoeiro, soja, citros, milho etc. À época não existia nenhum produto químico registrado para a praga. E o agricultor teve que usar um vírus já comercializado em outros países e o Trichogramma pretiosum como parasitoide de ovos. Ambos funcionaram muito bem! Pena que a oferta destes insumos não atendeu a todos os interessados na época. Essa mudança vem acompanhada do surgimento de pequenas empresas de CB, como (startups) (Bug Agentes Biológicos e Promip, ambas saídas da USP/Esalq, por exemplo) e de grandes, como a Koppert, maior empresa de CB do mundo que entrou no País em 2010. Atualmente, quase todas as empresas de
Figura 1 - Principais linhas de pesquisa do SPARCBio
Figura 2 - Etapas para desenvolvimento de um programa de Controle Biológico completo
Inimigos naturais têm papel importante no manejo de pragas
químicos têm um produto biológico no seu portfólio. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) tem um programa de incentivo às pequenas empresas (Pipe). Um grande número de startups de CB (cerca de 15) começou a aparecer. O aumento da oferta dos insumos biológicos permitirá o incentivo da utilização desta técnica de controle. São ainda poucos os produtos registrados no Brasil em relação aos 440 existentes no mundo. É interessante lembrar que já existiam empresas de CB no Brasil desde a década de 1980 em Alagoas (Biotech), posteriormente a Biocontrol (Sertãozinho-SP), entre outras, ao lado de laboratórios de usinas de cana-de-açúcar e laboratórios independentes produzindo parasitoides para o controle da broca da cana (Diatraea saccharalis). O que se faz em CB com macro-organismos é a liberação de uma grande quantidade de insetos ou ácaros para controle da praga. Portanto, há necessidade de domínio de técnicas de criação de dois insetos: a praga e o inimigo natural, às vezes com dietas artificiais que substituem o alimento natural para a praga. Este é o Controle Biológico Aumentativo (também chamado de Aplicado), que tem um efeito rápido sobre a praga, como os inseticidas, e é mais aceito pelo agricultor. Como são grandes áreas, há necessidade de se produzir grandes quantidades de insetos, que, muitas vezes, demandam sistemas automatizados. Existem outros tipos de CB para áreas menores, como o método de CB Clássico, que usa um inimigo natural exótico, liberando-se pequenas quantidades, e o resultado vem a longo prazo, porém é duradouro, servindo para culturas perenes e semiperenes. E o CB Conservativo, que é mais para pequenas áreas e tem por objetivo manter e, se possível, aumentar os inimigos naturais que já existem na área (aliado a outras técnicas como uso de produtos seletivos e manejo da resistência). E mais recentemente foi referido um novo procedimento em CB. O Manejo Externo (Diniz et al., 2019), em que o inimigo natural é liberado fora do local de cultivo (onde se deseja a redução da praga), e é utilizado para pragas transmissoras de doenças como o psilídeo dos citros (Diaphorina citri), que é vetor das bactérias causadoras do Huanglongbing (HLB) ou Greening. Neste caso, o
inimigo natural, o parasitoide (Tamarixia radiata) é liberado fora dos pomares comercias em locais onde há o foco da doença (nos quais os insetos contaminados se reproduzem), como pomares abandonados, orgânicos, áreas com murta (hospedeiro do psilídeo), fundos de quintal ou ainda áreas sem aplicação de inseticidas. O Brasil tem uma grande diversidade que pode ser explorada, tanto de macro quanto de micro-organismos. Estes micro-organismos já vêm sendo bastante utilizados, milhões de hectares são atualmente tratados com Trichoderma harzianum (fungo para controle de doença, mas também como nutriente para plantas), Metarhizium anisopliae, Beauveria bassiana, Bacillus thuringiensis, B. subtilis, Cordyceps fumosoroseus etc. para controle de cigarrinhas da cana, das pastagens, broca do café, mosca-branca, lagartas de modo geral e psilídeo dos citros, entre outros. Os vírus específicos são comercializados para diversos lepidópteros, e os ácaros para olerícolas e flores Dentre os macro-organismos, a cana-de-açúcar é a cultura onde se aplicam mais medidas de CB: para o controle da broca é utilizado o parasitoide larval Cotesia flavipes em mais de três milhões de hectares e o parasitoide de ovos Trichogramma galloi em mais de dois milhões de hectares. A espécie Trichogramma pretiosum vem sendo utilizada em algodoeiro e soja para lepidópteros, em abacateiro para Stenoma catenifer, em tomateiro para Tuta absoluta, em tabaco para Phthorimaea operculella. Outros parasitoides vêm sendo utilizados para controle do percevejo-marrom da soja (Euschistus heros), no caso, Telenomus podisi; T. remus e/ou Trichogramma pretiosum para controle de Spodoptera frugiperda com muitos outros agentes potenciais e em estudos em diferentes culturas. Em todos, dependendo, ainda, de uma maior produção e oferta dos parasitoides e de predadores ao agricultor. Uma lista de inimigos naturais utilizados no Brasil é apresentada na Tabela 1. Os avanços do CB são evidentes no Brasil com o aumento de massa crítica de interessados em estudar o tema, formados www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
33
desde a prospecção de novos agentes até a incorporação do CB em programas de MIP (Figura 1). Além da importância da pesquisa, este Centro, que possui coordenação do professor José Roberto Postali Parra, procurará difundir o CB em diferentes níveis, desde o pré-universitário, o universitário, a pós-graduação e obviamente até o agricultor. É óbvio que ainda há desafios, citados por Parra (2014), incluindo além da mudança da cultura do agricultor, problemas com a transferência de tecnologia ao campo; monitoramento de pragas, oferta dos insumos biológicos (necessidade de surgimento de mais empresas na área); qualidade do material biológico disponível, logística de armazenamento e transporte (considerando-se a extensão territorial do país); legislação própria e mais adequada; tecnologia de liberação, entre outros. Uma vez que a nova agricultura é muito dinâmica e envolve extensas áreas com transgênicos, estas deverão conviver, da melhor forma, com produtos biológicos. Estes obstáculos começam a ser transpostos em alguns itens como a liberação de macro-organismos e monitoramento de pragas e o agricultor
José Roberto Parra
nos últimos anos em cursos de pós-graduação. Esta é atualmente uma tendência mundial, pois há um anseio por uma agricultura sustentável em curto espaço de tempo. Portanto, há necessidade de investimentos, formação de recursos humanos e organização em torno do CB. Existiu até 2019 a Associação Brasileira de Controle Biológico (ABCBio), que concentrava as empresas que definiam as diretrizes sobre o assunto no Brasil. Recentemente esta associação foi incorporada pela CropLife que, de modo geral, é relacionada à proteção de cultivos. Investimentos começam a surgir. As grandes empresas de agroquímicos concentram esforços para terem produtos biológicos no seu portfólio. O governo começa a investir, havendo um grande programa de biocontroladores desenvolvido na Esalq, e apoiado pela Embrapii, ligado ao INCTI e ao pesquisador Ítalo Delalibera. Em fevereiro foi lançado o SPARCBio, Centro de Excelência de CB, no qual há uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP), a Fapesp e a empresa Koppert Biological Systems. O SPARCBio tem sede no Departamento de Entomologia e Acarologia da Esalq/USP e desenvolverá trabalhos
Tabela 1 - Lista de alguns agentes de CB atualmente utilizados na agricultura brasileira Macro-organismos Ácaros Neoseiulus californicus Phytoseiulus macropilis Stratiolaelaps scimitus Insetos
Cotesia flavipes Telenomus podisi Trichogramma galloi Telenomus remus Trichogramma pretiosum Podisus nigrispinus Trichogramma atopovirilia Cryptolaemus montrouzieri Tamarixia radiata Orius insidiosus Micro-organismos Fungos Metarhizium anisopliae Cordiceps fumosoroseus Beauveria bassiana Trichoderma harzianum Bactérias Bacillus thuringiensis Bacillus subtillis Vírus Baculovírus para diversas espécies
está se adaptando à Agricultura 4.0. Assim, em cana-de-açúcar, das áreas tratadas com T. galloi (> 2 milhões de hectares) 91% das liberações do parasitoide são feitas com uso de drones. Paralelamente, estudos com equipamentos adaptados aos drones permitirão a amostragem de pragas, para liberação de agentes de controle, com uso de sensoriamento remoto. O Brasil avança, entretanto, para que a sociedade não seja desapontada, os estudos de CB envolvem diferentes etapas e para tal desenvolvimento. Às vezes são necessários alguns anos, como o caso de Trichogramma, que exigiu 15 anos com pesquisas inter e multidisciplinares envolvendo desde a prospecção do agente de controle biológico, sua taxonomia, até avaliação do custo- benefício para sua oferta ao agricultor (Figura 2). Há estudos sendo iniciados em muitas áreas, e os desafios para regiões tropicais em “campos abertos” são diferentes de tudo o que já foi feito no mundo. Portanto, o grande desafio é desenvolver um modelo de CB para regiões tropicais feito com muito criC tério e ciência. José Roberto Postali Parra, Alexandre José Ferreira Diniz e Aloísio Coelho Júnior, USP/Esalq
34
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Empresa
Fotos Ubyfol
Crescimento sólido A
produção agropecuária é uma atividade extremamente dinâmica, competitiva e que vive em constante modificação. Para atender às demandas diárias do produtor é preciso oferecer soluções eficientes e sustentáveis e que realmente entreguem resultados e maior produtividade da lavoura. Este desafio tem sido a principal missão da Ubyfol, nos últimos anos. A empresa especialista em nutrição vegetal, com sede em Uberaba, no Triângulo Mineiro, passou por uma grande restruturação para se preparar para as demandas crescentes no agro. Hoje a marca está estre as líderes do segmento, com crescimento na casa dos dois dígitos, bem acima da média do mercado, e isso é resultado de um planejamento estruturado que começou lá atrás. Ao longo dos seus 35 anos, a empresa se dedica a desenvolver produtos para ajudar os produtores. De acordo com Fabrício Simões, diretor executivo da companhia, nos últimos sete anos foram estruturados novos e importantes pilares muito sólidos. Destes, os focos foram o sistema de controle, uma gestão eficiente e uma governança muito consistente, o que permitiu que as decisões e o fluxo de comunicação ocorressem de maneira organizada dentro da empresa. “Nos preparamos muito para dar um salto de crescimento e aumentar a nossa presença no mercado”, afirma. Este salto de crescimento contou com a construção de sua nova fábrica. Com cerca de 60 mil metros quadrados, além de ser uma das maiores do País no segmento de nutrição vegetal, é uma das mais modernas do mundo. Segundo Simões, o investimento foi de R$ 50 milhões na nova estrutura. “Nós temos também um aporte alto em pesquisa e desenvolvimento. Com o nível tecnológico muito alto que atingimos conseguimos olhar para o futuro e capturar as oportunidades que virão pela frente”, destaca o diretor. A nova fábrica tem outro importante diferencial, ela já é certificada pela ISO 9001 com controle de gestão da qualidade total e a ISO 9014, que diz a respeito às responsabilidades socioambientais. “Essas certificações mostram nossa responsabilidade com o nosso cliente e sem dúvida é um dos nossos diferenciais em um mercado tão competitivo”, cita o executivo. Simões destacou preparativos Outro importante para salto de crescimento 36
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Ao celebrar 35 anos a Ubyfol comemora conquistas após reestruturação do processo de gestão e governança e aumentar a força de vendas. Especialista em nutrição vegetal, a empresa agora foca na meta de continuar crescendo acima da média do mercado
diferencial da empresa é sua preocupação em levar produtos mais eficientes ao mercado. Para isso, além de uma estrutura fabril moderna, a Ubyfol mantém uma sólida parceria com a Faculdade de Agronomia de Uberaba (Fazu), onde há uma estação de pesquisa extremamente relevante. A área, que fica no interior da fazenda-escola da Fazu, é composta por 13 hectares, sendo que seis deles são destinados à estação de pesquisa da Ubyfol. Lá são cultivados soja e milho para avaliação de produtos ligados à nutrição complementar das plantas. Além de estrutura muito mais robusta, a Ubyfol focou no desenvolvimento de pessoas, remodelando sua força de vendas. Com a nova estratégia passou a ter mais profissionais espalhados por todo o País, ampliando a cobertura no território nacional. “Aumentamos em 100% a área de vendas com foco no cliente, para assim melhorar no nosso atendimento. Melhoramos também o acesso ao mercado e estruturamos a distribuição”, relata Simões.
INTERNACIONALIZAÇÃO E CRESCIMENTO
Uma das metas da empresa, além da liderança no mercado no Brasil, é a sua internacionalização. Para isso já realiza há 20 anos um trabalho focado no Paraguai. Segundo o executivo, a empresa já iniciou o processo de entrada nos mercados da Argentina, do Chile, da Colômbia e do México e em breve começará a operar nesses quatro países. “Estamos montando uma estrutura comercial bem estruturada para assim ganhar mercado internacional. Precisamos crescer onde a gente já está bem posicionado, manter a nossa liderança. Esse é nosso C desafio para os próximos anos”, conclui o diretor.
Soja Cecília Czepak
Controle oportuno Como controlar de modo eficiente populações de adultos e ninfas da mosca-branca (Bemisia tabaci), praga que exige manejo rigoroso e a aplicação de inseticidas para a diminuição da população do inseto e a preservação da sanidade da lavoura de soja
O
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA/2019) estimou que a produção de soja (Glycine max) no mundo foi de 362,075 milhões de toneladas, para uma área plantada de 125,691 milhões de hectares. O Brasil é um grande responsável pela produção desta oleaginosa juntamente com os Estados Unidos. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab/2019), o Brasil produziu 114,843 milhões de toneladas na safra 2018-2019, o que resultou em uma média produtiva de 3.206kg/ha. A cultura da soja está sujeita a ataques de pragas e patógenos em geral desde o momento em que é semeada, podendo 38
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
ser afetada por pragas de solo, e mesmo pelas da parte aérea após sua emergência, insetos mastigadores ou sugadores, e por outros patógenos como fungos, vírus e bactérias, que podem afetar o potencial produtivo da cultura. A mosca-branca Bemisia tabaci biótipo B (Gennadius, 1889) (Hemiptera: Aleyrodidae) é um inseto cosmopolita que pode se alimentar de mais de 600 espécies de plantas (Oliveira et al., 2001). A Bemisia tabaci ocasiona danos diretos às plantas, pois se alimenta diretamente no floema debilitando a planta, além de provocar danos indiretos que ocorrem por meio da excreção açucarada honeydew ou “mela”, favorecendo o fungo Capno-
dium (fumagina), que impede trocas gasosas pelas folhas, diminuindo a produção (Lima 2001). Além dos danos diretos causados à cultura, a mosca-branca é vetor de inúmeras espécies de vírus, podendo provocar prejuízos indiretos ao inocular estirpes de vírus nas plantas caso o inseto esteja contaminado. Por possuir fácil adaptabilidade a novas espécies de plantas e diversidade de hospedeiros, aliadas ao clima tropical, a mosca-branca atingiu alto nível de propagação em regiões produtoras agrícolas no Brasil, tornando-se uma praga importante e de difícil controle (Quintela, 2013). Neste contexto objetivou-se realizar um estudo de controle da população de Bemisia tabaci utilizando inseticidas comerciais de diferentes ingredientes ativos em início de infestação da cultura da soja. O estudo foi realizado na estação experimental da MRE Agropesquisa, localizada na zona rural do município de Rio Verde, Goiás, com coordenadas geográficas de 51º09’01,9”W e 17º55’17,6”S com altitude (NMM) de 756m. Utilizou-se a variedade M7739 IPRO, semeada em sistema direto com espaçamento de 0,5m entre linhas e uma população de 14 plantas por metro linear. O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso, com cinco tratamentos e quatro repetições. As parcelas foram compostas por 9m de largura por 10m de comprimento, perfazendo um total de 90m² por unidade experimental. Os tratamentos foram compostos por tiametoxam + lambda-cialotrina [mistura comercial (300ml/ha)], piriproxifem (250ml/ha), acetamiprido + piriproxifem [mistura comercial (250ml/ha)], ciantraniliprole (500ml/ha) e controle (sem aplicação de inseticida), as doses são de produto comercial, outros manejos fitossanitários foram semelhantes para todos os tratamentos. A aplicação dos tratamentos inseticidas foi realizada no início da infestação da mosca-branca (Bemisia tabaci), com pulverizador costal pressurizado a CO2, provido de barra de pulverização contendo seis pontas espaçadas com 0,50m, jato duplo tipo cone vazio TXA
80015, garantindo pressão constante de trabalho (30 PSI), com volume de calda proporcional a 150L/ha. A pulverização ocorreu a 0,5m do alvo, proporcionando cobertura homogênea da folhagem. Foram realizadas duas aplicações com intervalo de sete dias (Tabela 1). Foi avaliada a população de insetos (adultos e ninfas). Os insetos adultos foram avaliados em dez folíolos aleatórios na área útil da unidade experimental, realizou-se uma avaliação prévia (um dia antes da aplicação dos tratamentos), e avaliações pós-aplicação foram efetuadas aos um, três e sete dias após a 1ª aplicação (DA1A), e aos um, três e sete dias depois da 2ª aplicação (DA2A). As avaliações de ninfas foram realizadas de modo prévio (antecedendo a aplicação dos inseticidas) e aos três e sete dias após a 1ª aplicação (DA1A), e aos três, sete e 14 dias depois da 2ª
Figura 1 - Exemplificação de um adulto de Bemisia tabaci
Tabela 1 - Informações edafoclimáticas no momento da 1ª e da 2ª aplicação dos tratamentos inseticidas. Rio Verde - GO, safra 2018-2019 Parâmetros Data Hora da aplicação Temperatura (°C) Umidade Relativa (%) V. Vento (Km/h) Nebulosidade (%) Condições do solo
Aplicações dos Tratamentos 1ª 2ª 09/02/2018 16/02/2018 09:30 17:30 25,1 26,2 84 69 3,8 2,4 40 50 úmido/úmido úmido/seco
Tabela 2 - População de adultos e ninfas de Bemisia tabaci e produtividade da soja. Rio Verde - GO, safra 2018-2019 Dose* ml p.c/ha 300 Tiametoxam + Lambda-Cialotrina 250 Piriproxifem 250 Acetamiprido + Piriproxifem 500 Ciantraniliprole 0 Controle C.V. (%) Dose* Tratametos ml p.c/ha 300 Tiametoxam + Lambda-Cialotrina 250 Piriproxifem 250 Acetamiprido + Piriproxifem 500 Ciantraniliprole 0 Controle C.V. (%) Tratametos
Médias Adulto¹ 3 DA1A 7 DA1A 1 DA2A 3 DA2A 7 DA2A 6,95 ab 8,90 a 3,28 ab 5,20 b 4,28 a 10,10 a 5,65 a 4,05 ab 8,60 ab 4,60 a 3,35 b 5,12 a 2,65 b 5,50 b 3,25 a 4,35 ab 6,70 a 1,92 b 3,90 b 3,82 a 7,80 ab 9,15 a 6,40 a 11,05 a 4,82 a 43,79 36,75 43,83 32,28 32,8 Médias Ninfa² Produtividade Prévia³ 3 DA1A4 7 DA1A 3 DA2A5 7 DA2A 14 DA2A Sacas/ha 13,70 a 14,32 b 11,78 b 8,62 b 17,25 b 12,68 b 49,1 c 11,68 a 10,58 bc 7,02 c 5,02 bc 7,10 c 5,45 c 54,1 bc 13,22 a 6,68 c 3,42 d 1,00 d 1,08 d 1,55 c 60,4 a 17,62 a 7,48 c 4,45 cd 1,68 cd 4,58 cd 4,08 c 57,5 ab 14,92 a 20,82 a 20,20 a 18,80 a 32,82 a 20,40 a 42,9 d 19,21 16,25 21,06 23,50 13,80 21,95 4,77
Prévia 2,95 a 2,98 a 3,55 a 3,02 a 3,58 a 15,96
1 DA1A 1,45 b 2,55 ab 1,80 b 1,52 b 4,12 a 37,69
*Doses de produto comercial (p.c) em ml por hectare; 1 Médias de adultos contados em dez folíolos por tratamento; ² Média de ninfas em 2cm²/folíolo; ³ Prévia: contagem feita um dia antes da aplicação dos tratamentos; 4 DA1A: Dias Após 1ª Aplicação; 5 DA2A: Dias Após 2ª Aplicação; Médias seguidas pela mesma letra na coluna não diferem entre si pelo teste de Tukey a 0,05 de significância.
Figura 2 - Ilustração de adultos na face adaxial da planta (esquerda) e visão de ninfas de Bemisia tabaci (direita) em visão pela lupa binocular estereoscópica com aumento de 20 vezes
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
39
Figura 3 - Eficiência no controle de adultos de Bemisia tabaci em dias após a 1ª aplicação (DA1A), um, três e sete dias, respectivamente. Rio Verde - GO, safra 2018-2019
Figura 4 - Eficiência no controle de adultos de Bemisia tabaci em dias após a 2ª aplicação (DA2A), um, três e sete dias, respectivamente. Rio Verde - GO, safra 2018-2019
aplicação (DA2A). As avaliações do número de ninfas foram realizadas com a coleta dos folíolos a campo, levados ao laboratório de entomologia da MRE Agropesquisa, e com o auxílio de uma lupa binocular estereoscópica com aumento de 20 vezes realizou-se a contagem das ninfas em uma área total de 2cm²/folíolo. Ao final do ciclo da cultura realizou-se a colheita da soja e feita correção da umidade dos grãos para 13%. Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância pelo teste de F (p<0,05) e comparados pelo teste de médias de Tukey (p<0,05), utilizando o software SASM – Agri (Canteri et al., 2001).
RESULTADOS
Na Tabela 2 observam-se os resultados da população de adultos e de ninfas de mosca-branca antes da aplicação e após a primeira
e segunda aplicações, assim como os valores de produtividade da cultura da soja em sacas por hectare. As avaliações prévias demonstram estabilidade entre o número de indivíduos por folíolo amostrado tanto para adultos quanto para ninfas em início de pressão exercida pela praga na lavoura. Para as avaliações de adulto após a primeira aplicação (DA1A) é possível observar que os tratamentos compostos com os ingredientes ativos, mistura comercial de tiametoxam + lambda-cialotrina (300ml/ha), a mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ ha) e ciantraniliprole (500ml/ha) obtiveram a maior eficiência de controle um dia após a aplicação, destacando-se o tratamento que continha a mistura
Figura 5 - Eficiência no controle de ninfas de Bemisia tabaci em dias após a 1ª aplicação (DA1A), três e sete dias, respectivamente. Rio Verde - GO, safra 2018-19
40
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ha), que aos três dias após a 1ª aplicação continuou com a melhor porcentagem de eficácia no controle do adulto de Bemisia tabaci (Figura 3). Para a avaliação aos 7 DA1A, a população de adulto nos folíolos se estabilizou para todos os tratamentos, não havendo diferença estatística significativa. Após a segunda aplicação (DA2A), é possível observar um destaque na eficiência de controle dos adultos de mosca-branca para os tratamentos de mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ha) e ciantraniliprole (500ml/ha) que obtiveram os melhores níveis de controle para as avalições de 1 e 3 DA2A, e mesmo na avaliação de 7 DA2A (Figura 4), onde não há diferença estatística entre os tratamentos do estudo, é possível verificar que para estes dois tratamentos citados anteriormente a média de indivíduos adultos por folíolo foi menor. As ninfas foram avaliadas em laboratório após colheita dos folíolos em campo. As avaliações de três e sete dias após primeira aplicação (DA1A) demonstraram que todos os inseticidas aplicados reduziram a população de ninfas, com destaque para a mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ha) e ciantraniliprole (500ml/
Figura 6 - Eficiência no controle de ninfas de Bemisia tabaci em dias após a 2ª aplicação (DA2A), três, sete e 14 dias, respectivamente. Rio Verde - GO, safra 2018-2019
ha) que reduziram drasticamente a população de ninfas nos folíolos da planta de soja, obtendo maior eficiência de controle (Figura 5). Após a aplicação sequencial, sete dias depois da primeira aplicação, observou-se uma redução drástica aos três, sete e 14 dias após a segunda aplicação (DA2A) da população de ninfas nos folíolos avaliados, destacando-se os tratamentos inseticidas com ingredientes ativos piriproxifem (250ml/ha), a mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ha) e ciantraniliprole (500ml/ha), que mantiveram uma eficácia de controle até os 14 DA2A, como mostra a Figura 6. A colheita da soja foi realizada quando as plantas estavam em final de estádio fenológico. Após a colheita, os grãos tiveram umidade corrigida para 13%, e foi possível observar, tanto na Tabela 2 quanto na Figura 7, que todos os tratamentos que tiveram inseticidas aplicadas resultaram em aumento de produtividade da soja quando comparados ao tratamento controle, onde não houve aplicação do inseticida. Os tratamentos contendo a mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ ha) e ciantraniliprole (500ml/ha) proporcionaram a maior produtividade da oleaginosa com 60 sacas/ha e 58 sacas/ ha, respectivamente, demonstrando que a eficiência destes produtos sobre as populações de adultos e ninfas de Bemisia tabaci foi fundamental para a sanidade da lavoura e incrementar valor produtivo sobre a área que não teve controle da praga. Os pesquisadores registraram as faces superiores e inferiores de folíolos da soja 21 dias após a segunda aplicação (Figura 8), sendo possível observar
a sanidade das plantas independentemente da face, nos tratamentos inseticidas com ingredientes ativos piriproxifem (250ml/ha), a mistura comercial de acetamiprido + piriproxifem (250ml/ha) e ciantraniliprole (500ml/ha), representando visualmente os dados analíticos expressos na Tabela 1 e figuras de controle e produtividade já apresentadas. Os adultos de Bemisia tabaci depositam seus ovos na folha, e quando as ninfas eclodem começam a se alimentar de fotoassimilados das plantas, causando prejuízo direto à cultura. Ao se alimentar, excretam substâncias. Este melaço excretado pelas ninfas se torna substrato para o desenvolvimento de fumagina nas folhas e nos frutos. O controle das populações de Bemisia tabaci com aplicação sequencial de inseticida se faz necessário para a diminuição da população do inseto e a preservação da sanidade da lavoura C de soja.
Figura 7 - Produtividade da soja em sacas por hectare. Rio Verde - GO, safra 2018-2019
Estevão Rodrigues Raphael Neumaister MRE Agropesquisa Fernando Rezende Corrêa UniBras Corrêa Weed Science Nelmício Furtado da Silva UniBras AgirTec Paulo Afonso Betinelli Wendson Soares da Silva Cavalcante Bruna Guimarães da Silva Daniele Ferreira Ribeiro UniBras
Figura 8 - Face adaxial (parte superior) e face abaxial (parte inferior) das folhas de Glycine max, 21 dias após a segunda aplicação. Rio Verde - GO, safra 2018-2019
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
41
Soja
Reflexos em nematoides Como a integração lavoura-pecuária, com a sucessão de cultivo de soja, pastagens e presença de carga animal, interage com fitonematoides
A
azevém anual. Porém, dois aspectos podem afetar a sustentabilidade da ILP na região subtropical do Brasil: o cultivo continuado da sucessão soja/aveia e o excesso de carga animal na pastagem. O plantio direto é utilizado pela quase totalidade dos produtores rurais, porém um princípio fundamental deste sistema, a rotação de culturas, tem sido negligenciada por motivos econômicos. Em aproximadamente 15 milhões de hectares há 20 anos têm
Juliane Schmitt
integração lavoura-pecuária (ILP), se bem manejada, permite diversificar e aumentar a produção de alimentos por área, melhorar a renda dos produtores rurais e a qualidade do ambiente. Na região Sul do Brasil, um sistema muito utilizado é o que alterna culturas para a produção de grãos no verão, especialmente a soja, com pastagens anuais de inverno para o pastejo dos bovinos, principalmente aveia preta em mistura ou não com
42
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
sido cultivada a sucessão de soja/aveia preta na região Sul do Brasil. A falta de rotação de culturas tem resultado em diversos problemas, dentre os quais se destaca o aumento da ocorrência ou o surgimento de novas pragas, doenças e plantas daninhas, tanto na soja quanto na aveia. Um dos problemas mais graves é o aumento das áreas infestadas por fitonematoides, especialmente devido ao uso de cultivares de soja suscetíveis. Outro problema observado com fre-
quência nas propriedades que adotam a ILP é o excesso de carga animal na pastagem, que reduz a biomassa das plantas forrageiras, aumenta a compactação do solo, reduz a infiltração de água e a aeração, aumenta a erosão, reduz o teor de matéria orgânica e a ciclagem de nutrientes etc. Tudo isto resulta em elevado estresse às plantas forrageiras e às plantas produtoras de grãos cultivadas em sucessão. Já foi comprovado que as plantas cultivadas em condições de estresses ambientais são menos tolerantes à incidência de fitonematoides. Até o momento, nenhum estudo sobre a ocorrência dos fitonematoides em sistemas de ILP da região subtropical do Brasil havia sido realizado, por isto foi efetuada uma pesquisa para avaliar a infestação de nematoides em uma integração lavoura-pecuária, que há 15 anos é cultivada com a sucessão soja/aveia + azevém e manejada com quatro intensidades de pastejo. O estudo foi realizado na Fazenda do Espinilho, que pertence a Agropecuária Cerro Coroado, localizada em São Miguel das Missões, Rio Grande do Sul, em uma área exprimental de 22ha (Figura 1). O solo é classificado como Latossolo Vermelho, profundo, bem drenado e de textura argilosa (540, 270 e 190 g/kg de argila, silte e areia, respectivamente). Em 2001, o sistema ILP foi instalado e desde então a área é cultivada continuamente sob o sistema de plantio direto em uma sucessão de soja no verão (novembro a abril) e aveia preta + azevém no inverno (maio a outubro) para o pastejo de bovinos. A área foi dividida em 12 parcelas de 0,90ha a 3,53ha, onde o pasto é mantido nas alturas de 10cm, 20cm, 30cm ou 40cm no inverno pelo pastejo de três novilhos em
Figura 1 - Esquema da área experimental com as parcelas com diferentes alturas de pasto e duas parcelas sem pastejo
cada parcela (peso vivo inicial médio de 200kg) (Figura 1). Há também duas parcelas sem pastejo no inverno, onde a aveia + azevém foi utilizada somente para a produção de palha para o plantio direto do verão. As coletas de solo para a análise dos nematoides foram realizadas no verão e no inverno, no florescimento da soja
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
43
Fotos Juliane Schmitt
Figura 3 - Porcentagem dos fitonematoides nas amostras de solo
Figura 2 - Aspecto das diferentes alturas do pasto na área experimental
e da aveia preta. Em cada parcela foram coletadas cinco amostras compostas (resultado da mistura de nove subamostras cada) com auxílio de um trado calador, até 20cm de profundidade. Os nematoides foram extraídos de 300cm3 de solo e identificados no Laboratório de Biologia do Solo da Universidade Federal de Santa Maria.
Foram identificados oito gêneros de fitonematoides no solo da ILP, todos abaixo do nível de dano econômico: Helicotylenchus, Xiphinema, Tylenchus, Hoplolaimus, Hemicycliophora, Meloidogyne, Pratylenchus e Trichodorus. O gênero Helicotylenchus foi o mais abundante, representando 77% dos fitonematoides coletados na
Aspecto geral do experimento durante o cultivo da soja nos meses de verão
44
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
pastagem e 82% da soja (Figura 3). Apesar da ampla dominância, somente a espécie Helicotylenchus dihystera foi detectada. O gênero Xiphinema representou 17% dos fitonematoides coletados na pastagem, mas somente 5% na soja. Comportamento contrário ao gênero Tylenchus, que abrigou 4% dos fitonematoides coletados na pastagem, mas 12% na soja. Os gêneros Meloidogyne e Pratylenchus representaram somente 1% das amostras da soja. O nível de dano econômico de Helicotylenchus para a cultura da soja ainda não foi estabelecido. Mas pesquisas indicam que densidades populacionais de cerca de cinco mil espécimes por 100cm³ de solo não causaram danos econômicos. Ainda que Helicotylenchus seja considerado um parasita secundário para esta cultura, tem sido relatado com grande frequência em diversos sistemas de produção. Os danos secundários causados provêm de sua associação com outros fitonematoides e por facilitar a entrada de fungos e bactérias patogênicos nos ferimentos abertos no sistema radicular. A intensidade do pastejo no inverno alterou a abundância dos fitonematoides da pastagem e da soja (Figura
4). A altura do pasto a 40cm e a área não pastejada apresentaram densidades elevadas no inverno. Por outro lado, os tratamentos com pastejo a 10cm e a 20cm apresentaram as menores densidades de fitonematoides. Já nas análises realizadas no verão, observa-se que a área pastejada com a menor altura de pasto no inverno (10cm) resultou em maior densidade de fitonematoides na soja (Figura 4), a grande maioria destes do gênero Helicotylenchus. Apesar de a soja tolerar elevadas densidades deste fitonematoide, os dados indicam que o pastejo intenso no inverno aumentou em 374% a densidade de Helicotylenchus na soja. Se este manejo continuar a ser adotado, nos próximos anos estes nematoides poderão tornar-se um problema fitossanitário para a cultura da soja. Machado et al. (2019) consideram H. dihystera como um potencial patógeno da soja no Brasil, onde sua dispersão e densidade têm aumentado nas lavouras. Esta ILP foi cultivada por 15 anos com a mesma sucessão de cultura (soja/aveia preta + azevém) e com cultivares de soja suscetíveis aos fitonematoides. Assim, era de se esperar que a infestação de fitonematoides fosse maior. Porém, as características desta ILP contribuíram para a redução da abundância dos nematoides. Pesquisas indicam que a aveia preta e o azevém não são bons hospedeiros de nematoides, então o cultivo destas plantas contribuiria para reduzir a reprodução dos nematoides durante o inverno. A textura argilosa (540kg) do solo também pode limitar o desenvolvimento das populações de fitonematoides. Diversos autores relatam que nematoides dos gêneros Meloidogyne e Pratylenchus têm preferência por solos com textura arenosa a franco-argilosa. A deposição de esterco bovino no solo durante o pastejo no inverno também pode auxiliar no controle dos fitonematoides. A amônia é liberada durante a decomposição microbiana do esterco e tem efeito nematicida. Além disto, a deposição de esterco aumenta a atividade biológica do solo, aumentado a quantidade de predadores e parasitas dos fitonematoides (inimigos naturais). Nesta mesma área experimental, Da Sil-
va et al. (2014) determinaram durante um ciclo da pastagem a produção de esterco de 669kg/ha 478kg/ha 366kg/ha e 213kg/ha (em massa seca) para as alturas de pasto de 10cm, 20cm, 30cm e 40cm, respectivamente. Assim, é possível que as menores abundâncias de fitonematoides nas áreas com 10cm, 20cm e 30cm tenham relação com a maior deposição de esterco no inverno. As condições presentes na ILP contribuem para que a incidência de fitonematoides no solo não seja elevada, porém o ajuste da carga animal é fundamental para a sustentabilidade deste sistema. Diversos estudos realizados nesta área indicam que ao ser realizado o pastejo a 20cm e 30cm consegue-se aliar maior produção de carne, melhoria da qualidade do solo, redução dos impactos ambientais, sem prejuízos à produtividade da soja cultivada em sucessão. Os dados deste estudo confirmam isto, pois a maior altura de pasto (40cm) aumenta a densidade de fitonematoides na pastagem, enquanto a menor altura de pasto contribui para o crescimento da denC sidade de fitonematoides na soja. Juliane Schmitt e Rodrigo Josemar Seminoti Jacques, Universidade Federal de Santa Maria Paulo César de Faccio Carvalho, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Figura 4 - Densidade de fitonematoides no solo
Juliane (ao centro) e Rodrigo (ao seu lado direito) juntamente com os demais estudantes do Laboratório de Biologia do Solo/UFSM que realizaram a pesquisa
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
45
Algodão Geraldo F. Pereira
Praga em alta Lavouras de soja e de algodão têm sido atacadas com alta frequência por elevadas infestações de tripes Frankliniella schultzei. No caso do algodoeiro é recomendado começar as pulverizações de inseticidas antes do surgimento das primeiras folhas verdadeiras, em complemento ao tratamento de sementes, além de reduzir o intervalo entre as aplicações foliares na fase inicial
N
os últimos quatro anos o Cerrado do Oeste da Bahia vem registrando infestações elevadas de tripes nas culturas da soja e do algodão, sendo a espécie Frankliniella schultzei Trybom (Thysanoptera: Thripidae) a mais abundante em coletas realizadas na região pela empresa Corteva Agriscience e por consultorias agronômicas.
46
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
A infestação do inseto na soja tem início nos primeiros estádios vegetativos da planta (V2 e V3), estendendo-se durante o período de florescimento-frutificação, e sendo encontrado em folíolos, flores e vagens novas. Nos folíolos o inseto produz estrias e causa prateamento na face inferior, aparentemente sem comprometer o desenvolvimento da folha ou causar desfolha. Nas flores são
Genivaldo B. Santos, 2019.
Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa
Ninfas e adultos de tripes na face inferior do folíolo de soja
cujas populações de tripes não são manejadas. Assim como na soja, não houve evidência de transmissão de viroses no algodoeiro. Todas as principais cultivares de algodão apresentaram infestações elevadas da praga. O controle de tripes no algodoeiro mostra-se difícil e oneroso, com rápida recomposição da população da praga após as pulverizações foliares e a intensa migração do inseto vindo da soja. Em muitas áreas foram realizadas até oito pulverizações foliares específicas para o controle de tripes, encarecendo o custo de produção. Estudos realizados pelo Laboratório de Entomologia Agrícola da Universidade do Estado da Bahia (Barreiras/BA), em parceria com a empresa Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa (Luís Eduardo Magalhães/BA), nas safras 2018/19 e 2019/20, obtiveram bons resultados de controle da praga no algodoeiro, cultivado em estufa e campo, utilizando-se inseticidas neonicotinoides no tratamento de sementes (imidaclo-
prido e tiametoxam) e produtos em aplicação foliar pertencente a diversos grupos químicos como tiametoxam, tiacloprido, acetamiprido, imidaclorpido, espinetoram, carbosulfano, profenofós, acefato, imidacloprido + beta-ciflutrina e acetamiprido + bifentrina. Além do controle de ninfas houve redução nos danos (lesões) e no encarquilhamento das folhas do ponteiro. Os estudos também apontam para a necessidade de se monitorar as infestações do inseto a partir das folhas cotiledonares. Em situação de alta infestação da praga é aconselhado iniciar as pulverizações antes do surgimento das primeiras folhas verdadeiras, em complemento ao tratamento de sementes, além de reduzir o intervalo entre as aplicações foliares na fase inicial do algodoeiro como medida para evitar danos severos no ponteiro e o consequente C atraso no desenvolvimento da planta. Marco Antonio Tamai, Universidade do Estado da Bahia Geraldo F. Pereira, Equipe Consultoria Mônica Cagnin Martins, Círculo Verde Assessoria Agronômica e Pesquisa
Geraldo F. Pereira
encontradas populações elevadas do inseto, com alguns produtores associando esta presença a uma maior quantidade de flores abortadas e menor número de vagens nas plantas, especialmente no ponteiro (cachopas), o que precisa ser estudado. Até o momento não houve relato de lavouras com plantas apresentando os sintomas característicos da queima-do-broto da soja (Vobs), uma doença viral com ocorrência no Brasil cujos agentes transmissores são tripes do gênero Frankliniella (Almeida & Corso, 1990; Almeida et al., 1995). De modo geral os produtores não realizam o controle do inseto na soja, porém alguns estão realizando pulverizações de inseticida no florescimento para reduzir as infestações nas flores. Os danos causados por tripes no algodoeiro vêm aumentando anualmente. Na safra 2016/17 o ataque ocorreu nas flores, durante a fase de florescimento pleno da cultura. Já nas safras 2017/18 e 2018/19 a infestação se iniciou logo após a emergência das plantas, causando danos severos nas folhas do ponteiro (má-formação, lesões necróticas, prateamento da face inferior, rasgadura do limbo e encarquilhamento) e paralisia de crescimento da planta. Na fase reprodutiva foram observadas infestações elevadas nas flores, raspagens em botões-florais e maçãs novas, além da suspeita de estar associada ao aumento no abortamento de botões florais e capulhos com abertura parcial. Os cultivos irrigados, semeados em janeiro/fevereiro, foram os mais infestados, em consequência da intensa migração de tripes vindos dos cultivos adjacentes, em especial dos talhões de soja
Danos severos por tripes nas folhas do ponteiro do algodão
Adultos de tripes na flor da soja
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
47
Coluna Agronegócios
Agricultura: fatos e mitos
C
inquenta anos lidando com o agronegócio renderam muitos causos que vivi, vi ou ouvi. Primeiro, uma história bem antiga, lá dos primórdios. Do tempo em que a soja era uma ilustre desconhecida, suas pragas então, nem se fala. Os primeiros agricultores literalmente se apavoravam com a repentina “invasão” de lagartas na lavoura que, em poucos dias, deixavam a soja “pelada”, nas palavras deles. Alguns até usavam “pó-de-gafanhoto”, que era o inseticida disponível no galpão. Havia quem buscasse ajuda sobrenatural. Alguns procuravam benzedeiras. Outros apelavam ao padre, houve até episódio de procissão para acabar com o ataque de lagartas... E eis que, assim, num estalar de dedos, de repente todas as lagartas ficavam meio lerdas, morriam, tornavam-se branquinhas da silva. Imediatamente os créditos e os agradecimentos iam para a benzedeira ou para o padre. E que dificuldade que nós, agrônomos, enfrentávamos para que o pessoal entendesse que se tratava de um caso de sucesso de controle biológico, devido ao fungo Metarhizium rileyi, que, à época, se chamava Nomuraea rileyi. Não menos folclórico foi uma indicação “segura” para controlar percevejos na soja, com alta eficiência. Bastaria urinar em um pano, pendurá-lo em uma estaca na lavoura de soja, e pronto, adeus, percevejos! Esta “indicação segura” foi igual a fogo de morro acima – ou água de morro abaixo: espalhou-se rapidamente. Que dificuldade para provar aos agricultores que não tinha nada a ver com urina, era uma questão de equilíbrio biológico. Para não parecer que distorções ocorrem apenas no Brasil, vivenciei um episódio interessante nos EUA. Em visita a uma Universidade, fui convidado para almoçar na casa de um professor, no final de semana. Para preparar o almoço, viajamos 35km até um mercado fora da cidade, que vendia produtos orgânicos, porque o professor se dizia “verde” e não aceitava alimentos derivados de transgênicos. Durante a viagem descobri que os pais do professor eram diabéticos, dependentes de insulina. Obtida de bactérias transgênicas! E a viagem de 70km jogou 26kg de CO2 na atmosfera. É a dualidade de convicção, para conferir qualidade de vida aos pais, a engenharia genética é do bem; mas, para baratear alimentos e torná-los mais acessíveis aos menos favorecidos, é do mal. Assim como agressão à Natureza é só coisa de agricultor, o povo da cidade não polui nada...
FATOS E MITOS
Daniel Sosa Gomes
Seguramente todos nós temos histórias parecidas para contar. Os fatos relatados acima eram mais folclóricos do que prejudiciais. Mas existem muitas fake news assacadas contra o agronegócio bra-
Lagarta morta pelo ataque de Metharizium rileyi
48
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
sileiro que dilapidam sua imagem e prejudicam os negócios no exterior. Está indelevelmente gravada na minha memória uma missão oficial em que acompanhei o então ministro da Agricultura, Blairo Maggi, em dezenas de audiências por países europeus. A impressão que ficava ao final da audiência era de que o agricultor brasileiro sequer estava preocupado em produzir, em ser rentável, seus objetivos seriam destruir florestas, poluir águas e expulsar índios de suas terras! O acumular destes mitos foi o mote que levou três engenheiros agrônomos (Xico Graziano, Maria Thereza Pedroso e eu) a escreverem o livro “Agricultura, Fatos e Mitos”. A missão que nos impusemos foi separar o joio do trigo, os fatos dos mitos. Os fatos são narrados com o máximo possível de fidelidade, lastreados em fontes fidedignas. E os mitos são desconstruídos com o auxílio de fatos e números fundamentados na melhor Ciência.
ALGUNS MITOS
À guisa de ilustração, comentemos o reposicionamento de três mitos, detalhados no livro. O primeiro: 70% dos alimentos da mesa dos brasileiros vêm de pequenos agricultores. Este foi um número que circulou com força de verdade na década passada, era uma heresia contestá-lo, afinal havia sido pronunciado pela primeira vez por um ministro do governo brasileiro, para alardear o sucesso de suas políticas públicas. Porém, um professor da Unicamp demonstrou com números irrefutáveis que a verdade era outra, apenas 25% dos alimentos provinham deste segmento. O segundo mito é mais recente. Inúmeras cidades brasileiras foram inundadas com outdoors e a mídia divulgava, incessantemente, quantos litros de agroquímico cada cidadão brasileiro consumia por ano. O valor mais alto que eu cataloguei foi de 46 litros por pessoa, por ano, no Mato Grosso. Em um dos capítulos do livro, refizemos as contas, com base em números oficiais e fatos científicos, e chegamos a meros 0,085 litro por pessoa, por ano. Ou menos de 2% dos tais 46 litros! O terceiro mito é a mudança pura e simples de agricultura brasileira de convencional para orgânica. Foquemos em um aspecto apenas, a substituição de fertilizantes industriais por adubação orgânica. Calculamos a necessidade de esterco em 2,9 bilhões de toneladas ao ano, o que demandaria 195 milhões de cabeças de gado confinadas. Para transportar todo este fertilizante orgânico, precisaríamos de 145 milhões de viagens de caminhão, rodando 75 bilhões de quilômetros. O custo equivaleria a um terço da produção agrícola do País. E, o pior: seriam queimados 15 bilhões de litros de óleo diesel, que emitiriam 39 milhões de toneladas de gás carbônico. O agronegócio é o grande motor da economia brasileira. Para o bem do Brasil e de seus cidadãos, os mitos contra ele assacados precisam ser desmontados com base na melhor Ciência, com fatos e números irrefutáveis. Parte disso está feita no livro mencionado anteriormente, mas há muito mais a ser feito, e todos temos que C ser parte deste esforço.
Decio Luiz Gazzoni O autor é Engenheiro Agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja
Coluna Mercado Agrícola
Safra 2020/21 se aproxima do plantio com expectativa de novo recorde para o Brasil
A
safra 2020/21 está próxima do início do plantio, com otimismo do setor produtivo. A soja teve um dos melhores anos da história, com perdas pontuais por conta do clima e colheita superior a 120 milhões de toneladas. Deve bater recorde de área plantada, com projeção de 38,5 milhões de hectares, frente aos 37,4 milhões de hectares da última safra e fôlego para passar de 130 milhões de toneladas. O milho da primeira safra deve ter pequena redução de área e ficar perto de cinco milhões de hec-
tares, com potencial de colher 30 milhões de toneladas. A safrinha tende a registrar avanço de plantio a partir de fevereiro, com potencial para alcançar algo próximo de 15 milhões de hectares e atingir 80 milhões de toneladas. Aliado a outros grãos, o Brasil se encaminha para bater o recorde histórico de 270 milhões de toneladas. O mundo precisa de alimentos e o País necessita sair da crise. As cotações estão favoráveis aos produtores brasileiros e tudo conspira favoravelmente para que o setor siga crescendo.
MILHO
de toneladas para serem negociadas (parte deste volume certamente ainda irá para a exportação), as importações ganharam ritmo antes do meio do ano e até o final de julho já estavam em mais de 240 mil toneladas de soja importadas. O volume do ano deve passar de um milhão de toneladas. Com cotações favorecendo os produtores que também já negociaram grande parte da safra de 2021, que tem mais de 35% dos 130 milhões de toneladas previstas negoSOJA O Brasil tem uma boa demanda de soja, ciadas até o momento. Os portos bateram farelo e óleo no segundo semestre, e neste recorde de cotação e fecharam acima de ano o quadro estará muito apertado. No R$ 121,50 a saca nos melhores momentos. primeiro semestre, mais de 60% da safra ARROZ já havia sido destinada à exportação e até O mercado do arroz neste ano surpreo final de julho este volume estava acima dos 72%, restando pouco para atender à de- endeu os produtores, com cotações maiomanda interna. Com menos de 12 milhões res que o esperado pelo setor. Níveis de R$ A colheita do milho safrinha se encaminha para a fase final, restando ser colhida parte da safra de Goiás, Mato Grosso do Sul e Paraná, além do Sudeste e parte do Norte. Aproximadamente 70% da safra, estimada em pouco mais de 70 milhões de toneladas, já foi negociada e resta pouco para atender o mercado até a colheita da safra de verão.
65,00 a R$ 75,00 a saca na base do Casca do Rio Grande do Sul e patamares acima de R$ 80,00 no Norte e no Centro-Oeste para o arroz de 60 quilos próximo às indústrias. Com esses números os produtores venderam a maior parte da safra, e agora resta menos de 30% dos mais de 11 milhões de toneladas colhidas para serem negociadas. Há espaço para novas altas, em um período em que normalmente ainda restaria mais de 50% da safra para ser comercializada. O setor aproveitou para negociar e quitar dívidas antigas, ao mesmo tempo em que se prepara para C uma nova e grande safra. Vlamir Brandalizze Twitter@brandalizzecons www.brandalizzeconsulting.com.br Instagram BrandalizzeConsulting ou Vlamir Brandalizze
Curtas e boas TRIGO - O mercado do trigo segue favorável aos produtores, com cotações fortes e à espera de que a partir de agosto comece a chegar a safra nova do Paraná e de outubro em diante a colheita do restante do Sul do País. Então o mercado poderá recuar um pouco, mas não muito, porque o grão importado chegará ao Brasil acima dos R$ 1.200,00 por tonelada. O ano seguirá positivo aos produtores, porque há forte demanda e mesmo com safra maior, perto de 6,5 milhões de toneladas, o consumo tende a ultrapassar 12 milhões de toneladas. EUA - Os produtores tiveram boas condições para a safra até o final de julho e assim as projeções até aquele momento mostravam indicativos de colheita maior que as projeções do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Estimativa de 113 milhões de toneladas para a soja e mais de 386 milhões de toneladas para o milho. Mas os fundamentos são positivos, porque a demanda
mundial irá consumir tudo e parte dos estoques. CHINA - Mesmo com as disputas políticas e comerciais, a China não parou de comprar forte dos EUA, com a aquisição de milhões de toneladas de milho e de soja americana em julho. Ainda deve comprar forte em agosto, porque o país sofre com a falta de grãos. Teve os menores estoques em quase uma década, na virada do ano comercial (fevereiro), e com isso houve disparada das cotações internas. O milho bateu acima dos 300 dólares por tonelada e a soja superou a marca de 500 dólares por tonelada. ARGENTINA - A safra dos argentinos fechou sem grandes novidades, com a soja pouco abaixo de 50 milhões de toneladas e o milho também no mesmo patamar. A exportação avançou porque houve muita presença da China comprando e levando boa parte da soja que estava sendo negociada, deixando o mercado interno apertado para o restante do ano.
www.revistacultivar.com.br • Agosto 2020
49
Coluna ANPII
Sustentabilidade visível Preservar, mostrar que preserva e atender ao anseios dos clientes, cada vez mais exigentes em questões ambientais, estão entre os desafios da agricultura brasileira. A Fixação Biológica de Nitrogênio é uma das ferramentas que conseguem atender a essa demanda
A
sustentabilidade ambiental é um tema amplamente dis- servar o ambiente e mostrar que o preserva, e o comercial, de cutido em todo o mundo. Cada vez mais se questiona a atender aos desejos do cliente, cada vez mais exigente em quesação do ser humano na manutenção de um equilíbrio tões ambientais, a fixação biológica do nitrogênio (FBN) é uma das entre a necessidade de utilizar e preservar os recursos naturais. ferramentas que mais claramente atendem a estes dois princípios. Como utilizá-los em benefício da humanidade e, ao mesmo temSem a FBN, a soja necessitaria de cerca de 600kg de ureia/ha, po, evitar um desequilíbrio ambiental que comprometa, irrever- isto para atender à produtividade de 3.000kg de grãos, que atusivelmente, estes mesmos recursos, tornando-os escassos ou até almente é considerada baixa. Em 35 milhões de hectares de soja, mesmo inexistentes para gerações futuras? seriam necessários 21 milhões de toneladas de ureia. Levando em A agricultura não foge a este debate, com posições que, muitas conta que cada quilo de fertilizante nitrogenado, de sua produção vezes, saem da troca de ideias técnicas e resvalam para o campo da até a aplicação na lavoura, emite cerca de dez quilos de gás efeito polêmica ideológica extremada, tornando difícil a busca do neces- estufa, pode-se dimensionar a mitigação de gases efeito estufa sário e indispensável equilíbrio. Este debate, quando escrevemos que se consegue anualmente com o uso do nitrogênio biológico este artigo, encontra-se fortemente presente no Brasil. Sem entrar na cultura da soja. Quando o Brasil estruturou o programa ABC de no mérito do debate em si, lembramos apenas de dois aspectos mitigação de emissões de carbono pela agropecuária brasileira, a pelo lado do agro brasileiro, o que nos diz resFBN foi um dos seis pilares deste amplo peito: (a) - do ponto de vista da humanidade, programa, cujos resultados já se fazem seguindo a linha da maioria dos pesquisadores sentir há vários anos. Se o Brasil tivesse Assim, além do clima, há a necessidade de baixar os índices que usar esta quantidade de fertilizante da significativa de emissão de gases de efeito estufa e (b) – nas nitrogenado, seriam necessárias 600 mil negociações com nossos principais clientes de viagens de carretas com 35 toneladas caredução de produtos agropecuários, temos que nos adapda, pelas já saturadas estradas brasileiras. custos para o tar às exigências dos mesmos, como é feito em Acrescentando-se a isto a eutrofizaagricultor, pela qualquer negociação comercial, lembrando o ção de cursos d’água causada pelo uso de velho pregão do marketing: o cliente sempre fertilizantes nitrogenados, o que também diminuição de tem razão. é reduzido pela FBN, temos o enorme importações, com O Brasil tem uma legislação moderna e únitamanho da “pegada” ecológica do uso ca no mundo, o que nos tornaria, sem dúvida, de inoculantes pelo agricultor brasileiro. economia para o líderes no equilíbrio entre produção agrícola e Assim, além da significativa redução País, o inoculante preservação do ambiente. Mas, infelizmente, de custos para o agricultor, pela dimipor má comunicação e pelo reiterado descumnuição de importações, com economia ainda contribui primento estrito da lei, aparecemos muitas para o País, o inoculante ainda contribui grandemente vezes como vilões em questões ambientais. grandemente com o ambiente, levando a com o ambiente, Parafraseando uma citação da antiga Roma: agricultura brasileira a um patamar talvez “A mulher de César não basta ser honesta, tem único no mundo. levando a que parecer honesta”. Assim, ao Brasil, não basIsto deveria ser divulgado com mais agricultura ta preservar o ambiente e fazer uma agricultura ênfase, fazendo parte do discurso oficial, sustentável. Tem que mostrar isto claramente, como uma política de Estado. As emprebrasileira a um dar sinais inequívocos do compromisso de ter sas associadas à ANPII vêm, através dos patamar talvez uma agricultura altamente produtiva, capaz de anos, contribuindo de forma inestimável único no mundo alimentar bilhões de pessoas e, ao mesmo temcom inoculantes de alta qualidade, para po, preservar o ambiente através de políticas que o agricultor brasileiro, e de outros específicas. Fatos para isto temos em larga espaíses, possa produzir soja e outras legucala. Falta a narrativa clara e verdadeira, mostrando nossa posição minosas com baixa utilização de fertilizantes nitrogenados e com a todo o mundo. Um discurso claro, forte, comprometido, aliado bactérias selecionadas que levam a elevadas produtividades, com C aos fatos existentes, sem ter que inventar nada, e ao mesmo temrespeito ao ambiente. po ações claras e decisivas no sentido de coibir toda a ação ilegal de danos ao ambiente, colocará o Brasil em sua devida posição, Solon Araújo, de produtor de alimentos e sustentabilidade da agropecuária. Consultor da ANPII Assim, dentro destes dois parâmetros, o conceitual, de pre50
Agosto 2020 • www.revistacultivar.com.br
Maurício Meyer
Soja • Agosto 2020
Controle construído Como planejar e posicionar o programa de manejo de doenças como a ferrugem-asiática e a machaalvo em soja de modo a obter eficiência de controle e reflexos positivos na produtividade, sem que as expectativas sejam frustradas por problemas como a resistência à aplicação de fungicidas
O
s planos para o manejo de doenças muitas vezes não atingem as expectativas, seja pela realidade climática ou pelo cenário de resistência. Quando se planeja um programa de manejo para as doenças da soja, busca-se avaliar qual o principal alvo, de acordo com sua ocorrência na região, e impacto econômico. Porém, também é preciso avaliar qual fase fenológica do desenvolvimento da cultura é mais importante, do ponto de vista epidemiológico, para o referido alvo. O monitoramento é indispensável para evitar que o ambiente afete a assertividade das expectativas e, claro, evitar o uso de moléculas isoladas ou repetidamente, sob o risco de não controlar devido à resistência. Para a safra 2020/21 de soja, é necessário estar atento aos resulta03
Fotos Valtemir José Carlin
Soja • Agosto 2020
As condições ótimas para o desenvolvimento da soja no Brasil também oferecem ambiente favorável às doenças que afetam a cultura
dos de pesquisa, mostrando que o processo (como é usado o fungicida) tem mais impacto nos resultados de produtividade que o fungicida em si. Em outras palavras, muitas vezes há preocupação com a escolha do melhor produto, quando, na verdade, o “capricho” no processo de utilização é muito mais importante. Programas de aplicações iniciados mais preventivamente, apresentaram produtividade de até 8 sc/ha a mais quando comparados a programas iniciados mais curativos, mais “tarde” no ciclo da soja. Os intervalos entre as aplicações de um programa, também importante, com mais de 15 dias entre aplicações, podem roubar até 4 sc/ha em um plano com quatro aplicações. O componente fisiológico deve ser considerado para estruturar um bom plano de manejo de doenças. No desenvolvimento da soja as folhas são os principais atores, em que tanto as doenças, como as aplicações de defensivos, buscam vencer. E durante a fase vegetativa, onde a planta ainda não possui estruturas de dreno de fotoassimilados, como flores e vagens, o estado energético da planta oferece alta oferta de energia para defesas contra doenças, 04
fazendo com que se desenvolvam de forma lenta nessa fase. Assim, o início do controle, preventivo nessa fase, oferece a possibilidade de construir o manejo de doenças à medida que a planta está construindo sua área foliar. Pois na fase vegetativa é o momento em que a planta pode melhor responder aos estímulos das tecnologias utilizadas, como indutores de resistência, nutricionais e até mesmo os fungicidas. Produzindo assim uma realidade muito mais promissora para a fase reprodutiva, e certamente uma expectativa de resultados muito mais realista em relação aos planos almejados. No outro lado, o componente fitopatológico também apresenta uma baixa possibilidade de que as doenças sejam epidemicamente fortes na fase inicial da cultura. O inóculo, mesmo em condições de monocultura, ou em sistemas como soja/algodão, tende a ser baixo na fase vegetativa. As doenças presentes na área irão apresentar uma fase epidêmica inicial lenta, diretamente proporcional à quantidade de inóculo. Seja esse inóculo inicial interno da lavoura, presente nas sementes ou na palhada do cultivo antecessor, ou externo à lavoura em plantas volun-
tárias, preservando especialmente os biotróficos, como ferrugem. Dentro de uma expectativa de semeadura de acordo com as recomendações, as doenças levarão um tempo até produzirem inóculo suficiente, assim como a planta para produzir área foliar suficiente, para que uma epidemia com alta pressão se estabeleça. E justamente nessa janela tática que se deve agir para construir o controle de doenças, manejando resistência. Afinal, o melhor manejo de resistência de fungos a fungicidas ainda é a aplicação preventiva, na ausência de sintomas, logrando com isso os melhores resultados econômicos (produtividade). Porém, planejar, expectar é fácil, difícil é conseguir contornar os fatores técnicos, operacionais e, pior ainda, climáticos, de modo a atingir o resultado projetado. Onde geralmente as expectativas dificilmente alcançam a realidade. Mas um dos principais fatores que têm frustrado bons resultados, mesmo em situações de investimentos robustos em fungicidas para soja, é a resistência, com sua dinâmica diversa e difícil a cada safra, e como não bastasse, resistência para diferentes doenças da cultura da soja. Mesmo com medidas integradas de controle adotadas nacionalmente, como o vazio sanitário e a proibição de soja de segunda safra, os casos de menor eficiência dos fungicidas são cada vez mais recorrentes, não para diferentes locais, mas para mecanismos diversos de ação. Os mecanismos de resistência desenvolvidos pelo fungo Phakopsora pachyrhizi ao longo dos últimos 15 anos de controle químico são descritos em diversos trabalhos científicos. O grupo químico dos triazóis no gene cyp51, alterando a “força” de ligação dos IDMs (inibidores da desmetilação) com a enzima-alvo e superexpressão. Nas estrobilurinas, a fenil alanina trocada por leucina na posição 129 -F129L no cytB (Schmitz, 2013; Klosowski, 2015). Em ambos os casos, a resistência de populações de Phakopsora pachyrhizi a estes fungicidas é produzida por
Soja • Agosto 2020
uma seleção direcional. O uso intensivo e extensivo destas tecnologias, associado às condições ambientais conducentes à alta multiplicação do patógeno, facilitou e acelerou a seleção de mutantes, fazendo com que estes indivíduos menos sensíveis predominassem dentro da população, aparentemente sem custo adaptativo, mantendo-se virulentos e tornando o controle da ferrugem cada vez mais difícil no Brasil. Não só para ferrugem, mas Corynespora cassiicola e Cercospora kikuchii também com trabalhos científicos relatando resistência a grupos químicos de fungicidas muito utilizados comercialmente. Trazendo dificuldades e prejuízo econômico para os sojicultores brasileiros (Mathew, et al. 2019; Sautua, et al. 2019; Duan, et al. 2019). Pesquisas de campo apontaram que o aumento de dose de fungicida pela adição de outras moléculas (reforço) proporcionou incremento significativo no controle da ferrugem e impacto positivo na produtividade da soja (Mikaberidze, 2013). Aumentar ou melhorar o controle pela adição de outros fungicidas, aos normalmente utilizados, é recomendado como uma estratégia para evitar possíveis populações resistentes dos fungos aos fungicidas (Gullino, 2010). Em um programa de controle com quatro aplicações de fungicidas no ciclo da soja, a adição de fungicidas mais curativos, como do grupo químico das morfolinas, proporcionou incremento no controle e na produtividade da soja. Esse grupo químico, oferece uma excelente ferramenta para o manejo da resistência. Possui ação curativa e sítio de ação distinto dos demais fungicidas historicamente utilizados em soja. Em vista de que os fungicidas multissítio conhecidos por sua ação protetora e por consequência essencialmente preventivos, contar com uma ferramenta curativa nesse cenário traz um benefício tanto nas primeiras aplicações, no início do programa de controle, como para as últimas. As morfolinas não suprimem a germinação de esporos dos
fungos, mas são altamente eficazes na inibição do crescimento micelial (Mercer, 1991). Um ensaio conduzido por Haloch, em 1987, mostrou que o fempropimorfe foi 2,5 vezes mais eficiente do que o tridemorfe na inibição do esterol ∆8→∆7-isomerase e 43 vezes melhor na inibição do esterol ∆14-redutase. Ziogas, em 1991, publicou que fempropimorfe, mas não outras morfolinas, provoca a acumulação de esqualeno, inibindo a esqualeno epoxidase em algumas espécies de fungo. Estes trabalhos indicam que a ação fungicida do fempropimorfe se deve à privação de ergosterol através da inibição de mais de uma enzima, o que pode ser considerado bom para o manejo de resistência.
O PAPEL DAS MISTURAS NO MANEJO DA RESISTÊNCIA
A principal estratégia de manejo de resistência de fungos a fungicidas é a aplicação preventiva do ponto de vista epidemiológico, e sempre em misturas. Atualmente, na cultura da soja não existe um fungicida seguro para ser recomendado para aplicação isolada. As misturas são o futuro do controle. O uso de misturas, além de conferir múltiplos sítios de ação pode proporcionar um efeito de “aumento de dose”, uma estratégia
segura para retardar o surgimento de novas populações resistentes. A discussão sobre a efetividade do uso de misturas, com dois ou mais mecanismos de ação, como método no manejo da resistência é alvo de discussões desde os anos 1970. O primeiro benefício das misturas é o espectro de controle, onde a sensibilidade de diferentes patógenos é variável entre ativos fungicidas. Podem ser utilizadas ou entendidas como um seguro contra falhas de um dos componentes da mistura. Se o patógeno a ser controlado desenvolver resistência a um dos componentes da mistura, o outro fungicida (de um modo de ação diferente) pode garantir o controle efetivo. Por fim, as misturas sempre se referem a uma tática de manejo de resistência, aumentando especificamente a longevidade da eficiência do produto, por diminuir a taxa de evolução da resistência na população do patógeno (Bosch, 2014). A pergunta para a safra de soja 2021 é: como controlar a resistência? Teoricamente as respostas seriam: adicionando um parceiro de mistura a um fungicida, assim reduzindo a taxa de seleção. O que se deve considerar é o efeito relativo da dose dos dois fungicidas na mistura, o efeito da mistura na vida útil do fungicida
No desenvolvimento da soja as folhas são os principais atores, onde tanto as doenças, como as aplicações de defensivos buscam vencer
05
Valtemir José Carlin
Soja • Agosto 2020
A principal estratégia de manejo de resistência de fungos a fungicidas é a aplicação preventiva, sempre em misturas
e o tipo da resistência (fatores intrínsecos do ciclo de vida do patógeno). É importante entender a fase de emergência da evolução da resistência, e os efeitos das misturas durante esta fase (normalmente mais longa e não perceptível a campo, pois os fungicidas são ainda efetivos). A taxa intrínseca de avanço da resistência é o aumento líquido na densidade do patógeno (indivíduos resistentes/ sobreviventes) por ciclo de infecção por lesão patogênica (Bosch, 2014 e Elderfield, 2018). A aptidão de um biótipo de Phakopsora pachyrhizi é definida como a fração da população, por ciclo, relacionada com o tempo que um novo modo de ação permanece efetivo (Elderfield, 2018). Porém, essa estratégia é a mais efetiva para evitar o avanço dos biótipos resistentes na fase de emergência dessa população (fase não perceptível) (Milgroom & Fry, 1988 e Elderfield, 2018). A resistência aos triazóis se construiu mais rapidamente por ser utilizado apenas um modo de ação ou somente uma tática de controle (Milgroom & Fry, 1988 e Bosch, 2014). Atualmente, parece que as carboxamidas (mecanismo de ação 06
mais moderno em uso) precisam encontrar seu parceiro ideal de mistura. A construção de um fungicida multissítio pela mistura de vários sítio-específicos em uma mesma formulação, por exemplo, estrobilurina com triazol, mais carboxamida com morfolina, poderá resolver? O controle sobre o patógeno, sim. E o controle da resistência e o custo, viabilidade econômica? Ou ainda é necessário entender mais detalhadamente a dinâmica populacional de Phakopsora pachyrhizi, na sua interação abrangente em mais de 35 milhões de hectares uniformemente distribuídos de seu principal hospedeiro. No conceito para construir uma mistura de fungicidas eficiente, do ponto de vista do manejo da resistência é preciso entender o que tem maior efeito. O aumento na dose do parceiro de mistura (multissítio) ou a diminuição na dose do fungicida em risco (carboxamida). Se diminuir a dose do fungicida em risco, a eficácia do controle diminuirá. Aumentar a dose do componente de mistura, a eficácia do controle (e o custo) aumentará. Teoricamente, adicionar um fungicida “B” a um
fungicida em risco “A” diminuirá a seleção para resistência para o “A”. A adição de um fungicida em risco “B” cria pressão de seleção para resistência contra “B”. Com o objetivo de retardar a seleção, a adição de um fungicida em risco ao programa de pulverização supera a perda de colocar um fungicida adicional em risco de resistência (Bosch, 2014). Falando em multissítio ou sítio-específico, se o parceiro de mistura for multissítio de ação, teoricamente o patógeno não irá adquirir resistência, em sua população, a este princípio ativo. Atualmente, há um controle de ferrugem em soja caro e ruim, comparativamente às safras entre 2002 e 2006. Outro trabalho importante, pouco conhecido, dos autores Vittal et al. de 2012 no European Journal of Plant Pathology demonstrou a fusão de tubos germinativos nos urediniosporos de Phakopsora pachyrhizi, um mecanismo importante para a diversidade genética em Phakopsora pachyrhizi. O experimento mostrou migração de núcleos, resultando em hifas multinucleadas. Considerando a falta de um estágio sexual conhecido de P. pachyrhizi na soja, essa anastomose hifal seguida pelo ciclo parassexual pode explicar a diversidade genética na virulência entre as populações de P. pachyrhizi. Consequentemente, a rápida flutuação populacional quanto à resistência a fungicidas. O fungo pode apresentar sensibilidade alterada aos fungicidas na população de cada safra, de forma independente e diferente, não importando a herdabilidade ou a sobrevivência dos indivíduos resistentes de uma safra para a outra. O princípio governante do coeficiente de seleção e do tempo de exposição deve ser considerado para o gerenciamento da resistência usando misturas (Milgroom & Fry, 1988). Uma fração da população total do patógeno, por ciclo de infecção, está relacionada (não linearmente) ao período de tempo em que um novo modo de ação permanecerá eficaz, considerando em que momento da epidemia da doença a mistura fun-
Soja • Agosto 2020
oferecem às doenças alto índice de área foliar, aliado ao método de pulverização mais utilizado, possibilitando aos patógenos sobreviverem facilmente ao controle químico na fase final de desenvolvimento de seu hospedeiro. As condições de extensas regiões uniformemente cultivadas com soja oferecem a possibilidade para os patógenos apresentarem populações elevadas e de alta variabilidade (Vittal, 2012). Fatores que proporcionam a seleção direcional de acordo com as condições de época de semeadura, cultivar mais utilizada e condições climáticas no final da safra, intrínsecas de cada região. Ou seja, cada região de produção de soja pode apresentar sensibilidade variada aos diferentes mecanismos de ação fungicidas, o que inviabiliza um manejo padrão (Chechi, 2019). Entretanto, o manejo de doenças segue um padrão, que do ponto de vista do fungo, seja Phakopsora, Corynespora ou Cercospora, proporciona a
capacidade para que esses fungos obtenham populações selecionadas, altamente resistentes a algumas moléculas, sempre as mais populares comercialmente (Elderfield, 2018). Assim, é necessário estudar a dinâmica populacional de forma regional, a capacidade de medir o custo adaptativo de cada população, dos diferentes patógenos, para os diversos mecanismos de ação, bem como a capacidade de sobrevivência do fungo para cada região ou situação (época de semeadura, cultivar, clima, sequência de culturas). Tal informação poderá otimizar o manejo da resistência e, consequentemente, o uso eficiente dos fungicidas, de modo mais efetivo, com menor custo e com mais benefícios, não só na eficiência de controle, mas também C em produtividade. Lucas Navarini, Planta Conhecimento/ha Jairo Santos
gicida é utilizada (Elderfield, 2018). Em outras palavras, a ordem de mecanismos de ação deve ser direcionada para que o fungicida utilizado na segunda aplicação seja a mistura mais efetiva sobre a população sobrevivente (resistente) da primeira aplicação. Sempre respeitando as características de cada grupo químico, carboxamidas preventivas e triazóis curativos. Isso é muito importante para a alta eficiência de controle e para que, ao final do programa, os indivíduos sobreviventes de P. pachyrhizi sejam ainda sensíveis aos fungicidas. As extensas evidências experimentais mostraram que a adição de um componente de mistura a um fungicida em risco, sem alterar a sua dose, reduz a evolução da resistência a fungicidas (Bosch, 2014). As carboxamidas, novos fungicidas altamente efetivos contra diversas doenças na cultura da soja, mostraram alta eficiência de controle em suas primeiras safras de utilização, decaindo de forma significativa, a partir do intenso uso curativo, sob alta pressão de seleção na população do patógeno, não respeitando suas características preventivas de ação. Os fatores relacionados com o momento específico do crescimento foliar, a expressão de plantas de soja na fase vegetativa ou reprodutiva quanto à resistência à ferrugem e as mudanças nos padrões climáticos (final do ciclo com alta favorabilidade a doenças, explosão populacional do fungo, seleção) fazem com que a população de P. pachyrhizi, por exemplo, cresça mais rápido no final do ciclo da cultura (Elderfield, 2018 e Bosch, 2014). O posicionamento ou o uso inadequado desse mecanismo de ação, nas últimas aplicações, potencializou a seleção de populações menos sensíveis. Fato que afirma a teoria foram as primeiras populações menos sensíveis que surgiram nas regiões com maior pressão da doença, de semeaduras mais tardias e em safras com clima mais favorável ao desenvolvimento da doença. No Brasil, as condições ótimas para o desenvolvimento da soja
As misturas são o futuro do controle e têm papel fundamental no manejo de resistência
07
Soja • Agosto 2020 Rodrigo Rodrigues
Pronto pra usar O uso de fungicida multissítio associado a sítio-específico é uma alternativa eficiente no manejo de doenças como a ferrugemasiática na soja, bem como enquanto estratégia antirresistência aos fungos. Contar com uma formulação pronta, que contemple ambas as características, fornece maior segurança e comodidade ao produtor para realizar as aplicações 08
A
complexidade do manejo de doenças em soja vem causando uma revolução na agricultura, na fitopatologia, na indústria de proteção de cultivos e no nível de conhecimento necessário do agricultor. A cada safra o conjunto de informações empregadas na cultura da soja é maior, tanto no que tange à tecnologia de aplicação, à eficácia das pulverizações, às associações das ferramentas de controle e ao melhoramento genético ou agronômico. O controle químico, que compõe o controle integrado das patologias da cultura, tem um peso cada vez maior, na medida em que outros pilares do manejo não estejam tão solidificados naquele sistema de cultivo ou manejo. Um olhar mais abrangente ou amplo em cima do contexto da lavoura de soja faz-se necessário. A análise das metas de produtividade, juntamente com o ambiente em que a cultura está inserida, solo, clima, genética, época de plantio etc., é de suma importância na escolha das ferramentas químicas responsáveis pela proteção do cultivo, uma vez que estamos tratando uma planta e a interação doença-fungicida-planta deve ser levada em consideração. Entrando mais a fundo no controle químico das doenças da soja e olhando os tetos produtivos alcançados atualmente, tanto em nível de experimentação, concursos de produtividade e lavouras comerciais, é possível deparar-se com um paradoxo, em que não se admitem perdas por doenças na cultura, o que exige elevado nível de controle dessas doenças e a seleção direcional, principal causador de patógenos cada vez mais resistentes ou tolerantes aos fungicidas empregados. Fungicidas sítio-específicos foram e ainda são a principal estratégia para mitigar danos causados pelo complexo de doenças no cultivo da soja, porém a resistência de algumas populações de patógenos causadores de ferrugem-asiática da soja, mancha-alvo e crestamento
Soja • Agosto 2020
Severidade da ferrugem-asiática, porcentagem de controle (C) em relação à testemunha sem fungicida, produtividade e porcentagem de redução de produtividade (RP) em relação ao tratamento com a maior produtividade, para os diferentes tratamentos no experimento com fungicidas registrados. Média de 17 experimentos para severidade e 14 para produtividade, safra 2019/2020
foliar de cercóspora exige associações de vários mecanismos de ação ou produtos com diferentes sítios de ação para um controle mais efetivo ou satisfatório. O uso de fungicidas multissítios, em mistura com fungicidas sítio-específicos, deixou de ser considerado apenas um reforço e atualmente, em algumas regiões, tem peso igual ou maior na responsabilidade do controle. Isso pode ser justificado analisando três pontos de relevância no manejo de doenças: melhoria no controle, segurança do controle de doenças quando já houver resistência no campo e gerenciamento de resistência.
MELHORIA NO CONTROLE
As misturas podem ser utilizadas para ampliar o espectro de controle de doenças de um produto comercial, para combinar as características específicas dos componentes da mistura e aumentar a eficácia do produto (exemplo: atividade curativa mais protetora ou sistêmica) ou para tirar proveito das interações aditivas ou sinérgicas que levam a um melhor controle de doenças e maior flexibilidade.
SEGURANÇA DO CONTROLE DE DOENÇAS QUANDO JÁ HOUVER RESISTÊNCIA NO CAMPO
A resistência para fungicidas com vários modos de ação utilizados para se controlar doenças em soja já é uma realidade presente nos diferentes sistemas de cultivo de soja no Brasil e, para tanto, o uso de misturas prontas é melhor do que uma estratégia de alternância, pois o programa de aplicação é mais robusto em termos de controle dos indivíduos resistentes.
GERENCIAMENTO DE RESISTÊNCIA
É necessário que pelo menos dois componentes da mistura tenham atividade contra o patógeno-alvo quando utilizado sozinho. Além disso, é preciso que o controle dos ingredientes ativos combinados seja eficaz de maneira que se alcance um controle adequado da doença. Na busca por ferramentas que contemplam esses importantes pilares na construção do programa de fungicidas e pensando na comodidade ao agricultor, algumas empresas trazem ao mercado formulações de fungicidas sítio-específicos asso-
ciados a multissítios. Produtos, sem a necessidade ou a obrigatoriedade de misturas de tanque no momento da pulverização. Um exemplo dessa tecnologia foi o lançamento feito pela BASF na Expodireto 2020, do fungicida Aumenax. A primeira formulação que traz a associação de uma carboxamida mais um protetor multissítio inorgânico. A empresa testou mais de 70 protótipos de formulações para chegar à melhor combinação de tamanho de partículas da mistura. A combinação da carboxamida (fluxapiroxad), de amplo espectro e eficiente controle da ferrugem da soja, e do protetor multissítio oxicloreto de cobre, molécula de partículas extremamente pequenas, confere uma melhor distribuição e permanência na superfície das folhas. Também traz o benefício da baixa dose de uso, já que o protetor multissítio geralmente carrega em doses elevadas as formulações. Outro ponto importante é a interação das moléculas usadas na formulação. Algumas podem diminuir riscos de fitoxicidade, como é o caso de misturas prontas contendo mancozeb, ou ter efeito aditivo, como é o caso da formulação pronta 09
Soja • Agosto 2020
soja, Phakopsora pachyrhizi, na safra 2019/2020: resultados sumarizados dos ensaios cooperativos”, tabela 5, fica evidenciado no Programa 1
Rodrigo Rodrigues
de fluxapiroxad + oxicloreto de cobre, onde a carboxamida em questão mostra resultados sinérgicos e positivos, entregando controles superiores quando associada ao cobre em comparação a outros multissítios. Conhecer as características intrínsecas de cada molécula ou da associação de fungicidas, juntamente com o entendimento da dinâmica da doença (no caso da ferrugem da soja) e seu potencial epidêmico é base para a construção do programa de manejo fúngico. O amplo espectro de controle é característica da nova ferramenta, criando uma base robusta para o programa como um todo. Na Circular Técnica 160 da Embrapa “Eficiência de fungicidas para o controle da ferrugem-asiática da
(tratamento 14) a importância de se iniciar o programa de manejo com uma carboxamida de amplo espectro de controle associada a um potente protetor multissítio, no caso o cobre. Vale lembrar que a construção do programa de aplicações e seus possíveis ajustes deve levar em consideração a favorabilidade de ocorrência de doenças. Não se pode esperar uma boa performance de um fungicida se o produto for alocado em momento do ciclo da cultura ou da evolução da doença, onde suas características de atuação não condizem com a situação. O uso de multissítio associado ao fungicida sítio-específico é uma alternativa eficiente na melhora do controle da P. pachyrhizi, como também é a melhor estratégia no manejo antirresistência ao fungo. Aumenax traz praticidade e proteção com uma uma formulação única no mercado, entregando ao sojicultor a segurança e a robustez necessárias para um manejo que garanta a produtividade C da lavoura. Diego Pires, Desenvolvimento de Mercado BASF
Considerar o ambiente e a interação doença/fungicida/planta é indispensável na escolha das ferramentas responsáveis pela proteção do cultivo
10
Encarte Técnico Circula encartado na revista Cultivar Grandes Culturas nº 255 • Agosto 2020 Capa - Carolina Deuner Reimpressões podem ser solicitadas através do telefone: (53) 3028.2075
www.revistacultivar.com.br