8 minute read
Influência do clima em café
from Cultivar 126
Clima extremo
O que mostram os números das precipitações no Espírito Santo ao longo dos últimos anos em relação à produção de café Conilon, o que se pode extrair de lições e que práticas podem auxiliar a minimizar os efeitos desses eventos climáticos adversos
Wenderson Araujo CNA O estado do Espírito Santo (ES) é responsável por 13% da produção mundial e 70% da produção brasileira de café Conilon. Em 2019, o estado produziu mais de dez milhões de sacas (60kg), com produtividade média de 43 sacas por hectare (sc/ha). Em comparação, os estados de Minas Gerais e Rondônia obtiveram produtividade de 33 sc/ha e 35 sc/ha, respectivamente. A obtenção de maiores níveis de produtividade no Espírito Santo é possível devido à busca crescente por melhorias dos níveis tecnológicos e de manejo das lavouras. No estado, aproximadamente 70% das lavouras de café Conilon são irrigadas e, em associação com outras tecnologias e práticas de manejo, têm possibilitado a alguns produtores atingir níveis de produtividade superiores a 100 sc/ha.
O Norte do Espírito Santo produz 80% do café Conilon capixaba (destacado em vermelho na Figura 2c). Nesta região, o café é a principal fonte de renda em 80% das propriedades rurais. A cultura é reponsável por 35% do PIB agrícola do estado, e gera 250 mil empregos diretos e indiretos. Contudo, os crescentes custos de produção e a variabilidade climática têm gerado instabilidades na produção de café Conilon do estado.
O custo de produção de café Conilon em algumas regiões, como no município de Pinheiros, Espírito Santo, passou de R$ 10 mil/ha em 2010, para R$ 20 mil/ha em 2019 (Figura 1c), ou seja, em nove anos o custo de produção dobrou de preço. No mesmo período, o preço de venda médio anual da saca de 60kg do produto aumentou de R$ 310,00 para R$ 420,00 (Figura 1d), significando um aumento de 36%. Com isso, há a necessidade de se obter maiores produtividades para que a atividade cafeeira seja lucrativa. Em 2010, por exemplo, a produtividade média necessária para compensar os custos foi de 30 sc/ha, enquanto em 2019, foi superior a 40 sc/ha. Estas condições deixam os produtores rurais mais vulneráveis a eventos climáticos adversos, como os ocorridos durante as safras de 2015 e 2016.
A média histórica do acumulado mensal de chuva em novembro no Norte do Espírito Santo é, aproximadamente, 200mm. Em novembro de 2014, a chuva média acumulada nessa região foi de 83mm. Acumulados de chuva abaixo da média também foram registrados para dezembro de 2014 e janeiro de 2015. Os baixos volumes de chuva, associados às altas temperaturas no mesmo período, fizeram com que a produção de café Conilon em 2015 diminuísse 22% em relação a 2014. Além disso, devido às condições climáticas adversas, 9% das áreas em produção de café Conilon foram destruídas, prejudicando a safra de 2016 (Figura 1b).
Figura 1 - Os desafios da produção de café Conilon no Espírito Santo. (a) Variação espacial da área em produção de café Conilon nos munícipios do ES entre 2010-2019 (IBGE, 2020). (b) Variação da área em produção de café Conilon, entre 2010-2019, no ES (Conab, 2020). (c) Variação do Custo de produção de Conilon, entre 2010-2019, em Pinheiros-ES (Conab, 2020). (d) Variação do preço de venda de café Conilon, entre 20102019, no ES (Pecege, 2020). Variação do número de sacas de café (60 kg) necessárias para cobrir o custo de produção, entre 2010-2019, no ES
Figura 2 - A produção de café Conilon no Espírito Santo. (a) Variação espacial da produção de café Conilon no ES e Brasil entre 2010-2020 (Conab, 2020). (b) Variação espacial da produtividade de café Conilon no ES e Brasil entre 2010-2020. (c) Variação espacial da produtividade do Conilon em 2016 em relação à média do período de 10 anos (2010-2020), adaptado de IBGE (2020). Boxplots (d) da média da temperatura média mensal, (e) do número de dias com chuva nos meses do ano e (f) da chuva acumulada mensal. Os valores referentes as médias mensais da safra 2016 estão destacadas com o asterísco vermelho em (d), (e) e (f)
Figura 3 - As variáveis climáticas e a produtividade do Conilon. (a) Correlação de Pearson entre a produtividade de café Conilon e a média mensal da temperatura média (Tmed) e precipitação mensal acumulada (Chuva). Os “x” se referem à correlação não estatisticamente significante a um nível de significância de 0,05. Relação entre produtividade média de café Conilon no ES e (b) Chuva acumulada e (c) temperaura média durante a formação dos grãos de café Conilon. (d) e (e) Efeitos dos eventos climáticos extremos durante a safra 2016 no cafeeiro Conilon em Marilândia-ES
A safra de café Conilon de 2016 foi desastrosa no Norte do Espírito Santo. A precipitação acumulada dos meses de outubro, novembro e dezembro de 2015 foi a menor dos últimos dez anos (Figura 2e). O número médio de dias com chuva no mês de outubro é de 12 dias. Em outubro de 2015, a chuva ocorreu em somente dois dias (Figura 1d). O acumulado mensal de chuva em novembro foi de 30mm, o que corresponde a 15% do esperado para o mês. Além disso, as temperaturas médias mensais para novembro e dezembro também foram as maiores registradas neste século. A temperatura média em dezembro, por exemplo, foi de 27,5°C, i.e., 2°C superior à média histórica para o mês na região. As chuvas retornaram em janeiro de 2016, contudo um segundo período de seca começou em fevereiro e prevaleceu até maio do mesmo ano. Durante este período (2015/2016), também houve a proibição da irrigação em alguns locais, devido à contaminação das águas do Rio Doce pelos rejeitos de mineração provenientes do rompimento da barragem de Mariana, Minas Gerais.
Essas condições adversas destruíram, pela segunda safra consecutiva, 10% das áreas em produção de café Conilon do Espírito Santo. Nesta década, alguns munícipios do Norte do estado perderam mais de 20% das áreas em produção (Figura 1a). A produtividade média em 2016 foi 37% inferior à média histórica do Espírito Santo (Figura 2b). Alguns munícipios tiveram produtividade reduzida em mais de 60% (Figura 2c). Em 2016, a produção brasileira de café Conilon diminuiu 29% em relação à média histórica, o que correspondeu a 417 mil sacas (Figura 2a). Vale ressaltar que a variação positiva da produtividade do Conilon na região Sul do estado pouco impactou na produção nacional, uma vez que 80% da produção de Conilon é proveniente do Norte do Espírito Santo (Figura 2c).
Condições climáticas extremas, como as ocorridas durante as safras de 2015 e 2016, já podem ser consequências das mudanças climáticas. Portanto, essas condições podem se tornar ainda mais frequentes em um futuro próximo, uma vez que há tendência de mudança nos padrões de distribuição e quantidade de chuva e de temperatura.
Questiona-se, portanto, como minimizar os impactos desses eventos climáticos extremos?
É importante conhecer quais são as variáveis climáticas que afetam a produtividade do café Conilon. Para isso, correlacionou-se a produtividade média dos munícipios do Norte do Espírito Santo nos últimos dez anos, com a chuva acumulada e a temperatura média mensal do mesmo período. Os resultados indicam que o estresse hídrico e as altas temperaturas durante a formação dos grãos (Nov-Dez) podem afetar drasticamente a produtividade do cafeeiro (Figura 3a, 3b e 3c). Além disso, as altas temperaturas durante o florescimento (Set-Out) e enchimento de grãos (Jan-Mar) também prejudicam a produção da cultura (Figura 3a). C C
Nóia Júnior, Christo e Verdin Filho
Rogério de Souza Nóia Júnior, Universidade da Flórida Tafarel Victor Colodetti, Universidade Federal do Espírito Santo Bruno Fardim Christo, Agroconsult Abraão Carlos Verdin Filho, Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural
Práticas para minimizar os efeitos climáticos adversos
Irrigação
Se não for possível irrigar durante todo o ciclo da cultura, é importante manter a irrigação pelo menos entre os meses de novembro e fevereiro (momento de maior demanda hídrica do Conilon). Além disso, é importante o uso de sistemas de irrigação eficientes (e.g. irrigação localizada) e a realização do manejo da irrigação, para fornecer água em quantidade e momento adequados.
Favorecer o desenvolvimento das raízes
Um sistema radicular mais profundo e bem desenvolvido possibilita acessar maiores volumes de água no solo. Esse tipo de estratégia pode ser atingido através de mudas com sistema radicular pivotante (e.g. propagação seminífera) e/ou por meio de técnicas de manejo nutricional, como, por exemplo, através da aplicação de gesso agrícola para estimular o desenvolvimento das raízes em camadas mais profundas do solo.
Escolha de cultivares mais resistentes às altas temperaturas e ao déficit hídrico
A escolha adequada do material genético a ser utilizado é uma das prerrogativas no planejamento da atividade cafeeira. No contexto da resistência à seca, o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) lançou, recentemente, a cultivar clonal “Marilândia ES8143” e a cultivar de propagação seminífera “Conquista ES8152”. Estas cultivares apresentam características de tolerância ao déficit hídrico. A cultivar “Marilândia ES8143” pode atingir produtividade de 63 sc/ha em condições de restrição hídrica.
Adensamento
Cultivos adensados possibilitam menor incidência de radiação solar sobre o solo, diminuição da temperatura no inteiro do dossel e da perda de água por evaporação, proporciona maior aproveitamento da área e dos insumos aplicados, favorece a manutenção da umidade do solo devido à maior cobertura do mesmo, diminui a ocorrência de erosões, entre outros. No cafeeiro Conilon, o adensamento da lavoura pode se dar tanto no número de plantas por área, quanto pelo número de ramos ortotrópicos mantidos na planta.
Cultivos consorciados
Os efeitos dos eventos climáticos extremos podem ser minimizados através de cultivos consorciados. Por exemplo, o cultivo em consórcio do cafeeiro Conilon com o coqueiro-anão favorece a conservação da umidade do solo, a diminuição de danos causados pelos ventos, a menor incidência de plantas espontâneas, o maior aproveitamento da mão de obra e a possibilidade de maior retorno financeiro.
Divulgação