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Capa - Lagarta-das-fruteiras em soja

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Coluna ANPII

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Fernando Willian Neves

Fronteira rompida

Lagarta-das-fruteiras (Argyrotaenia sphaleropa) é registrada pela primeira vez em lavouras de soja do Mato Grosso. Praga comum em uva, pêssego, caqui, laranja e maçã, em grandes culturas começa o ataque pelas folhas jovens. Sua capacidade de adaptação e a ampla gama de plantas hospedeiras presentes no território nacional permitem que o inseto venha a se estabelecer em outras regiões produtoras

Asoja é a principal cultura cultivada no Brasil e, pela sua rentabilidade, tem ocupado lugar de outras culturas de importância econômica. Atualmente o País é o maior produtor e exportador mundial da oleaginosa, cuja expectativa de produção da safra 2020/21 é estimada em 133,817 milhões de toneladas, ganho de 7,2% em relação à safra 2019/20, No entanto, a produtividade da agricultura nacional está suscetível ao ataque de pragas que ameaçam a sojicultura.

As pragas, de modo geral, reduzem o volume de produção, causam prejuízos à qualidade de produtos e, conforme a infestação, podem matar as plantas e até dizimar lavouras inteiras. Por conta da diversidade de pragas, os desafios são enormes ao agricultor para elevar a produtividade. Conhecida como lagarta-das-fruteiras ou traça-verde-dos-cachos, (Argyrotaenia sphaleropa (Meyrick, 1909), Lepidoptera: Tortricidae), é um inseto polífago, com hábito crepuscular e noturno, nativo da América do

Sul, encontrado com frequência danificando frutas como uva, pêssego, caqui, laranja, maçã, entre outras culturas agrícolas cultivadas em clima temperado subtropical úmido.

Com o advento da agricultura, organismos como insetos, ácaros, bactérias, vírus e fungos tiveram oportunidades de se estabelecer em novos locais. As atividades agrícolas, de certa forma, criaram condições propícias para a ocorrência de pragas em áreas onde elas naturalmente não ocorreriam. A partir da safra agrícola 2017/18, no município de Sapezal, Mato Grosso, de clima tropical com estação seca foram observadas lagartas com comportamento bastante ativo, medindo aproximadamente 14mm de comprimento, de coloração verde-claro enroladas nas folhas de soja no terço superior. Também se alimentam das folhas antes de tecer fios de seda que formam seu abrigo em forma de galeria.

A entrada da lagarta-das-fruteiras pode ter se iniciado com um conjunto de indivíduos ou, às vezes, com um único indivíduo. A sua introdução pode ter sido não intencional, resultado secundário do transporte intencional de outro produto, como o transporte de uva in natura para o mercado consumidor da região Oeste do Mato Grosso. Em outros países da América do Sul são apresentados relatos da ocorrência desta praga na Argentina, Bolívia, Colômbia, Peru, Paraguai e Uruguai, com ataque a plantas frutíferas, ornamentais e aromáticas. As larvas podem se alimentar de brotos, folhas, flores e frutos, dependendo do hospedeiro.

A dispersão natural desta espécie não nativa no Mato Grosso é bastante limitada, com a dispersão a longas distâncias ocorrendo unicamente através de atividades humanas. Esse fenômeno da expansão geográfica da lagarta-das-fruteiras pode ser explicado por duas forças de origem antrópica: a expansão das fronteiras agrícolas e a movimentação de material vegetal.

A identificação da espécie foi feita através da morfologia e levantamento bibliográfico. Os adultos da lagarta-das-fruteiras apresentam 15mm de envergadura e 8mm de comprimento, sendo as fêmeas maiores que os machos, permanecem nesta fase durante 14 dias. Possuem cabeça com antenas filiformes e tórax com tufo de cor castanho, abdome marrom acinzentado e a parte caudal um pouco mais clara, com pelos evidentes. Possuem asas anteriores de cor variável e oscilam entre o castanho-claro e o castanho-escuro, sendo as asas traseiras cinza-claro, um pouco transparentes.

Os ovos são ovipositados em massas, média de 31 ovos/postura, cada fêmea oviposita entre 240 ovos e 260 ovos de coloração amarelada durante o ciclo de vida, vindo a emergir lagartas de coloração verde-claro, em média sete dias depois da postura. As lagartas possuem comprimento de até 14mm no quinto instar e permanecem na fase larval por 14 dias e posteriormente empupam sob as próprias folhas que lhes servirão de abrigo e alimento. As pupas possuem coloração castanho-claro. Em cada segmento do abdome possuem duas fileiras de microespinhos dorsais e ficam protegidas sob a teia durante cinco dias até a emergência do inseto adulto.

Os danos visíveis na fruticultura, por exemplo, na viticultura, ocorrem quando as lagartas alojam-se no interior dos cachos durante a floração ou nas bagas, onde danificam a casca do engaço, causando o murchamento e

Fotos Fernando Willian Neves

Na fase larval a praga produz uma espécie de teia para se abrigar, causando o enrolamento do limbo foliar

Folha de soja com danos provocados pelo ataque do inseto

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Fernando Willian Neves, UFV

consequentemente a queda das uvas. Quando o ataque ocorre próximo à colheita, provoca o rompimento das bagas, resultando no extravasamento do suco sobre o qual proliferam bactérias que ocasionam a podridão ácida, reduzindo a qualidade dos vinhos ou depreciando os cachos para o comércio in natura. Os possíveis danos em potencial na cultura da soja começam pelas folhas jovens, na qual o estádio larval produz uma teia para se abrigar, causando assim o enrolamento do limbo foliar onde se alimenta, levando ao apodrecimento do ponteiro e à redução da área fotossintética ativa.

O monitoramento semanal de pragas é a atividade que faz parte das Boas Práticas Agronômicas, as quais auxiliam na identificação e na melhor tomada de decisão. O controle do inseto adulto pode ser feito através de armadilha de feromônios sintéticos, muito utilizada por fruticultores na região Sul do País, e para as lagartas o uso de produtos biológicos à base de Bacillus thuringiensis é o mais recomendado como parte do programa de Manejo Integrado de Pragas da soja.

A ampla adaptação do inseto de temperaturas mais amenas a clima quente e úmido, além da oferta de plantas hospedeiras ao longo de todo o ano em território nacional, faz com que a praga se estabeleça em outras regiões, podendo se estabelecer em grandes culturas como a soja. A importância do relato em sua primeira ocorrência deixa em alerta as autoridades da defesa fitossanitária para melhor entender a dispersão e os possíveis danos desta praga.

A definição das possíveis vias de ingresso e disseminação da lagarta-das-fruteiras em soja é o primeiro ponto necessário para a implementação de políticas de prevenção e manejo. Essas ações devem ser acordadas entre os setores governamentais e o setor privado que tenham interesse direto na proteção fitossanitária.

A redução da área fotossintética ativa é um dos efeitos da incidência da lagarta

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