6 minute read

Esporos da ferrugem no Paraná

Marcelo Madalosso

Resultado colateral

Como a antecipação da época de semeadura da soja pode ter contribuído para que o estado do Paraná se tornasse fonte geradora de esporos da ferrugem-asiática

Aferrugem-asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, é uma doença de alto potencial destruidor da cultura, podendo causar perdas de até 70% da produção. O estado do Paraná se destaca no cenário nacional como um dos maiores produtores de soja, mantendo uma legislação rigorosa no cerco à evolução da ferrugem nas lavouras do estado.

O vazio sanitário vigente atualmente no estado vai de 10 de junho a 10 de setembro. Anteriormente à legislação atual este período se estendia do dia 15 de junho a 15 de setembro. Este fato, infelizmente possibilitou que se estreitasse a ponte que liga a geração de esporos de plantas guaxas de soja ou mesmo de safrinha, provenientes dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, que não têm legislação específica para o vazio sanitário na cultura da soja.

Anteriormente as atenções se voltavam para o Paraguai, que não adotava o vazio sanitário e era responsável pela produção de esporos tanto no plantio de soja safrinha quanto no plantio de soja no mês de agosto, também chamada soja “tempranera”. Estes esporos atingiam as lavouras paranaenses, pois eram trazidos pelo deslocamento de sistemas frontais de chuva, que passavam por aquele país, entrando pelo Brasil, via Paraná. Este fato ainda ocorre, pois o vazio sanitário adotado naquele país termina em 1º de setembro, possibilitando que os produtores semeiem a soja cinco dias antes do término do vazio, uma vez que o que vale é plântula emergida.

Os coletores de esporos até então, eram instrumentos fundamentais para se monitorar o momento de chegada desses esporos para então se determinar a aplicação de fungicidas preventivamente, baseado na presença do patógeno, nas condições ambientais favoráveis e na soja em situação de vulnera-

bilidade devido à ação do fungo Phakopsora pachyrhizi. Com isso, se fugia das aplicações calendarizadas, iniciadas durante o período de florescimento até metade do enchimento dos grãos.

Esta metodologia propiciava reduzir de três para até zero as aplicações de fungicidas, significando ganhos ao produtor, ao ambiente e para os poucos princípios ativos disponíveis no mercado para o controle de ferrugem-asiática da soja.

A antecipação do plantio e a utilização de cultivares precoces com o intuito de se criar áreas de escape da ferrugem-asiática da soja, na verdade criaram outro problema, que foi a transformação destas áreas de escape em áreas fontes geradoras de esporos. Tal afirmação é baseada no fato de que tanto na plataforma do Consórcio Antiferrugem como na plataforma Alerta Ferrugem, do IDR-PR, tanto os esporos como o aparecimento dos primeiros sintomas de ocorrência têm sido registrados cada vez mais precocemente.

Na safra 2019/2020, segundo a plataforma Alerta Ferrugem, os esporos foram identificados nos coletores no dia 31 de outubro, no município de Vitorino, Paraná, no Sudoeste do estado (Figura 1). Os sintomas nas folhas também foram detectados nessa mesma região e relatados na plataforma do Consórcio Antiferrugem (Figura 2). Nas safras 2018/2019 e 2020/2021 o mesmo ocorre, com aparecimento precoce em 31/10/2018 e 21/10/2020, respectivamente, sob condições favoráveis, na mesma região do Paraná, corroborado pela plataforma do Consórcio Antiferrugem.

Anteriormente a este novo calendário do vazio sanitário, mesmo em períodos de El Niño, o aparecimento de ferrugem da soja se dava na segunda quinzena do mês de dezembro. Em anos de La Niña observou-se que os esporos chegavam mais tardiamente no início do mês de janeiro.

O aparecimento precoce de ferrugem-asiática nestes locais enseja que pelo menos três a cinco aplicações de fungicidas devam ser realizadas para controle da doença na região Sudoeste, em condições normais de tempo, uma vez que com o aparecimento precoce dos esporos, no final do mês de outubro e no máximo um intervalo de 15 dias para outra aplicação, dependendo do estádio da cultura.

Se as condições meteorológicas indicarem alta probabilidade de ocorrência de chuvas, o controle fica mais difícil, e a doença facilmente se dissemina por toda a região e por todo o estado, como na prática já está ocorrendo. Tal situação destoa da afirmação de que se antecipando o plantio se poderia reduzir o número de aplicações. Na metodologia adotada pelo IDR-PR, o aparecimento de apenas um esporo viável já é razão suficiente para se dar início às pulverizações.

O que se observa é que as informações obtidas via coletor de esporos estão indicando uma antecipação também no controle de ferrugem-asiática, o que, na prática, revela que a antecipação do plantio de nada adiantou com relação à possibilidade de escape da doença.

Por sua vez, com o início dos relatos de presença de esporos nos coletores, o gatilho para aplicação de fungicidas começa a ser disparado em todo o Paraná, pelo pavor de que a doença possa se alastrar rapidamente e dizimar as plantações. Sem dúvida, para os produtores que trabalham com cultivares mais tardias ou mesmo precoces cultivadas no mês de outubro, serão necessárias mais que três aplicações para supostamente controlar a doença.

Por que na região Sudoeste do

Figura 1 - Localização do primeiro esporo detectado no coletor de esporo do município de Vitorino (PR), na safra 2019/2020, na região sudoeste do Paraná. Fonte: Alerta Ferrugem (IDR-PR)

Figura 2 - Ocorrência de ferrugem-asiática da soja no estado do Paraná. Fonte: Consórcio Antiferrugem, safra 2018/2019

Figura 3 – Concentração de relatos de detecção de esporos de ferrugem em coletores de esporos na rede do IDR – PR, safra 2020/2021. Fonte: Alerta Ferrugem (IDR-PR)

Paraná a epidemia tem se iniciado antes de outras regiões do estado? Primeiro, pela proximidade com estados onde não se adota o vazio sanitário e estreitamento da ponte verde de sobrevivência do patógeno. Segundo, porque o plantio precoce utilizando cultivares precoces, possibilita presença de hospedeiro verde mais rapidamente na região. Em terceiro vem o clima favorável, em que a maior parte das frentes frias chega primeiro a esta região, depois se dilui para as demais regiões do estado, levando chuva ou não.

Nesta safra especificamente, 2020/2021, apesar da ocorrência de estiagem no estado, a região registrou índices pluviométricos melhores que as demais regiões, possibilitando o estabelecimento da cultura logo após o término do vazio sanitário, em 10 de setembro. Neste momento de intensas chuvas, muitas lavouras já estão em ponto de colheita, enquanto na maior parte do estado a soja ainda está na fase de formação de vagem e enchimento de grãos.

Se as condições meteorológicas desta região se refletissem em todo o estado do Paraná, certamente a maioria dos produtores teria semeado a cultura da soja logo após a liberação do vazio sanitário, e a situação seria muito pior do que a observada agora, com relação à ferrugem-asiática da soja.

Os primeiros e a maioria dos relatos de esporos se concentram na região Sudoeste do estado, demonstrando claramente uma concentração de esporos nesta região que claramente é fonte geradora de esporos que irão contaminar outras lavouras do Paraná (Figura 3).

O esporo da doença já se encontra diluído no estado do Paraná e isto conduz a refletir sobre a necessidade de um período maior de vazio sanitário ou de manutenção do período de vazio anterior, fechando em 15 de setembro, pois como já observado, o estado ingressou na condição de autossuficiência na produção de esporos de ferrugem-asiática, talvez nem sendo necessária a utilização de coletores, uma vez que já há produção doméstica. C C

Claudinei Antonio Minchio, IDR-PR

Valtemir José Carlin

A ferrugem-asiática é uma doença com alto potencial de destruição na cultura da soja

This article is from: