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CONCLUSÃO

de nós profissionais atuantes na sociedade em todos os campos profissionais.

Neste trabalho, ao se falar de entulho se fala de dois temas paralelos: recursos e memória. Lixo é energia, é dinheiro e é herança natural produzido pela terra e/ou ciência humana. Resíduos são recursos até terem seu ciclo produtivo esgotado, o que não ocorre na atualidade. Por isso se mostrou necessário compreender o sistema de gestão de entulho vigente na cidade de São Paulo. Para além de recurso, os resíduos – em específico neste trabalho, o RCD – são testemunhos físicos de uma ética, moral, poética e estética até então vigentes, e só por isso já deveriam ser preservados em relação ao seu ciclo produtivo e de gestão de resíduos. Por conta desta visão pré-determinada sobre a importância do entulho que foi necessária a compreensão do status real que estes resíduos têm em nossa sociedade. E para além da história da gestão do entulho, é impossível dissociá-la da história da cidade e consequentemente de seus espaços públicos, o outro tema tratado neste trabalho.

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Compreender as raízes da desigualdade socioespacial em São Paulo é compreender que este trabalho só faz sentido junto a um coro de soluções semelhantes e todos respaldados por validação e investimento estatal. Até lá, saídas descentralizadas vindas do povo em direção ao Estado se mostram cada vez mais precisas e ocorrentes, ao mesmo tempo que mostram que a população começa a modificar seu raciocínio vigente até então.

Este texto foi produzido sob a visão de que a arquitetura pode capacitar a população e servir como ferramenta para uma sociedade mais sustentável em todos os seus sentidos: economicamente viável, ambientalmente correta e socialmente justa. A gênese prática deste trabalho busca seguir a visão de que a arquitetura não se basta dentro das estruturas institucionalizadas da academia, laboratórios e escritórios, mas sim floresce no campo prático. Projetar é praticar a arquitetura, mas somente no campo da atuação – o canteiro – que o projeto se consagra e a arquitetura realmente acontece. A final de contas, projetar é fazer com que a teoria e a prática não só dialoguem, mas frutifiquem.

Neste trabalho – que durou dois anos em sua totalidade, incluindo o primeiro processo experimental – a proposta de uma opção frente ao status-quo de gestão de espaços públicos e de lixo se mostrou necessária em duas escalas. A primeira, de cunho individual e de comunidade, busca respostas imediatas para problemas reais, e por isso a criação de um manual para o

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Imagem 112:

Produção total do processo prático de pesquisa. Mais de 300kg de concreto reciclado.

reuso de RCD. A segunda, de alçada coletiva e governamental, busca compreender de que formas essas diferentes problemáticas estudadas – lixo e espaço público em relação as populações carentes – podem se relacionar e sublimar soluções possíveis para suas mazelas. Infelizmente, somente com amplo amparo estatal de políticas públicas uma resposta como a dada neste trabalho pode causar um impacto real e na escala da população e território paulistano. Por isso que ao mesmo tempo que este projeto tem caráter sistemático e de ampla abrangência – quando se trata da tecnologia desenvolvida – mas também individual e poético, quando se oferece o poder de escolha às populações carentes sobre o destino dado aos seus resíduos.

Falar “O início, fim e o meio” é compreender que o ciclo produtivo não tem exatamente essas etapas como imaginamos, é entender que existem infinitos tipos de início de vida de um material, de uma política pública, de um espaço livre. É tentar entender que o “fim” é uma ilusão propagandeada pelo sistema econômico vigente e que o verdadeiro fim para um objeto – uma pessoa ou um espaço – reside dentro de nós e na memória que

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geramos deste objeto. Por final, o meio acaba por ser, ao mesmo tempo, o conglomerado de ações e vivências entre estes “inícios” e “fins”, mas também o território e as condições que todas essas ações e vivências têm palco.

Este trabalho busca entregar, mesmo que de forma seletiva, o que as políticas públicas em sua pretensa universalidade nunca garantiram: gestão sustentável de resíduos e disponibilidade de espaços públicos de qualidade difundidos em todo o território urbano. Lembrar-se do fim, do início e, principalmente, do meio das coisas é lembrar que o poder de ação e, principalmente, de subversão. Esta última reside em todos nós, e é dever – pra não dizer uma forma de reparação histórica – dos profissionais da arquitetura “instruídos” devolver as populações carentes o poder criativo e o direito de projetar seu futuro sendo fiel aos seus recursos: econômicos, sociais e ambientais.

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