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Jornal Laboratório do Curso de Comunicação Social do Uni-BH Ano 29 • número 186 • Outubro de 2011 • Belo Horizonte/MG
Vapt vupt! Festivais de cenas curtas mostram que é possível falar muito em poucas palavras
divulgação/guto muniz
PÁGINAS 2 e 3
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Belo Horizonte, outubro de 2011
Teatro
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15 minutos... e nada mais Festivais de cenas curtas movimentam o fazer teatral em várias cidades brasileiras fotos: divulgação/guto muniz
Criar uma história envolvente e coerente, mas que dure apenas 15 minutos: esse é o desafio proposto pelos festivais
Giovanna Almeida 7º período Edição: Diego Costa Foram 103 projetos inscritos, 62 de Minas Gerais e 41 de outros estados. De São Paulo vieram dez, do Rio de Janeiro, oito e só em Belo Horizonte foram 50. Esses são alguns dos números do 12º Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto, que, em 2011, selecionou 16 cenas. A quantidade de inscrições pode até impressionar, mas não está distante de outros festivais que, a cada ano, apresentam cenas teatrais de 10 a 15 minutos de duração. No Brasil, é possível encontrar pelo menos seis festivais que seguem esse formato. O festival de Paranapiacaba, no estado de São Paulo, chega a sua 11ª edição, em 2011. O Festival Dulcina de Cenas Curtas, em Brasília, e o Festival Cenas Breves de Teatro, de Manaus, surgiram há menos de cinco anos. Esse tipo de evento tem influenciado o próprio processo de criação dos grupos de teatro, instigando os artistas a experimentar novas linguagens cênicas e no-
vas soluções de dramaturgia. As propostas procuram misturar cenas de palco e rua nas apresentações. Sejam comédias com dramas, performances, ou mesmo dança e bonecos. “O que temos visto ao longo desses anos são muitos acertos. A efervescência criativa que temos presenciado, desde a primeira edição, realimenta nossas energias e nos faz acreditar que caminhamos na direção correta”, conta Leonardo Lessa, Coordenador Geral do Galpão Cine Horto. Debate e reflexão O festival também integra um ciclo de debates e encontros sobre as cenas apresentadas no evento, chamado de “O Dia Seguinte”, realizado desde a nona edição, em 2008. O objetivo é aproveitar a diversidade dos grupos para promover a troca de informações, experiências e repertórios. Durante os quatro dias seguintes às apresentações, no turno da tarde, os grupos e artistas de cada sessão se reúnem com um mediador para um bate-papo sobre seus proces-
sos de criação e suas cenas dentro dos espetáculos. “Esse encontro de diferentes culturas abre novas possibilidades de diálogo e confere ainda mais vigor ao Festival”, ressalta o coordenador. É nesse momento que os grupos têm a oportunidade de discutir linguagens teatrais, conhecer o movimento cultural de ou-
Mas ao contrário das apresentações, que chegam a lotar os 200 lugares do teatro
Wanda Fernandes, no Galpão Cine Horto, os encontros não aguçam a curiosidade e o interesse de muitos. Tiago Pena, coordenador de comunicação do espaço, explica que esse formato, apesar da gratuidade, é pouco atrativo ao grande público, que normalmente tem pequena disponibilidade no horário e raramente se interessa pelo simples debate. “Isto se deve ao conteúdo da discussão, que se limita a um panorama superficial dos trabalhos, sem criar uma interlocução objetiva entre as cenas e referências externas. Além disso, ca-racterísticas estruturais, como a curta duração, que é de cerca de duas horas, e o horário, das 15h às 17h, são barreiras para a participação”. Apesar do problema, a intenção da produção é sempre repensar e avaliar o formato de todo o festival. Para isso, algumas medidas foram criadas a fim de enriquecer “O Dia Seguinte”, como o convite a pesquisadores e jornalistas importantes para a mediação dos encontros, além da inserção de temas e provocações aos artistas e ao público. reprodução
“A efervescência criativa que temos presenciado realimenta nossas energias e nos faz acreditar que estamos na direção correta” Leonardo Lessa tros lugares e trocar experiências com pessoas de tradições e escolas de teatro de diferentes metodologias.
Cartaz do Festival de Cenas Curtas da cidade de Juiz de Fora
Teatro
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Síntese e invenção A marca mais óbvia de uma cena curta é o tempo: aproximadamente 15 minutos. E é assim que os atores descobrem a dificuldade em se definir o material pronto em relação ao processo de criação e montagem. O ator da Cia do Chá, Jésus Lataliza, conta que durante a criação da cena o grupo precisou organizar as ideias e as vontades de cada um dentro do tempo determinado. “O desafio foi grande, pois não queríamos esticar a cena, aumentando o tempo de duração, queríamos continuar a pesquisa do que já estava sendo desenvolvido”, acrescenta Jésus. Uma segunda característica é direcionar a pesquisa e selecionar a abordagem da investigação teatral que se pretende levar para a cena. Os festivais buscam trabalhos que arriscam novas ideias, o que deve ser feito de forma precisa e pontual. Já o público quer participar ativamente e entrar no jogo proposto pelo grupo durante os poucos minutos de apresentação. Na maior parte dos festivais, os espectadores votam e determinam as
cenas vencedoras de alguns dos prêmios. Para enviar o projeto de uma cena curta, o ator ou produtor deve pensar detalhadamente na proposta. Os festivais procuram cenas que arrisquem em textos de autoria própria, de caráter experimental. Dramaturgias prontas também não são descartadas, dependendo da proposta de montagem. Muitos grupos apostam em crônicas ou contos para a criação de cenas. Mas a maioria acaba surgindo por meio da criação coletiva, em que toda a equipe constroi o trabalho. “A gente começa a desenvolver de forma um pouco mais organizada, na medida em que os festivais vão ganhando projeção”, conta Leonardo Lessa. Isso não significa que uma cena curta, necessariamente, se transforme em espetáculo. Ele acredita ser uma oportunidade para quem tem boas ideias e pode apresentálas ao público.“Esse contato vai dizer muito do futuro do trabalho e dos desdobramentos que a pesquisa pode ter” conclui Leonardo.
Festival do Galpão Cine Horto, em Belo Horizonte, é um dos mais importantes do país
Alguns festivais pelo Brasil
divulgação
• Festival Dulcina de Cenas Curtas Edição: 4ª Onde: Brasília - DF Informações: www.dulcina.art.br/cenascurtas
• Festival Breves Cenas de Teatro Edição: 3ª Onde: Manaus - AM Informações: www.brevescenas.com.br
• Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto Edição: 12ª Onde: Belo Horizonte - MG Informações: www.galpaocinehorto.com.br
. Mostra Cena Breve Curitiba Edição: 7ª Onde: Curitiba - PR Informações: www.ciasenhas.art.br
• Festival de Cenas Curtas de Teresina Edição: 1ª Onde: Teresina – PI Informações: ongpontodeequilibrio.blogspot.com
• Festival de Cenas Curtas de Juiz de Fora Edição: 3ª Onde: Juiz de Fora – MG Informações: http://www.pjf.mg.gov.br/funalfa
Teatro feito na conta do chá
Cena de uma das peças do grupo: “Ensaio para outra história”
A possibilidade de conhecer novas cidades, novos artistas e teatros são alguns dos desejos de atores e diretores ao se inscreverem para os festivais em todo país. Além disso, existe sempre a curiosidade de se apresentar para um público diferente do que se está acostumado em sua cidade ou região. O riso e o silêncio em momentos nunca pensados durante a cena dão, ao artista, a necessidade de reorganizar o trabalho durante a própria apresentação das peças. Estes instantes acabam por proporcionar ao grupo o amadurecimento na criação dos roteiros.
Jésus Lataliza, ator da Cia do Chá, conta que os festivais de cenas curtas são importantes tanto na formação do público, quanto na dos artistas. “O festival cria para o espectador e para o artista uma possibilidade nova de assistir teatro. Novos dramaturgos, diretores, encenadores, atores, iluminadores, muita gente pensando teatro, isso é o mais legal. É o teatro se movimentando”. Ele conta, também, que a participação no Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto deu ao grupo maior visibilidade, por o local ser um espaço de grande renome no país e casa
de diferentes projetos. “É um lugar que respeita o artista”, avalia Lataliza. Formada em 2007, a Cia. do Chá conquistou o prêmio Cena Espetáculo com o trabalho “A mudança”, na 10ª edição do Festival de Cenas Curtas Galpão Cine Horto, em 2009. Com “Ensaio para outra história”, o grupo foi o vencedor da categoria Criação em Dramaturgia, no Festival de Breves Cenas de Manaus, em 2011. A Companhia também participou do 3º Festival Dulcina de Cenas Curtas, em 2010, em Brasília e da 5ª Mostra de Cenas Breves de Curitiba, em 2009.
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Belo HorIzonTe, ouTuBro de 2011
Espaços culturais
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Galpão Cine Horto une pessoas pelo teatro Centro Cultural se destaca na formação de artistas e educa gerações por meio da arte Jonathan maxuell 8º pEríodo
Edição: rodrigo Espeschit O Centro Cultural Galpão Cine Horto foi criado pelo Grupo Galpão, tradicional companhia de teatro, com quase 30 anos de existência. Instalado em um importante cinema de Belo Horizonte da década de 1950 que estava abandonado, o local é hoje referência de fomento, de pesquisa e de compartilhamento das artes cênicas. A criação do Galpão Cine Horto se deu como uma consequência do trabalho do Grupo Galpão, que queria expandir suas atividades. Para o coordenador geral, Leonardo Lessa, o instituto cultural “surgiu para ocupar um espaço de diálogo entre o Grupo Galpão e a sociedade, atingindo de forma mais ampla a comunidade artística local e nacional e até o cidadão comum”. Desde 1998, ano de sua fundação, mais de 1,4 mil eventos foram realizados pelo Galpão Cine Horto em todo o território nacional Aproximadamente, 2 mil alunos participaram dos cursos livres de teatro, oficinas e núcleos de pesquisa. Só o projeto Conexão Galpão, por exemplo, de caráter sócio-educativo e voltado para estudantes do ensino funda-
mental, atinge cerca de 10 mil crianças por ano. Valor reconhecido A jornalista cultural, apresentadora do programa Cultura Geral, na rádio Guarani FM, e do Agenda Cultural, na TV Alterosa, Carolina Braga, reitera o papel fundamental do Galpão Cine Horto no cenário cultural de Minas e do Brasil. Para ela, o centro cultural é responsável pela “renovação de uma geração de artistas que nasceram e cresceram em BH”. Um desses artistas é o ator e promotor cultural Paulo Azevedo, fundador e ex-integrante do Grupo Espanca. Em 2002, o belo-horizontino foi aluno do projeto Oficinão, destinado ao aprimoramento e reciclagem de atores com experiência. “Muito do que entendo da minha vocação foi possível graças à possibilidade de estar nesse lugar, onde há a experimentação e o risco”, destaca. Paulo e o Espanca encenaram “Por Elise” no Festival de Cenas Curtas do Galpão Cine Horto, em 2004, projeto voltado para artistas profissionais e amadores, em que propostas artísticas são transformadas em cenas de até 15 minutos. Seis meses depois, a cena curta se transformou em espetáculo com estreia no Festival de Teatro de Curitiba. Em 2005, o espetáculo
recebeu o prêmio Shell de Teatro, um dos mais importantes do segmento. Carolina Braga foi aluna da primeira turma do Curso Livre de Teatro, em 1998, ministrado pela atriz e diretora Rita Clemente. De lá para cá, a jornalista tem acompanhado bem de perto o trabalho do centro cultural. “Eu estive perto o tempo inteiro: primeiro como aluna e depois como repórter”, conta. A apresentadora, que divide o teatro recente mineiro em antes e depois da criação do Galpão Cine Horto, considera o “instituto extremamente importante na formação de uma classe artística”. E para a formação dessa classe, os cursos, as oficinas e os núcleos de pesquisa são fundamentais. Formação continuada Um dos 18 projetos desenvolvidos pelo Galpão Cine
“o instituto é extremamente importante na formação de uma classe artística” Carolina Braga
Horto é o Cine Horto Pé na Rua, uma espécie de continuação do Oficinão, para atores que querem complementar a formação. Aliás, esta formação é vista pelo centro cultural como contínua. Leonardo Lessa garante que “[no Galpão Cine Horto] o ator não só executa, mas pensa, projeta e investe na sua formação de forma continuada”. A atriz Fabiana Brasil concorda com o coordenador. Ela vê no instituto cultural um espaço que disponibiliza todas as ferramentas para o sucesso do profissional em teatro. “Nós oferecemos nosso trabalho como atores e eles nos dão os subsídios necessários: de local de ensaio, de agendamento e de produção dos espetáculos”, comenta. E a intenção é mesmo essa, investir na formação do artista e de um pensamento artístico. A diretora de teatro Juliana Pautilla acredita que o Galpão Cine Horto é “muito ativo com seus projetos, formando pessoas, artistas e incitando a discussão da arte”. Outro projeto de destaque é o Sabadão, que transforma esse dia da semana em encontros com artistas da cena teatral brasileira. Também voltado para a continuação da formação dos estudantes e profissionais do teatro, nestes encontros, o fazer teatral é discutido e os participantes têm a oportunidade de
compartilhar das experiências dos artistas já consagrados. De forma geral, os projetos foram criados a partir da demanda dos artistas do teatro. Mais que isso: são os próprios artistas quem executam os projetos, tornando-se parte da gestão do centro cultural. Acervo pioneiro O Grupo Galpão fundou, em 2005, o Centro de Pesquisa e Memória do Teatro (CPMT), para responder à demanda de pesquisadores que queiram estudar os projetos do centro cultural. O CPMT tem um acervo bibliográfico, audiovisual e iconográfico especializado em teatro, com mais de 4 mil títulos, entre livros e DVD’s. A iniciativa é pioneira no Brasil. O Centro de Pesquisa e Memória do Teatro possui o selo Edições CPMT, criado em 2008, que publica a Revista Subtexto de Teatro e dos Cadernos de Dramaturgia do Galpão Cine Horto. O espaço também é responsável pelo Portal Primeiro Sinal (www. primeirosinal.com.br), com informações sobre o local. Acompanhe a programação do Galpão Cine Horto: www.galpaocinehorto.com. br, (31) 3481-5580 ou diretamente no local, na rua Pitangui, 3643, bairro Horto, zona Leste da capital. divulgação/guto muniz
Comunidade é beneficiada com textos cênicos que levam à reflexão do cotidiano. Cursos livres de teatro, oficinas e núcleos de pesquisa atingem 2 mil alunos
Espaços culturais
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Futeb l: a grande identidade nacional
Museu do Futebol legitima a modalidade como uma manifestação cultural brasileira Fotos: divulgação
Rafael Arruda
de Jairzinho, no jogo entre Brasil e Inglaterra, válido pela Copa de 1970, narrado por Fiori Giglotti. “É uma linha do tempo da transmissão esportiva no rádio brasileiro. Aqui, temos a oportunidade de conhecer locutores que fizeram sucesso desde as épocas em que o futebol ainda estava em crescimento, até a atualidade, com o esporte sendo esse fenômeno cultural no país. Percebemos a diferença das locuções dos anos 40 para hoje. A cada período, um novo estilo foi adotado”, diz o estudante de Direito, Antônio Leandro Gonçalves, de 20 anos. Sob as arquibancadas do Pacaembu, no Museu do Futebol, a sala que reproduz sons de torcedores arrepia muita gente. A sensação de estar no meio delas é tão grande, que a pessoa pode sentir nos pés a vibração do estádio. À frente do público, existem telões que mostram o movimento e o contraste de torcedor, estádio e jogadores. Cada hora, um canto de uma torcida diferente é tocado.
4º período
Edição: Diogo Silva A história do esporte no Brasil é contada pelo Museu do Futebol, localizado no Estádio do Pacaembu, em São Paulo, de maneira completa. São três ambientes de conhecimento e interação. No primeiro, existem flâmulas, figurinhas, botões e escudos de times. No segundo, estão os áudios e vídeos de gols históricos, inclusive com depoimentos da crônica esportiva brasileira. Além disso, há fotos e quadros informativos com os principais momentos do futebol. Por fim, no terceiro ambiente, estão as regras e expressões do universo da modalidade apresentadas em quadros coloridos. O visitante pode, ainda, conhecer diferentes versões de mesas de pebolim e esquemas táticos e salas com vídeos de dribles, grandes defesas e gols. Quem for ao Museu do Futebol tem a oportunidade de ouvir as narrações de gols decisivos na voz de grandes locutores, como os da final da Copa de 1950, entoados por Jorge Cury, ou, ainda, o gol
O acervo apresenta milhares de fotos e um conteúdo interativo, que aproxima o visitante
@
Ouça entrevista com o repórter Rafael Arruda sobre a viagem a São Paulo no site: www.jornalimpressao.com.br
Popularização do esporte A aceitação da prática esportiva de cidadãos negros e a decisão de profissionalizar o futebol no então governo de Getúlio Vargas são destaques no Museu do Futebol. Os dois fatos justificam, em parte, a consolidação do esporte de orgiem bretã como uma das principais marcas da identidade nacional brasileira. “Antes disso, os universitários foram os primeiros a abandonar o futebol, pois na época era muito melhor tentar ser médico, advogado ou engenheiro, do que se arriscar numa profissão que não tinha tanto destaque como hoje”, afirma o repórter do jornal “Hoje Em Dia” e pesquisador da história do futebol, Pedro Rotterdan. A regulamentação do futebol como profissão acabou obrigando os clubes a darem oportunidade para que os homens de classe mais baixa pudessem jogar e trabalhar
como atletas, gerando uma boa aceitação do público em geral. Outro elemento que ajudou o desenvolvimento do futebol no Brasil foi o forte apoio da imprensa. A era do rádio popularizou o esporte e revelou grandes narradores esportivos, como é o caso do lendário Ary Barroso, torcedor declarado do Flamengo. O compositor era tão apaixonado pelo time que, ao narrar lances das equipes adversárias, usava falas como “os inimigos estão vindo com tudo!” ou, até mesmo, “tira essa bola daí!”. Charles Miller, ao trazer o esporte para o país, com certeza, não imaginava a dimensão e a importância que ele ganharia. A modalidade extrapolou os limites de prática esportiva e a tornou essencial para a compreensão da formação antropológica do povo brasileiro.
Inaugurado em 2008, o Museu do Futebol mantém preservada a história do esporte
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Flávio Tavares Marcos de Souza William Alves 7º período
Edição: Rodrigo Espeschit Sidney Lumet conseguiu um acachapante sucesso na década de 70, com filmes como Um dia de cão (“Dog Day Afternoon”, 1975) e Rede de intrigas (“Network”, 1976). Mesmo assim, manteve-se fiel às suas convicções e instaurou um novo modus operandi cinematográfico. Esta matéria relembra os principais pontos da carreira do cineasta, morto em 9 de abril de 2011, aos 86 anos, vítima de um linfoma. Depois de se estabelecer em uma bem-sucedida carreira de diretor de programas de televisão, Lumet decidiu rumar para o cinema e o primeiro fruto disso foi Doze Homens e uma Sentença (“12 Angry Men”), de 1957. O filme conta com Henry Fonda no papel principal, a essa altura um talento já consolidado, principalmente depois de atuar em Vinhas da Ira (“The Grapes of Wrath”), de John Ford, dezessete anos antes. Vinte e cinco anos depois de sua estréia cinematográfica, Lumet afirmaria ao entrevistador Don Shewey: “Eu gosto de fazer filmes sobre homens que evocam coragem para desafiar o sistema vigente”. Ao filmar Doze Homens e uma Sentença, cuja história se concentra em Davis, único membro de um júri que se opõe a uma decisão apressada que ceifaria a vida de um jovem infrator, Lumet prova que os seus princípios cinematográficos duraram ao me-
nos um quarto de século. Em O Homem do Prego (“The Pawnbroker”, 1964) o diretor resvala em sua própria história, ao narrar o holocausto sob o ponto de vista de um judeu. Os pais de Lumet eram judeus e ele próprio se envolveu efetivamente com arte através de um papel em um teatro judaico, aos cinco anos de idade. Ele também passou três dos seus oitenta e seis anos servindo ao exército dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, o que lhe proporcionou know-how suficiente para conceber sua obra. Na cena mais emblemática do longa-metragem, Jesus Ortiz, empregado, pergunta ao seu patrão, o judeu Nazerman: “Como vocês (judeus) se envolvem tão naturalmente com os negócios?”. Nazerman tenta esconder a irritação, adotando um tom brando no início da sua resposta, mas logo acaba se descontrolando e revela a frustração com a intolerância e zombaria que o rodeiam: “Como? Ora, eu só posso ser um feiticeiro!”. O Homem do Prego foi ambientado em Nova York, cidade que se tornou uma espécie de metonímia para o trabalho de Sidney Lumet. E é a “Grande Maçã” que sedia dois dos filmes mais conhecidos do diretor, Serpico (1973) e Um Dia de Cão, ambos com o astro Al Pacino como protagonista. “Um Dia de Cão é um filme controlado pelo tempo, mas dirigido com grande espontaneidade. É um suspense em forma porque cria a tensão pelas esperas e falsas expectativas, mas no fundo é um estudo de perso-
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nagens em seus limites. E é forte justamente por isso, porque cria interesse em várias vertentes e todas elas estruturam o filme em seu desenvolvimento”, afirma Filipe Chamy, redator da revista Zingu!, especializada em cinema. A rigor, o cerne da trama de Um Dia de Cão se resume a um assalto que deu errado e acabou atraindo mais atenção que deveria. Mas, como Chamy bem observa, há vertentes. Uma delas é a justificativa de Sonny para o roubo: uma mudança de sexo para o seu amante homossexual. “Em princípio, Sonny é o herói da multidão e ele executa uma desafiadora dança em frente ao banco, assemelhando-se a um rockstar se exibindo aos seus fãs. Quando o fato de que Sonny é bissexual se torna conhecido, a multidão se volta contra ele. Mas dentro de um curto período de tempo (Nova York sendo Nova York), gays libertários passam a apoiá-lo”, analisa Roger Ebert, crítico de cinema do Chicago Sun Times. Lumet se ancora em seu terreno favorito – o filme policial – mas não perde a oportunidade de cutucar significativamente a (suposta) cidade mais cosmopolita do mundo, brincando com assuntos tão díspares quanto a sexualidade e o show business. Afinal, como atestou o próprio diretor em entrevista, “embora a meta de todos os filmes seja entreter, o tipo de filme que acho que vai um passo além obriga o espectador a examinar uma ou outra faceta de sua própria consciência, estimula o pensamento e faz fluir a criatividade”.
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Um
Este ano o cinema diretor que soube man trabalhando com os gra
@ Doze homens e uma sentença: cartão de visitas
Veja fi www.j
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contra o mundo ! Fotos: divulgação
a perdeu Sidney Lumet, nter a independência, mesmo andes estúdios de Hollywood.
filmografia completa no site: jornalimpressao.com.br
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No sucesso e no fracasso, um cineasta sempre influente Howard Beale é um respeitado âncora de um respeitado telejornal estadunidense. No entanto, Beale está gritando alto em frente às câmeras, veias pulsando perigosamente em seu pescoço: “eu estou louco como o diabo e não vou aguentar mais isso”. O ato contagia toda a cidade e, pouco após a exibição, milhares de pessoas estão debruçadas em suas janelas, também loucas como o diabo e gritando que não aguentam mais. A célebre cena faz parte de Rede de Intrigas. Como Um Dia de Cão havia sido lançado apenas um ano antes e também tinha como um de seus temas a obscena intrusão da imprensa em dramas pessoais, pode-se afirmar que Rede de Intrigas começa onde o outro termina. “O filme representa um olhar certeiro de Lumet sobre o mundo. E não somente o mundo de 1977. O enredo continua atual”, diz Leo Pyrata, cineasta belo-horizontino. Equus, de 1977, é, provavelmente, a obra mais subestimada do diretor. Longe de obter a mesma aclamação de seus outros filmes, Equus acompanha a saga de Martin Dysart (Richards Burton) em identificar o criminoso que teria como bizarro fetiche cegar cavalos em um estábulo de Hampshire. Rendeu a Richard Burton um Globo de Ouro e uma indicação ao Oscar.
Legado Lumet fez filmes memoráveis do começo (Doze Homens e uma sentença) ao fim (Antes que o diabo saiba que você está morto, “Before the devil knows you’re dead”, 2007), completando exatos 50 anos de filmografia. O diretor cravou profundas marcas no cinema e também na televisão, em diversos seriados contemporâneos. “Ele deixou o drama urbano mais ‘cotidiano’, ao instaurar temas que não eram literários e nem arquetípicos como o perigo da irresponsabilidade nuclear (Limite de segurança), a falta de escrúpulos da imprensa (Rede de intrigas), o fim da privacidade (Um dia de cão) e a falência da família burguesa (Antes que o diabo saiba que você está morto). Trouxe uma encenação mais livre e menos marcada e se aproximou da estética de televisão sem com isso deixar de construir planos eficientes e descuidar da montagem, dos enquadramentos e outros aspectos extradiegéticos de seus trabalhos”, atesta Filipe Chamy. “Praticamente todo cineasta que viu seus filmes aprendeu com ele alguma técnica narrativa ou de controle da ação, e, provavelmente, a geração dos anos 70 (Brian De Palma, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Steven Spielberg) é o grupo mais nitidamente influenciado pelos filmes de Lumet”, completa.
Principais premiações de Lumet • 4 indicações ao Oscar de Melhor Diretor, por Doze Homens E Uma Sentença (1957), Um Dia de Cão (1975), Rede de Intrigas (1976) e O Veredito (1982); • Oscar honorário pelo conjunto da obra em 2005; • Indicação ao Oscar, na categoria de Melhor Roteiro Adaptado, por O Príncipe da Cidade (1981); • 5 indicações ao Globo de Ouro, na categoria de Melhor Diretor, vencendo em 1976, por Rede de Intrigas ; • 4 indicações ao BAFTA, na categoria de Melhor Diretor, por Assassinato No Expresso do Oriente (1974), Serpico (1974), Um Dia De Cão (1975) e Rede de Intrigas (1976); • 2 indicações ao BAFTA, na categoria de Melhor Filme Britânico, por A Colina dos Homens Perdidos (1965) e Chamada Para Um Morto (1967); • Urso de Ouro e Prêmio OCIC, no Festival de Berlim, por Doze Homens E Uma Sentença (1957); • Prêmio FIPRESCI, no Festival de Berlim, por O Homem Do Prego (1964); • Prêmio Pasinetti, no Festival de Veneza, por O Príncipe da Cidade (1981).
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Quadrinhos
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Era uma vez em BH Celton, escritor e desenhista, vende suas revistas no tumultuado trânsito da cidade Bruna Ávila Dayane Lima Hévila Oliveira 7º período Edição: Sandra Leão Combates entre seres mitológicos e tipos cotidianos em frente ao Mineirão, perseguições na Praça Sete, encontros amorosos nas esquinas de Belo Horizonte, escândalos de políticos famosos. Estas são cenas das revistas em quadrinhos de Lacarmélio Alfeo de Araújo. Foi sentado em uma árvore na Praça da Estação, em meio ao barulho dos ônibus, carros e pedestres, que o autor, mais conhecido como Celton, conversou com o Impressão. Sempre vestido com terno amarelo e gravata, ele é reconhecido por vários motoristas. Celton vende suas revistas, de mesmo nome, em meio ao trânsito intenso da cidade. Já produziu cerca de 50 títulos e chegou a publicar mais de 40 mil exemplares de uma única edição. Atribui o sucesso à sua dedicação e disciplina. Celton largou o trabalho de desenhista, numa agência de publicidade, para investir no mundo dos quadrinhos. As primeiras revistas, de 1981, eram vendidas em bancas da capital. Mas a falta de divulgação, as vendas pouco lucrativas e as dívidas contraídas com empréstimos o obrigaram a mudar de estratégia. Resolveu vender as revistas por conta própria em bares, escolas, teatros e faculdades. Como o dinheiro das vendas ainda não era suficiente, partiu para os EUA, onde trabalhou como desenhista
Foto: divulgação
e cantor. Chegou a tocar debaixo de pontes em Nova Iorque para conseguir dinheiro. Ao retornar ao Brasil, pagou as dívidas e suspendeu a revista. Mas, por paixão aos quadrinhos, voltou a produzir em 1998. “Não conseguia ficar longe dela, não tinha jeito” revela. Após diversas reformulações, passou a vender a revista no trânsito, como acontece até hoje. Os engarrafamentos são um dos maiores problemas das grandes metrópoles, mas, para Celton, foram a solução. Ele circula pela cidade, sempre em busca de lugares de grande movimento. Os principais corredores de venda são as avenidas Bias Fortes, Cristóvão Colombo e Antônio Carlos. BH retratada A opção por assuntos populares e cenários cotidianos da capital foi a alternativa encontrada para transformar a publicação e aumentar as vendas. “A revista tinha muita influência de histórias americanas e os nomes dos personagens eram todos em inglês” afirma Celton. A fidelidade aos traços da cidade é fruto de muita observação e pesquisa. O tempo de produção de cada edição muda conforme o assunto. Em média, o autor leva um mês para a produção, porém algumas obras exigem uma pesquisa mais profunda, como “O Fantasma de Ouro Preto”, que tomou um ano. Os leitores da revista admiram o esforço do escritor e consideram que ele faz um bom trabalho. “É uma forma
Faça calor ou faça frio, Lacarmélio sai às ruas com sua enorme placa e seu terno amarelo
super inusitada, divertida, que marcou!” elogia Inara Silveira, 27 anos, editora de imagens. Ela, que acompanha a revista há 5 anos, revela que sua preferida é a que traz a história da célebre Loira do Bonfim. “Gosto de um bocado de histórias, mas essa me marcou mais. Na época, comprei a revistinha porque começaram a me chamar de
Curiosidades sobre Celton
• Desde a refomulação no ano de 1998, a revista Celton está na sua 26ª edição. • A tiragem, em torno de 2 mil exemplares, vem crescendo a cada nova história. • Celton já chegou a publicar mais de 40 mil exemplares de uma única edição. • A revista mais vendida foi “O combate da sogra com o capeta”, com várias reimpressões. • O personagem Celton e sua namorada estão presentes em todas as edições. • Os cenários da capital mineira e os pequenos detalhes dos espaços urbanos ilustram os quadrinhos. • O autor recebeu diversas condecorações na capital mineira e expôs seu trabalho no 4º Festival Internacional de Quadrinhos e na Mostra Mineira de Zines, em 2005.
Loira do Bonfim. Fiquei sem entender e fui buscar informação. Aí me deparei com uma lenda urbana, que adorei”. Celton coleciona um número razoável de leitores assíduos, mas sabe que “se o trabalho perder qualidade, o público fiel desaparece”. Além disso, começou a ampliar seus horizontes. “Produzo basicamente sobre assuntos regionais, mas estou tentando fugir disso, por causa do mercado de São Paulo” conta o autor, que já começou a vender na capital paulista. “A tática de falar sobre assuntos populares vai se manter, os cenários é que vão ser específicos. A próxima aventura começa em São Paulo e termina em BH”. Estímulo à leitura Embora o próprio autor não se considere um agente valorizador da cultura, muitos estudiosos afirmam que as histórias em quadrinhos contribuem no aprendizado das crianças e são um estímulo para aqueles que querem adquirir o hábito da leitura. Para o doutor em comunicação e professor da USP Waldomiro Vergueiro, “a junção imagem e texto, oferecida pelas HQs, representa uma forma narra-
tiva única, que faz o caminho para a leitura da palavra escrita muito mais ameno e agradável”. Para ele, os quadrinhos podem encaminhar à leitura de outros tipos de textos escritos ou literários. Vergueiro ainda afirma que a revista Celton não é um formato bem aceito pelo mercado editorial. “Entendo que os quadrinhos de Celton não despertaram o interesse das editoras devido à forma como ele os produz. Ele é um produtor independente, que não se adequaria às exigências de uma editora”. Ao contrário das editoras, o professor, que também é fundador e coordenador do Observátorio de Histórias em Quadrinhos da USP, tem um apreço especial pelo trabalho de Lacarmélio e publicou um texto sobre o autor, na enciclopédia especializada espanhola Del Tebeo al Manga. “Celton é quase parte do folclore da cidade. As histórias falam de BH, mostrando a vida de pessoas simples e suas dificuldades cotidianas, narrando as peripécias de um herói sem máscara, sem uniforme e sem identidade secreta, que ajuda a todos e enfrenta bandidos comuns” explica o doutor.
Quadrinhos
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Histórias
para gente grande Hqs deixam de ser um produto voltado para as crianças e ganham versões para adultos Fotos: rEprodução
marcus vinícius pereira markilma Carter 7º período Edição: diogo silva Na estante que ocupa uma parede inteira de seu quarto, o estudante de Letras Marcos Matias de Araújo, de 30 anos, guarda sua pequena coleção de quadrinhos, que divide espaço com vários livros. Mesmo assim, a quantidade de títulos é de fazer inveja em muitos. Ele possui exemplares de “Watchmen”; “V de Vingança”; “Toda Mafalda”; um box do “Garfield”, além da maioria das obras do desenhista alemão Ralf König, como “Camisinha”, “Homem Ideal” e “Assassina”, algumas do japonês Suehiro Maruo; a saga da DC Comics 52 Semanas; a edição definitiva de “Sandman”. Ao lado da estante, algumas caixas de papelão com mais revistas que esperam ser organizadas. “Como me mudei há pouco tempo, tem muita coisa encaixotada ainda”, explica Marcos. O estudante também guarda algumas revistas compradas na infância, como edições da Turma da Mônica e da Disney. Mas ele cresceu, amadureceu, e seu gosto por quadrinhos permaneceu. Foi-se o tempo em que histórias em quadrinhos eram coisa de criança. Cada vez mais elas migram das bancas de jornal para as prateleiras de livrarias, dividindo espaço com grandes nomes da literatura. E além das tradicionais revistas periódicas, alguns títulos ganham edições luxuosas, com um trabalho gráfico personalizado e acabamento de qualidade. Tudo para atrair os antigos leitores de quadrinhos, que antes se divertiam com as histórias da Turma da Mônica, por exemplo, e hoje envelheceram. Segundo relatório de uma pesquisa da
público adulto. Além das edições periódicas, as séries ganham versões encadernadas, as chamadas graphic novels. Segundo o coordenador do setor de quadrinhos da Livraria Leitura Savassi, Gustavo Siuves, as editoras estão apostando em histórias mais politizadas, com forte crítica social e uma veia literária mais evidente. “São histórias cada vez mais críticas e complexas, de autores nacionais e estrangeiros”, salienta Gustavo. E como o atual leitor de quadrinhos não está de olho apenas no conteúdo, mas também na qualidade da publicação, edições de luxo estão cada vez mais presentes nas livrarias. O estudante Marcos Matias dá preferência às edições especiais por causa da durabilidade. “Revistas normais podem amassar, enquanto as edições encadernadas têm acabamento melhor e duram mais. É um investimento de longo prazo”, garante.
FIQ esperto! “V de Vingança”, do inglês Alan Moore, mira o leitor adulto, e se transformou em filme em 2006.
Simba Information, empresa que estuda o mercado editorial dos EUA, divulgado em outubro do ano passado, aproximadamente um entre quatro leitores de HQ no país tem 65 anos ou mais. E esta é a situação do mercado editorial em todo o mundo. Tradição Mas nem sempre os quadrinhos receberam essa importância e tratamento diferenciado, sendo, por muito tempo, considerado um gênero inferior, voltado para crianças. Segundo a educadora e mestre em História da Literatura Janira Gomes de Oliveira, as histórias em
quadrinhos surgiram no século XVI, como forma de transmitir histórias de santos e mártires da igreja cristã e em nada pareciam com o que temos hoje. “O alvo principal eram leitores iniciantes. Durante muito tempo foi apenas essa sua utilidade”, comenta a educadora. Em meados do século XVIII, os ingleses passam a usar as HQs, com a sua estrutura de pouco texto e imagens, no ensino de crianças. Quando perceberam que o formato facilitava o entendimento e poderia agradar e ensinar às crianças, os ingleses passaram a publicar histórias com imagens grandes e textos curtos, nos jornais de
maior circulação. Porém o cenário mudou e os quadrinhos não são mais vistos apenas como um gênero infantil. O estudante de Educação Física Jessiel Gomes, de 23 anos, compra em média 10 revistas em quadrinhos por mês, entre quadrinhos americanos, e mangás, com traço japonês. “Muitos ainda olham torto para o fato de eu colecionar essas revistas, acham que é coisa de criança. Mas as histórias são mais profundas e tratam de temas do mundo dos adultos”, comenta Jessiel. De olho nessa mudança de perfil do consumidor, as editoras investem em lançamentos voltados para o
Em 2011, o FIQ (Festival Internacional de Quadrinhos), chega à sua sétima edição. De 9 a 13 de novembro, quem visitar a Serraria Souza Pinto poderá conferir obras de quadrinistas nacionais e internacionais, além de palestras e oficinas. Saiba mais: - Site oficial: http://fiqbh.com.br/ - Twitter: @fiq_bh - Facebook: www.facebook.com/ festivalinternacionaldequadrinhos
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Belo HorIzonTe, ouTuBro de 2011
Música
Impressão
Estilo black soul volta à cena urbana Movimento cultural black reúne velhos amigos e muda a cena urbana de Belo Horizonte natanael de Jesus 4º pEríodo
Edição: diego Costa Desde que o DJ Abelha, o DJ Geraldinho – então Valdeci e Geraldo Antônio – e mais alguns amigos tocaram um certo tipo de música numa velha Caravan, as tardes de sábado no Centro de Belo Horizonte mudaram bastante. Pelo menos para quem, há anos, não se encontrava como nos velhos tempos. Ali, nascia o Quarteirão do Soul. No sábado seguinte, já se via a faixa anunciando: “Bem vindos ao Quarteirão do Soul! Aqui, a velha guarda se reúne”. Era o estilo da black soul music voltando à cena urbana da capital mineira. Sete anos depois jovens de outros tempos reúnem-se e fazem daquele lugar um espaço democrático. Tudo isso em meio a prédios, lojas, bancas, carros. Dessa maneira, modificam a cena urbana, rompem com o rotineiro vai e vem e deixam um pouco de lado a identidade particular para fortalecer uma identidade coletiva, a black. Nesse espaço, as histórias das pessoas voltam a se encontrar em um ambiente totalmente diferente. Donizete Bonifácio é exemplo disso. Desde que montou outro negócio – uma eletrônica – o tempo se tornou escasso e é difícil conciliar o trabalho com o lazer. Ele não participava do Quarteirão havia um ano. Na época dos grandes bailes em
Belo Horizonte, Doni – como é conhecido – era dono de duas produtoras de eventos. Na verdade, produtoras de bailes soul. “Os salões tinham, em média, 500m2. Alguns eram bem maiores. Mesmo assim, em 15 anos, era difícil ver bailes vazios”, lembra. Segundo ele, as pessoas queriam apenas se divertir ao som de James Brown, Aretha Franklin e tantos outros. Marquinho Breca, dançarino do Quarteirão – como se apresenta – é outro personagem. Ele frequenta o local e não pensa em outra coisa a não ser encontrar os amigos e dançar. O dançarino é cump r i mentado a todo o momento pelos blacks e até por curiosos. “Tenho 52 anos e pretendo dançar até quando Deus me der força. Venho aqui para encontrar meus amigos. Infelizmente alguns já morreram e outros não via há 20 anos. Volto a
encontrá-los no Quarteirão”, diz Marquinho. No Quarteirão do Soul, há espaço de revitalização da memória de um movimento, as roupas têm destaque. Inspiradas pelo estilo daquele que consideram ser o pai do movimento black soul, o músico americano James Brown, as pessoas se vestem de maneira especial para o baile ao ar livre. Sapatos bicolores,
calça de linho, blaser, colete, gravata e boina ou chapéu. Cada um dos participantes compõe seu visual com trajes extravagantes. Tonhão Black e Marquinho Breca, cujos filhos participam eventualmente dos bailes, dizem respeitar as escolhas dos filhos. “Hoje em dia, eles se inclinam mais para o lado do funk carioca, do rap e do hip hop. Sabemos
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que não podemos evitar, é o que se ouve nessa geração”, afirma Tonhão. A maioria dos participantes tem entre 40 e 55 anos. Mas não é tão difícil encontrar pessoas de 20 a 30 anos. Ou menos, ou bem mais. Todas são atraídas pelos mesmos agudos e graves que soam em perfeita harmonia: os agudos dos instrumentos de sopro e das guitarras e os graves das cordas do baixo. Muitas dessas pessoas encontraram no movimento black, precisamente no Quarteirão do Soul, além da boa música, uma fonte produtiva de boas histórias. Um caso especial é o da estudante de jornalismo Bárbara Silva, que freqüenta o evento há três meses e fez do movimento soul objeto de estudo do trabalho de conclusão de curso da faculdade: “O Quarteirão encanta porque é um lugar democrático e aberto. Todos podem participar e acabam gostando”, pondera Bárbara. O turista italiano Aleandro Tubaldi fica atento a tudo e registra vários momentos para compor um vídeo pessoal, uma lembrança da viagem a Belo Horizonte. O europeu se sente à vontade no baile. Tira dezenas de fotografias e filma os dançarinos. “A abordagem é muito tranquila, eles gostam de ser fotografados e filmados. É a forma que encontram de mostrar sua arte para as outras pessoas”, constata.
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Veja a Galeira de Fotos no site: www.jornalimpressao.com.br
Convivendo com os vizinhos A quadra da Rua Santa Catarina, onde o Quarteirão do Soul acontece, é inteiramente comercial. Surge, então, uma discussão acerca da pertinência em se manter o evento no local ou de transferilo, se for o caso. Para o proprietário de um salão, Antônio Ferreira, o fechamento do quarteirão para que o evento ocorra é prejudicial. “Antes o cliente chegava e podia estacionar o carro próximo ao estabelecimento, hoje, com a rua fechada e o som alto ele
passa direto”, critica Antônio. A questão passa a ser um jogo de empurra-empurra. “Eles não atendem quando pedimos para abaixar o volume do som. Poderiam, pelo menos, virar as caixas para o outro lado”, defende Ferreira. O gerente de um sacolão, Geraldo Sousa, faz coro à fala de Ferreira e completa dizendo que chegou até a fechar mais cedo por causa do barulho. “Além dos clientes, os funcionários também reclamam”, finaliza. O estabeleci-
mento fica bem em frente ao local onde se posiciona o DJ com a aparelhagem. Para o dono de um bar, José Aparecido, o baile é “espetacular. Belo Horizonte precisa de mais ambientes de cultura e lazer”. Aparecido acha importante que as pessoas participem das manifestações artísticas de sua cidade e que “todo movimento cultural deve ser fortalecido para que o passado não se perca. Quarteirão do Soul tem que continuar”, emociona-se.
tonhão prestigia as noites do quarteirão do soul com estilo
Perfil
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Belo Horizonte, outubro de 2011
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Belo Horizonte
entre pincéis e tintas O artista plástico mineiro, Rafael Abreu, retrata o ambiente urbano através da pintura REnata queiroz
Rafael Abreu ao lado de um de seus quadros. A cidade de Congonhas foi inspiração da obra
Leilane Tolentino Stauffer 4º período Edição: Diego Costa O ditado “filho de peixe, peixinho é” se torna crível quando se percebe o contexto de vida do artista plástico mineiro Rafael Abreu e a história dele com o mundo das tintas e dos pincéis. Nascido em 24 de janeiro de 1976, no hospital São Lucas, em Belo Horizonte, é o mais velho dos três filhos do casamento dos artistas Gilberto de Abreu e Miriam Rodrigues. Seduzido pelo
universo artístico, Rafael sempre teve os pais como grande referencial. Com o pai, ele frequentou ateliers de vários artistas, acompanhando esse vasto mundo desde a infância. Ao lado da mãe, Miriam, o menino conviveu com a arte em forma de artesanato. Por causa dessa experiência, ele aprendeu a valorizar as características simples, mas capazes de estimular a sensibilidade das pessoas. “Desde a época em que ele era criança, notei o quanto se envolvia e corria atrás do que
“Eu presto homenagem ao criador por criar. Criar, para mim, é poder semear algo pra vida inteira” Rafael Abreu
achava interessante. Sempre foi presente, observador e muito participativo”, afirma Gilberto de Abreu, 58 anos, ao resgatar momentos vividos com o filho. Rafael desenvolveu uma linha artística voltada para a representação do cenário belo-horizontino. “Presto homenagem a quem eu gosto na pintura, à cidade onde vivo, a quem eu acho que é significativo. Homenageio o criador por criar. Criar, para mim, é poder semear algo pra vida inteira”. A artista que sintetiza Minas, como é conhecida a artista plástica e professora de História da Arte, Yara Tupynambá, 76 anos, explica a escolha dos temas a serem retratados pelos artistas nas obras: “Cada artista precisa ter um conteúdo central que seja significante de maneira histórica e social”. Obras Arquitetônicas A cidade começou a aparecer nos trabalhos de Rafael em 97, com o centenário de Belo Horizonte. A exposição BH 100 Mistério, inspirada nas obras do artista Amilcar de Castro, reuniu traços abstratos de quatro paisagens da capital mineira: Igreja da Pampulha, Praça da Liberdade, Praça do Papa e Viaduto Santa Tereza, cenários que
fazem parte da vida do jovem criador. O trabalho mais recente e um dos mais marcantes na carreira de Rafael Abreu foi o projeto Memória da Cidade, realizado no Cine Belas Artes, em 2006. Sensível à história arquitetônica de Belo Horizonte, Rafael se inspirou em retratá-la a partir da exposição Bello Horizonte em Cena. Por acreditar que “os edifícios são livros de concreto e nos contam histórias”, Rafael selecionou dez deles: a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, a Santa Casa de Misericórdia, o Minas Tênis Clube, a Igreja São Francisco das Chagas, o Hospital Felício Rocho, o Colégio Marconi, o Museu Inimá de Paula, o Hotel Itatiaia, o Hotel Metrópole e o extinto Cine Metrópole. As construções representadas na exposição do artista foram projetadas pelo arquiteto italiano e um dos fundadores da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Raffaello Berti. O artista, ao ser questionado sobre a importância do trabalho que ele desenvolve para a cultura de Belo Horizonte, enfatiza: “Eu acredito que eu estou fazendo a minha parte. A história é quem vai dizer se foi bom, se foi válido ou não”, conclui Rafael. Rafael abreu
O artista e a cidade
A exposição criativa Seres – Ser artista, ser cidade reuniu pequenos quadros de Rafael Abreu, em 2008. A inspiração das obras esteve na simplicidade do cotidiano, que sintetizavam como é ser artista e como é ser cidade, ou seja, fazer parte dela. A representação escolhida do “ser cidade” foi a Igreja da Pampulha pelos fatores arquitetônicos, históricos e de identificação do ponto turístico com Belo Horizonte e Minas Gerais. Para Rafael, a Igreja da Pampulha sintetiza a cidade por essas características. “Esse foi um trabalho que veio mais de dentro, a começar pela palavra ‘seres’ que é um palíndromo. E quem são esses ‘seres’? A descoberta do ser artista e do ser que faz parte da cidade”, recorda Rafael. Cores vivas e formas variadas marcam a cidade
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Crônicas
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O preço do espetáculo rafaella arruda 6º PERÍODO
ILUSTRAÇÕES: PHELLIPPE SAMARONE
Sempre me causou espanto o fato de as pessoas pagarem para assistir a espetáculos de sangue. Digo espetáculos reais, onde não há encenação nem personagens. Onde os alvos são de carne e osso e literalmente sentem na pele o impacto da espada, da mordida, da flecha e do fogo. Me soa terrivelmente sádico pensar no aplauso da plateia diante de uma cena dantesca em que se enfrentam homens e feras. A morte, de um ou de outro, é o apogeu tão aguardado. O gol que vale o preço do ingresso. Cenas de um passado distante, medieval, quiçá fantasiado pelas grandes produções cinematográficas acerca de hereges, gladiadores e bárbaros... É. Pena que o distante não esteja tão distante assim, e que a ficção estabeleça linha tão tênue com o real. Digamos que os atores dos circos
foram transformados, as armaduras sofisticadas, o coliseu reconstruído, o fogo condensado e as feras domesticadas. Mas, e a plateia? Ah, essa permanece lá. Talvez com um novo requinte e novos gritos de guerra. Talvez estejam mais despojadas e socializadas em suas festas populares. Ainda assim, não menos sequiosas por um espetáculo de sangue e horror. E que venham então as touradas com suas lanças, capas vermelhas e olés. E que se glorifique o folclore com suas excêntricas farras de boi. E que nos encham de orgulho os rodeios com suas cantorias, rezas e seus abençoados peões. Ah, os rodeios. E suas novíssimas modalidades! Uma dessas, conhecida como bulldog, premia o peão que melhor derrubar e imobilizar um bezerro. Mas como a inércia tende a angustiar alguns tantos, por que imobilizar se é possível impressionar? Talvez tenha sido isso o que se passou na cabeça do temido bulldogueiro Cesar Brosco quando, ao disputar a prova na 56ª Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, no último mês de agosto, não apenas imobilizou o po-
bre do bicho como também atingiu sua coluna cervical, deixando-o tetraplégico. O bezerro, mesmo socorrido, acabou sendo eutanasiado. Já não tinha mais o movimento das patas. Nesse estado, não serviria mais como vítima de outro bulldogueiro e muito menos como alvo de um elegante toureiro. Melhor ser mesmo descartado, concluíram os veterinários. Sacrificado. Talvez não tenha pensado sobre nada disso o aprendiz de peão. Talvez estivesse apenas lá, atendendo aos apelos de um público extasiado e exigente demais por fazer valer o preço do ingresso em um evento tão aclamado. Talvez quisesse apenas fazer seu nome, talvez apenas garantir o salário. Na verdade, nada disso importa, não é mesmo? É apenas a realidade. Diversão para muitos e um nada para outros muitos. Na arena já vazia salvaram-se todos, menos o bezerro. Na areia, menos o touro. Na farra, menos o boi. Haverá outros espetáculos e o povo continuará a comprar os ingressos... Afinal, ainda que mudem os palhaços, mais vale o prazer do circo como assim o valia trocentos anos atrás.
Ponto de vista feminino sobre um furacão débora arcuri 6º PERÍODO
É. O mundo inteiro parou por causa de Irene. E quando digo que parou, é porque parou mesmo. Irene pra cá, Irene pra lá... Chegou aqui, saiu de lá. Irene parou o trânsito e fechou aeroportos, fez com que pessoas saíssem de casa e ficassem em estado de alerta. Chegou de fininho e mudou tudo sem pedir permissão. Irene foi a mais falada em todos os jornais e foi pronunciada por todos os idiomas. Falando assim, parece que acabamos de saber quem é a Miss Universo 2011. Mas não, não... Irene é mais um furacão com nome de mulher. Simplesmente não dá pra entender porque a maioria dos furacões tem nomes femininos. Você já parou para pensar nisso? Dizem que um comitê internacional mantém uma lista de 126 nomes, metade masculina e metade feminina, que são repetidos em um ciclo de seis anos. Mas por coincidência, os furacões mais devastadores da história levam o nome de mulheres, como por exemplo: Katrina, Rita e
Wilma, em 2005. O que será que eles querem dizer com isso? “Toda mulher é histérica e fica apenas esperando um deslize para levar sua casa, carro e ainda te deixar de cabelos em pé!” Ou o que a maioria deles responde quando queremos sair no final do campeonato de futebol: “o que acontece que essas mulheres estão sempre de TPM?”. A causa de tudo isso é bem simples: homem. São eles que nos fazem perder a paciência e passar de um a cinco na escala Fujita em apenas 10 segundos! “Hanrã querida. Hanrã. Agora sai da frente da televisão que eu preciso ver o segundo tempo do jogo.” Uma dúvida. Eles ouvem ou fingem que ouvem? Além de deixar a tampa levantada, esquecer o dia do aniversário de namoro e comprar aquele presente que ele diz que tem tudo a ver com você, mas que na realidade... E quem leve a fama? Nós, mulheres. Ouvi falar uma vez que qualquer pessoa pode indicar um nome para um furacão no website do National Hurricane Center (centro nacional de furacões). Bom mesmo seria se nós, mulheres, nos reuníssemos para indicar
o nome de um homem bem complicado! Aquele que termina com você na véspera do carnaval e ainda diz: “A culpa é toda minha. Eu não te mereço!” É... Aposto que essa lista de 126 nomes triplicaria rapidamente e ficaria muito mais interessante. “O furacão Pe d ro atingiu a cidade de Nova Yorque neste sábado com ventos fortes e chuva torrencial, o que levou a ameaça de enchentes na cidade”. Ou então, “Roberto acaba de chegar à costa dos Estados Unidos e já causou vários danos e mortes por onde passou”. Além do conforto e comodidade que teríamos ao saber detalhadamente dos passos dos “nossos tornados” pelo Painel Global de Monitoramento. Já imaginou que bom seria?