Edição 211 - Caderno 2

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foto: aMaNda seiXas

Jornal laboratório do Curso de Jornalismo do uniBh ano 37 • número 211 • abril de 2019 • Belo horizonte • Mg


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DOSSIÊ Cultura

Abril de 2019 Jornal Impressão

isso pode? foto: reprodução

Ativiistas e socióogos explicam o que é Apropriação Cultural e o que a caracteriza

Editorial brasileiro foi questionado por usar modelos brancas de turbantes, e não mulheres negras

Mariana Reis O termo Apropriação Cultural ganhou discussão acalorada nas redes sociais após a jovem Thauane Cordeiro relatar uma experiência no Facebook. No depoimento, publicado em Fevereiro de 2017, Thauane alega ter sido abordada na estação de metrô por quatro mulheres negras que, supostamente, advertiram a jovem branca pelo uso do turbante. A garota recorria ao adereço na intenção de esconder a queda de cabelos causada pelo tratamento de câncer ao qual estava submetida. Apesar da discussão recém fomentada no Brasil, a ideologia começou a ser discutida na França na década de 1930 por Léopold Senghor e Aimé Césaire, dois intelectuais que analisaram como o Ocidente estava se apropriando da ques-

tão cultural negra. Posteriormente, esse estudo foi retomado por pesquisadores norte-americanos no contexto de surgimento das grandes vozes do jazz e do rock. Elvis Presley se consagrou como protagonista e os negros, precursores desses estilos musicais, foram coadjuvantes, sem a devida representatividade. O conceito de Apropriação Cultural está ligado à imposição de uma sociedade dominante sobre um grupo historicamente dominado e marginalizado. Por esse contexto partir de uma relação entre sociedades, o tema não deve ser analisado sob o ponto de vista individual. Portanto, as consequências acerca dessa problemática se dão em nível coletivo, quando algum bem simbólico ou cultural ao ser partilhado, é ressignificado pela cultura hegemônica junto a um processo

de apagamento da identidade de origem. O Antropólogo Rubens Alves, professor na UFMG e coordenador do NEPPaMCs, Núcleo de Estudos sobre Performance, Patrimônio e Mediações Culturais da instituição, afirma que a expressão denuncia o uso abusivo de traços culturais deslocados do seu contexto original. Para o professor, trata-se “de uma categoria política acionada no campo de enfrentamento dos problemas relacionados a situações de tensão e conflitos socioculturais e étnico-raciais persistentes historicamente”. Sobretudo, quando se analisa a apropriação da cultura negra é notório o “embranquecimento” de símbolos, elementos e/ou manifestações culturais que perdem o valor pejorativo e passam a ser prestigiadas com status de algo exótico na mídia bem como na indústria cul-

tural pop. ‘’A exaltação de formas de expressão da “cultura negra” ou “cultura afro-brasileira” no contexto da sociedade brasileira, sobretudo pelas elites, quase sempre foi motivada pelo atrativo dos aspectos estéticos, exóticos e de espetacularização e o que isso pudesse render aos interesses de capitalização política, atração turística e midiática” completa Rubens. O carnaval é uma

das representações mais expressivas da cultura negra. No passado, as escolas de samba foram fundadas como um espaço de resistência em que a negritude se reunia para celebrar a festividade, já que a sua participação não era bem aceita pelos clubes sociais da elite branca. Ao longo do tempo, é possível reparar como esse cenário foi sendo modificado, por meio da substituição de moças

da periferia por personalidades da mídia. A recolocação de quem, na maioria das vezes, têm uma ligação hereditária com a escola, salienta a diminuição da representatividade negra, a quem o samba é de fato pertinente, em prol do destaque de uma figura das celebridades por questões comerciais e midiáticas. Por meio dos exemplos, é possível identificar a Apropriação

Nadando contra a corrente Em Novo Hamburgo (RS), a Universidade Feevale desenvolveu o projeto Aruanda. Na região que têm sua identidade associada à imigração germânica, o objetivo do projeto é difundir as tradições negras para conscientizar as crianças das escolas municipais locais o papel fundamental desse povo na construção do Estado e do País. O projeto realiza encontros semanais nas escolas propondo a exposição e o debate de temas como etnicidade, história e características culturais do povo negro de forma lúdica, com atividades e oficinas.


DOSSIÊ culturA foram compostas para violino. Nenhum desses exemplos ilustram argumentos análogos à apropriação. A assimilação é algo inevitável no mundo globalizado que estamos inseridos e principalmente, em um país historicamente marcado pela miscigenação como o Brasil. “A gente tem que tomar cuidado com o uso do conceito porque ele tem uma fertilidade que gera algumas ambiguidades” adverte Dimitri Fazito. E propõe a reflexão: “Em termos práticos: Quando é que está ocorrendo uma apropriação cultural?” O Sociólogo recorda a polêmica gerada pela publicidade que representou mulheres brancas utilizando turbante e explica “Ali claramente, você tem uma tentativa de “pegar carona” numa valorização genuína de um grupo específico que tem uma tradição e todo um processo histórico que justifica o uso de determinados diacríticos, categorias específicas que constituem a história daquele próprio agrupamento e do desenvolvimento de sua identidade”. O lugar de fala é uma das expressões que norteiam o assunto da apropiação cultural. Misley Pereira

foto: arquivo pessoal

Twitter, e provocou discussões polêmicas sobre a apropriação cultural pela indústria da moda. Nas discussões, questionava-se o fato do lucro obtido pela grife não beneficiar, nem em mínima porcentagem, as verdadeiras artesãs. Caracterizando assim, um processo de apagamento do protagonismo da comunidade produtora da obra. Comumente, a condução do debate sobre o assunto é polemizada por indivíduos que confundem o conceito com a ideia de assimilação cultural. “Existem muitas especificidades e muitas questões contextuais que fazem com que a gente tenha uma dificuldade interpretativa, tanto do ponto de vista de um analista, quanto do ponto de vista das pessoas no cotidiano.” admite o Professor do Departamento de Sociologia da UFMG, Dimitri Fazito. Nesta deturpação conceitual, o termo é banalizado e difunde questionamentos, por vezes irônicos, acerca da venda/consumo de comida japonesa em restaurantes brasileiros, até a legitimidade de se tocar determinadas obras de Beethoven no piano já que originalmente

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Misley Pereira é mulher, negra e ativista

é mulher, negra e militante pela causa. Parte da sua renda vem do trabalho artesanal com tranças afro que desenvolve em domicílio. Questionada sobre o assunto, Misley diz que, “quando você hoje, enquanto indivíduo branco, resolve colocar uma trança e dizer que é uma homenagem à mulher negra que usa trança, você está afron-

tando essa identidade negra de resistência. Você não está homenageando ela”. O debate pela internet, ao mesmo tempo em que dissemina uma discussão vazia e sem criticidade, pode ser considerado válido na medida em que traz à tona um tema que era invisível aos olhos do poder hegemônico. O assunto não deve ser

encarado como uma enquete de quem é a favor ou contra a validade do conceito. Também não pode se resumir a um consenso sobre o uso individual de turbantes ou outras indumentárias, ignorando a amplitude das questões estruturais. É necessário exercer a empatia, estar aberto ao diálogo, saber ouvir e reconhecer as relações de força assimétricas. foto: reprodução

Cultural como um argumento ligado à questões racistas e ao movimento negro, mas isso não significa que o conceito não se manifeste em outras situações. A grife francesa Isabel Marant lançou em sua coleção de Verão 2015, uma túnica bordada idêntica às peças tradicionalmente produzidas por mulheres indígenas de Oaxaca, no México. Este artesanato é produzido há mais de 600 anos e representa uma das principais fontes de renda da comunidade Santa Maria Tlahuitoltepec. A peça foi confeccionada em larga escala para compor a coleção da grife e vendida por £ 200 (o equivalente a R$ 1.000), enquanto a original tinha o custo de aproximadamente £ 13 (R$ 65). O acontecimento ganhou a internet por meio de uma publicação feita pela cantora mexicana Susana Harp, ao expor uma foto comparativa em seu Twitter acompanhada da #miblusadetlahui, denunciando o plágio feito pela marca. A hashtag utilizada pela cantora (#miblusadetlahui), alcançou os Trending Topics, assuntos mais comentados no

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Premiação dos vencedores do duelo de MCs


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Muito além da música Os festivais como palco para o ativismo e resistência Bianca Costa

A existência dos festivais começa na Grécia Antiga, mais especificamente seis anos antes de Cristo. Eram eventos de cultura, apresentações esportivas, teatrais e musicais.

Nesse período, não podia haver guerras, os conflitos que existiam eram deixados de lado por respeito aos “sagrados festivais”, que eram muito prestigiados por todo o povo grego.

Já no século XX, os meios de comunicação em alta maximizaram o poder dos festivais. Não se sabe exatamente de quem foi a ideia de reunir ícones da música em um mesmo evento.

O que se sabe, é que isso deu muito certo. Desde então, o espaço cresceu para movimentos ativistas como o LGBTQ+, movimento negro e político, tornando-se o que é hoje.

FOTOS: REPRODUÇÃO

O ativismo está, constantemente, presente nos festivais de música. Marcam mudanças sociais e consagram a diversidade.

A plataforma sempre foi usada por músicos para divulgar mensagens de defesa aos direitos humanos e ao meio ambiente. Música e militância andam juntas há um bom tempo.

fotoS: VONECIA CARSWELL / UNSPLASH

Esquerda: cartaz de divulgavação do Woodtock (1969); Centro: cartaz de divulgação do Rock in Rio (1985); Direita: cartaz de divulgação do Lollapalooza (1991)

Festival Afropunk em 2013, na cidade de Nova iorque


música, ativismo e resistência

DOSSIÊ culturA WOODSTOCK

Abril de 2019 Jornal Impressão 1969

1985

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Paz, amor, música e resistência. O festival Woodstock aconteceu em 1969, entre os dias 15 e 18 de agosto, na cidade de Bethel, interior de Nova York. O público era formado, majoritariamente, por jovens da cultura hippie e do movimento da contracultura americana. Esse último movimento atingiu o auge em 1960, como forma de contestação social. Os jovens tinham estilos inovadores que provocavam a família conservadora americana. A primeira edição do Rock In Rio aconteceu em 1985. Mesmo o nome sendo “Rock” In Rio o festival sempre aderiu a todos os estilos musicais. O primeiro Rock In Rio ocorreu na mesma semana das eleições brasileiras para presidente, 21 anos depois da Ditadura Militar, e foi marcado por muita diversidade e ativismo. Era a vez de Barão Vermelho no palco do Rock In Rio. Com muita confiança, os cariocas conquistaram o público ao tocar hits como “Milagres” e “Sem Vergonha”. Na clássica “Pro Dia Nascer Feliz”, o vocalista Cazuza aproveitou a música para dar boas-vindas e energias positivas à nova república: “Que o dia nasça feliz para todo mundo amanhã. Em um Brasil novo, uma rapaziada esperta. Valeu!”

ROCK IN RIO

Quando falamos de Rock In Rio, o show da banda Queen, em 1985, é sempre um dos mais lembrados, mesmo para os fãs que não o presenciaram. A banda inglesa tocou duas noites no evento e marcou a história do festival com a performance inesquecível de “Love Of My Life”. O público de 250 mil pessoas entonou o refrão da música e deixou até o vocalista Freddie Mercury surpreso. Foi extraordinário!

2013

1991

2018

LOLLAPALOOZA 2018

2003

AFROPUNK

VENEZUELA AID LIVE

2019

A mistura de cultura nunca foi tão real. A cantora americana Beyoncé fez um show e tanto em 2013, cheio de surpresas, com 2 horas de duração. Uma enquete realizada pelo G1 elegeu o show como o melhor daquela edição do Rock In Rio, deixando para trás ícones como Iron Maiden. Na performance final, Beyoncé surpreendeu ao dançar o funk “O passinho do Volante”, do grupo carioca Os Lelek, com direito ao famoso “quadradinho” para encerrar a apresentação.

O Lollapalooza teve origem em 1991, nos Estados Unidos, e até hoje continua sendo uma plataforma para bandas undergrounds ganharem mais reconhecimento e fãs. A palavra Lollapalooza vem do inglês americano, que significa uma pessoa ou situação fenomenal. O festival acontece em países como: Brasil, Argentina, Chile, França, Suécia, Alemanha e Estados Unidos. No Brasil, o evento é sediado na cidade de São Paulo, no Autódromo de Interlagos. O Lollapalooza é muito conhecido por suas características marcantes, sua diversidade de estilos entre o público, os diferentes gêneros musicais em seu lineup e o ativismo durante as apresentações.

Headliner no Lollapalooza Brasil em 2018, o vocalista Eddie da PEARL JAM dedicou várias músicas aos fãs que estavam presentes, falou em português e não deixou de apoiar a marcha organizada por estudantes, que pedia por maiores controles de armas de fogo no país: “Esses jovens estão mudando o mundo para melhor. Estamos orgulhosos deles”, disse o vocalista. Eddie também comentou sobre a política brasileira: “Nossos países estão vivendo momentos parecidos. Estamos lidando com muita m**** e isso tem que parar”. O vocalista do Pearl Jam ainda deixou claro que parte do cachê da banda seria doado para uma iniciativa ambiental na Amazônia.

A banda se apresentou no dia 24 de março. O vocalista Dan Reynolds, da banda IMAGINE DRAGONS, reafirmou seu ativismo ao incentivar o amor e o respeito à comunidade LGBTQ+: “Por hoje, que a gente se ame e espalhe paz, sem ligar para política, religião e dinheiro. Vamos celebrar a vida e a diversidade juntos, respirando o mesmo ar”. Durante a música “It’s Time”, o vocalista levantou a bandeira LGBTQ+, o que mais tarde virou um post no seu Instagram que dizia: “Celebrem a nossa diversidade. Aceitem a juventude LGBTQ+. ‘Aceitar’ não significa apenas ‘amar’, significa que você valida essas pessoas e apoia as diversas orientações sexuais, sem ver a sexualidade de alguém como ‘errada’ ou ‘pecaminosa’. Senão, amor é só uma palavra vazia”, afirmou Reynolds.

Começou a ser produzido, por Matthew Morgan e James Spooner, um documentário intitulado de “Afropunk”, sobre jovens negros da cena punk-indie e rock-hardcore. O documentário foi muito bem recebido pela comunidade e, então, surgiu a ideia de criar um festival para que os entrevistados se conhecessem. A primeira edição aconteceu em 2005, em Nova York, no Brooklyn Academy of Music (BAM). De maneira espontânea, as pessoas dividiram suas histórias e assistiram aos vários shows que aconteciam, frases de liberdade também eram exibidas durante o Afropunk Festival. O festival se tornou internacional e, em 2019, acontecerá em Paris, Londres, Brooklyn, Atlanta e Joanesburgo. “Você não precisa ser um homem para lutar pela liberdade. Tudo o que você precisa fazer é ser inteligente”. Frase de Malcon X exibida durante o Afropunk Festival.

O Venezuela Aid Live, festival gratuito organizado por Richard Branso, um bilionário britânico, teve como objetivo pressionar o governo de Maduro para que a ajuda de outros países entrasse na Venezuela. O festival aconteceu dia 22 de fevereiro de 2019 e foram arrecadados 2,5 milhões de dólares em uma semana. O lineup era formado por muitos latino-americanos como Alejandro Sanz, Juanes, Luis Fonsi e Maluma. A tentativa de entrada de alimentos e medicamentos pela Colômbia e pelo Brasil foi barrada. Do outro lado, Maduro também anunciou um festival formado por artistas apoiadores do seu regime. Foi planejado um festival de três dias chamado “Mãos fora da Venezuela”, porém, ainda não aconteceu.


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Com que frequência você lê? Quando eu tinha 5 anos, o que eu mais queria aprender era ler. Eu já estava aprendendo o formato das letras e os seus sons fonéticos, mas ainda não sabia conectá-las. Minha vontade era tanta que eu procurava palavras em todos os lugares. Até que finalmente aprendi. Depois disso, um novo mundo se abriu pra mim, um novo caminho para adquirir conhecimentos e expandir minhas experiências. A curiosidade e a vontade de conhecer algo novo é o que desperta nas crianças o desejo pela leitura. Os primeiros passos são essenciais para a construção do conhecimento ao longo da vida. Sem o hábito de leitura, o conhecimento é limitado.

Hábitos A maioria das pessoas cria o hábito de ler quando estão na fase escolar. Os professores inserem a leitura de livros e conteúdos que irão agregar conhecimento e preparar o estudante para o futuro. Os avanços tecnológicos e o surgimento da internet democratizaram o acesso a informação, o que favoreceu a vida dos estudantes. É o que diz o estudante, Gabriel Veloso (22): “Facilita a busca daquilo que você procura naquele momento, sem precisar sair em busca de livros que talvez você nem ache mais”. O estudante também acredita que a internet trouxe novos hábitos que facilitam as atividades do cotidiano. “Hoje, para tudo, estamos usando o celular e outros meios da internet, acabamos desenvolvendo o hábi-

to ler notícias, artigos, livros, pelo celular, tabletes e outros”. Gabriel também confessou que, hoje em dia, sua leitura é apenas no ambiente digital.

Desafios A professora de Português Polyana Miranda, do sétimo ano do Ensino Fundamental II e do primeiro ano do Ensino Médio na E. E. Catarina Jorge Gonçalves, diz que a maioria dos seus alunos não gosta de ler. A professora acredita que as pessoas lêem mal. “O fato de haver uma infinidade de textos na internet já indica que temos que fazer uma leitura rápida e superficial, talvez por isso procuramos textos não verbais com mais intensidade, dada a nossa curiosidade de ler tudo ou de receber inúmeros estímulos visuais para leitura; consequentemente, acredito que isso poderá provocar problemas na aquisição de aprendizagem”. A professora também acredita que os novos hábitos de leitura comprometem a formação de leitores, principalmente nos moldes do ensino atual. “A escola ainda não acompanha as novas tecnologias e não concilia o aprendizado de leitura e escrita com as formas digitais. Isso compromete a proficiência em leitura, ou seja, a qualidade da leitura crítica, efetiva e profunda”. Polyana ainda diz que despertar o interesse dos alunos pela leitura é o maior desafio que enfrenta hoje. “A leitura por meio dos livros é importante e enriquecedora para a formação de bons leitores, no entanto, eles não conseguem compe-

tir com os textos audiovisuais”, opina.

Leia mais É desafiador se manter atualizado em meio a correria do dia a dia, por isso, as pessoas têm procurado se informar por meio de conteúdos compactos, como infográficos, podcast, imagens, vídeos etc, porém, estão lendo cada vez menos. A psicopedagoga Alessandra Madeira diz que assim como o exercício físico, a leitura é um dos “caminhos” para preservar o cérebro. Alessandra é formada em Psicopedagogia Clínica e Institucional, Neuropsicologia Clínica, e Neuropsicopedagogia. Ela afirma que as pessoas que lêem pouco tem baixa reserva cognitiva. O que é? Cognição é a capacidade de assimilar e absorver o conhecimento. Já a reserva cognitiva é o armazenamento do conhecimento que adquirimos ao longo da vida. Alessandra explica que a reserva cognitiva do nosso cérebro é muito utilizada

nos momentos conturbados que afetam as nossas emoções, como estresse e depressão. “Esses estresses são muito impactantes no cérebro. Geram uma superprodução de hormônios que não são bons para a nossa vida”.A psicopedagoga trabalha com crianças com dificuldades ou transtornos de aprendizagem, e também reabilitação neurocognitiva de pacientes em períodos iniciais de Alzheimer, ou qualquer demência. Ela esclareceu que ao longo da vida perdemos nossa reserva cognitiva, mas

na velhice essa perda é mais intensa: “Quando chegamos à fase idosa temos um declínio cognitivo, e nessa fase precisamos da nossa reserva cognitiva, se você não tem reserva cognitiva você começa a perder conexões neuronais que são básicas”. Diante disso, Alessandra se mostrou preocupada com o futuro da sociedade. “Não só as crianças, mas os adultos estão deixando de ler. Não vejo mais jovens falando que estão lendo. Tem jovem que lê um livro por ano”. Assim como Polyana,

a psicopedagoga acredita que “não é que as pessoas não leêm, o problema é que elas leêm mal”, e por isso precisam mudar os hábitos de leitura para não sofrerem consequências no futuro. Alessandra deixa a dica: “É importantíssimo que você se mantenha em dia com a leitura. Você pode escolher o que vai ler, pode ler revista, alguma coisa da sua área, mas mantenha a leitura, pois com isso você adquire reserva cognitiva. Temos que estudar, ler muito e aprender a, também, ler coisas diferentes”. fotos: rAFAELA SOUZA

Stéffane Nascimento

fotos: NATÁLIA XAVIER

iPad, celular, computador: as novas plataformas que mudaram os hábitos de leitura


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O IMPRESSO VAI ACABAR? fotos: DÉBORA NASCIMENTO

Com os novos hábitos de leitura, o mercado editorial precisou se reinventar mente”. Mas isso, sem perder o foco na produção dos conteúdos mais complexos.

Preto, São Paulo, interrompeu a circulação da versão impressa e migrou para o ambiente digital. Outros jornais, principalmente os locais, precisaram fechar as portas por falta de recursos para manter. Porém, não só os jornais foram atingidos. A editora Abril surpreendeu ao anunciar o fechamento de algumas editorias da empresa. Em declaração concedida ao Valor Econômico, a Abril justificou a decisão como um ato de sobrevivência para “garantir sua saúde operacional em um ambiente de profundas transformações tecnológicas, cujo impacto vem sendo sentido por todo o setor de mídia”. A editora permaneceu com apenas 15 títulos, dentre eles a Veja, Exame, Claudia, Saúde, Superinteressante e Você S/A.

Desafios O Diretor de Edição

da Superinteressante, Alexandre Versiganassi, diz que conquistar a atenção das pessoas é um grande desafio, e que para garantir esse sucesso a revista busca produzir conteúdos de qualidade, que sejam “imersivos” e “profundos”. Alexandre também afirma que há uma necessidade de mudança na cultura das pessoas “para que

elas entendam que o bom conteúdo não é de graça”, ressalta. A Revista Supeinteressante foi trazida para o Brasil em 1987, quando a Editora Abril comprou os direitos autorais da revista espanhola Muy Interessante. A Super, desde o início, seguiu uma linha diferente das outras revistas: temáticas diferentes como,

foto: reprodução

A preferência por conteúdos digitais despertou a grande dúvida no meio midiático: Será que o impresso vai acabar? Os resultados da pesquisa Brasileira de Mídia - Hábitos de Consumo de Mídia pela População Brasileira, realizada em 2016 e divulgada em 24 de janeiro de 2017, apontaram que 3% dos entrevistados mencionaram os jornais impressos como fonte primária de informação e 0% mencionou as revistas. A maioria também afirmou preferir TV ou internet. Ainda que essa pesquisa tenha acontecido há quase três anos, ela justifica boa parte dos impactos que o mercado editorial tem sofrido, principalmente as revistas. O ano de 2018 foi impactante para o mercado editorial. O Diário de S. Paulo decretou falência logo no início do ano, O Jornal da Cidade, em Ribeirão

O designer Fabrício Miranda ressalta a importância do texto ser interativo hoje

inteligência dos robôs, vidas em outros planetas, novas tecnologias, avanços da ciência, entre outros conteúdos, chamavam a atenção do público. Em 1994 a revista passou por uma reforma gráfica, e começou a apresentar o conteúdo por meio de infográficos, hoje marca registrada da editoria. Entre 2006 e 2007 os conteúdos passaram a ser disponibilizados online. Segundo Alexandro, nessa época a internet era muito diferente do que é hoje: “A idéia era colocar o texto todo da revista na internet. Então, esses textos passaram a alimentar a home page”. Mesmo com o portal disponível, ainda não havia uma produção exclusiva para essa área, o que só veio acontecer em 2015. “Começamos a produzir conteúdos para a internet de forma intensiva. Tínhamos a redação toda produzindo conteúdo diaria-

Nova realidade O Designer Gráfico Fabrício Miranda diz que hoje o mercado editorial vive uma grande crise. “O modelo de negócios não conseguiu transcender totalmente para o universo digital e isso impactou diretamente os profissionais da área”, explica. Fabrício trabalhou durante 16 anos no setor, que, inicialmente, era todo voltado para o impresso. “A principal demanda era manter o nível do design editorial no topo, fazer um produto de qualidade e que atendesse ao público com perfeição. Ali valiam as regras já consagradas do design gráfico, como, legibilidade perfeita, uma ótima edição de fotografia e layouts instigantes”. Ele diz que, com os novos hábitos dos leitores, é primordial interligar a arte com o texto. “Informar, instigar, ajudar na compreensão, interagir com o texto; independente do suporte e da mídia”, afirma. Assim como Alexandre, Fabrício acredita que “o conteúdo perdeu seu senso de valor, já que público acha que não precisa mais pagar por ele. Livros e revistas parecem obsoletos e a forma como a distribuição desses produtos acontece, hoje em dia, funcionou como o prego do caixão”. Completa dizendo que os profissionais de hoje precisam ser multidisciplinares. “Esteja apto a flertar com os setores da produção de conteúdo, da forma como ele é distribuído, do conhecimento do seu público e da forma como ele o consome”, aconselha.


EXERCÍCIO fotográfico

Novos olhares

Alunos de fotografia retratam seus olhares sobre os novos universos da leitura nhor era reflexivo e sereno. Era como se ele se comunicasse com Deus pela leitura das escrituras do divino. Já Lídia Marques fez a comparação entre as alternativas de leitura dos estudantes hoje, mostrando o mesmo livro em sua versão impressa e digital. Alex Filogônio visitou a Casa do Saber – Renascida das Cinzas e captou como o conhecimento renasce e se reconstrói todos o dias através das mãos daqueles que entendem que a sabedoria não é passível

de posse, e sim de partilha. Foi recebido pelo voluntário da Casa com a declaração: “Bem-vindo! Aqui nada é meu, tudo é nosso.” Para Milene Gomes, as bancas são locais com grandes histórias, passadas de geração em geração. Nas suas fotografias, ela quis evidenciar a maneira que as pessoas e carros, hoje, passam diante de uma banca e a ignoram. Bruna Nogueira escolheu fotografar os sebos do Edifício Maleta, localizado no coração de Belo Horizonte. Ela

mostrou a delicadeza da escolha de um livro por uma pessoa quando existem tantos outros diante dela na prateleira. Rafaela Souza optou por registrar a leitura digital através do celular. Ela vê que as pessoas estão mais conectadas nesse universo e, cada vez mais, interessados pelas tecnologias. Hoje, é possível um estudante ter acesso ao mundo da leitura bem na palma da sua mão. Aprecie, a seguir, os retratos, delicadamente, produzidos por eles.

fOTO: MILENE GOMES

fOTO: LÍDIA MARQUES

foto: Stella paiva

Da beira de uma banca de jornais desabitada ao Kindle. O consumo de livros, revistas e jornais ganhou novas formas dentro de um mundo onde o que mais se vê é o digital. Os alunos do curso de Fotografia, orientados pelo professor Rodney Costa, retratam nessa edição seus olhares sobre os novos hábitos de leitura. A aluna Stella Paiva se deparou com Seu Matias sentado, em frente à banca, no passeio da alameda. O olhar do se-

fOTO: Alex Filogônio

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fOTO: BRUNA NOGUEIRA

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fOTO: RAFAELA SOUZA

EXERCÍCIO fotográfico

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TRAMAS CONTEMPORâneas

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Quem faz suas roupas? fOTOs: Beatriz almeida

Movimentos exigem mais transparência no processo de confecção das roupas

A personagem Maria Antônia* costura, em média, por 12 horas no dia

Beatriz Almeida Moda, para alguns, forma de expressão. Para outros, apenas um conceito subjetivo de algo tão simples quanto escolher a primeira roupa no guarda-roupa. Porém, a questão que tem ganhado cada vez mais espaço é: até onde é possível conhecer esse mundo tão antagônico? Um mundo muito glamuroso mas, ao mesmo tempo, muito obscuro. Campanhas de marketing bem elaboradas têm o poder de abafar realidades insalubres e desumanas por trás da confecção de uma “blusinha”, por exemplo. Devido a necessidade de conscientização acerca dos processos de confecção das peças de roupas, nasceu o movimento chamado FASHION REVOLUTION. O primeiro evento do movimento aconteceu em 2014

- exatamente um ano após a tragédia em Bangladesh, em 2013, em que mais de 1.100 trabalhadores envolvidos em confecções de grandes marcas americanas, como Primark e Walmart, foram mortos devido à negligência em relação as condições precárias no ambiente de trabalho, culminando no desabamento do edifício Rana Plaza. Não apenas para homenagear as vítimas, mas, principalmente, conscientizar a população mundial sobre o lado sombrio do mundo da moda, o FASHION REVOLUTION tem realizado conferências anuais com o objetivo de fazer as pessoas pensarem duas vezes antes de comprar uma peça de roupa. Com a hashtag #whomademyclothes (quem fez as minhas roupas), a revolução tem trazido grandes

avanços para a moda sustentável e consciente. O movimento tem repercutido a ponto de receber atenção de grandes marcas preocupadas com a sua atuação no mercado. Uma das formas de alcançar isso, é por meio do Fashion Transparency Index, o levantamento anual do FASHION REVOLUTION que revela o nível de transparência de grandes marcas de roupa, desde marcas de grife como Chanel, Prada, até o chamado fast fashion (Forever 21 e C&A, por exemplo). Nesse ranking, o objetivo é mostrar o quanto uma marca deixa transparecer para o público a origem de suas roupas e sua relação com os empregados, por exemplo. Para a surpresa de muitos, as marcas menos ranqueadas foram as consideradas de luxo, o que desvincula a ideia de que o preço está

diretamente ligado à qualidade e fabricação consciente. É precipitado achar que, por ser um movimento internacional, mais voltado para marcas estrangeiras, o Brasil escape como um país de moda consciente. A exploração nas confecções de grandes marcas, infelizmente, também é uma realidade em nosso país. Em regiões conhecidas como polos de moda, em Belo Horizonte e São Paulo, por exemplo, há grandes concentrações de imigrantes bolivianos trabalhando em fábricas de costura de forma caracterizada como análoga à escravidão. Ambientes sujos e insalubres, carga horária desumana para atender demandas altas e remuneração muito abaixo do salário mínimo. A maioria desses imigrantes estão de forma irregular no país, as empresas confiscam seus documentos e passaportes até que os trabalhadores consigam produzir o suficiente para comprar sua passagem de volta ao seu país. Por mais que se pense na erradicação do trabalho escravo, todas as características submetidas aos bolivianos

em facções de marcas brasileiras se enquadram no que o Artigo 149 do Código Penal Brasileiro denomina como trabalho escravo. Diante de toda essa realidade, surgiu um ramo do direito especializado na área da moda: o Fashion Law. Dayane Almeida, advogada especializada em direito da moda, conta sua experiência na área: “Quando fiz o curso, percebi que a moda tem um contexto, uma história. Com isso, abri a mente para a sua conceituação, que é algo muito diferente do que a gente pensa que é. Tem um mundo por trás daquilo ali. Até a roupa chegar a você, passou pela mão de várias pessoas, seja pelo lado bom ou ruim. Tem muita história por trás da roupa que a gente usa”, explica. Segundo Maria Antônia*, nome fictício de uma faccionista que pediu para não ser identificada, a realidade da rotina de trabalho de responsáveis pela confecção de roupas de luxo, onde o ritmo de facção (nome dado para lugares com confecção de roupas em massa) exige fidelidade do empregado, conta com

Desenhos de Dayane Almeida, advogaad especializada em Direito de Moda

uma impessoalidade entre o profissional e o empregador, o que quebra a transparência de obrigações e direitos. As marcas dificilmente vinculam diretamente seu nome às facções responsáveis por suas roupas. Maria* também revela que não existe uma carga horária estipulada. “Eles nos entregam um saco cheio, com os cortes de uma peça, e você precisa se virar para entregar. O tempo depende da quantidade e da sua rapidez. Geralmente, isso custa 12 horas por dia”, conta. Pensando isso, muitas pessoas têm adotado um estilo de vida que vai na contramão do consumismo, costurando suas próprias roupas e aprendendo a viver apenas com o necessário. Mas, não é um trabalho fácil. O primeiro passo pode ser começar a se perguntar “quem fez a roupa que estou vestindo?”. Por meio dessa conscientização, é possível enxergar o guarda-roupa com outros olhos. É possível pensar nas peças de roupa como horas de trabalho de outra pessoa e, assim, ponderar antes de descartar uma peça e comprar outra.


11 INFOGRÁFICO: CINTYA DIAS / CACAU UNIBH

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OUTROS PAPOS

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Animação é coisa de criança? Filmes de animação abrem espaço para o público adulto se divertir

A Chegada de Um Trem À Estação é um curta-metragem com 20 minutos de duração, exibido para 33 pessoas, em 1895 (França). Produzido pelos irmãos Auguste e Louis Lumière, o curta marcou a vida das pessoas que estavam presentes naquele dia, pois vivenciaram a primeira exibição cinematográfica da história. Com o tempo, outros produtores surgiram e buscaram novos enredos e histórias que chamassem a atenção do público. Cerca de 14 anos após a estreia dos irmãos Lumière, a primeira produção de animação surgiu. Emile Cohl, também francês, exibiu o Fantasmagorie, um curta-metragem de 2 minutos, em 1908. O Fantasmagorie é diferente dos formatos de desenhos que conhecemos hoje. No início do curta, aparece a mão do próprio Emile desenhando o personagem principal no quadro negro. Não tinha sons e todos os desenhos foram feitos com giz. Desse curta, nasceram outras produções em animação, como El Apóstol, lançado em 1917, e As aventuras do Principe Archmed, lançado em 1926, até chegarmos ao modelo de produção de hoje.

Do giz ao Mickey Mouse Em 1923, foi fundada a Disney Brothers Cartoon Studio, hoje, Walt Disney. Os fundadores Walt e Roy Disney, provavelmente, não imaginaram que a produtora seria referência mundial de animação. Em 1928, após uma crise financeira, tudo mudou com a criação do Mickey Mouse. O famoso ratinho conquistou a atenção do público e se tornou marca registrada da produtora. Outros personagens foram sendo criados para compor a história do Mickey, como o Pato Donald, o Pateta e a Minnie. Nessa época, o público-alvo da produtora eram as crianças. Então, tudo o que criavam era para conquistar a atenção delas. O produtor de animação e professor do curso de cinema da UNA, Sávio Leite Silva, acredita que “as pessoas foram, durante todo o século 20, um pouco doutrinadas com os produtos da Disney”, e, por isso, os adultos não se sentiam atraídos pelos desenhos. Mas, ainda assim, as produções tinham uma “pegada” adulta. “Se você pegar o filme Bambi, ele é um filme muito triste. É um filme voltado para o público infantil, mas tem a morte, que é a coisa da perda

da mãe, e toda criança sente quando vê esse filme”, explica Sávio.

Mudando o alvo Sávio acredita que, mesmo com esse conceito, boa parte dos desenhos animados abordava temática adulta. “O Pernalonga era para o público infantil, mas, se você for parar para analisar, ali tem muito bullying, tem morte, às vezes tem duplo suicídio. Vejo isso em todos da Warner. E era voltado para o público infantil, e a gente era alimentado com esse tipo de animação”, contextualiza o professor. Os produtores de desenhos animados começaram a mudar o foco e a criar narrativas que também conquistassem o público adulto. Sávio acredita que Toy Story, produzido em 1995, foi o filme que impulsionou essa mudança. “É um filme voltado para o público infantil, mas que agrada a família inteira com um roteiro muito original e muito bem feito. Pode-se perceber que a identificação do gênero passou de ‘infantil e família’ para ‘filmes para a família e crianças’”, explica Sávio. Animação como forma de interação Os filmes animados têm foco para todos os públicos, buscam unir

lançamentos 2019

Confira algumas animações que serão lançadas ainda este ano: 28 de março: Dumbo 09 de maio: Pokémon: Detetive Pikachu 24 de maio: Aladdin 20 de junho: Toy Story 4 26 de junho: Turma da Mônica: Laços 19 de julho: O Rei Leão

fotos: reprodução/divulgação

Jéssica Teixeira Stéffane Nascimento

Cartaz do filme Toy Story 4 que estreia no próximo dia 21 de junho

pais e filhos e trazer um conteúdo que seja interessante para ambos. “Muitas produtoras têm investido em histórias que possuam uma base que atraia a criança, mas com elementos sutis que divirtam ou entretenham os adultos. Detona Ralph, por exemplo, é uma história de dois personagens que buscam aceitação, mas se passa em um mundo que as crianças pouco conhecem, porém, familiar aos adultos”. Diz Giovanna Bianchini, Diretora de Animação da produtora mineira Ovelha Negra. A estudante de jornalismo, Lorena Aguiar, revela que gasta, em média, de 6h a 8h por fim

de semana para assistir animações. “Eu cresci em uma família em que meus tios e avós se sentavam comigo para assistir desenho. Nunca vi o gênero como algo apenas para crianças. Mas atualmente, existem animações bem direcionadas a crianças, isso depende do design dos personagens e da história também. Então, desde que tenha um design mais desenvolvido, acho que deixa de ser apenas para o público infantil”, comenta. Mestre em cinema pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Wagner Miranda, acredita que “já tem muito tempo que as animações atuais tam-

bém pensam no público adulto, porque a criança não vai no cinema sozinha”.

Tocando no íntimo Os desenhos animados sempre chamaram a atenção por algum motivo. É uma obra de arte fantástica que, quando casada ao enredo instigante, toca na alma de quem assiste, seja criança ou adulto. Em meio a tantas responsabilidades que a vida adulta traz, o público adulto tem encontrado grande alegria e distração em produções como estas. É o momento de lembrar, por meio da animação, do seu lado humano e da sua inocência.


TRAMAS CONTEMPORâneas

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Um recomeço: a volta aos palcos Carolina Rizzo

grupo fará shows também em Fortaleza, Recife, João Pessoa, Belo Horizonte, Brasília, Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo. A contadora Carolina Carvalho é fã e apaixonada pela dupla Sandy e Júnior desde os nove anos. Quando soube do retorno da dupla não conseguiu segurar a emoção. “Estou ansiosa demais. Vai ser uma nostalgia gostosa, um pedaço da minha infância por meio dos hits da dupla. É um show que não tem como perder. Se, naquela época, eles já tinham um show super estruturado, imagina com a tecnologia de hoje? Não vejo a hora”, exalta Carolina. A notícia do retorno da dupla foi um dos assuntos mais comentados nas redes sociais nos últimos dias. O mistério sobre a volta de Sandy e Júnior começou quando os dois fizeram publicações na internet reforçando rumores de que estariam juntos novamente nos palcos. Confirmada a informação, os fãs foram à loucura. Carolina conta como foi a sua reação ao receber

fotos: reprodução

O mundo da música é um caminho cheio de mistérios e surpresas, aparenta ser mil maravilhas, mas, nos bastidores, pouquíssimos sabem como é difícil cada passo a ser dado. Da carreira solo a formação de bandas, existem vários conflitos que, muitas vezes, resultam na pausa ou no término de grandes trajetórias artísticas. Os motivos dessas separações nem sempre são revelados, mas, sabemos que, como em todo meio de trabalho, obstáculos como dinheiro, personalidades diferentes, manias, responsabilidades, ego, objetivos, cansaço, entre outros, pesam na decisão final. Contudo, para a alegria dos fãs, muitos desses artistas curam suas feridas, conquistam seus objetivos e tomam a decisão de retomarem o trabalho. Um exemplo, que enlouqueceu os fãs no último mês, foi a notícia da volta da dupla Sandy e Júnior. Doze anos após anunciarem o término da dupla, os irmãos resolveram se

unir para uma turnê em várias cidades do Brasil. A turnê “Nossa História” contará com diversas músicas antigas. O objetivo parece ser relembrar os velhos tempos e celebrar os 30 anos de carreira. A dupla passará por Salvador, Recife, Fortaleza, Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba, Manaus e Belém. Os 24 mil ingressos reservados para a apresentação em Belo Horizonte, marcada para o dia 17 de agosto, foram esgotados em poucas horas. Cidades como Rio de Janeiro e São Paulo já abriram shows extras. Donos do hit Anna Júlia, a banda Los Hermanos se separou no ano de 2007, mas voltaram aos palcos para uma turnê de despedida em 2015. Em dezembro de 2018, foi anunciada a volta do grupo. O retorno do quarteto carioca já havia sido cogitado quando a banda se apresentou no line up da edição argentina do festival Lollapalooza, programado para março de 2019. A turnê no Brasil inicia no dia 5 de abril, em Salvador. O

O sucesso Anna Júlia saiu no primeiro álbum da banda Los Hermanos, lançado em 1999

foto: enviada por Carolina carvalho

Artistas retomam parcerias fazendo turnês arrebatadoras

Carolina Carvalho é fã de Sandy e Júnior e ficou emocionada ao saber do retorno da dupla

a notícia. “Quando vazou a informação que eles iriam se unir para fazer a turnê, foi uma mistura de expectativa com agradecimento por, finalmente, ter a oportunidade de ir em um show deles. Eu saí igual louca atrás de informações para saber se teria show deles aqui em Belo Horizonte. É uma felicidade imensa”. Além de Sandy e Júnior e Los Hermanos, outras bandas como Rouge, Balão Mágico e Novos Baianos também retomaram a parceria nos últimos anos. Depois de 15 anos, os Tribalistas surpreenderam seus fãs ao anunciar, em agosto de 2017, o retorno aos palcos. Por meio de uma live nas redes sociais, o trio revelou que um novo disco de canções inéditas seria lançado. Além disso, a banda realizou, em 2018, uma turnê pelo Brasil. Salvador foi escolhida como ponto

de partida dessa nova grande história. Outras cidades como Rio de Janeiro, Recife, Fortaleza, São Paulo, Porto Alegre, Curitiba, Brasília e Belo Horizonte também foram palcos dessa nova turnê. A retomada de vários projetos está ficando cada vez mais comum no mundo da música. Rodrigo Borges, produtor musical, destaca que existem desafios também no retorno desses artistas. “Primeiramente, eles precisam se sustentar no mercado de uma maneira longeva, porque geralmente são oportunidades de mercado que surgem, com uma grande proposta, e eles tendem a aproveitar. O desafio é conseguir produzir novo material relevante para continuar em frente. É essencial superar antigas divergências ou se adaptar a uma nova formação. Um outro desafio, principalmen-

te nos dias de hoje, é conseguir se destacar em tempos de redes socais, internet, além de conseguir dialogar com as novas gerações”, pondera Rodrigo. Rodrigo conta que, como produtor, nunca esteve diretamente envolvido em projeto semelhante, mas, observou o retorno da banda Los Hermanos no festival de música SWU. “Eu estava trabalhando pela rádio OiFM, coordenando as transmissões ao vivo que a gente fez do evento, e pude ver essa catarse de público, pois é uma banda que movimenta fãs muito fiéis. A volta deles sempre foi muito aguardada, e pude perceber que foi muito proveitoso esse retorno para o grupo. Certamente, essa participação nesse show de grande porte acabou motivando a ampliação da agenda para outros lugares do Brasil e do mundo”, avalia.


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Você sabia?

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Mais alto, mais rápido, mais longe Marianna Bortolini Nathália Souza Apesar do estúdio Marvel ter uma legião de icônicas super-heroínas – como a Viúva Negra, pedido frequente dos fãs para franquia solo - este é o primeiro filme protagonizado por uma mulher. No último filme dos Vingadores, por exemplo, em meio a tantos protagonistas, a Feiticeira Escarlate, sem dúvidas, desempenhou um papel importantíssimo ao mostrar o quanto é poderosa. Em Pantera Negra, filme aclamado pela representatividade e ganhador de Oscar, as mulheres também tiveram papel de destaque. Ou seja, já era hora da Marvel lançar um filme em que a protagonista fosse uma mulher, outro importante passo no mercado audiovisual. Desde o sucesso de Mulher Maravilha, as mulheres querem mais super-heroínas nas telonas, elas também gostam do gênero e querem ser representadas, tendo personagens que são genuinamente relevantes e importantes para a trama. O filme explica a origem da super heroína Capitã Marvel, alter ego da piloto da Força Aérea norte-americana Carol Danvers, protagonizada pela atriz vencedora do Oscar, Brie Larson. No planeta Hala, a heroína vive com o nome de Vers, um soldado do exército Kree e sem memória de sua vida terrena. Em uma perseguição à alguns soldados Skull, uma raça considerada inimiga, ela acaba chegando ao planeta Terra, nos anos 90 e foi encontrada pelo agente da SHIELD, Nick Fury (Samuel L. Jackson), um velho conhecido nosso. Com apenas alguns flashs de sua vida

terrena, juntos eles buscam respostas e tentam capturar os invasores. Não é surpresa pra ninguém que os filmes da Marvel estão todos conectados, assim, estávamos ansiosos para saber quem era a heroína e como ela se encaixa no universo. Pudemos conhecer um pouco da Capitã, sua força é uma surpresa para o público e, até mesmo, para os personagens. O longa contém todos os elementos já conhecidos da Marvel: dinamismo, diversão e bons efeitos visuais, principalmente na representação da energia em volta da Capitã. A grande diferença vem no protagonismo da mulher: Carol Danvers carrega uma mistura de força, determinação, resiliência e sarcasmo. Desde a infância, Carol representa a imagem de uma mulher que sobrevive em meio a repressão de uma sociedade machista. Durante os flashes de memória da personagem, podemos ver sua trajetória em diferentes momentos: Carol criança tentando vencer uma corrida e sendo reprimida pelo pai; no teste para entrar no exército sua força é julgada; em sua maior ambição, que é ser piloto, os homens dizem que ela nunca vai chegar lá. Mesmo com as derrotas, Carol encontra forças para se levantar e correr atrás do que busca. Entretanto, mesmo como Capitã Marvel, tentam reprimi-la e controlá-la. Seu relacionamento com o líder da Starforce, Yon-Rogg (Jude Law), é baseado no interesse dele em utilizar a força da Capitã e controlar seus poderes para o benefício do exército dos Kree. Rogg se beneficia da perda de memória para manipular suas emoções.

fOTO: REPRODUÇÃO

Chegou a hora da Capitã Marvel: A hegemonia masculina em filmes de heróis está com dias contados

Capitã Marvel é a primeira heroína protagonista de um filme do estúdio

Neste filme, conhecemos um Nick Fury mais jovem, divertido, trabalhando na recém criada SHIELD e sem nenhum contato com pessoas super poderosas ou alienígenas. É interessante acompanhar um Fury com um olhar inocente e tomado de fascinação pelas novas descobertas. É também nova sua relação com, o então novato, agente Coulson (Clark Gregg), e podemos perceber o laço de amizade criado entre eles. E o mais legal: descobrimos como Fury perdeu o olho! Outro ponto importante da história é a relação de Carol com sua

amiga Maria Rambeau (Lashana Lynch) e a pequena Monica Rambeau (Akira Akbar). A surpresa em saber que Danvers não morreu no acidente logo se transforma em um misto de alívio e tristeza. Maria era companheira de Carol na Força Aérea e a proximidade delas faz com que a amizade se assemelhe a uma pequena família. Nessa relação, podemos ver um lado mais humano da Capitã Marvel, menos agressivo. É nesse momento que Carol decide mudar a cor de seu traje. Com a ajuda de Monica, ela abandona o verde do exército

Kree e assume as cores azul e vermelho, inspiradas na Força Aérea norte-americana. A esperada participação do Stan Lee, que, infelismente, faleceu no ano passado, foi modificada após sua morte. Na cena, em plena perseguição, a heroína para e sorri para Stan, uma singela homenagem ao criador dos heróis. Antes, a cena teria o tom cômico familiar em outras obras. A ligação mais interessante com os Vingadores é que, após a jornada do Fury com a Capitã, ele idealiza a “Iniciativa Vingadores”, inicialmente chamada de “Iniciativa

Protetores”. Sua intenção é descobrir outros como ela, agora que ele sabe da existência de outros mundos e universos. A Capitã deixa claro, ao final do filme, que ele deveria contactá-la apenas em casos de extrema emergência. Após Thanos conseguir juntar todas as joias do infinito e sumir com metade da população mundial, Fury decidiu ser uma boa hora para chamá-la. Thanos que se cuide, porque a Capitã Marvel não vem para lutar uma guerra, vem para acabar com ela. Vingadores: Ultimato, estreia nos cinemas no dia 25 de abril de 2019.


Você já VIU E OUviu?

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Violência x Games: qual é a causa? Luciano Neto Imagine um jogo em que você entra em um campo de batalha e precisa eliminar o máximo de pessoas possíveis para vencer. Lembra o estilo Battle Royale, onde você se conecta a outros jogadores em um servidor e seu objetivo é sobreviver. Fortnite, PUBG e Apex Legends, todos têm esse enredo de jogo. E se eu disser que isso acontece na vida real? Durante a história, massacres em escolas tem assustado a humanidade e deixado um alerta em nossa sociedade. Pessoas entram nos estabelecimentos e o transformam em um campo de batalha e chacina. É o exemplo do atentado em Columbine (20 de abril de 1999), o Massacre de Realengo (7 de abril de 2011), o massacre na Universidade Virginia Tech (16 de abril de 2007) e o mais recente, o atentado na Raul Brasil, uma escola na cidade de Suzano, São Paulo, no dia 13 de março de 2019. Guilherme Taucci Monteiro e Luiz Henrique de Castro, de 17 e 25 anos, respectivamente, invadiram a escola Raul Brasil portando armas como pistolas, besta (pistola automática com flechas em formato de arco) e machados. Os jovens assassinaram 10 pessoas e deixaram 11 feridos. No mesmo dia, o vice-presidente do Brasil General Amilton Mourão associou o ataque aos jogos eletrônicos, segundo informações do jornal Correio Braziliense: “Temos que entender o porquê de isso estar acontecendo. Essas coisas não aconteciam no Brasil. Vemos essa garotada viciada em videogames violentos. Tenho

netos e os vejo muitas vezes mergulhados nisso aí”. Mas será que o problema está somente nos games? Não é a primeira vez que associam atentados reais aos games. Em fevereiro de 2018, o presidente dos Estados Unidos Donald Trump fez um discurso semelhante ao de Mourão durante um encontro sobre a violência nas escolas norte-americanas: “Nós precisamos fazer alguma coisa quanto ao que eles [jovens] estão vendo e como eles estão vendo. E também os videogames”, disse Trump. “Quer dizer, mais e mais pessoas dizem isso, o nível da violência nos videogames está fazendo a cabeça dos jovens. E você dá mais um passo, e são os filmes. Você vê esses filmes, e eles são tão violentos.”, reafirma o presidente norte-americano. Já no Brasil, em 2016, o então ministro da Justiça José Eduardo Cardozo fez o mesmo paralelo: “Outro dia ouvi um especialista dizer que nunca viu um game em que o vencedor é quem salva vidas, pois o vencedor é sempre quem mata. Essa cultura da exaltação da violência se projeta e acaba banalizando a violência”, comentou na época.Mas, até onde a tecnologia influencia os comportamentos dos jovens? Jogos violentos realmente aumentam a agressividade? A ciência afirma que não. Um estudo feito pela Universidade de Oxford, e divulgado, coincidentemente, no mesmo dia do massacre em Suzano, mostra que não há relação alguma entre jovens violentos e games. A pesquisa contou com cerca de 1.004 pessoas, entre 14 e 15 anos, além dos respecti-

FOTO: Richard Clark/ iStock

Atentados recentes reacenderam um debate sobre a influência dos games no comportamento juvenil

vos pais e responsáveis. Já o estudo publicado em dezembro de 2010 pelo cientista Christopher J. Fergunson, no períodico científico Journal of Youth and Adolescence (Jornal de estudos e pesquisas de jovens e adolescentes), diz que existe uma baixa relação entre videogames e alguma mudança de personalidade do adolescente que o consome. Segundo ele, a agressividade não “aparece” por causa do videogame, o jogo, basicamente, não cria algo que já está enraizado no jovem. Os dois tópicos se desenvolvem em paralelo, um não justifica o outro. O estudo de Fergunson também afirma que não há evidências sólidas de que um jogo violento aumenta a agressividade, porém, os jogos podem ter influência e inspirar tal ato. O discurso de

culpabilizar apenas o videogame é raso. Coloca a principal causa da violência para debaixo do tapete. E, afinal, qual o causador deste problema? No caso do Brasil, a intolerância já está culturalmente enraizada em nosso cotidiano, pessoas engessadas em suas bolhas sociais não permitem que alguém pense algo diferente. Discursos de ódio pelo viés ideológico, religioso, esportivo e tantos outros. Brigas envolvendo pessoas com posicionamentos políticos de esquerda ou direita e torcedores rivais. A discussão deve ir além de um simples “joguinho”. A afirmação do vice-presidente brasileiro não é totalmente certa, mas não está inteiramente equivocada. Jogos podem influenciar, mas culpá-los como o vetor de tudo é falha de análise e ignorância. O

ser humano é preconceituoso e a quem cabe mudar isso? É preciso que todas as pessoas estimulem o debate e pratiquem o respeito. O amigo não deixa de ser amigo se tiver uma visão diferente. Jogos de videogame podem estimular o trabalho em equipe, a agilidade, a concentração, o raciocínio lógico e todos servem para diversão. Autor do livro “Videogame e violência” (Civilização Brasileira), Salah H. Khaled Jr., professor de Criminologia e Direito Penal da Universidade Federal do Rio Grande, afirma que os games são usados como “bodes expiatórios” para evitar a discussão de problemas sociais complexos. Quando questionado sobre o que pode ter causado a tragédia de Suzano, o pesquisador afirma que “somos consumidores de violência

através das diferentes mídias: filmes, livros e videogames. Por meio dessas representações narrativas, experimentamos as sensações que decorrem da prática de condutas criminais”. Salah culpa os próprios consumidores pelos massacres. “(...) A sensação de empoderamento que o sujeito experimenta diante da sociedade que ele considera opressora, a subjugação das vítimas ao seu poder e a projeção da própria imagem para uma potencial audiência. A performance é para a vítima, para terceiros e para o próprio autor. Por meio das redes sociais, uma espécie de imortalidade pode ser alcançada. Não é por acaso que os atiradores documentaram a preparação para o ataque”. Encerro essa crítica com a pergunta. Afinal, qual é a causa?


CRÔNICas 16 Não é de Deus, e sim do diabo! Abril de 2019 Jornal Impressão

Imagine se, em um belo dia, você acorda e, de manhãzinha, ao checar as notícias, vê lá no alto da capa de um importante jornal online a seguinte manchete: “A alegria acabou! A partir dessa data, fica terminantemente proibida a celebração das festas populares, principalmente o Carnaval”. Sem nenhuma explicação plausível, só uma notinha no fim da página, bem escondidinha, diz assim: “Não é de Deus, e sim do diabo”. Em 2019, depois de três meses no governo, Jair Bolsonaro proibiu que as transmissões dos desfiles das escolas de samba campeãs dos carnavais de São Paulo e do Rio de Janeiro fossem veiculadas pela TV Brasil, que é mantida pela EBC, Empresa Brasil de Comunicação. Como forma de apoio, a TV Brasil fazia as transmissões dos desfiles das campeãs há 3 anos. Depois de discutir sobre a Lei Rouanet

com Daniela Mercury, após ela e Caetano Veloso postarem o clipe da música Proibido o Carnaval, Bolsonaro ficou sem argumento para manifestar a sua insatisfação e soltou o vídeo de um golden shower pelo Twitter - cujo conteúdo era pornográfico -, filmado durante o carnaval em São Paulo. No post, ele ainda escreveu: “Não me sinto confortável em mostrar, mas temos que expor a verdade para a população ter conhecimento e tirar suas prioridades. É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro. Comentem e tirem suas próprias conclusões.” No post seguinte, questionou: “O que é golden shower?” Segundo Roberto da Matta, autor do livro Carnavais, malandros e heróis, de 1979, o Carnaval é um ritual nacional. Um feriado com período de três dias - domingo, segunda e terça -, comemorado em bailes com

concursos de fantasias e desfiles das escolas de samba. É um ritual cósmico, já que se relaciona com o divino, uma vez que o carnaval precede a quarta-feira de cinzas, onde iniciase a quaresma. Ainda de acordo com o autor, o início do carnaval não é datado,

remete a relação do homem com a santidade e confunde-se com a história universal. O feriado tem, ainda, implicações políticas, uma vertente institucionalizada do estado da sociedade civil enquanto povo ou massa. Pela vigésima primeira vez, a escola de

samba Mangueira, do Rio de Janeiro, ganhou o tradicional desfile de Carnaval em 2019, com enredo sobre personagens não descritos pelos livros de história, como a ex-vereadora Marielle Franco - assassinada há um ano. No enredo, que exemplifica as liga-

ções sociais e políticas da festa citadas por Roberto da Matta, o carnavalesco Leandro Vieira cita tantos outros personagens, como os índios que tiveram as terras invadidas por europeus, personalidades mangueirenses como Mussum, Jamelão, Lecí Brandão e outros. Foto: reprodução / facebook

Ana Borges

Peça gráfica com o tema do desfile de carnaval da Estação Primeira de Mangueira 2019

Victória Farias Se eu te contasse sobre tudo isso, se algum dia tivesse coragem, me pergunto: o que eu realmente diria a você? Te contaria sobre o tempo? Parece que aconteceu há séculos. Te contaria sobre as culturas que foram misturadas e separadas por fios de espada? Acho que não valeria a pena entrar em um assunto tão pessoal. Mas, talvez, eu pudesse te contar sobre as coisas que todos nós já sabemos, como, por que o nosso azul é tão azul, ou o verde é tão verde. Seria um prazer te contar os segredos e costumes da nossa gente, que se

espalha do Oiapoque ao Chui. Mas como nós sabemos, são tantas histórias, tantas escolhas que nos levaram a caminhos tão diferentes. Pelo lado bom, você já sabe como tudo começou. Aparentemente, somos a pedra no caminho das Índias. De lá para cá, muitas coisas deram muito errado, outras muito certo, e sempre tudo esteve bem mais ou menos. Como está a economia? Mais ou menos. Como está o tempo? Mais ou menos. Como está a democracia? Ah… acho melhor não falarmos sobre isso. Vai que, até a publicação deste impresso, o governo proíba que assuntos como esses sejam

falados abertamente, e eles descubram que eu faço jornalismo no UniBH do campus Buritis, pela manhã, mais precisamente na sala 114. Seria um desastre! Mas saber como tudo começou, não quer dizer que sabemos como fomos parar aqui. Quem, em sã consciência, escolheria parar em um lugar onde não se consegue andar de ônibus, não se consegue andar de carro e quando consegue, não tem onde parar? Sem falar, é claro, meu caro amigo, nos riscos eminentes. Cedo, muito cedo, quando eu e você já estivermos formados, e trabalhando em pro-

fissões completamente diferentes, sem saber que um dia secretamente nos conhecemos por meio desta crônica, o nosso verde não será tão verde assim, e será uma sorte imensa, se ainda tivermos o azul. Mas nem tudo estará perdido! Ainda teremos os segredos que nunca contamos um ao outro, ou que Brasília nunca nos conta. Peço desculpas por falar sem parar, mas se você não percebeu, tudo o que você precisa saber, sobre o passado e o presente, está bem aqui. Pelo lado ruim, você tem alguma ideia de quanto estará a cotação do dólar amanhã?

foto: laura mourão

meu Brasil nem tão brasileiro assim


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