4 minute read

3 – Pítia de Delfos

3

PÍTIA DE DELFOS

Advertisement

Egeu saiu às escondidas da cidade de Atenas. Preferiu retirar-se sem o séquito real, sem sua habitual comitiva. Passou pelas portas não vigiadas da cidade e fez-se acompanhar por poucos homens, todos de confiança, e no segredo da palavra. – Não quero que saibam que procuro um filho homem… não tenho conseguido gerar filhos homens, só me nascem meninas… – lamentava-se a caminho. – Ninguém saberá, senhor, ninguém! – ponderava Ceres, ao seu lado.

Eram oito homens silenciosos, oito homens de confiança, com o segredo do rei.

Ceres era o melhor e o mais atento dos generais de Egeu, mas comportava-se como um servo. Homem de tamanha honestidade e fidelidade que fazia o rei descansar em paz e repousar tranquilo, longe das suspeitas

de traição ou de infame conjuração revoltosa. Egeu tinha-lhe como filho e queria-lhe bem, por isso exigiu que o acompanhasse ao santuário de Delfos. – Você me quer bem, Ceres? – perguntou Egeu.

Estavam descansando numa clareira, à tarde, debaixo de árvores frondosas, na sombra fresca das folhagens. Os homens estavam próximos, cansados ainda da jornada. – Meu senhor, que pergunta! Por quê?

Egeu desviou-lhe o olhar, entristecido. – Nada, meu caro, esqueça, me deu vontade de saber se posso confiar… – Quê?! O meu senhor duvida de mim? – falou Ceres, erguendo-se. – Não! Não, Ceres, claro que não duvido de você! – acalmou-o Egeu. – Mas por que me pergunta o que já sabe? – Por nada, esqueça! – deu por encerrado o rei.

Ceres afastou-se, voltando-se confuso para o rei vez por outra. Egeu arrependeu-se das palavras e o chamou a si. – Meu filho, venha cá! – pediu. – Senhor… o que quer? – intimidou-se o general. – Abrace-me, filho, eu estou arrependido pelas palavras truncadas e vazias. Abrace-me, porque sou como um pai que não possui filho! – falou com voz estremecida o senhor de Atenas.

Ceres olhava-o enternecido. Seus olhos marejavam de comoção e os outros homens observavam a cena com atenção. – Meu senhor… meu senhor… – repetia Ceres enquanto se deixava abraçar pelo poderoso de Atenas.

Ao subirem a colina do altar dedicado a Apolo, em Delfos, uma chuva forte caiu no entorno, impedindo o pequeno séquito de continuar. Por isso, refugiaram-se numa hospedagem e lá comeram e descansaram dos dias difíceis.

Enquanto os outros homens se distraíam com jogos e músicas, Egeu acercou-se de Ceres. – Será que obterei do divino boas respostas? – Meu senhor, o deus Apolo é benigno! – Quero um filho homem, Ceres, pois logo estarei velho e frouxo! Não conseguirei mais, não é mesmo? – Que é isso, senhor, não fique assim, o divino Apolo atenderá seus rogos, claro que sim! – acalmava-o o fiel servo.

Egeu olhou o general de cima a baixo, com ternura, sabia que era amado e protegido. Olhou-o mais uma vez e dirigiu-se ao quarto reservado para dormir. – Levantaremos-nos cedo, meu amigo! – Sim, senhor, às ordens – respondeu o outro.

E Ceres, vendo o rei recolher-se, voltou-se para os outros e, firme, exigiu: – Não bebam mais. Nada de abusos além da hora, nosso rei precisa muito de nós!

Todos de uma só vez balançaram positivamente a cabeça. A concordância do grupo era a marca de união. Ceres então retirou-se ao quarto contíguo ao de Egeu. Entrou, mas não se deitou: permaneceu de pé, rente à parede onde, do outro lado, a cama do rei estava colocada, e durante toda a noite velou seu sono.

Aos primeiros raios de sol, quando o Oráculo de Delfos se deixou envolver pela luminosidade, o seleto grupo de Egeu já estava aos seus degraus. – Parem! Eu irei adiante! – pediu o rei.

Todos prontamente estacionaram, obedientes. – Você pode me seguir, Ceres! – Sim, senhor!

E ambos foram recebidos pela Pítia. – O que querem do deus Sol, senhores? – Sou de Atenas… – Sim, eu sei, Egeu – interrompeu-o a vidente –, e sei que és o soberano, o senhor absoluto de Atenas! – Então, sabe que eu sou um necessitado, um miserável, que precisa de ajuda… – Sim, eu sei algumas coisas, mas tu deves falar, confessar suas necessidades, senhor de Atenas! – esclareceu a mulher.

– Pois bem, vim aqui para pedir, ou melhor, consultar Apolo, o magnânimo deus, para saber se terei um filho homem, eu, que só tenho meninas… – desabafou o monarca.

A Pítia achou graça. A mulher sorriu em transe, soltou uma gargalhada, assustando Egeu e Ceres, que se entreolharam e recuaram. Os outros homens, na suspeita de algo pior, avançaram resolutos. – O que devemos fazer, senhor?! – perguntaram. – Sosseguem, ela está em comunicação com a divindade! – acalmou-os Egeu.

Em um período curto de tempo, a mulher tomou uma atitude patética: balançava a cabeça de um lado para o outro, revirava os olhos e sua voz assumiu uma entonação grave. Subitamente, quedou-se estática e assim permaneceu.

Egeu aproximou-se, temeroso, mas venceu-se, tocando-a enquanto dizia: – Senhora, senhora, o que devo fazer?

A Pítia despertou, segurou-lhe o braço e, com os olhos arregalados, enquanto a boca abria-se vertiginosamente, várias vezes, todos ouviram como num som surdo e prolongado as palavras certas: – Não desates a boca do odre antes de chegar a Atenas!

E assim, ainda proferindo, tombou, inerme, sendo ajudada por outros soldados que a reconduziram ao interior do templo para ser tratada.

Assustados, Egeu e Ceres sentaram-se nos bancos do átrio sem conseguirem entender o enigma declarado. – Você entendeu, filho? – quis saber Egeu. – Não, meu senhor.

E os dois ficaram cogitando o enigma pronunciado e como sabiamente decifrá-lo.

This article is from: