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16 – Ariadne e suas tramas

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ARIADNE E SUAS TRAMAS

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– Pai, eu estou suplicando como jamais ousei pe dir! – falava Ariadne nos jardins com o pai. -

Minos parecia transtornado. – Pedido impróprio e incômodo esse, como poderei livrar Teseu? E a promessa? Minha palavra, Ariadne? Como dizer que devo ter catorze jovens e só entregar treze? – respondia o homem de maneira desagradável e com um olhar sério, desconcertado diante da filha com a sua súbita intromissão.

Ariadne mexia os cabelos, inquieta. Não estava satisfeita, pois queria livrar o homem por quem seu coração enamorou-se deveras. O que fazer? Como livrar seu amado de terrível vingança? O que fazer? O Minotauro não deixaria ninguém vivo. Jamais alguém escapou; era

uma morte certa. Sua única opção era demover o pai de seu projeto vingativo e perverso. –Pai… o que posso fazer? Que posso pedir para que liberte Teseu, amigo de meu irmão, íntimo de seu filho? –advogava, súplice.

Minos desviava o olhar, não sabia mais o que responder. Então, por fim, fixou os olhos em Ariadne, pousou suas mãos nos ombros dela e disse, firme: – Amanhã, filha, deixe-me por hoje. Amanhã darei uma melhor resposta, sim? – falou com voz mansa aquele que tinha forma de mau e grosseiro.

Ariadne deixou escorrer uma lágrima, Minos ficou mais um pouco desconcertado e disse: – O que é isso, filha? O que é isso? Vamos, tenho que descansar e pensar melhor, sim? Amanhã terei os pensamentos mais arrumados.

A moça ouvia o pai, contudo o coração lhe apertava no peito. Um pressentimento ruim indicava que o resultado não seria bom, então se jogou no chão, abraçou fortemente as pernas de Minos e gritou a plenos pulmões: – Não, meu pai! Não, meu pai! Não deixarei ir até que permita que eu fale com Teseu! – e gritava mais e mais, então Minos ordenou que os guardas trouxessem Teseu.

O rei foi prontamente atendido; Ariadne só se desvencilhou do forte abraço nas pernas do pai quando viu Teseu aproximar-se acompanhado pelos guardas.

– Veja! Veja, filho de Egeu, você foi admirado pelo meu querido filho, agora minha filha também devota a você grande afeto, espero que Ariadne não se perca como o outro, porque não confio em você, Teseu!

Teseu mantinha a cabeça erguida, mas não respondeu e voltou-se com olhos amáveis para Ariadne, ainda caída ao chão, chorosa.

Ele se aproximou, solícito, para erguê-la. Minos observava, mas ao vê-lo estender a mão para a filha, avançou com passos rápidos para fora da sala. – O que você tem? Por que está assim? O que ele fez? – indagava apreensivo. – Nada, nada não; ele não me fez nada, eu pedia por sua vida e a de seus amigos. Sou contra essa matança no Labirinto, já disse, não entendo como pode isso ainda acontecer! Não é mais possível tolerar tal carnificina… Pedi que poupasse sua vida e a de seus amigos…!

Teseu subitamente compreendeu a circunstância em que estava envolvido e interessou-se. – Então, o que ele disse? Vai me poupar e aos meus?

Ariadne demorou a responder, bem que desejava transmitir melhores palavras, uma boa notícia, mas retrucou calma, esperançosa: – Amanhã… ele disse que amanhã terá melhor resposta, porque precisa pensar melhor… – replicou com voz alegre, não obstante a cara triste.

Teseu fixou-lhe o olhar e lhe exprimia carinho e ternura. Aquela moça mal o conhecia e enfrentava seu tirânico pai, enfrentava com palavras e presença o terrível Minos; não era moça qualquer, mas mulher de fibra, de convicções e de resolutas decisões, como não abraçá-la? Como não até beijá-la, porque era uma garota de caráter, empenhada em suas decisões?

Num impulso rápido, sem se intimidar com os circunstantes, Teseu avançou, apertou Ariadne em seus braços e em seguida beijou-lhe longa e ternamente a testa. – Eu estou muito agradecido, moça! – disse enternecido ante os olhos perplexos de Ariadne. – Tenho maneira propícia para que escape do Labirinto e das garras do Minotauro! – sussurrou-lhe aos ouvidos. – Como? Diga-me agora, sim? – pediu ele.

Ariadne pôs-lhe o dedo na boca. – Amanhã, amanhã lhe direi tudo, caso meu pai não isente você e os demais do suplício – acalmou-lhe a princesa.

Nem Teseu nem seus companheiros dormiram, porque temiam pela sua sorte. Tanto os homens quanto as mulheres desdenhavam da possibilidade de sucesso, por isso criticavam ora a perversidade de Minos, ora a generosidade da filha.

– O rei ainda tem presente, diante de seus olhos, o sangue do filho. Se pudesse com as suas próprias mãos nos esganava a todos, ora se não fazia isso?! – falava, com tom áspero, Nausítoo.

As vítimas estavam trancadas num cubículo. Tristeza e revolta povoavam as lembranças e as palavras. A possibilidade real de enfrentarem o monstro, além da confusão labiríntica e dos famosos corredores que não permitiam a saída ou fuga dos prisioneiros deixavam a perplexidade e o mal-estar no recinto. – A filha do rei também nos quer confundir e afrontar! Como pode prometer que nos libertará? Quem mais poderoso que Minos, tirano cruel, capaz das piores atrocidades, para cumprir quaisquer de suas resoluções malignas? Não estou certa de que a vingança seja pela morte do filho ou apenas porque deseja fazer sofrer, matar, mostrar-se senhor de todos! – falava Eribeia, com raiva. – Ariadne não prometeu, ela pediu ao pai por nós! – comentou Teseu. – Creio que mais por você do que por nós! – acrescentou Eribeia.

Teseu não respondeu, apenas olhou compreensivo para a companheira enciumada. – Seja por Teseu ou por nós, a princesa prometeu ajuda a todos! – explicou Menestes. – Veremos amanhã o resultado. Veremos o que somos perante o rei de Creta e se sua filha pode nos

valer para alguma coisa…! – desdenhava Eribeia, sem olhar para Teseu.

Ele, por sua vez, não discordava; considerava prudente continuar calado. Estavam confinados num cubículo imundo e quente, sem alimentação adequada e muito aflitos. Eles podiam falar o que quisessem enquanto ele pensava numa maneira de salvar os companheiros e a si próprio.

Teseu ouvia na escuridão os gemidos, suspiros e soluços involuntários. Cada qual queria sustentar a esperança, mas o golpe do desespero permeava sutilmente os ânimos.

De fato, Minos comunicou aos ministros no dia seguinte, às primeiras horas da manhã, sua irrevogável decisão.

Todos aqueles de Atenas deveriam ser encerrados no Labirinto e enfrentar o Minotauro. Aquele que escapasse retornaria à sua pátria!

Quando Ariadne soube, soltou um grito e partiu em busca do pai, que não a recebeu. Furiosa, foi ao encontro dos prisioneiros, chorando angustiada e batendo no próprio peito. Diante da porta de ferro, diante dos soldados de Minos, gritou: – Teseu! Teseu, venha falar comigo! – Por que insiste? Por que nos atormenta com suas

falsas promessas? Nosso mal já nos oprime tanto, por que não nos deixa em paz?! – respondeu Eribeia. – Teseu! Teseu! Fala comigo! – pedia Ariadne. – Vá embora, mulher! – gritou, impaciente, Nausítoo.

Então silenciaram-se. Um silêncio que parecia um mundo. A voz de Teseu se fez ouvir. – Ariadne, quer falar comigo? – Sim, quero; a sós, porque tenho novidades! – Mentirosa! Está contente com a nossa sorte e nos quer mal! – gritou Eribeia. – Eribeia! Vamos, Eribeia, não temos nada a perder em ouvi-la – aclamou Teseu. – Soldados, abram! Deixem-no passar por aqui! – ordenou a princesa.

Dois soldados conduziram Teseu perante Ariadne. Assim que o viu, ela o abraçou, feliz. – Meu querido, vou salvá-lo, pode confiar! – disse esperançosa.

Exigiu que os soldados a deixassem a sós com o prisioneiro, apesar da relutância dos homens. Eles se afastaram a um tiro de pedra, mas observavam-na. – O que tem a falar? O que é? – quis saber Teseu. – Repare em meu pedido, se você se livrar do Minotauro e do Labirinto, se isto ocorrer, você casa comigo e me leva para Atenas? – indagou a filha de Minos.

Teseu ficou surpreso com a proposta, não respondeu prontamente, e ela insistiu:

– Casa comigo e me leva a Atenas?

O jovem suspirou embaraçado, dizendo: – Sim, caso e você retorna comigo!

Alegre, abraçou-o com força. Então lhe passou um novelo rapidamente. – Toma, cuidado! Estão nos olhando! Não deixe que vejam, guarde isso consigo. Sei que é bravo e forte para matar o Minotauro, e o novelo vai fazer você entrar e sair do Labirinto! – Abraçou-o mais ainda e o beijou na boca.

Aturdido, Teseu não correspondia espontaneamente, mas gesticulava de um jeito mecânico. Ele escondeu o novelo. Queria ser salvo. – Desenrole o novelo a cada vez que adentrar mais e mais no Labirinto! Você entrará bem, matará com a sua força o monstro e retornará feliz na companhia de seus amigos! – falava Ariadne com voz segura, ainda abraçada a ele.

Teseu, então, compreendeu a circunstância. Seus olhos abriram-se felizes, pois o novelo o salvaria do Labirinto. Só assim beijou correspondente Ariadne; o beijo era o selo do acerto de contas.

Ariadne afastou-se, célere, mas olhava para trás, feliz e com lágrimas nos olhos, emocionada.

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