Expediente Texto: Isadora Tavares
Diagramação: Caio Magno
Revisão/Edição: Isadora Tavares Caio Magno
Projeto Gráfico: Isadora Tavares Fotografia de Capa: Julliane Souza
Fotografia: Isadora Tavares
Impressão Gráfica: Craft Comic Books
Orientação: Cíntia Siqueira
Ficha Catalográfica
Tavares, Isadora. Estudar Pra Quê?,2018, 82p. Orientadora: Cintia Siqueira Projeto Jornalismo Especializado I - Centro Universitário de Patos de Minas. Curso de Comunicação Social – Jornalismo, Patos de Minas, 2018. 1.Estudantes, 2.Livro-reportagem, 3.Educação. I Centro Universitário de Patos de Minas. Curso de comunicação Social – Jornalismo. II Estudar Pra Quê?
Para Caio, Joana e Analzira.
As palavras só têm sentido se nos ajudam a ver o mundo melhor. Rubem Alves
Sumário Prefácio ............................................................................................ 11 Capítulo 1 – Estudar é importante?................................................ 13 Numa tarde quente de domingo ..................................................... 15 Pássaros engaiolados .................................................................... 18 Fazendo a diferença ...................................................................... 20 Conversa rápida de cozinha........................................................... 22 Menino prodígio ............................................................................. 24 Capítulo 2 – Estudar é difícil?......................................................... 29 Guerreiro de Fé.............................................................................. 35 Na estrada ..................................................................................... 38 Bio = Vida ...................................................................................... 40 Um menino e uma menina ............................................................. 43 Capítulo 3 – Como superar os desafios?....................................... 49 Esperança...................................................................................... 51 Estamos juntos .............................................................................. 54 Transformação ............................................................................... 56 Capítulo 4 – Cheguei lá, e agora?................................................... 63 O olho de Thandera ....................................................................... 65 Arteira ............................................................................................ 68 Reitoria .......................................................................................... 71 Posfácio ........................................................................................... 77
Agradecimentos
A todas as minhas fontes pela gentileza e disponibilidade em me conceder entrevistas.
Prefácio Do que se trata esse livro-reportagem? Muita calma nessa hora leitor, vou lhe responder tudinho. Mas por enquanto, o que você precisa saber é o seguinte: este livro-reportagem vai fazer a diferença na sua vida. Como? Da seguinte maneira: estudo. É justamente por causa dessa palavrinha que estamos aqui. E se você consegue ler isso, provavelmente você já passou ou está passando por ela. Tem muita coisa sobre o estudo que as pessoas não costumam falar. Uma delas é: vai ser complicado. Outra é: você vai passar por dificuldades. Mas, a mais importante é: você não está sozinho. E para lhe ajudar nesta caminhada, você tem as histórias incríveis deste livro-reportagem. Me acompanhe e vamos conhecer um pouquinho de cada personagem.
Capítulo 1 Estudar é importante?
Numa tarde de domingo Pássaros engaiolados Fazendo a diferença Conversa rápida de cozinha Menino prodígio
Numa tarde quente de domingo Numa tarde quente de domingo, podemos encontrar uma senhorinha de cabelos brancos sentada no sofá. Ondina me esperava em sua casa com os cabelos ainda molhados do banho, fios brancos, longos e finos amarrados por duas presilhas. Ela me olhava entrar na casa, era uma casa vermelha, com a tinta desbotada já para um tom de rosa. Não tinha muro, somente uma grade também vermelha de mais ou menos 1,65m de altura. Do lado do número da casa tinha uma borboleta azul, borboleta essa que a “Tia Ondia” (apelido pelo qual ela gosta de ser chamada) fez questão que eu tirasse uma foto. Do outro lado havia uma placa com a imagem de um cachorro escrito: Cão Bravo. Mas o engraçado é que não havia nem sequer um sinal de animal por ali. Enfim, entrei. Ela me chamou para sentar. Era uma casa simples, dois sofás de couro antigo marrom avermelhados na sala. Ela estava no sofá de dois lugares e eu no de três lugares bem a sua frente. A direita havia uma estante, cheia de fotos antigas, presentes e lembrancinhas. Vamos começar a entrevista. Então me levanto e sento ao seu lado, ligo o gravador. É hora de saber mais! Afinal, quem é essa Ondina? Era o ano da Semana da Arte Moderna no Brasil, com ninguém mais ninguém menos que Anitta Malfatti, Oswald e Mário de Andrade, Heitor Villa-lobos, Victor Brechet e Tarsila do Amaral. A nível mundial, na Itália, Benito Mussolini era eleito 1° ministro, Niels Bohr ganhava o Nobel de física e voltando para a nossa pátria, no dia 15 de novembro de 1922, Artur Bernardes era eleito o 12° presidente do Brasil. E, dois dias depois deste acontecimento, nasce Ondina. Agora, em 2018 ela completa 96 anos de vida. 15
Ondina Cândida Meira nunca estudou, resultado disso: Não sabe ler nem escrever. — Não tive oportunidade porque não tinha professor, ‘nois’ morava na fazenda e não tinha professor nenhum, depois é que foi um professor pra lá, mas ficava longe e meu pai mais minha mãe não deixava a gente ir, porque de ‘primera’ era corrigir demais. Aí eu não aprendi. Uma senhorinha simpática e calma me falava isso, enquanto eu observava as suas marcas de expressão, que o tempo resolveu deixar de presente. As mãos, o rosto, os braços... tudo tão enrugadinho, um corpo cheio de histórias para contar. — Vontade eu tinha, mas eu não estudei. Nem aqui não tinha professor. Os ‘minino’ estudava lá no ‘Curralero’, mas era ‘pagado’ e caro. As ‘muié’ não estudou não. Só minha irmã que aprendeu depois de casada e eu aprendi só assinar o nome com o ‘cumpade’ Claudinho, mas hoje em dia eu não consigo mais, as vistas não deixam, fica tudo enfumaçado” Ondina se orgulha em dizer que com o pouquinho que aprendeu, ela pode dar seu voto em todas as eleições, só não participou das eleições deste ano de 2018 porque segundo ela, as pernas não deixaram. — De primeira era difícil, porque a gente tinha que escrever, agora a gente só bate ‘tic e tac’ e pronto. Ela acha graça em contar como eram as eleições daquela época, em meados do século 40 e 50. O mais incrível de toda a nossa conversa é ver como uma senhora de quase 100 anos que não teve a oportunidade de estudar, dá um valor tão grande ao estudo. — O estudo é muito importante, ‘pruque’ deixa a pessoa mais ativo, sabe as coisas. Todo mundo tinha que ter a oportunidade de estudar, porque assim não sofria tanto. Se fosse hoje e eu tivesse menos uns 15 anos eu estudava. 16
Além disso, ver a felicidade estampada em seu rosto ao saber que seus filhos, netos e sobrinhos estão estudando, não tem preço. Ela sorria e tocava minha perna dizendo: — Fico muito feliz de eles estudar e aprender e viver uma vida com mais maravilhas. Eu não tive isso, mas desejo muito pra eles. Fim de conversa. Desligo o gravador com uma sensação boa no peito, com esperança na mente por causa dessa senhora que mais do que me dar uma entrevista, me deu uma lição para a vida. Sua sobrinha Edna que estava cuidando dela se levanta e pega algumas fotos da estante que Ondina pediu. Tem uma foto dela com um casaco bege em um casamento. Ondina estava abraçada com a noiva e por atrás, o noivo as abraçava, um momento tão especial para mim e para ela. Para mim, por poder estar ali e partilhar das histórias de sua vida, e para ela, por ser uma das poucas fotos em que ela aparece. Uma revelação que me deixou ainda mais orgulhosa por ela ter deixado eu tirar uma foto sua. Ao final do capítulo tem uma foto de uma senhorinha sentada no sofá numa tarde de domingo.
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Pássaros engaiolados Ao falar sobre estudo, educação e o quanto estas duas palavrinhas são importantes e andam juntas, sinto-me na obrigação de pegar emprestadas algumas palavras do mestre Rubem Alves. “Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em voo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.” Estas palavras me lembraram muito o que um menino de 14 anos me disse em uma entrevista: — “Nóis” fica dentro duma sala preso, parecendo uma jaula, cheio de cabeças na sua frente e não dá nem para prestar atenção. Acho que o Matheus Vinícius se sente como um pássaro engaiolado em sua escola. E não é que ele não ame o voo, é que as gaiolas o impedem de aprender a arte do voo. Ele me conta que se sua sala fosse menos tumultuada e abafada, com menos pessoas, ou ao ar livre, ele iria gostar mais.
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— Os ventiladores fazem muito barulho. Ia achar bem melhor se fosse ao ar livre, porque eu ia prestar atenção e ia estar no ar puro. Achei interessante ele dizer isso, porque no começo de nossa entrevista ele já havia dito logo de cara que não gostava de estudar. O que Matheus não sabia, é que ele gostava sim de estudar, o que ele não suportava era se sentir como o passarinho engaiolado citado muitas vezes por Rubem Alves em seus textos. Matheus é um menino alto para sua idade, cor de indígena e olhinhos pequenos, cabelos pretos jogados na testa. Ele adorou me contar que seu maior sonho era ter um Opala e ser mecânico. Este desejo surgiu segundo ele, desde que seu tio comprou um carro desse, daí em diante ele começou a se interessar por carros, motos, caminhões e tudo que esse universo envolve. Um dia ele descobrirá a beleza do estudo e se apaixonará por ele. Até lá, Matheus continuará achando dever de casa chato, talvez se as nossas escolas fossem menos parecidas com gaiolas, este dia chegaria mais rápido para ele conseguir realizar seus sonhos.
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Fazendo a diferença Ainda falando sobre escolas, certo dia entrevistei uma professora chamada Jéssica. Para ser mais exata, Jéssica Mota. Ela tem 27 anos e é formada em Pedagogia, dá aulas para crianças de 4 a 10 anos de idade. Jéssica tem uma estatura média, é branca, tem cabelos castanhos com mechas loiras. Na maioria das vezes ela aparece alegre, sorridente e desinibida. Ela conta que sempre gostou de estudar, desde pequenina. — Sempre gostei, eu tinha incentivo, mas não era aquela coisa de que meu pai ou minha mãe fosse de dentro da área da escola, eles só apoiavam, mas o gostar partiu de mim mesma. Eu gostava de apresentação, de fazer teatro, ler livros... Eu percebo que ela fica feliz em lembrar da sua época de estudante. Estamos na sala da casa do avô de Jéssica, há vários familiares dela ali conversando alto, além de suas duas filhas (uma de 4 e outra de 2 anos) toda hora chegarem nela para pedir algo. Mas mesmo assim ela não se abate e dá a maior atenção para a entrevista. Ela diz que no 1° ano do ensino fundamental ganhou a premiação do aluno que mais leu livros durante o ano. Jéssica se destacou dos demais alunos porque leu 680 livros. Lembrem-se que ela provavelmente tinha somente uns 7 anos de idade, e mesmo assim, leu mais livros do que a maioria dos brasileiros jamais lerá em toda sua vida. Estamos sentadas em duas cadeiras de madeira, são pesadas e antigas, chegamos bem perto da sacada para não pegar tanto o som do pessoal lá dentro. Jéssica está adorando dar entrevista, e ela fala bem! Afinal, ela confessou que se não fosse professora, seria atriz ou jornalista. Só não seguiu essas 20
duas carreiras porque na época em que se formou, não havia estes cursos na cidade. Foi uma longa conversa, onde batemos um papo sobre dificuldades e importâncias. Sobre as dificuldades que ela passou, vocês saberão no próximo capítulo, e sobre a importância, ela me disse uma frase que me deixou impactada: — A escola, às vezes, é o único diferencial que os alunos têm. A única oportunidade. Em casa eles não têm o contato com o livro que tem na escola, as vezes a televisão que a gente passo o filme, eles também não têm isso em casa. Então, qualquer tipo de aula lúdica diferente que você leva chama a atenção deles e desperta interesse. A escola é fundamental porque, para aquele aluno, naquelas 4 horas de prazo, você está fazendo a diferença. Com isso, o que podemos retirar dessa história com a professora Jéssica é o seguinte: Não basta ser professor, é preciso fazer a diferença. E não basta só fazer a diferença, é importante levar aos estudantes o valor do estudo, pois às vezes, isso é tudo que eles têm.
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Conversa rápida de cozinha Que o estudo é fundamental nós já não temos dúvidas. Mas, e quando você precisa desesperadamente dele? O que fazer? A importância é bem maior. Esse é o drama da Kauany Soares. Ela tem 18 anos, está terminando o ensino médio e se preparando para fazer o tão assustador ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) e o vestibular. Kauany é uma menina bonita, pele bem clara, com algumas sardinhas no rosto. Tem os cabelos castanhos escuros longos e cílios bem grandes. Ela diz que sempre gostou de estudar, mas que tem sentido um pouco de pressão agora. Um dos motivos que ela cita é a imaturidade que os alunos do ensino fundamental chegam para o ensino médio. — Você não tem consciência de que precisa aprender aquilo, porque quando chegar no seu terceiro ano, você vai prestar vestibular e vai precisar daquelas matérias. Estamos na cozinha de sua casa, ela se sente confortável ao conversar comigo. Os pais de Kauany sempre entenderam o valor do estudo para o futuro, por isso exigem notas altas da mocinha. — Minha mãe me incentiva muito a estudar, às vezes eu não tenho que fazer algo da casa para estudar. Nós tivemos uma conversa breve, mas é gratificante ver que uma jovem de 18 anos se preparou tanto para sua vida acadêmica. E fechamos nossa entrevista com uma frase linda dita por Kauany. — O estudo é a base de tudo. A gente precisa passar por esse processo. E eu não acho que o estudo é só uma coisa para 22
você passar no vestibular, o tempo que você passa na escola, vai formando a pessoa que você vai ser no futuro.
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Menino prodígio Ele é um menino lindo! Olhos verdes, pele clarinha, cabelos castanhos desarrumados. Rafael tem 7 anos de idade e está na 1ª série. Ele é a primeira, de uma série de 3 crianças desta mesma idade que entrevistei para compor este livro-reportagem. Eram 2 horas da tarde de uma terça-feira. Chego à escola, subo as escadas cercadas por tijolinhos marrons (tão típicos no ambiente escolar), e me deparo com a sala. Vinte e seis criancinhas de olhos atentos em mim. Rafael era o primeiro da 2ª fila próxima a porta. A professora me apresenta os alunos, logo entro e me sento na última carteira da sala, de lá posso observar todos. Rafael me chama atenção logo de cara, ele é muito inteligente, respondia tudo que a professora perguntava e se irritava quando algum coleguinha respondia errado. Mas tinha um detalhe: Rafael não se aquietava. Toda hora virava para um lado, para o outro e conversava com um colega. Eu tive a sorte de visitar a escola bem no dia da troca de livros. Sabe, esse momento é ímpar! É nele que percebemos quem gosta de ler ou não, quem só quer dar uma volta pela escola, e quem não tem interesse algum. Rafael estava todo ansioso para pegar um novo livro. Enfim ele desce. Depois de alguns minutinhos Rafael e seus olhinhos verdes estão de volta. O observo juntamente as outras crianças até o final da aula, para poder então conversar. Rafael me surpreende logo na primeira resposta, quando o pergunto porque ele gosta de estudar. — Porque a escola tem muita importância para o nosso futuro... se alguém quer alcançar algum desejo, por exemplo, se eu quiser ser bombeiro, eu tenho que estudar, estudar até chegar na minha profissão. 24
Imaginem a minha reação ao ouvir um menino de 7 anos falar algo assim. É felicidade sem tamanho! Ao longo da entrevista, descobri que Rafael mora com os pais e tem uma irmã. Descobri também, como ele faz questão em dizer, que sonha em ser bombeiro. — Eu quero ser bombeiro porque eu gosto de salvar vidas. Conversando sobre rotinas escolares, pergunto a Rafael sobre seus pais, ele diz que seus pais sempre o levam na escola, porém seus deveres são ensinados por uma monitora do amparo maternal (instituição da prefeitura municipal que auxilia as crianças, caso não houver um responsável para olha-las), onde ele fica antes da escola. E o que podemos retirar sobre a importância de estudar com essa pequena história de Rafael? Tudo! Uma criança de 7 anos já percebe que terá que superar inúmeras dificuldades, mas o principal é que ele tem a noção, que é com o estudo, que ele vai conquistar seu futuro.
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Capítulo 2 Estudar é difícil?
Acontecimento inesperado Guerreiro de Fé Na estrada Bio = Vida Um menino e uma menina
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Folha colorida
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Acontecimento inesperado Bem-vindos ao segundo capítulo deste livro-reportagem. Bem, nós já aprendemos que o estudo é importante e conhecemos alguns personagens especiais. Um deles é a professora Jéssica. Mas, vejamos o que será que aconteceu para Jéssica se tornar professora? Será que foi difícil? É exatamente isso que vamos descobrir agora! Foi o ano mais quente da história até onde se tem registro. Atentados eram promovidos pelo Estado Islâmico à França, mais especificamente ao jornal Charlie Hebdo. O desastre em Mariana manchava o Rio Doce aqui no Brasil, e ainda, justamente no ano de 2015 em que os estudantes defendiam suas escolas da reorganização no ensino proposta pelo governador do estado de São Paulo, que Jéssica se formava em pedagogia pela Universidade de Santo Amaro. — O curso é puxado, porque você tem que estudar sozinha, tem o tutor, mas você não tem aquela aula prática com um professor de cada matéria. Jéssica estudou à distância. O curso durou 3 anos, e nesse tempo ela conta que passou por muitas dificuldades. Ficava estressada com algumas matérias, mas sempre dava um jeitinho. — Eu largava as coisas e depois voltava. Eu tinha o prazo pra entregar a tarefa, mas quando eu via que não estava dando certo, eu dava um tempinho. Além desses contratempos, aconteceu algo que Jéssica não esperava. Uma gravidez no meio do seu curso! Como ela própria diz “dificuldades aparecem no meio do caminho”.
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— Antes eu conseguia fazer tudo direito sem ter filho. E enquanto eu estava grávida foi tranquilo, mas quando ela nasceu foi mais difícil, porque tinha a data das atividades para entregar, e o filho toma muito o seu tempo. Eu só tinha o período que ela estava dormindo, e as vezes o meu cansaço não deixava que eu fizesse as atividades, e ia prolongando, entregando sempre no limite. Mas nunca deixei de entregar. Além de estudar, Jéssica também fazia estágio, começou ainda no 1° período do curso. Segundo ela, “filho atrapalha sim, deixa as coisas mais difíceis”. Tanto é que ela diz que o final da faculdade não foi tão dedicado quanto o início. Mas Mikaela (o nome de sua filha mais velha) nunca foi um peso, pelo contrário, sempre foi motivo de felicidade. O que podemos perceber com esse relato, é que não é que seja ruim ter um filho enquanto se está estudando, mas é preciso ter noção que as dificuldades podem dobrar ou até triplicar às vezes. Jéssica tem uma tatuagem nas costas em homenagem as suas filhas. São duas borboletas azuis. Cada uma com o nome das meninas. Debaixo da borboleta maior está escrito Mikaela e por baixo da menor, Manuela. Jéssica trabalha em duas escolas diferentes, uma particular e outra pública. Ela percebe que a diferença de aprendizado dos alunos de uma escola para a outra muda completamente. —Muita coisa influencia, mas as principais são as condições sociais e a estrutura familiar da criança. Os alunos de escola pública, principalmente as de bairro, são muito criativos, tem muito interesse, porém, por exemplo, um projeto que eu desenvolvo em escola particular e pública simultaneamente, tem resultados diferentes. 32
Ela me conta especificamente de um projeto que realizou, a “maleta literária”. Esta maleta ia para casa com as crianças e as mães vinham apresentá-la em sala de aula juntamente com o filho. Seja uma peça de teatro ou algo parecido. Na escola particular onde Jéssica dá aulas, somente 2 de 22 alunos não apresentaram o trabalho. E já na escola pública, o projeto funciona parecido com este, porém com fábulas. Quando vão apresentar, os alunos também podem ter a ajuda da família. Fico impressionada em saber que de 10 alunos que faltavam para apresentar o trabalho, somente 1 mãe compareceu para ajudar. —Eles têm vontade, eles demostram isso, falam: ‘agora sou eu, é a minha vez’, mas no dia de apresentar não tem ninguém lá para apoiar. Fico intrigada com esse resultado e pergunto a ela porque isso acontece. Jéssica diz que os professores e diretores sempre falam que é importante a presença família-escola, mas não adianta. —Eles não conseguem entender o verdadeiro sentido que isso têm, e a diferença que faz na vida da criança que tem um apoio familiar e da criança que não tem. Ainda curiosa sobre o assunto, imagino se por acaso estes próprios pais que negligenciam seus filhos, não foram negligenciados quando estudantes. Jéssica diz que pode ser que sim. —A condição dos pais, é a que os filhos vivem. A gente que é professor não consegue sozinho, a gente tem vontade de ajudar, a escola faz a sua parte, só que não conseguimos sozinhos.
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Mas Jéssica ainda ressalta que a escola serve de apoio para estas crianças que não tem acompanhamento dos pais. A escola tem acesso ao Conselho Tutelar e Psicólogos. —A escola pública que trabalho é plano piloto de projetos. Então lá eles têm comunicação com o Conselho Tutelar. Qualquer tipo de queixa da criança (que ele própria queixe, porque não podemos investigar a fundo) já é encaminhada para o psicólogo. Também, caso a criança falte mais de 5 vezes consecutivas, o Conselho Tutelar vai na casa da família para ver o que está acontecendo. Essa parte da escola é importante, é o que podemos fazer dentro dos nossos limites. Assim, vemos que por mais que o estado não viabilize as escolas públicas, elas ainda prestam o seu papel social. Porém, sem a parceria dos Pais, não há muito mais o que ser feio.
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Guerreiro de Fé Sabe aquela frase que as pessoas falam: “Enfrentar nossas dificuldades de frente”? Então, foi exatamente isso que Manoel Gonçalves fez. Mas espera aí, você deve estar se perguntando...quem é esse? Manoel é um rapaz simpático. Estatura média para alta, negro, cabelo enroladinho e um sorriso aberto. Ele tem 21 anos e veio diretamente de Paracatu-MG para estudar Jornalismo em Patos de Minas. O detalhe é que Manoel não é “bom no português”, como ele ressalta. Mas resolveu escolher o curso com o objetivo de se desafiar. Para entendermos essa história melhor, vamos ir ao início de tudo. Em uma cidadezinha no Noroeste de Minas, com pouco mais de 90 mil habitantes, morava Manoel. Ele estudou todo o ensino fundamental e médio na cidade. Segundo ele, sempre gostou de aprender. —Eu sempre amei estudar, ler livros, conhecer as coisas. Só que eu sempre tive a limitação. Fui deixado como a pessoa que não tinha capacidade...sempre tive dificuldade. Acontece que Manoel tem Dislexia. Um distúrbio que dificulta a leitura, a fala e a escrita. Ele conta que quando estava na 2ª série do ensino fundamental, sua mãe foi chamada pelos professores e alertada de que havia grandes chances de Manoel ser dislexo. A partir daí o cuidado com sua aprendizagem teve que ser redobrado. —Eu sempre tive uma pessoa do meu lado me auxiliando. Às vezes eu estudava na escola e não entendia. Mas eu tinha professor em particular, que eram meus primos, porque eram inteligentes. 35
E, a partir disso, Manoel resolveu se revelar um verdadeiro guerreiro, como Davi, mas não lutando com o gigante Golias, e sim com palavras e letras. Ao terminar o 3º ano do ensino médio, Manoel fez vestibular para Jornalismo e passou. O desafio agora viria a ser se mudar. —Eu vim para Patos de Minas sozinho, não tinha família aqui. Eu só conhecia um Pastor em distância, porque eu trabalhava na igreja Casa da benção, e ela tinha a liderança em Patos de Minas. Eu conhecia o Pastor só de reuniões. Manoel precisava de um lugar para ficar. Foi então que ele se lembrou do Pastor e resolveu pedir esse favor a ele, que aceitou de prontidão. Hoje Manoel mora em uma casa nos fundos da igreja do Pastor em Patos de Minas. Além da dislexia e distância da família, Manoel também tem outra dificuldade: trabalhar para conseguir pagar a faculdade. —Eu abria a igreja e ali eu trabalhava até meio dia. De tarde eu ia trabalhar na Cemil (Indústria do ramo alimentício de Patos de Minas). Então eu pegava ônibus e às vezes não tinha tempo de almoçar, comprava alguma coisa na rua, entrava dentro do ônibus e comia. Saía da Cemil 5 horas da tarde e chegava no centro às 18 horas. Descia, trocava de camiseta e subia, porque 18:50 tinha que estar na faculdade. A rotina de Manoel era puxada, mas não parava por aí. Ele conta que de 18:50h, ficava na faculdade até às 10 horas da noite. Então ia embora, gastava 20 minutos para chegar em sua casa, mais 1 hora para fazer o jantar, 1 hora para fazer tarefas de casa, e às vezes, ainda estudava depois. Assim, ele dorme em média às uma hora da madrugada todos os dias. E no fim de semana, as coisas não eram das mais tranquilas. 36
—No fim de semana eu acordava mais tarde, umas nove horas ou dez, tomava um banho, arrumava e ia para o outro serviço no restaurante. Quinze horas eu voltava, quatro horas da tarde eu chegava em casa, tomava um banho e subia para a igreja onde eu trabalho... depois, chegava em casa por volta de 22:30, porque era eu quem fechava a igreja. E, mesmo com tantos desafios, Manoel não se abala. Percebo que ele fica feliz em dizer que será o primeiro membro da família a pegar um diploma do ensino superior. É isso Manoel, eu acredito que, assim como eu, a sua família que você tanto ama, também está orgulhosa de você. Nos encontraremos em 2020 para pegar o nosso tão sonhado diploma de Jornalismo.
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Na estrada Renato é um homem encorpado, pardo, com cerca de 1,68m de altura. Ele é caminhoneiro há mais de 10 anos. Renato estudou até o 3º ano do ensino médio, porém não concluiu. Segundo ele, não gostava muito de escola e decidiu largá-la para acompanhar seus irmãos. —Eu via meus irmãos viajando de caminhão e ficava com vontade de ir, igual minha filha chora para viajar hoje comigo, aí eu fui. Abandonar a escola para realizar um sonho. Foram esses o pensamento e a ação de Renato. Mas será que valeu a pena? Pergunto a ele se por acaso ele não tem vontade de voltar a estudar, ou mudar de profissão para ficar mais próximo da família, já que caminhoneiros normalmente passam bastante tempo viajando. Ele me diz que até tinha vontade, mas não têm animo para isso como antigamente. —Eu até tenho vontade de voltar, mas acho que a faculdade não é tudo, por exemplo, às vezes alguém forma e nem consegue emprego. Renato fica um pouco tímido ou desconcertado com a entrevista. Estamos sentados um do lado do outro, na casa do avô de sua esposa. Percebo que às vezes, em um relapso, Renato se joga em seus pensamentos. O que será que se passa por aquela mente? Sonhos perdidos? Isso nós nunca saberemos, pois, cada ser guarda uma imensidão de segredos em si. Como dizia o filósofo Sócrates: “O maior de todos os mistérios é o homem”. 38
Apesar de não gostar de estudar, Renato acredita na importância desta ação. Ele tem duas filhas lindas, uma loira e a outra com cabelos castanhos. Ambas têm idade inferior a 5 anos. São essas duas menininhas que alimentam a esperança de Renato. —Eu espero que as meninas façam o que elas gostam, estudem na área que gostem. Agora, depois de saberem um pouquinho da história desta nova personagem, talvez vocês se perguntem: Mas o que isso tem a ver com dificuldades? Bem, Renato abandonou a escola porque não conseguiu passar de ano e também porque queria realizar seu sonho. Toda vez que você escolhe algo, você tem que abrir mão de outra coisa. E seja qual for o caminho escolhido, vai ser difícil. Renato não encontrou dificuldades no estudo, mas sim por ignorar ele. Foram anos na estrada, que ele pegou pedra por pedra de seu caminho para construir sua nova direção. E nesta, encontra-se uma família linda, que se depender dele, continuará estudando para crescer e não passar tantas dificuldades quanto ele passou.
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Bio = Vida Imagine morar a vida toda em um povoado, e depois vir fazer faculdade na cidade. Imaginou? Pois bem, essa é a história de Fernando. Fernando Carlos tem 20 anos e cursa Ciências Biológicas. Ele está no 4º período. Conheci Fernando por acaso. Acaso não, por causa de um gafanhoto para ser mais verdadeira. Mas isso é história para outra hora, vamos voltar ao que interessa aqui, as dificuldades de Fernando. São 17:00 horas e estou sentada em uma cadeira na casa de Fernando. É uma casa simples. Sala, cozinha, 2 quartos e um banheiro. Quando solicitei a entrevista a ele, Fernando ficou um pouco receoso, mas acabou cedendo no final. Ele é um jovem de estatura média, usa óculos, tem pele branca, cabelos castanhos e sempre está alegre e sorridente. Ao chegar em sua casa, o encontro sentando em uma cadeira apoiado na mesa, com roupas de “ficar em casa” (estilo típico dos mineiros). Passada a primeira impressão da minha fonte e do local, ligo o gravador e começamos a nossa conversa. Como de praxe, o pergunto se ele gosta de estudar. Fernando me diz que sim. —Sim, mas a dificuldade é a leitura. Ficar lendo me dá sono. Vejamos que, com uma única pergunta, já descubro a primeira dificuldade de Fernando em relação ao estudo: a leitura. Fernando quer licenciatura e bacharel em biologia. Ele é apaixonado por alguns animais específicos: os pássaros. Ele me diz que pretende se especializar nesta carreira. 40
— Quero me especializar em Ornitologia, que é o estudo das aves, uma área muito bacana, precisa de um pouquinho de leitura porque tem que conhecer todos os nomes, mas esse tipo de leitura me agrada bastante. Mas, voltando um pouquinho no tempo, para Fernando conseguir chegar ao patamar de planejar seu futuro na biologia, muita “água passou por debaixo da ponte”, como nosso povo costuma dizer quando muita coisa já aconteceu até hoje. Fernando me conta que, antes de ir morar no povoado de Firmes, (localidade próxima a Patos de Minas) ele morou na fazenda. — O mais difícil era esperar o transporte, porque o meu transporte carregava para mais um outro local e aí a gente sempre era os últimos a ir embora, ficava mais uma hora na escola. Faço uma pausa ao escrever a história de Fernando. Uma manhã de sábado. Choveu a noite toda, até o momento. Olho pela janela e o vento nas árvores me chama a atenção. As folhas dançam, balançam, e eu quase consigo escutar a melodia de agradecimento das árvores pela chuva. Volto para o papel. Isso mesmo, com um lápis em uma folha de papel amarela, conto a história de Fernando para o mundo. Então, nada mais justo do que voltarmos para ela. Parece que, as dificuldades são dobradas para quem mora na fazenda. Mas Fernando lidava bem com isso. Segundo ele, está mais difícil agora, do que naquela época. — Agora tenho que aprofundar mais ainda no estudo, antes era algo supérfluo. Mas como será que Fernando lida com suas dificuldades? Ele me relata que sua família sempre o apoia, além de também se consultar com um psicólogo uma vez por semana. 41
— A terapia ajuda a colocar metas, o que vou fazer durante o dia, pra não ficar um dia muito cansativo. Às vezes escuto música para ficar mais calmo também. Acho interessante a história de vida de Fernando. Veio da fazenda, de um povoado onde as coisas acontecem devagar e chegou à faculdade com a bagagem de mil sonhos, superando até hoje as suas dificuldades.
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Um menino e uma menina Neste capítulo, vamos conhecer mais duas crianças da escola pública em que mencionei visitar no primeiro. Desta vez vamos falar de Clara Cristina, uma menina de pele morena, cabelos amarrados em um coque, olhos castanhos escuros. E de Lucas Antônio, um menino de pele esfumaçada linda, cabelos enroladinhos cortados bem curtinhos e olhos castanhos como os de Clara. Ambos têm sete anos e são colegas de Rafael, criança que vocês já conheceram a história também. Mas, porque falar destas duas novas crianças logo agora em um capítulo sobre dificuldades? Bem, o motivo é que, apesar de não terem nem uma década de vida ainda, estes meninos já passam por dificuldades. Veja bem, observando todos os alunos, dei uma atenção especial a Clara. Ela se senta em uma das últimas carteiras da primeira fila perto da porta. Percebi que Clara tinha uma certa dificuldade com as continhas que a professora estava passando no quadro. Ela olhava para o “quadro negro” e para o caderno, com a expressão de quem tentava entender algo. Clara parece ser tímida, apesar de conversar bastante com os coleguinhas. Quando fomos para a entrevista, percebi Clara um pouco vergonhosa, mexia para um lado e para o outro na cadeira logo ao meu lado. Clara não conversou muito comigo, mas, quando a interroguei sobre estudar, foi isso que ela disse: — Eu gosto, por causa que não pode faltar se não vai tomar bomba. Essa mesma menininha que me falou isso, disse também que o seu sonho era ser médica. Clara ainda não sabe, mas terá de estudar muito para isso, mesmo com a nossa pequena 43
conversa, descobri que ela mora com os tios. Segundo ela, as vezes eles participam de sua vida escolar. — Eles me trazem todo dia na escola, mas eu faço dever sozinha. Clara não está inserida em uma família tradicional com pai e mãe, e tem dificuldade de aprendizagem na escola, mas mesmo assim continua com seus sonhos intactos. O que podemos retirar de Clara é o seguinte: mesmo em meio as adversidades, continue firme nos seus sonhos. Ou podemos também exemplificar com essa frase dita por Alvo Dumbledore, personagem da nossa querida J. K. Rowling: “A felicidade pode ser encontrada mesmo nas horas mais difíceis, se você lembrar de acender a luz.” Agora, vamos voltar ao nosso 2º personagem: Lucas Antônio. Esse menino parece ser uma criança adorável, mas, que assim como Clara, demonstrava uma certa dificuldade para aprender, Lucas mesmo falou que não tinha afinidade com os números. — Não gosto de matemática porque é difícil. Lucas olhava para mim, para o chão, para o teto, para as outras crianças que passavam e tudo mais que lhe desviasse a atenção. Mas, e além da aprendizagem, qual é a dificuldade de Lucas? Bem, ao conversarmos, perguntei a ele se almoçava antes de vir para a escola. Ele disse que não. Vejamos, uma criança que estuda das 13 às 17 horas não almoça antes de ir para a escola, onde o lanche será servido somente as 15:30h. Nós, meros mortais, mesmo que bem alimentados, ainda temos dificuldades para estudar. Agora, imaginem essa criança. 44
Sobre família, Lucas disse que mora com sua mãe. E em relação ao “o que quer ser quando crescer” ele fica feliz em me dizer que deseja ser policial “para prender bandido”, segundo ele. E mais uma vez conseguimos retirar ensinamentos de uma pequena e rápida história.
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FOTO JESSICA
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Capítulo 3 Como superar os desafios?
Esperança Estamos juntos Transformação
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Folha colorida
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Esperança Larissa Nithielle. Esse é o nome da nossa primeira personagem deste capítulo. Atualmente loira, baixa e ‘miudinha’. É uma menina bonita. Larissa está prestes a completar 20 anos. Ela mora em um dos bairros considerados perigosos da cidade. Tem 5 irmãs e vive com sua mãe e as gêmeas caçulas. A razão desta garota estar aqui é a seguinte: Larissa ainda não conseguiu cursar uma faculdade. Ela terminou o ensino médio em 2016 e desde então têm tentado ao seu máximo entrar para a faculdade. Seu sonho é fazer psicologia. Larissa já fez o ENEM (considerado porta de entrada para a maioria das universidades brasileiras), cinco vezes. Se bem que as duas primeiras vezes foram só para teste, enquanto ela estava no ensino médio, mas as últimas três foram valendo. Larissa não conseguiu passar em nenhuma bolsa para o curso que deseja quando tinha 18 e 19 anos. Agora, desta última tentativa, ela espera que tudo dê certo, para que em 2019 possa seguir sua carreira rumo a se tornar uma psicóloga. — Fiz ENEM esse ano, espero que eu consiga passar. Estou sentada no sofá da casa de Larissa. Ele é de um tom azul no tecido Suede. O sofá estava frio, pois chovia há dias na cidade, e assim, a maioria dos móveis das casas pegam umidade. Larissa estava inquieta ao falar comigo, ficou mexendo com um pente quase o tempo todo. Mas, em alguns momentos ela para e se volta a mim. Apesar de não ter saído como esperava nas provas, Larissa diz que sempre gostou de estudar, mas em algumas matérias tinha dificuldades. 51
— Quando sabe as coisas é legal estudar, quando você entende a matéria dá vontade de fazer os exercícios. Quando era uma aula que a gente não entendia era chato. Em contrapartida, eu percebo que ela fica radiante ao me dizer que adorava quando sabia resolver as contas de matemática, segundo ela “eu ficava feliz, dava até gosto de resolver”. Larissa até chegou a entrar na faculdade. Ela passou no vestibular da instituição e conseguiu emprestado o valor para pagar a matrícula. Assim, Larissa ficou 1 mês na faculdade de psicologia. — Foi bem legal, eu vi que era o que eu queria. Mas, ao chegar o momento de pagar a primeira mensalidade, Larissa viu seus sonhos irem por água abaixo. Ela não tinha condições de quitar a mensalidade, e ainda se via impossibilitada de pegar mais dinheiro emprestado. Bem, essa normalmente é a sina de quem não tem condições para pagar uma mensalidade em faculdade particular, e como ainda não conseguiu ganhar uma bolsa, Larissa se viu novamente colocando seus sonhos em espera. A melhor parte ao conversar com Larissa é perceber que ela não desiste apesar de todas as inconveniências que passou. Ela acredita firmemente em seu futuro e diz que conseguirá alcançá-los. No final de nossa entrevista, Larissa falou algo que me tocou bastante. — Quando eu fiz faculdade tinha tanta gente de diferentes idades, tinha uma moça que era técnica de enfermagem que estava fazendo também, tinha uma senhora. Vi que tanta gente mais velha fazia faculdade, então fiquei tranquila. 52
O detalhe é que, em nossa cidade, que é no interior do estado, há uma pressão muito grande para que ao saírem do ensino médio, os estudantes já entrem na faculdade, para “não perder tempo”, como costumam dizer. Seja por pressão dos pais, da escola, ou da família, os estudantes se sentem obrigados a cursar algo, mesmo que não seja o que querem verdadeiramente para o futuro. Mas, cada indivíduo tem seu próprio tempo. Alguns chegam ao sucesso aos 20 anos e morrem as 50. Outros chegam lá aos 50 e morrem aos 100. Então, como Larissa percebeu, não há idade para fazer o que se ama, o importante é não desistir, e é justamente isso que encontramos como superação das dificuldades, a esperança.
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Estamos juntos Nesta história vamos falar da mãe de uma personagem que apareceu no nosso segundo capítulo: O Fernando. Aquele garoto que saiu do povoado e veio para Patos de Minas cursar biologia. Sua mãe se chama Conceição Barbosa. Ela tem 54 anos e ainda mora no povoado de Firmes. Conceição estudou somente até a 4ª série, mas diz que gosta muito do estudo. — Tem dia que eu ainda sonho que estou em uma sala de aula, meu sonha era estudar. Quando eu pedi ao Fernando que perguntasse a sua mãe se ela gostaria de me conceder uma entrevista, ele de prontidão me disse que sua mãe provavelmente não iria querer. Mas ao chegar em sua casa, Conceição me recebeu com muito carinho. Sentou-se em uma cadeira de fios com um tapete em cima e ficou me observando com um sorriso no rosto. Eu percebo que Conceição gosta de conversar comigo. Ela tem a pele clara, usa óculos e tem os cabelos pretos. Segundo ela, sempre apoiou Fernando em sua rotina de estudos. — Eu sempre apoiava ele muito, porque se estudar vai ter um emprego melhor, não vai passar por tanta dificuldade igual a gente tem passado. Conceição tem mais uma filha além de Fernando. Conceição sempre se sacrificou por eles, pois sabia que eles teriam mais oportunidade do que ela. — O sonho da gente passa pra eles, a gente tem vontade que eles sejam uma coisa que a gente não foi. A questiono se ela já percebeu Fernando passando por alguma dificuldade em relação aos estudos. Ela diz que sim e se relembra de quando ele chegava estressado em casa por causa 54
de alguma matéria, ou quando ficava o dia todo em casa para conseguir cumprir as tarefas propostas. Além disso, ela também comenta sobre as dificuldades em que Fernando passou quando morava no povoado, e que ela ficava preocupada com ele. Mas ela fica feliz em contar que essa época passou e agora são outros desafios a percorrer. — A gente sempre vai apoiar ele. E agora? Porque escolhi esta história para se encaixar em superar desafios? Pelo seguinte detalhe: O apoio. Esse foi o diferencial tão grande para que tanto Fernando quanto a própria Conceição conseguissem superar as dificuldades, eles sempre tiveram um ao outro. A presença dos pais é indispensável no ambiente escolar, como já vimos com a história da professora Jéssica e ainda veremos na história a seguir. Parabéns Conceição por participar e apoiar seu filho no estudo. Superar as dificuldades também é ter apoio!
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Transformação Agora vamos falar de superar dificuldades com um profissional. Victor Silva é psicólogo, especializado em atender crianças e adolescentes em escolas. Recebi uma indicação de Victor a partir de outro psicólogo, que me disse que ele seria a pessoa perfeita para uma entrevista, e foi. Victor não é muito alto, tem a pele clara, a barba por fazer e usa óculos. Ele é calmo como a maioria dos psicólogos, tem a conversa em um tom perfeito de se ouvir, não muito alto, nem baixo. Sempre admirei esse talento dos psicólogos, nos transmitem uma tranquilidade maravilhosa. E a nossa entrevista não foi diferente! Com muita delicadeza conversamos bastante, e descobri e aprendi coisas fantásticas com ele, que farei questão de mostrar aqui. — O conhecimento serve para um certo tipo de transformação, tanto no âmbito social quanto no âmbito pessoal. Essa é a primeira fala de Victor em nossa entrevista. Acho interessante seu posicionamento por causa de sua explicação. Segundo ele, na época de escola, ele tinha a sensação de estar sendo treinado, cujo objetivo era somente passar em um vestibular. E ainda, ele ressalta que só aprendeu esse valor do estudo quando já estava na faculdade. — O conhecimento não tinha função de transformação, de reflexão, de subversão da sua vida. O conhecimento tinha uma função técnica, simples, que era passar em uma prova. O conhecimento pra mim hoje é mais do que passar uma fórmula, é uma possibilidade de você construir uma postura crítica. Era uma tarde quente, quando nos encontramos na biblioteca de uma instituição de ensino da cidade. Após alguns 56
minutos de entrevista, o tempo se transformou em um dilúvio de chuva, que por causa de nossa animada conversa, nem percebemos. Só conseguíamos distinguir que estava chovendo a partir das trovoadas recorrentes que se sucediam. Seguindo em diante, acho bacana quando Victor fala que psicólogos lidam com estruturas sociais, e não só com o psiquismo, como as pessoas costumam achar. — A nossa forma de sofrer está intimamente ligada à nossa estruturação social das formas de viver. O que seria essa afirmação de Victor? Como ela se encaixa na nossa história de superação? Da seguinte maneira: As dificuldades que os estudantes passam em sua vida acadêmica, estão sempre diretas ou indiretamente ligadas as nossas estruturas socias. E bem, como seria exatamente isso? Para entendermos essa explicação, primeiro precisamos entender o que é estrutura social. Estrutura social é o que define e determina a sociedade. Ela se constitui da relação entre vários fatores econômicos, políticos, históricos, sociais, religiosos e culturais, que dão uma feição para cada sociedade. Assim, percebemos que o meio no qual o estudante está inserido, influência e influenciará em suas dificuldades. Por exemplo, as crianças e adolescentes que possuem renda baixa ou que tem pouca estrutura familiar, ou de etnia parda ou preto, provavelmente enfrentará mais dificuldades do que aquelas brancas, de classe média, e de família tradicional. Mas, não é uma regra, e é isso que Victor quis deixar bem claro em nossa entrevista. — Existem casos isolados. Sabe aquelas histórias que o cara saiu da favela e conseguiu passar na USP (Universidade de 57
São Paulo)? Isso daí é você pegar um caso e generalizar para milhares de pessoas que estão no crime, que não vão conseguir chegar à universidade. Se falar que porque um conseguiu, milhares, diversos outros tem que conseguir, é hipocrisia. Porque se a meritocracia fosse real, não existiria favela, todo mundo teria se tirado da lama sozinho. E, ainda falando sobre estruturas sociais, vale lembrar que a família é a primeira estrutura de qualquer indivíduo, e se este não encontrar apoio, ajuda, e superação nesta, as dificuldades de aprendizagem começarão dentro da própria casa, por isso é tão importante a parceria dos pais e da família na vida estudantil dos filhos, como a professora Jéssica comentou, como pudemos perceber na história de Kauany e de Fernando com sua mãe Conceição. — Quando você não tem apoio familiar isso é um fator de risco. Ou seja, você está aumentando a probabilidade para o aluno sair da escola e que não goste de escola. Mas é só um fator de risco, isso não quer dizer que a pessoa vai abandonar a escola porque não tem apoio familiar. Não é um raciocínio linear, mas está muito ligado. Victor acredita muito nesta parceria, como conseguimos identificar a partir de sua fala. Mas e se as coisas já acontecerem? As dificuldades estão batendo na porta dos estudantes. O que fazer? Sobre esse assunto, fiz questão de conversar com Victor e pedir dicas para ajudar aqueles estudantes que precisam de superação. — Mais do que dar conta de expectativas, entenda qual é sua própria expectativa, o que você quer alcançar com esse curso em sua vida, qual o sentido desse curso na sua vida. Porque aí eu tenho certeza que esse estudante, do jeito dele vai conseguir 58
ser um pouquinho diferente. Isso não quer dizer que ele vai ser bem-sucedido dentro dos padrões da sociedade, mas sim de uma maneira original dele. E, é importante saber que, caso não consiga achar sua função no mundo, procure ajuda psicológica, pois como diz Victor, “Isso é psicologia, ajudar a pessoa a ser ele”. A segunda dica é sobre transformação: — O ideal é que esse estudante utilize esse conhecimento não só para fazer uma transformação nele. Pois se você se transformou, transforme a sociedade. Porque você tem capacidade para isso. Afinal, quando estamos bem, e fazemos o bem ao próximo e à natureza, sentimo-nos melhor ainda, pois assim você já estará contribuindo para o que o mundo seja um lugar melhor. E como transformar o mundo? Com ações simples como não jogar lixo na rua, não comprar coisas desnecessárias que serão descartadas logo em seguida, ou siga o conselho de Victor: “não seja babaca, racista, misógino, machista, hipócrita...”. Ficamos por aqui com estas dicas de Victor. Continuem acreditando e tendo esperanças, pois assim vocês superarão as dificuldades e alcançarão seus objetivos. Nos vemos no próximo e último capitulo deste livro galerinha.
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FOTO PSYCHO
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Capítulo 4 Cheguei lá, e agora?
O olho de Thandera Arteira Reitoria
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COLORIDA
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O olho de Thandera Com 38 anos de idade, Hemerson Ramos tem 2 empresas, é casado, tem 1 filho e é formado em Gestão Comercial. Hemerson é o perfil que as pessoas costumam dizer que conseguiu “chegar lá”. Mas, o que a maioria destas não percebe, é que muita coisa aconteceu para que Hemerson chegasse onde ele está. E é justamente sobre isso que conversamos em nossa entrevista. —Eu me sinto muito feliz e realizado nessa área porque dos dois lados, de pai e de mãe, eu provavelmente devo ter uns 30 primos e nessas duas classes tenho alegria de falar que eu sou uns dos três que tem diploma de uma faculdade, mesmo que tardio. Então venho de família pobre, com um costume talvez errôneo, porque todo mundo partiu para trabalhar. E dentro dessa minha vida eu me sinto um vencedor. Sempre com o interesse em vendas, Hemerson se dava bem na área comercial. Não é para tanto, que ele trabalhou em duas empresas do ramo, a Rodobens e a Massey Ferguson, que foram importantíssimas para seu crescimento, segundo ele. —As principais empresas que trabalhei foi a Rodobens, que eu fui gerente de negócios e depois a Massey Ferguson, onde fui assistente comercial, que era uma função de gerente também e atendia várias cidades na região. Mas, indo além da experiência, foi com o estudo que Hemerson conquistou suas 2 empresas no ramo de Publicidade e Marketing. Diferente da grande parte da população, Hemerson resolveu cursar um ensino superior um pouco mais tarde. Ele ingressou no curso de gestão comercial quando tinha 33 anos. —Nesse momento que com 19 anos não estudei, fui trabalhar por falta de condição, o diploma me fez falta lá na frente. E aí eu decidi fazer gestão comercial porque era um curso dentro 65
da minha área, eu gostei muito porque era um curso empreendedor e era rápido. Segundo ele, algumas dificuldades surgiram durante o curso, como trabalhar o dia todo, a extensão de trabalhos passados e a pouca afinidade com a matéria Matemática Financeira. Foi também durante a faculdade que Hemerson conheceu sua atual esposa. Ela era sua colega de turma. —Eu nunca tinha visto a Lara em lugar nenhum, nem por foto, nem por rede social, nem na balada, nada. A gente se conheceu na faculdade, dentro da sala de aula. Na primeira vez que eu me lembro dela, ela estava passando pelo corredor de nariz empinado, e pensei ‘nossa deve ser a maior patricinha’. Mas depois eu fiz um comentário na sala de aula, ela virou pra trás e ficou me olhando. Aí a gente foi se aproximando mais a cada vez, trocando SMS (mensagens de texto) e no final do primeiro período começamos a namorar. Hoje, eles trabalham juntos na Agência Thandera e no NoGlobo.com, as duas empresas de Hemerson. A primeira no ramo de marketing digital e publicidade, e a segunda, um catálogo online de produtos e serviços da cidade de Patos de Minas. Ambas surgiram por causa do estudo. —A história mudou toda quando eu estava no UNIPAM, porque com toda aquela pegada de empreendedorismo, que é até muito, mas é boa, pra mim foi bom. E o bichinho do empreendedorismo me picou e eu resolvi montar empresa. Estou no escritório da Agência Thandera conversando com Hemerson, é um local espaçoso e bonito. Na sala de espera há um banco de madeira pintado de branco com algumas almofadas, no meio da salinha há um tapete de linho marrom. Em um dos cantos fica uma mesa de carretel de madeira. Logo à frente da sala, há o espaço de descanso, que é um colchão sobre paletes 66
de madeira com almofadas coloridas, e ao fundo estão as mesas e computadores de trabalho dos funcionários. Ao lado da sala de reuniões com uma longa mesa de madeira que eu estava, havia a sala do financeiro, onde Lara era a responsável. Caminhando para o final de nossa entrevista, peço para Hemerson deixar uma mensagem para aqueles estudantes que estão no caminho para alcançarem seus sonhos. Bem-humorado ele me diz o seguinte. —Se você for fazer alguma coisa na sua vida, você foca onde quer chegar e seja bom naquilo, faça bem feito, não precisa medir esforços. Temos que focar em ser pessoas com talentos, porque vamos contribuir no mundo inteiro para todos os lugares. E então, o que podemos retirar desta história com Hemerson? A seguinte lição: Nunca é tarde demais para correr atrás dos seus sonhos. Se dediquem, e procurem ajuda caso precisar, mas nunca abandonem seus ideais.
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Arteira Após uma chuva forte, típica das tardes de novembro, chego ao local da entrevista de nossa penúltima fonte. Ela é uma mulher com estatura média, loira, branca, com olhos azuis hipnotizantes. Ela é formada em Artes pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Seu nome é Andreia Teles. Me encontro com Andreia ainda no corredor da escola pública onde ela dá aulas. Andreia estava como sempre, dando atenção aos seus alunos. Chegando mais perto eu pude ouvir que se tratava de um projeto de música que estavam organizando. Andreia gentilmente me cumprimenta e vamos a sala de visitas da secretaria para a entrevista. Ao entrar pela porta me deparo com outra professora de qual eu também fui aluna, assim como Andreia. Ela dava aulas de matemática, e ficou feliz ao me ver. O interessante é que, estudei meus últimos dois anos do colegial nesta escola, e só naquele momento, percebi que eu nunca havia entrado ali naquele local, onde eu e a professora Andreia estávamos sentadas. Primeiramente, pergunto a Andreia se ela já deu aulas em diferentes tipos de escola. Ela diz que sim. — Eu já trabalhei em escolas da Zona Rural, as regiões que eu trabalhei assim foi Pindaíbas, Areado, mas a partir dos adventos tecnológicos que alcançaram as cidades, mudou um pouquinho a perspectiva da região. No meu tempo a disposição e a humildade dos alunos era um diferencial. É instigante imaginar, o quanto Andreia teve contato com diferentes tipos de estudantes, e que cada um deles tem dificuldades específicas, dentro do meio ao qual estão inseridos. Seja a fazenda, no caso dos alunos da zona rural, ou a Classe Média Alta, já no caso dos estudantes de escola particular. 68
Andreia me diz que cada vez mais o contato extracurricular entre aluno e professor tem sido deixado de lado. —A gente chega para conversar sobre alguma coisa e eles falam que não precisam aprender. A professora Andreia faz parte deste capítulo pelo seguinte motivo: a sua capacidade de adaptação aos diferentes locais de sua carreira e o seu amor pela profissão. Este primeiro nós já conhecemos o porquê, agora, o segundo motivo é algo que me deixou emocionada. Ao contar-me como foi a escolha do seu curso superior, Andreia me diz que sua mãe na época foi bem assertiva quando disse que “se você quiser fazer esse curso, saiba que não será por dinheiro”. Algo bacana que Andreia me contou, foi que, onde ela mais gosta de trabalhar é em escolas públicas. Pois são nelas que os estudantes realmente precisam dela, querem entender sua matéria e a importância da arte em suas vidas. —Meu perfil é escola pública, onde o aluno precisa de mim. Eu preciso convencer, ser necessária para esse aluno que não viaja, que nunca fez turismo, que não fez aula de pintura desde cedo, que não faz aula de balé. Arte em escola particular não tem essa euforia, eu não sou tão necessária. Também a questionei quanto a importância do estudo. Andreia diz que, os alunos já não conseguem mais prestar atenção como antes e reconhecer o valor de estudar, “dizem que nunca vão precisar daquilo”. E qual seria a solução para isso? Para Andreia, somente uma “revolução estudantil” seria capaz de possibilitar novos horizontes ao estudo. —Nossa escola é o modelo da década de 60, mesas enfileiradas, todo mundo em silêncio, aprender as fórmulas e aplicar. Enquanto outros caminhos são muito mais interessantes, como o vídeo, o áudio... 69
Apesar das escolas oferecerem o seu melhor, dentro dos recursos disponíveis, ainda há muito que ser feito. Mas, o importante no momento é fazer o que se pode. Mas como? Como a Andreia e seu amor pela profissão, com esperança, apoio e diversos outros valores que já foram descritos aqui no livro. Um dia chegaremos lá, mas enquanto esse tempo não chega, continuaremos aqui de pé, lutando e acreditando por “dias melhores pra sempre”, como já dizia Jota Quest em sua canção.
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Reitoria Milton Roberto de Castro Teixeira tem 60 anos e é Reitor do Centro Universitário de Patos de Minas. Ele é a última, mas não menos importante personagem deste livro. Quando decidi que faria uma entrevista com Milton, eu não esperava o que ouvi de sua história. Chego na reitoria 20 minutos antes do horário marcado para a entrevista. A secretaria me avisa que Milton se atrasará um pouco por causa do mau tempo (não parava de chover na cidade já havia uma semana). Então me sento e espero observando as pessoas que passam por lá. Já haviam 2 homens esperando por Milton no outro sofá, várias pessoas ziguezaguearam por lá, até que Milton chega e a secretaria me convida para ir a sua sala. Me levanto e encaminho-me para lá. Chegando a sala, pude perceber que era um espaço amplo, com plantas, almofadas e jarros de decoração. E por falar nestes últimos, um jarro que estava num aparador ao lado do sofá me chamou atenção. Ele era branco com detalhes florais, lindo. Este vaso me agradou tanto que, ao final do capitulo vocês podem conferi-lo junto à fotografia de Milton. Muitas vezes, erroneamente olhamos para uma pessoa no topo, sem olhar tudo o que está para trás e esta ação nos faz pensar que, tudo foi fácil, que as portas sempre estiveram abertas, mas não é assim. E com Milton, não foi diferente. Ele morou na fazenda grande parte de sua vida, depois de um tempo é que veio para a cidade. —Eu vim de uma família extremamente pobre, carente, filho de uma professora dos primeiros anos, antigamente chamados de primário, que não tinha formação nem de 1º grau, nem de 2º. Ela era professora de Zona rural e tinha uma crença de que a gente podia vencer na vida estudando. Depois que não 71
conseguiu atingir o estudo para os filhos, ela se mudou para a cidade, mesmo sem condições financeiras. Fomos morar com nossos avós e ela continuou dando aulas na zona rural, andando 7 km para ir e para voltar. Milton aprendeu a lutar desde cedo. E por isso, seu talento para administração desabrochou ao ver um tio ao qual pertencia uma lojinha. —Eu tinha desde os meus 14 anos um sonho imenso em fazer administração, não sei porque, mas acho que a gente sempre tem alguém que inspira a gente na vida, e não precisa ser donos de megaempresas. No meu caso acho que foi um tio que eu trabalhei com ele, ele tinha uma pequena loja de eletrodomésticos e eu me sentia espelhado e inspirado por ele e fui fazer administração. Percebo Milton um pouco inquieto em nossa entrevista, mas mesmo assim, ficava feliz em lembrar-se de histórias e me contá-las. E nestas histórias, estão também as dificuldades. Milton diz que seus maiores desafios foram enquanto ele estava cursando o ensino superior —Foi difícil demais no início, difícil para eu perceber que era uma universidade federal, porque eu tinha feito o ensino médio fraco, porque eu trabalhava 9 horas por dia. Foi difícil, mas eu consegui começar como estagiário na Caixa Econômica Federal, fui bolsista na faculdade para trabalhar lá e ter almoço, ajudava a servir, trabalhava de garçom. Depois prestei um concurso para a universidade e passei como auxiliar administrativo e consegui me manter. Mas, segundo ele, encontrou pessoas boas no caminho, que fizeram a total diferença em sua vida. —Eu tive um acolhimento muito bom, as pessoas do meu trabalho gostavam demais de mim. Me sentiam que eu era só, sem família, me levavam para o fim de semana...as pessoas me 72
acolheram, me adotaram mesmo, porque onde eu trabalhava todas as pessoas eram mais velhas, talvez a mais nova lá tivesse 35 anos. Tinha várias senhoras solteiras que me adoravam, pela minha humildade, minha vontade de aprender, acho que pela minha condição financeira também, porque não tinha com quem eu passar o dia das mães, o natal, então todos eles brigavam por mim. E isso ainda não era tudo. Milton conta que uma vez ao adoecer, ele recebeu apoio igual nunca tinha visto antes. Segundo ele, “nem em casa eu seria tratado assim”. - Foi geral na universidade, teve algo que deu infecção intestinal em uns 4 mil alunos lá e assim a minha infecção me deixou com febre, urinando sangue, e teve uma pessoa que me levou para dentro da casa dela, com boas condições financeiras, arrumou outro colega de trabalho para dormir comigo no quarto, fiquei quase que 1 semana assim. Eu acho que a minha válvula de escape foram ombros amigos. Milton é formado em Administração pela Universidade Federal de Viçosa- UFV, mestre em Administração pelo Centro Universitário do Triângulo - UNITRI, e mestre em Administração na área de Gestão Estratégica das Organizações pela Faculdade de Estudos Administrativos - FEAD. Pergunto para ele sobre a importância de levar conhecimento para seus alunos. Ele diz que é algo que ele ama fazer. —Quando eu vou para a sala de aula, eu me preparo tanto, porque eu penso no meu aluno. Não posso decepcionar essas pessoas que vem de tão longe. Eu vou fazer o maior esforço pensando em cada palavra que eu vou falar, cada exercício que eu vou dar, cada dinâmica que eu vou dar, pensando que aquilo vai agregar algo para eles. A minha condição de ser professor é que eu posso agregar muito conhecimento aos meus alunos. 73
Milton ainda comenta sobre a atenção que recebe de seus alunos, que é algo que ele adora. - Eu fico muito feliz de encontrar as pessoas e falar assim “você lembra que você era meu professor, eu lembro da sua aula assim, das suas aulas assim “, isso me deixa extremante feliz, e me alimenta o ego de ser educador. E sobre o valor do estudo, a resposta não é muito diferente. —O estudo foi uma alternativa para que a nossa vida melhorasse de alguma maneira. Para mim foi a minha vida, o meu porto seguro. Então vejamos que, de um menino pobre que morava na “roça”, Milton Roberto se tornou uma das principais personagens da cidade de Patos de Minas e do Estado de Minas Gerais, por estar na frente de um dos principais Centros Universitários do país. Para terminar nossa entrevista, Milton deixa uma mensagem da Madre Tereza de Calcutá para todas aquelas pessoas que estão tentando subir na vida por meio do estudo. —Uma mensagem que eu adoro é a da madre Tereza de Calcutá, que já velhinha, com os traços fortes de idade, debaixo do viaduto, porque ela sempre esteve com doentes terminas com feridas expostas, passou um executivo perto e tirou um valor até substancial e colocou lá para ela e falou: “olha, eu não faço isso por dinheiro nenhum”. E ela fitou bem nos olhos dele e falou assim: “eu também não faço. Porque eu também não faria, eu só faço isso por amor”. Então, quando você faz as coisas por amor, por mais pesado que seja, fica mais leve e a gente tem que pensar isso quando se fala em educação e um futuro melhor. E com essa frase, terminamos as nossas histórias deste livro. Espero que a vida de Milton, assim como a dos outros personagens, possa auxiliar a todos os estudantes. Seja por meio de superação, autoajuda ou inspiração, para que não desistam 74
dos seus sonhos pois um dia vocês também chegarão aonde desejam.
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Posfácio Escrever este livro-reportagem foi um daqueles “desafios e tanto”. Primeiramente, porque a rotina da faculdade já exige muitos trabalhos a serem feitos e entregues. E, em segundo lugar, porque um dos meus maiores sonhos era escrever e publicar um livro, então eu precisei me dedicar totalmente, para que cada capítulo e cada história fossem descritos para vocês perfeitamente. A temática educação centrada nos estudantes, é uma das minhas grandes paixões, pois sempre gostei de estudar. Assim, eu me vi na obrigação de levar a todos, o porque o estudo é tão importante em nossas vidas, além de mostrar meios para quem está nesta jornada, não desistir perante as dificuldades. O layout foi escolhido para ser da forma mais leve possível, por isso as páginas coloridas ao decorrer do livro. Cores passam alegria e eu quero que este livro a represente. Sobre a dedicatória, ela é especialmente feita a 3 pessoas importantes em minha vida; Joana a minha mãe, que sempre se sacrificou para poder me dar os melhores materiais e suporte para o estudo; Caio, o meu namorado que esteve comigo em todo o processo do livro, desde a escolha do tema até a finalização. E Analzira, minha avó, que me criou por 10 anos na Fazenda, acordando cedo todos os dias para me arrumar para a escola. Já o epigrafo, foi escolhido com muito carinho a partir de uma das minhas sessões de terapia em que por acaso fui apresentada ao incrível Rubem Alves. Com sua frase, quero deixar a mensagem de que não vale simplesmente ler este livro por ler, porque seria uma simples decodificação. Mas sim, ler para agregar sentimento, sabedoria e conhecimento.
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Isadora Luisa Silva Tavares nasceu em 28 de novembro de 1998, na cidade de Patos de Minas – MG. Desde pequena sempre gostou de ler e escrever. Isadora é apaixonada por arte e cultura, por isso resolveu fazer o curso superior de jornalismo, onde poderia levar estas informações a todos. Seu maior sonho é se tornar uma escritora de sucesso, publicando seus livros para todo o mundo.
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