Singularidades/Anotações - Rumos Artes Visuais 1998-2003 - Caderno de Conceitos e Atividades

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CADERNO DE CONCEITOS E ATIVIDADES


NÚCLEO DE EDUCAÇÃO E RELACIONAMENTO Gerência Valéria Toloi Coordenação Samara Ferreira Concepção do material Paula Pedroso e Raphael Giannini


Caro leitor, Neste caderno, desenvolvido pelo núcleo educativo do Itaú Cultural, você encontra alguns conceitos e propostas de atividades ligados à exposição Singularidades/Anotações: Rumos Artes Visuais 1998-2013 – em cartaz no instituto entre 28 de agosto e 26 de outubro de 2014. Acreditamos que as ideias aqui levantadas possam inspirar reflexões ou discussões sobre o cenário da arte contemporânea brasileira – mais especificamente, sobre a produção de alguns dos artistas que o Itaú Cultural apoiou, ao longo de 16 anos, por meio do programa Rumos Artes Visuais. Caso atue como educador, você pode organizar em sala de aula as atividades que propomos a seguir. Elas são adaptáveis a diferentes perfis de alunos e podem ser realizadas com materiais de fácil acesso. Você também encontra, nas últimas páginas do caderno, sugestões de links e uma bibliografia relacionados a temas e nomes da mostra. Confira outros materiais educativos feitos pelo Itaú Cultural em http://novo.itaucultural. org.br/explore/educacao/projetos. E, por meio do Blog do Professor, em http://novo. itaucultural.org.br/explore/blogs/blog-do-professor, compartilhe e divida conosco os desdobramentos das propostas presentes nesta publicação!

De acordo com o artigo 46, incisos III e VIII, e com o artigo 48 da Lei nº 9.610/98 (Lei dos Direitos Autorais), não constitui ofensa aos direitos de autor a reprodução de obras nos termos dos referidos artigos; contudo, fica expressamente vedada qualquer forma de utilização com finalidade lucrativa/comercial deste material.


VOCÊ JÁ PENSOU... ... sobre a arte que é feita atualmente aqui no Brasil?

Quem a executa? Seria possível reunir, em um só lugar, toda a produção artística contemporânea de um país com dimensões continentais como o nosso? Essas questões são difíceis de responder. Existem muitas maneiras de organizar essa produção – mas, mesmo assim, dificilmente conseguiríamos encontrar todos os artistas. Com o intuito de mapear e dar visibilidade à arte contemporânea brasileira, o Itaú Cultural criou, em 1997, o Rumos Artes Visuais. Além de dar suporte para que os artistas pudessem realizar suas obras, o programa organizou uma série de mostras itinerantes para divulgar, em diferentes cidades do país, a produção dos selecionados. Até 2013, o Rumos lançava editais específicos para cada área de expressão artística – artes visuais, música, literatura etc. Mas recentemente o programa foi reformulado e passou a contemplar, em uma mesma edição, projetos ligados a diversos campos.


Saiba mais: Rumos Artes Visuais • http://novo.itaucultural.org.br/rumo/artes-visuais-5/ Mapeamentos da produção nacional emergente • 1999-2000: http://d3nv1jy4u7zmsc.cloudfront.net/wp-content/uploads/2012/02/000351.pdf • 2001-2003: http://d3nv1jy4u7zmsc.cloudfront.net/wp-content/uploads/2012/02/000305.pdf O novo Rumos • http://novo.itaucultural.org.br/explore/blogs/rumos-2/um-novo-rumos • http://novo.itaucultural.org.br/canal-video/rumos-itau-cultural-o-novo-rumos-2013

Singularidades/Anotações, a exposição a que fazemos referência neste caderno, revisita o trabalho de alguns dos artistas que já contaram com o apoio do Rumos. Muitas delas inéditas, as obras apresentadas não são necessariamente da época em que os artistas foram contemplados pelo programa.


PARA QUE UMA MOSTRA DE ARTE SE CONCRETIZE, É ESSENCIAL A PRESENÇA DE UMA FIGURA: O CURADOR. COM O OBJETIVO DE DAR UMA IDEIA DA ATUAÇÃO DESSA FIGURA TÃO IMPORTANTE, PROPOMOS PRIMEIRAMENTE UMA ATIVIDADE EM FORMA DE JOGO – E, EM SEGUIDA, POSSÍVEIS TÓPICOS PARA DISCUSSÕES E CONVERSAS SOBRE O TEMA.

JOGO DA CURADORIA

Você já mostrou alguma coleção sua – de figurinhas, de brinquedos, de chaveiros... – a alguém? Imagine então fazer uma exposição com esses itens. Quais deles você exibiria? Caberia tudo em uma parede só? Como os objetos estariam dispostos no espaço expositivo? Em cima de mesas? Atrás de vitrines? Você os separaria por tema, cor, forma? Ao pensar nessas questões, você está agindo como um curador! Um dos sinônimos desse termo é a palavra “tutor”, que faz referência a alguém que cuida, temporariamente, de alguma coisa – no nosso caso, de uma coleção de obras de arte –, devolvendo-a posteriormente ao seu dono – o próprio artista ou seus parentes, uma galeria ou um colecionador de arte... Muito respeitado no universo artístico, o curador não tem uma formação específica. Ele pode ser um historiador, um crítico e até mesmo um artista.


Para organizar este jogo, você vai precisar de: • objetos pessoais (de cada participante); • papel ou papel-cartão; • caneta ou lápis. Regras: 1. Peça que cada aluno traga um objeto pessoal – que tenha algum significado especial ou que o represente de alguma maneira. 2. A seguir, faça uma roda e peça que cada participante conte aos demais por que trouxe e o que significa para ele o seu objeto. 3. Reúna todos esses objetos em uma mesa e divida a turma em grupos. 4. Cada grupo deve olhar para todos os objetos reunidos e escolher, sem retirá-los da mesa, alguns deles – no mínimo três –, tentando identificar um ponto em comum – a forma, o tamanho, a cor ou a utilidade, por exemplo. 5. Cada grupo, então, deve se apresentar, recolhendo os objetos escolhidos e explicando aos colegas o que motivou as escolhas. Concluída a apresentação, os objetos são devolvidos à mesa. Sugestões: 1. Se você quiser direcionar a atividade, crie fichas com indicações de “temas” – como forma, tamanho, cor... – e peça que cada grupo escolha uma delas. 2. Cada um dos grupos também pode escrever um pequeno texto sobre a relação dos objetos com o tema. 3. Organize, ao término de cada apresentação, uma conversa sobre as possíveis maneiras de expor os objetos escolhidos. Desdobramento: Por meio da fotografia, seus alunos têm a chance de seguir explorando os possíveis significados dos objetos que eles trouxeram. Você pode pedir que cada participante da atividade recolha a sua peça e a fotografe junto a outra, comparando-as, ou em algum local capaz de ressignificá-la de alguma maneira.


Veja, como exemplo, esta série – de Berna Reale – que faz parte da exposição Singularidades/Anotações:




Berna Reale | sĂŠrie MMXII, 2013


Quem está sendo representado nas fotos? Um herói? Um vilão? Um policial? Um agente especial? Essa personagem é um homem ou uma mulher? E como é a sua vestimenta? É um uniforme comum de polícia ou um uniforme de algum grupo especial da polícia? A roupa, em todo caso, é mesmo adequada a esse profissional? Ela o protege? É uma roupa de ação, de treinamento, de recreação? O que nessas fotos parece real, de uso cotidiano da polícia? O capacete e o cassetete? E os objetos que aparecem na mão esquerda da personagem? Eles nos dizem algo? Perceba o conjunto: cassetete, uniforme, objetos empunhados... Para você, qual deles é o símbolo mais forte e representativo? Quais perdem seu sentido original e ganham outro? Quais acabam reforçando algumas ideias? Quem aparece nas fotos, enfim, é a própria artista, que também trabalha como perita criminal. Em suas imagens, Berna Reale se apropria e – deslocando-os de seus contextos originais – ressignifica determinados objetos. Essas apropriações, ainda que de maneira diversa, também podem ser vistas na obra de Rodrigo Braga:


Rodrigo Braga | Mortalha, 2014

Quais elementos o artista usou nessa foto? Como eles estão posicionados? Pode-se dizer que a imagem faz referência a um rito de passagem: como se estivesse sendo velado, um peixe recém-morto – já que ainda não se encontra em estágio de decomposição – é coberto por uma folha, como se esta fosse um sudário. Com tal sobreposição de elementos, Braga nos dá margem a uma série de interpretações ligadas às ideias de vida e de morte. A imagem ilustra tanto uma relação entre dois seres vivos – a planta, ainda bastante verde, e o peixe – quanto uma espécie de fusão entre dois elementos mortos – afinal, o “sudário” vai se decompor com o animal. Repare também que ambos estão fora de seus hábitats naturais, ou de seus contextos originais, e ganham, assim, outros significados.


Algo semelhante ocorre nesta foto:

Rodrigo Braga | Biomimesis, 2014

Note como a folha, novamente, cobre o peixe, mas agora ela simula o formato de sua espinha. É quase como se pudéssemos ver o que há dentro do animal ou como se ele estivesse cortado ao meio. O próprio título da obra, Biomimesis, nos sugere essa fusão. O termo “mimesis” designa uma representação ou a cópia de algo real – geralmente relacionado à natureza. Será que a folha, quando o artista a encontrou, já se assemelhava a uma espinha? Será que as folhas, em ambas as fotos, já tinham o mesmo formato dos peixes sobre os quais elas repousam? Ou será que elas foram adaptadas para isso? Converse sobre essas e outras questões com os seus alunos. Elas não necessariamente têm uma resposta definida, e são várias as conclusões às quais vocês podem chegar!


O QUE ACHOU DA DISCUSSÃO PROPOSTA NAS PÁGINAS ANTERIORES?

ELA MUDOU, DE ALGUM JEITO, A MANEIRA COMO VOCÊ VÊ UMA OBRA DE ARTE?

E, FALANDO NISSO... O QUE SERIA, PARA VOCÊ, UMA OBRA DE ARTE?

Várias definições já foram elaboradas por estudiosos e artistas. Umas se opõem, outras se complementam... Veja algumas delas: “A arte não reproduz o visível, ela torna visível.” [Paul Klee, artista, 1924] “A única coisa a ser dita sobre a arte é que ela é uma coisa. A arte é artecomo-arte e todo o resto é todo o resto. A arte como arte não é nada além de arte. A arte não é o que não é arte.” [Ad Reinhardt, artista, 1963] “Uma coisa que realmente não existe é aquilo que se dá o nome de Arte. Existem somente artistas. Outrora eram homens que apanhavam terra colorida e modelavam toscamente as formas de um bisão na parede de uma caverna; hoje, alguns compram suas tintas e desenham cartazes para os tapumes; eles faziam e fazem muitas outras coisas. Não prejudica ninguém chamar a todas essas atividades arte, desde que conservemos em mente que tal palavra pode significar coisas muito diferentes, em tempos e lugares diferentes e que Arte com A maiúsculo não existe. Na verdade, Arte com A maiúsculo passou a ser algo de um bicho-papão e de um fetiche.” [E. H. Gombrich, historiador da arte, 1978]


“O conceito de arte não se define. Este está sempre ligado ao trabalho humano e às suas técnicas e indica o resultado de uma relação entre uma atividade mental e uma atividade operacional.” [Giulio Carlo Argan, historiador e teórico da arte, 1994] “Podemos ficar tranquilos: se não conseguimos saber o que a arte é, pelo menos sabemos quais coisas correspondem a essa ideia e como devemos nos comportar diante delas.” [Jorge Coli, historiador da arte, 1995]

Se estendêssemos essa lista, veríamos como o conceito de arte mudou ao longo do tempo – e como ele se modifica de acordo com o enfoque (sociológico, filosófico, político, científico) pelo qual é abordado. Em todo caso, vamos delimitar a questão e partir para o conceito específico de arte contemporânea – no qual se encaixam os trabalhos apresentados em Singularidades/Anotações.

VOCÊ CONSEGUE IDENTIFICAR DIFERENÇAS ENTRE A ARTE FEITA “ANTIGAMENTE” E OBRAS COMO AS DE BERNA REALE, RODRIGO BRAGA E OUTROS ARTISTAS CONTEMPORÂNEOS?

ALÉM DO FATO DE SER PRODUZIDA NOS DIAS DE HOJE, O QUE CARACTERIZA A ARTE CONTEMPORÂNEA? COMO VOCÊ A DESCREVERIA?

A francesa Anne Cauquelin, em seu livro Arte Contemporânea – uma Introdução (Martins Fontes, 2005), a define como “a arte do agora, a arte que se manifesta no mesmo momento e no próprio momento em que o público a percebe”. Muitas das obras dessa “arte do agora” propõem novas experiências ao espectador. Mais do que isso: elas fazem com que o espectador se torne parte da obra, instigando-o a desvendar o que ele vê.


Geralmente, diante de um trabalho de arte contemporânea: Identificamos diferentes códigos, figuras e símbolos, e relacionamos os conceitos a eles ligados. Percebemos cores, formas, texturas, sons, e assim criamos uma relação contemplativa e sensitiva com a obra. Reconhecemos uma ordem de entendimento com começo, meio e fim – caso de alguns vídeos ou músicas – e nos deixamos levar pelo seu ritmo. Se, entretanto, não houver um começo, um meio e um fim determinados – uma pintura, uma foto ou uma instalação, por exemplo –, criamos um ritmo pessoal para nos relacionar com a obra.

E quando não identificamos nada e, assim, não conseguimos nos relacionar com a obra de arte? Pode ser – e isso não é raro – que o que vemos ali não nos comunique nada, não faça, a princípio, sentido algum. Nesse caso, podemos recorrer a fontes externas: pesquisar a trajetória do artista, conferir outras obras de sua autoria, tentar descobrir o que ele diz sobre aquele trabalho específico... Mas o mais importante é estar aberto àquilo que, em primeira instância, a obra nos propõe: o estranhamento. Somos forçados, em muitos casos, a sair da nossa zona de conforto, a questionar inclusive o nosso conceito de arte e os nossos valores preconcebidos. Para trabalhar esses valores em sala de aula, procure com seus alunos exemplos de obras de arte produzidas em várias épocas e lugares e, feito isso, tentem, juntos, identificar diferenças. Nesse momento, deixe claro que vocês farão uma análise puramente formal, que ainda não está em jogo nenhum julgamento pessoal ou de gosto. Analisem as diferentes formas, cores, figuras, símbolos, texturas, sons, técnicas e linguagens que aparecem.


Depois de um estudo minucioso, pergunte a eles como se sentem em relação às obras e o que elas comunicam a cada um. Para esclarecer como, na arte, o novo e o inusitado são capazes de gerar sensações, reflexões e discussões interessantes, vamos dar uma olhada em outros trabalhos que integram a mostra Singularidades/Anotações e que lançam mão de diferentes tecnologias. A Espera, obra de Leandro Lima e Gisela Motta, é um exemplo do que chamamos de instalação [http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3648/instalacao]. Ou, mais especificamente, instalação interativa – já que conta com a participação, com a interferência do público.

Gisela Motta e Leandro Lima | A Espera, 2013


Por meio de um jogo de luzes e projeções disposto sobre um par de bancos, o público vê a sua sombra misturada às sombras de pessoas que já estiveram ali – e já se foram. O trabalho, assim, nos faz pensar em algo como a memória de um lugar – ou a memória que esse lugar tem das pessoas que passaram por ele, das situações às quais ele assistiu (e para as quais serviu de “palco”). Uma memória, como a nossa, marcada por sombras, ausências. É claro que o público também pode olhar para a obra sem interagir com ela, como se estivesse vendo um vídeo – talvez se perguntando por quais razões as pessoas cujas sombras ele pode identificar se sentaram naqueles bancos... Elas se conheciam? Uma esperava pela outra? E nós? Por que nos sentaríamos em um daqueles bancos? Para esperar por alguém? Para descansar? Ou simplesmente pelo gosto de interagir com a obra?


Como tínhamos comentado anteriormente, a relação que o público estabelece com a obra de arte contemporânea pode ser contemplativa, sensitiva, interativa... Ou tudo isso ao mesmo tempo! E também é comum, na arte contemporânea, que a técnica empregada por um artista na construção de seu trabalho seja difícil de ser identificada de imediato. E desvendar essa técnica não deixa de ser outro tipo de interação. Veja esta série de obras de Fabricio Lopez:

Fabricio Lopez | Traumas, Metáforas e Suspensão I, II e III, 2012

Conseguimos identificar a técnica usada pelo artista? Ainda que as imagens deem a impressão de ser pinturas, elas foram realizadas por meio do desenho e da xilogravura. Tendo como referência algumas gravuras produzidas no século XVII, Lopez fez seus desenhos com base na observação do local em que vive, no litoral de São Paulo.


Confira um detalhe ampliado:

A xilogravura é uma técnica muito antiga. Ela não é “direta” como o desenho e a pintura: primeiro o artista confecciona, usando ferramentas de corte, uma espécie de carimbo, uma matriz de madeira que servirá de base para estampar a imagem criada sobre o papel ou outro suporte. Existem inúmeras técnicas de gravura; e, conforme o material utilizado na matriz, ela recebe um nome específico. “Xylon”, em grego, é “madeira”, e daí a matriz da xilogravura ser feita nesse material. Você pode saber mais sobre essas técnicas em http://itaucultural.org. br/experiencias_educacionais/gravuraPDF/caderno_gravura.pdf.


A gravura permite ao artista fazer sobreposições de matrizes e, consequentemente, de imagens. Nessas obras, Lopez vai e vem com impressão sobre impressão, combinando estampas até que certa combinação de imagens ganhe sua própria dinâmica. As estampas, aqui, representam a mesma região, o local onde o artista nasceu e instalou o seu ateliê: o bairro do Valongo, em Santos. Com a obra Arvorar, por sua vez, Katia Maciel nos leva a outra paisagem – ou leva outra paisagem para dentro do espaço expositivo. E nos propõe outros tipos de interação. Veja um detalhe do trabalho:

Katia Maciel | Arvorar, 2013


Ao assoprar microfones instalados em frente à projeção de uma selva, o observador – ou participante, ou interator – da obra é capaz de gerar uma ventania no ambiente projetado, movendo as folhas da floresta de acordo com a intensidade de seu sopro. Podemos indicar semelhanças entre esse trabalho e o de Fabricio Lopez. Ambos nos remetem – ainda que em níveis distintos – a outro lugar, outras paisagens. E ambos são apresentados em grandes dimensões – favorecendo, assim, uma relação de contemplação por parte do público. Pergunte aos seus alunos quais são as sensações que eles têm ao observar uma obra muito grande ou um trabalho que ocupa todo o espaço de uma sala. E se a obra for muito pequena? Como eles podem interagir com ela?


COMO VIMOS, ALÉM DA INTERAÇÃO DIRETA QUE O PÚBLICO PODE ESTABELECER COM A OBRA – O QUE OCORRE, POR EXEMPLO, EM A ESPERA E ARVORAR –, HÁ A INTERAÇÃO DE DIFERENTES ELEMENTOS NUM MESMO TRABALHO – CASO DAS IMAGENS DE FABRICIO LOPEZ. A SEGUINTE ATIVIDADE, QUE PROPÕE A REALIZAÇÃO DE UM DESENHO A VÁRIAS MÃOS, EXPLORA ESSA SEGUNDA CATEGORIA DE INTERAÇÃO.

PAISAGEM INTERATIVA

A ideia, aqui, é que os seus alunos criem desenhos em conjunto com base nas paisagens observadas no trajeto que eles percorrem de casa até a escola. Não é raro que várias pessoas costumem passar pelos mesmos lugares, mas, ainda assim, cada uma delas deve ter experiências próprias, singulares, ao longo do seu deslocamento. Somados ou sobrepostos em um mesmo desenho, esses diferentes olhares, essas singulares subjetividades podem gerar uma espécie de olhar coletivo da turma. Para organizar esta atividade, você vai precisar de: • papéis (um para cada participante); • lápis (um para cada participante); • outros materiais de uso coletivo (opcional), como giz de cera, canetinha hidrográfica ou tinta. Instruções: 1. Combine com os seus alunos para que eles prestem atenção no percurso de ida até a escola para que, no mesmo dia, vocês possam fazer a atividade. Se quiser, reserve um tempo da aula para que eles anotem o que viram ou sentiram.


2. Divida a turma em dois grupos e os nomeie: “turma A” e “turma B”, por exemplo. 3. Peça, então, que cada aluno desenhe o seu percurso. Estabeleça um tempo para essa parte da atividade, ao término do qual toda a turma deve parar de desenhar. 4. Recolha os desenhos e redistribua-os entre os alunos, trocando os trabalhos dos integrantes da “turma A” com os dos membros da “turma B”. 5. Agora, peça que cada aluno faça interferências no desenho recebido, somando, subtraindo ou modificando elementos. Lembre-se de que essas modificações devem seguir a temática inicial – o percurso até a escola. Sugestões: 1. Você pode organizar quantas rodadas quiser. Só tome o cuidado de distribuir bem o tempo entre elas, para garantir que haja tempo para as modificações. Sugira a utilização de outros materiais, como giz de cera e canetinha hidrográfica, a cada rodada. 2. Promova uma exposição – pode ser na sala de aula mesmo – com os desenhos e abra um debate sobre o que os alunos acharam de realizar interferências no trabalho dos seus colegas – e de deixar que seus próprios desenhos fossem alterados. Adaptações: 1. Se houver um retroprojetor na escola, você pode usá-lo para sobrepor os desenhos e, depois, fotografá-los, criando assim novas paisagens. Para que isso dê certo, claro, os alunos devem fazer seus desenhos com canetas Pilot sobre folha de acetato. Ainda: se a escola contar com aulas de informática, peça ao professor da área que os ajude a fazer sobreposições digitais por meio de algum programa de computador. 2. Você também pode adaptar essa atividade para outro suporte: a fotografia. Siga os mesmos passos, mas peça que os alunos fotografem partes do trajeto – mesmo que seja com a câmera do celular – e levem as imagens impressas à sala de aula. Durante a atividade, então, peça que eles recortem as fotos, ficando com as partes que acharem mais interessantes e cedendo as demais ao resto da turma. Cada aluno, assim, fará uma colagem com pedaços de diferentes registros.


Como foi – para você e para os seus alunos – trabalhar a ideia de interatividade por meio do desenho? As interferências realizadas durante a atividade foram bem-aceitas pelo grupo? Os trabalhos resultantes deram origem a uma narrativa? Falando nisso, vamos analisar agora uma obra de Thiago Martins de Melo que utiliza um suporte clássico, a pintura, para construir uma narrativa.

Thiago Martins de Melo | A Durga de 7 Braços de Ogum Pare a Rébis Mestiça sob a Ameaça do Moedor de Carne Ultramarino do Liberal Mahisha, 2014

Observe os elementos que compõem a pintura. Personagens, objetos, símbolos... É difícil ficar indiferente a eles, não?


Caso, no entanto, você não consiga identificá-los, observe o trabalho com mais atenção, por mais tempo. Atente para todas as partes da pintura. Você também pode recorrer às informações que o artista traz no título da obra. Há nele, por exemplo, referências ao hinduísmo – Durga, Mahisha – e ao candomblé – Ogum. Se esses nomes não lhe dizem nada, e se você não puder pesquisar o significado deles, ainda assim você pode interpretar a obra à sua maneira. Mesmo sem dominar as referências do artista e sem saber qual é a narrativa que ele propõe, é válido – e muito interessante – usar os elementos formais da pintura para, partindo só do seu ponto de vista sobre eles, criar a sua própria narrativa. Nesse sentido, você pode trabalhar o olhar do grupo, pedindo que seus alunos observem e anotem os detalhes e os elementos que mais lhes chamaram a atenção – tanto em relação às formas e às figuras quanto no que diz respeito à composição ou à narrativa. Depois, vocês podem conversar sobre a maneira como, diante da mesma obra, cada um desenvolve a sua narrativa. Se achar interessante, peça que eles pesquisem os nomes aos quais o artista se refere no título da pintura. Lembre-se de que a obra original sempre contém mais elementos do que uma reprodução fotográfica dela. O ideal é que vocês vejam a obra ao vivo, na exposição, e depois conversem sobre as diferenças entre as duas versões. O que ganhamos ao analisar o trabalho em suas reais dimensões, podendo conferir as verdadeiras cores e a textura da tinta sobre a tela?

QUAIS HISTÓRIAS PODEMOS CRIAR AO OBSERVAR UMA PINTURA COMO ESSA?

PARA A PRÓXIMA ATIVIDADE, PROPOMOS O CAMINHO INVERSO: EM VEZ DE LER AS HISTÓRIAS QUE SE INSINUAM EM UMA IMAGEM, VAMOS TRANSFORMAR UMA NARRATIVA ESCRITA EM UM DESENHO?


NARRATIVA INTERATIVA

Quando contamos uma história, por vezes a linearidade se perde – começamos a narrar pelo fim da história, ou pelo meio, ou às vezes retomamos fatos que aconteceram antes para só depois contar o fim. Esse processo é muito parecido com a leitura de obras de arte, em que, diversas vezes, vamos reunindo falas com base no que se vê para seguir adiante. Para organizar esta atividade, você vai precisar de: • duas folhas de papel A3 ou maior (uma para cada grupo); • giz de cera, canetinha hidrográfica, tinta e outros materiais de uso coletivo; • uma história dividida em fichas (uma ficha para cada grupo). Instruções: 1. Escolha uma história. Você pode, por exemplo, se basear em mitos ou retirá-la de contos, crônicas, canções de teor narrativo... 2. Reparta essa história em fichas e, em seguida, divida a turma em grupos correspondentes ao número de fichas. Cada grupo, assim, deve receber uma parte da história. 3. Entregue uma folha em branco a cada grupo e peça que os participantes transformem em um desenho o episódio narrado na sua respectiva ficha. É importante que essa folha seja A3 ou maior, já que várias pessoas vão desenhar nela.


4. Feito isso, os grupos devem trocar as suas fichas. Para facilitar, você pode propor uma ordem – sentido horário, por exemplo. 5. Repita esse processo até que todos os grupos tenham desenhado todas as fichas na mesma folha. Sugestões: 1. No que diz respeito aos materiais a ser utilizados, pense no tempo disponível para a atividade. Lápis e giz de cera são mais fáceis e rápidos de usar; tinta guache ou acrílica, por sua vez, demanda mais tempo e atenção. 2. Você pode se juntar ao professor de história, literatura ou música para escolher a narrativa. 3. Antes de distribuir as fichas, se preferir, explique aos alunos todas as etapas da atividade. Assim, eles podem se organizar melhor quando forem fazer os seus desenhos. Desdobramento: Proponha à turma uma apresentação dos trabalhos e conversem sobre as diferenças e semelhanças entre cada um deles. Vocês também podem falar sobre as dificuldades de interpretar uma narrativa que se apresenta de forma não linear.


NESTE CADERNO, ABORDAMOS CONCEITOS E PROPUSEMOS ATIVIDADES LIGADOS À MOSTRA SINGULARIDADES/ANOTAÇÕES: RUMOS ARTES VISUAIS 1998-2013. Citamos aqui uma pequena parcela dos artistas que integram a exposição. Ao todo, são 35. E as relações que estabelecemos entre eles são apenas algumas entre muitas possibilidades. Caso pretenda usar este material, tente visitar a exposição – com os seus alunos, de preferência. Afinal, diante das obras originais é possível reparar em detalhes que não são percebidos nas reproduções – mesmo quando se trata da reprodução de uma pintura, por exemplo – e de fato interagir com o trabalho. A seguir, você pode consultar uma bibliografia, com indicações de livros sobre a história da arte, alguns museus de arte contemporânea e uma série de links sobre os artistas citados nas páginas anteriores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: • Guia de história da arte (Estampa, Portugal, 1994), de Giulio Carlo Argan e Maurizio Fagiolo • Arte contemporânea – uma introdução (Martins Fontes, 2005), de Anne Cauquelin • O que é arte? (Brasiliense, 1995), de Jorge Coli • A história da arte (LTC, 2000), de E. H. Gombrich • Escritos de artistas – anos 60/70 (Jorge Zahar, 2006), de Glória Ferreira e Cecilia Cotrim (Org.) • Teoría del arte moderno (Cactus, Argentina, 2007), de Paul Klee

MUSEUS DE ARTE CONTEMPORÂNEA BRASILEIROS: • Museu de Arte Contemporânea de Goiânia • Museu de Arte Contemporânea de Niterói • Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo • Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul (em Porto Alegre) • Museu de Arte Contemporânea de Campo Grande


• Museu de Arte Contemporânea de Campinas José Pancetti • Museu de Arte Contemporânea do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (em Fortaleza) • Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco (em Olinda) • Museu de Arte Contemporânea do Paraná (em Curitiba) • Museu de Arte Contemporânea de Americana

SITES SOBRE OS ARTISTAS CITADOS: • Berna Reale: http://www.pipa.org.br/pag/berna-reale/ • Fabricio Lopez http://fabriciolopez.com/ http://fabriciolopez.files.wordpress.com/2009/11/volume011.pdf http://fabriciolopez.files.wordpress.com/2009/11/volume02.pdf http://www.pipa.org.br/pag/artistas/fabricio-lopez/ http://www.mariantonia.prceu.usp.br/celeuma/?q=revista/2/o-trabalho-da-arte/fabricio-lopez • Gisela Motta e Leandro Lima http://www.aagua.net/Espera • Katia Maciel http://vimeo.com/user9938752 http://vimeo.com/74017965 • Rodrigo Braga http://www.rodrigobraga.com.br/ http://www.pipa.org.br/pag/artistas/rodrigo-braga/ • Thiago Martins de Melo http://www.pipa.org.br/pag/artistas/thiago-martins-de-melo/ http://arteseanp.blogspot.com.br/2011/11/conversando-sobre-arte-entrevistado.html


Realização

/itaucultural itaucultural.org.br fone 11 2168 1777 atendimento@itaucultural.org.br avenida paulista 149 são paulo sp 01311 000 [estação brigadeiro do metrô]


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