INTRODUÇÃO Este documento apresenta um estudo sobre os “Gastos da Prefeitura do Recife com Publicidade entre outubro de 2018 e setembro de 2019”, compreendendo as despesas com propaganda institucional e educativa (concepção, produção e veiculação de campanhas) nos últimos 12 meses, executadas pela Secretaria de Governo e Participação Social. Não foram considerados, para efeito deste estudo, os gastos com publicidade para promoção turística do Recife, executados pela Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer. Vale salientar que o acesso a tais dados no Portal da Transparência do Recife (http://transparencia.recife.pe.gov.br/) foi resultado da ampla incidência do nosso mandato, junto com o Fórum Pernambucano de Comunicação (FOPECOM), organizações da sociedade civil, ativistas e pesquisadores do direito à comunicação, desde 2017, para que a Prefeitura do Recife cumprisse a Lei Federal 12.232/2010, que estabelece normas gerais para licitação e contratação de serviços de publicidade pela administração pública: “Art. 16. As informações sobre a execução do contrato, com os nomes dos fornecedores de serviços especializados e veículos, serão divulgadas em sítio próprio aberto para o contrato na rede mundial de computadores, garantido o livre acesso às informações por quaisquer interessados. Parágrafo único. As informações sobre valores pagos serão divulgadas pelos totais de cada tipo de serviço de fornecedores e de cada meio de divulgação.” Lançamos a campanha #praondevaionossodinheiro, protocolamos requerimentos realizamos diversas reuniões e uma audiência pública e, por fim, foi necessário apresentar denúncia ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE) para que, apenas após a notificação do MPPE (outubro de 2018), a Prefeitura do Recife passasse a disponibilizar os dados mês a mês. Essa foi uma conquista importante para que os órgãos de controle e a sociedade em geral possam ter acesso aos valores gastos nas campanhas publicitárias realizadas pela Prefeitura, por finalidade de campanha, demonstrando quanto foi pago para as respectivas agencias e veículos de comunicação. A partir de janeiro de 2019, os dados passaram a ser disponibilizados trimestralmente, sendo a primeira publicação retroativa a outubro de 2018, mês em que denunciamos a situação ao MPPE. Passamos a analisar cada lançamento e publicar balanços cumulativos a cada seis meses, sendo este o segundo estudo. Desse modo, pudemos verificar o comportamento desse tipo de despesa e, agora com precisão, podemos afirmar que temos um quadro de gastos excessivos em 12 meses (R$ 40,8 milhões), extremamente concentrados nos veículos de mídia comercial de grande porte da cidade, como a TV Globo (R$ 12 milhões), que a maior parte dos gastos é com propaganda da Prefeitura (60%) e não de campanhas educativas (40%), entre outros aspectos que apresentamos a seguir.
GASTOS TOTAIS REALIZADOS NOS ÚLTIMOS 12 MESES (Outubro de 2018 a Setembro de 2019)
Ao identificar os gastos com publicidade da Prefeitura do Recife, mês a mês, verificamos que há uma distribuição irregular do volume de pagamentos, mas percebe-se um volume mais expressivo a partir de fevereiro de 2019, com valores mensais superando a casa dos R$ 3 milhões, chegando a superar os R$ 6 milhões em junho. Do total de R$ 40,8 milhões pagos nos últimos 12 meses, R$ 36 milhões foram desembolsados apenas em 2019.
Fonte: http://transparencia.recife.pe.gov.br | Elaboração: Mandato Vereador Ivan Moraes
COMPARATIVO ENTRE INVESTIMENTOS COM RECURSOS PRÓPRIOS E GASTOS COM PROPAGANDA (Outubro de 2018 a Setembro de 2019)
Considerando-se o cenário de recessão e a baixa capacidade de investimentos por parte da Prefeitura do Recife, resultante do alto comprometimento das receitas com o custeio (despesas com pessoal e outras despesas correntes), gastar R$ 40,8 milhões de recursos próprios não vinculados (fonte 100) com publicidade, em 12 meses, parece uma opção de gestão, no mínimo, equivocada. Para se ter uma ideia, o total de investimentos da Prefeitura do Recife, com recursos próprios não vinculados, no mesmo período, em novas obras e instalações de serviços públicos (novas creches, unidades de saúde, pavimentação, muros de arrimo, etc.) foi de pouco mais de R$ 94 milhões!
Fonte: http://transparencia.recife.pe.gov.br | Elaboração: Mandato Vereador Ivan Moraes
DISTRIBUIÇÃO DOS GASTOS REALIZADOS POR FINALIDADE DA CAMPANHA (Outubro de 2018 a Setembro de 2019)
Os gastos com publicidade da Prefeitura do Recife nos últimos 12 meses podem ser agrupados em duas finalidades diferentes de campanha: as propagandas institucionais da gestão e as campanhas educativas. Vale lembrar que o terceiro tipo de publicidade permitida para o setor público é a promoção turística, não considerada nesse estudo. O que os números revelaram, diferentemente do que afirmava a gestão municipal, foi que os gastos com propaganda institucional são superiores àqueles destinados ao desenvolvimento de campanhas educativas. No período analisado, R$ 24,18 milhões foram gastos com propaganda da gestão (59%), enquanto para campanhas de prevenção à saúde, contra a violência de gênero e demais campanhas educativas, pouco mais de R$ 16 milhões foram gastos (41%).
Fonte: http://transparencia.recife.pe.gov.br | Elaboração: Mandato Vereador Ivan Moraes
GASTOS POR CAMANHA
(Outubro de 2018 a Setembro de 2019) Quando analisamos os gastos com publicidade da Prefeitura do Recife por campanha publicitária, verificamos que há uma concentração excessiva de gastos em algumas delas. Analisamos de forma positiva o fato da campanha “Recife que se Cuida” ter sido a com maior volume de recursos desembolsados nos últimos 12 meses: R$ 3,6 milhões. Trata-se de importante campanha de prevenção à sífilis, estímulo ao pré-natal, orientação para a saúde da pessoa idosa e outras campanhas educativas de saúde. O problema é que esse total gasto na campanha ocorreu no último trimestre de 2018 e no primeiro de 2019. Ou seja, à exceção da campanha da Sífilis que gastou R$ 445 mil no segundo trimestre de 2019, não houve outros pagamentos relacionados à campanha, configurando falta de constância e descontinuidade nas campanhas. Nesse caso das campanhas educativas, questiona-se o porquê da concentração em grandes e onerosas campanhas? Por que não as manter perenes durante todo o ano, ampliando os temas e utilizando-se de formatos e veículos com custos menores? Mas o fato que mais chamou a atenção foram os custos das propagandas institucionais da gestão que, como visto anteriormente, somaram mais de R$ 24 milhões gastos em promoções de ações da prefeitura. Para propagandear o novo slogan da Prefeitura foram R$ 2,95 milhões, outros R$ 2,6 milhões pra mostrar o que a Prefeitura fez no carnaval. Para anunciar as Upinhas, foram mais de R$ 1 milhão de propaganda, valor igual ao gasto para divulgar as obras nos morros. Mais R$ 1,14 milhão foi gasto para mostrar o programa de recuperação de calçadas e, desse modo, outras campanhas de promoção da gestão ocorreram. Também nos chamou atenção as limitações de acessibilidade comunicacional ainda presentes nas peças publicitárias da Prefeitura, mesmo diante de campanhas com custos tão elevados, como visto anteriormente. Falta tradução em Libras (Língua Brasileira de Surdos) nos vídeos e as legendas não contemplam as pessoas surdas. Na TV e nos canais da Prefeitura no youtube falta o recurso de audiodescrição nas peças.
GASTOS POR CAMANHA
(Outubro de 2018 a Setembro de 2019)
Fonte: http://transparencia.recife.pe.gov.br Elaboração: Mandato Vereador Ivan Moraes
GASTOS POR VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO (Outubro de 2018 a Setembro de 2019)
O estudo sobre as despesas da Prefeitura do Recife com propaganda nos últimos 12 meses mostrou que, dos R$ 40,8 milhões gastos, R$ 35,7 milhões foram para pagamento da veiculação das campanhas em tvs, rádios, jornais impressos, blogs e outros meios. Dentre os veículos, há grande concentração de pagamentos para veículos de mídia comercial de grande porte da cidade, pertencentes a um pequeno grupo de grandes empresários, como a TV Globo, TV Tribuna, TV Clube e TV Jornal do Comércio. Destaca-se o fato de mais de R$ 12 milhões terem sido destinados apenas para os cofres da TV Globo.
Fonte: http://transparencia.recife.pe.gov.br Elaboração: Mandato Vereador Ivan Moraes
Por outro lado, não há registros no Portal da Transparência de pagamentos a veículos de comunicação independentes, comunitários ou populares. Ou seja, a Prefeitura do Recife não reconhece a extensa rede de comunicação existente na cidade, nos grupos independentes, nas periferias, por toda parte e não acredita na potência de alcance da diversidade de seus veículos alternativos, como rádios comunitárias, rádios poste, blogs, cineclubes, “anuncicletas”, teatro de rua e tantos outros.
CONSIDERAÇÕES Esse estudo foi fortemente motivado pela conquista da disponibilização dos gastos com publicidade da Prefeitura do Recife, após dois anos de forte incidência de nosso mandato, com a mobilização dos diversos agentes que lutam pela transparência e democratização da comunicação e a atuação do Ministério Público de Pernambuco (MPPE). Ver cumprida a Lei Federal 12.232/2010 nos deu um sentimento de acesso ao direito, sobretudo à informação pública, através da transparência ativa já prevista na Constituição Federal, que faculta ao cidadão e à cidadã o acesso. E, assim, conseguimos acessar os números, os valores, quem recebeu, a que se destinou cada campanha e os respectivos recursos. Ou seja, do ponto de vista da transparência, avançamos, mesmo que ainda com limites, como vimos no quesito da acessibilidade comunicacional para pessoas cegas e com baixa visão, ou para aquelas surdas ou ensurdecidas. Mas o que o acesso às informações mostrou foi que, em relação à democratização da comunicação, os limites são gigantescos. A começar pelos gastos totais que alcançam a cifra dos R$ 40,8 milhões, diante da precarização dos serviços públicos municipais e da infraestrutura da cidade, ou mesmo diante da limitada capacidade de investimento verificada no período: pouco mais de R$ 94 milhões. Os gastos com publicidade da Prefeitura do Recife não promovem a democratização da comunicação, pois as campanhas priorizam propagandear os feitos da gestão, o que interessa a muito menos pessoas que as campanhas educativas que, de fato, podem orientar a população em relação aos direitos e aos serviços públicos. A prevenção ao HIV/AIDS, às Hepatites, os cuidados com o mosquito da dengue, as orientações para o tratamento da tuberculose, orientações massivas quanto ao destino do lixo e os cuidados com as águas, por exemplo, são temas importantes para a população e para os quais não há as milionárias campanhas. A política de comunicação da Prefeitura do Recife é excludente, porque não incorpora quem faz comunicação na cidade de forma independente, quem está no meio comunitário e popular. Como visto neste documento, os gastos são concentrados nos grandes oligopólios da mídia, nas redes comerciais e seus agentes locais. A situação da falta de acessibilidade comunicacional para pessoas cegas ou surdas é inadmissível diante dos valores desembolsados para as campanhas publicitárias. A supervalorização dos meios digitais de difusão da informação (portal da transparência, página da web, aplicativos, etc) são importantes, mas não são suficientes para alcançar a população que ainda
prescinde de um computador ou celular, e uma internet capazes de facilitar o acesso às informações nesses meios. Além disso, a navegação e os conteúdos são complexos e ininteligíveis para a quase totalidade das pessoas. É nesse sentido que reafirmamos a necessidade de democratizar os gastos com publicidade da Prefeitura do Recife. Parte desse recurso, hoje usado exclusivamente para comunicação estatal, precisa ser direcionado para a comunicação pública. O que, de fato, for destinado à publicidade da Prefeitura, precisa ser prioritariamente direcionado para campanhas educativas, diversas, nos temas que mais afetam as pessoas sem informação. Além disso, a veiculação precisa ocorrer com uma maior pluralidade de campanhas e formatos, permitindo que a diversidade de veículos de comunicação se encarregue de levar a informação até aonde ainda não chega. Esses limites foram explicitados através desse estudo sobre os “Gastos da Prefeitura do Recife com Publicidade entre outubro de 2018 e setembro de 2019”, pois seus números mostram que não há democratização da política de comunicação da gestão municipal. Em lugar disso, há exclusividade para a mídia comercial, prioridade para a propaganda da gestão, concentração de recursos em poucas e milionárias campanhas, exclusão de muita gente que faz comunicação, negação de acesso e acessibilidade à informação. Mas tem coisa boa, sim. No entanto, é preciso que a política de comunicação da Prefeitura do Recife seja boa toda, com a destinação de parte significativa dos recursos para a comunicação pública não-estatal, com maior distribuição de recursos entre diferentes temas e formatos de campanhas, com contratação expressiva de veículos independentes, comunitários e populares, com maior acesso e acessibilidade para todas as pessoas. É isso que continuaremos perseguindo, juntamente com quem luta pelo Direito à Comunicação e com quem defende a transparência e quer saber #praondevaionossodinheiro?