Jornaleco 315 01 jan 2009

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Aimberê Araken Machado

Lony Rosa

lonyrosa@hotmail.com

Um Natal diferente

Os desclassificados de 2008

O fato que vou narrar aconteceu na véspera do Natal de 1983, em Curitiba. Eu havia sido removido, em setembro, da Direção Geral do Banco do Brasil, em Brasília, para o Centro de Processamento de Dados de São José dos Pinhais (PR). Como é sabido, esta cidadezinha fica a 17 quilômetros de Curitiba. Por isso, instalei-me num apartamento na rua Souza Naves, no bairro Cristo Rei, sozinho e devidamente divorciado. De certo modo, considerava-me feliz, após a dissolução de um casamento absolutamente inviável. No dia 24 de dezembro, à tarde, a cidade agitava-se, docemente, para a noite de Natal. Saí, lampeiro, para a rua XV de Novembro, e me vi, de repente, na Boca Maldita. Tomei, ali, o costumeiro cafezinho. Depois, senteime no “Bar do Cachorro”, ao ar livre, para comer alguma coisa. Pedi o cardápio; escolhi. Dali a pouco, foi-me servida a comida, num imenso prato. Repasto exagerado – pensei eu –, não vou dar conta... Ia passando um garotinho pobre, e eu o convidei para sentar à mesa. O garçom olhou-me, severo, com jeito de reprovação, e explicou que não seria permitida a presença do menino. Redargui – já meio exaltado – que tal regra era absurda, e me mantive firme em meu ponto de vista: ou o garoto ficava, ou eu me retiraria. O garçom fincou pé, irredutível em sua exigência. Por isso, paguei a despesa e saí. Antes, porém, ordenei, rispidamente, que ele acondicionasse a comida – entregando-a, em seguida, ao garoto. O incidente deixou-me arrasado, irritado... e com fome. Andei, sem rumo, alguns minutos – não lembro quantos. Sentia-me com raiva, extremamente agitado, a cabeça estourando. Pensei em voltar, em dizer alguns desaforos para o garçom. De repente, um homem cutucou-me nas costas. Voltei-me, assustado. Ele trazia pela mão o mesmo menino, sorridente, com os olhinhos negros brilhando de felicidade. O pai agradecido abraçoume, balbuciou algumas palavras de agradecimento e se foram, os dois. Aquilo funcionou como um calmante, uma bênção – lavando-me a alma. Até esqueci a fome por algum tempo (só comi uma hora depois). Lembrei-me, então, de meus filhos – lá em Floripa –, e lhes desejei, intimamente, um FELIZ NATAL.

2008 agonizou lentamente. As desgraças que assolaram o país custam a desaparecer, como um longa-metragem de terror rodado em slow motion. As veias dos céus continuam abertas e as manhãs ensolaradas estão custando a chegar. A meteorologia parece fazer um jogo de pula-pula: quando as chuvas cessam de um lado, depois de registrar o desespero dos atingidos; quando se pensa que vai haver uma trégua, ela reinicia suas atividades catastróficas numa outra banda, semeando o pânico e deixando os governos sem uma reação eficaz. Quando se apercebem da situação já é tarde demais. Mortos, desaparecidos, feridos, desalojados, flagelados, e a sensação de perda e impotência são a cara do Brasil. Paralelamente a esse movimento de caos que poderia ser menos doloroso se uma infra-estrutura inteligente, competente e ágil entrasse em ação durante as enchentes, temos outros desastres acontecendo em alguns setores dessa pátria. Alguns dos desclassificados de 2008: A renovação do mobiliário dos apartamentos dos deputados em Brasília – já falei disso num outro momento – no montante de quase dois milhões de reais, decisão tomada em pleno dilúvio catarinense, é digna do Guiness; maldade dessa monta só o flagelo de Cristo. O roubo dos mantimentos doados por todos os brasileiros que se comoveram com a tragédia, registrado por uma câmara indiscreta, mostrou que vários crápulas estavam praticando o crime “numa boa”, mostrando que aquela frase da grande profeta falsamente platinada, Marta Suplicy, “relaxa e goza”, pode ser aplicada também em casos de enchentes. O presidente de um tribunal de justiça e todo o seu staff presos por tentar driblar as leis não comove mais ninguém. É a raposa cuidando das galinhas. É Ali Babá, com cada vez mais ladrões em sua “quadrilha”. Mas segundo decisão de um ministro do Tribunal de Justiça, foram todos soltos, porque já prestaram depoimento, enriquecendo o rol dos desclassificados de 2008. É esse o parque de diversões dos graúdos, gente sem qualquer lembrança do que sejam valores, e sem o mínimo de escrúpulos, que movimentam as engrenagens de seus carrosséis à custa de quem padece. Estão querendo ampliar as câmaras municipais, no seu quadro de vereadores, como se já não bastasse a incompetência de uma maioria que está aí, ociosa, inculta e sem direção. Quais são as referências atuais para os cidadãos brasileiros? São esses homens e mulheres sarcásticos, gozadores da miséria de outros? Apostar em quem? Confiar? É possível ainda usar esses verbos no sentido real? Ou ficarão apenas nos livros e dicionários de verbetes antiquados, utópicos e esquecidos como a Atlântida? Para 2009, devemos renovar os votos de um ano “bom”? Pedir um “melhor”? Melhor para quem? É muito difícil acreditar num futuro mais justo. Infelizmente, a justiça não só tarda, mas também falha.

ISMAEL ULYSSÉA (in memoriam)

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ARARANGUÁ, 1º DE JANEIRO DE 2009 • ANO 15 • Nº 315

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© Ricardo Francisco Gomes Grechi

(reg. nº 99866 - prot. 4315/RJ, de 17/07/1995)

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88900.000 Araranguá - SC - Brasil jornalecocultural@yahoo.com.br

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ARARANGUÁ v i s i t e : w w w. a r a r a n g u a . n e t

“O melhor time de futebol de praia do Arroio do século 20”. (Ismael Ulysséa)

Muitos concordarão com o Ismael Ulysséa [falecido em novembro de 2008] quando ele anuncia [para o Jornaleco 126, de 16 de fevereiro de 2001] este time como o melhor do século 20 nas areias do Arroio do Silva. Mas é natural que existiram outros tão bons (ou quase, né, Ismael?). De qualquer maneira, essa “seleção” será insuperável em vários aspectos, como, por exemplo, na formação das equipes, que jogavam com onze jogadores, quando hoje só se vê nas areias o futebol-sete. Na foto, no Balneário Arroio do Silva dos anos 1970, de pé: Cláudio Coalhada, Berto, Navalha, Mário Canela, Luis Carlos e Leoberto (“mascote”); agach.: Ismael, Ênio, Tatavo, Pedroca, Abílio (Bombrilho) e Keka. Ao fundo, as casas de madeira à beira-mar, sobre palafitas, mantinham as areias. (RG)

A marca do seu parceiro de estrada

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1º/01/2009 • ANO 15 • Nº 315

Feliz 2009

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Faleceu Ismael, o mais jovem dos irmãos Ulysséa, com apenas 57 anos. Último filho do Dr. Ramiro Cabral Ulysséa e de D. Aurora Casagrande Ulysséa, Ismael fez brilhante carreira acadêmica. Doutorou-se na Inglaterra, e foi competente e estimado mestre na Universidade Federal de Santa Catarina. Tinha o temperamento equilibrado que caracteriza a família Ulysséa, estirpe com a qual sempre mantive calorosa amizade (desde os tempos de curso primário, no Grupo Escolar Castro Alves, quando fui colega de classe da Verônica e do Gilberto). Nem quero relembrar – até mesmo por absoluta impossibilidade emocional – os últimos tempos da agonia do Ismael. Foi uma fatalidade, esta que roubou sua vida, pois ele estava em plena produtividade e vigor intelectual. A última conversa que tivemos foi no centro de Florianópolis. Ainda não tinha conhecimento da doença que o acometia. Falamos a respeito do Evilásio, seu irmão. A Rosane Bacha desabafou-me, emocionada, seu pesar pela morte do Ismael. Ela foi colega de juventude dele. Lembrou sua doçura, sua delicadeza, seu perfil humano correto e exemplar. ADEUS, ISMAEL!

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