Enfoque Vila Brás 149

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ENFOQUE VILA BRÁS

SÃO LEOPOLDO / RS

NOVEMBRO DE 2014

EDIÇÃO

149

INSEGURANÇA MUDA ROTINA MORADORES USAM A CRIATIVIDADE PARA SE PROTEGER. PÁGINA 13

PRAÇA

TAINÁ HESSLER

Ausência de estrutura prejudica o lazer

RISCO NA CONSTRUÇÃO

FALTA DE CONSCIENTIZAÇÃO COLOCA VIDAS EM PERIGO PÁGINA 15

Página 3

DO

RUDINEI MACHA

FUTEBOL Crianças se arriscam por um sonho Página 6

IDOSOS

JÚLIO HANAUER

Amadurecer de modo saudável Página 11

OTTO BELISA LAZZAR

DANÇA Comunidade movida pela música Página 7

ENQUETE

ANA FUKUI

Olhares sobre o bairro

Páginas Centrais NATHALIA FEIJÓ

FUTURO

Página 16

BETINA VEPPO

Como será o amanhã


2. CLIQUE

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

ASSEMBLEIA

ATRAVÉS DE UM OLHAR

Associação convoca moradores

CAROLINA SCHAEFER

O presidente da Associação de Moradores da Vila Brás, Cleber da Silveira, convida todos os moradores da Vila Brás para assembleia extraordinária a ser realizada no dia 24/11/2014, segunda-feira, às 19h30, na Avenida Leopoldo Wasun, 984. Na oportunidade, será votada a redução do período de mandato da diretoria, de três para dois anos. Também será examinada a modificação do estatuto. Os interessados em participar deverão levar um comprovante de residência.

CORREÇÃO Na edição 148, a foto da seção Clique, na página 2, foi publicada com o crédito errado do fotógrafo. A autora correta da imagem é Bruna Mattana.

A cumplicidade entre Helena e sua cachorrinha Nina é evidente na troca de olhares. Captado pela sensibilidade da fotógrafa Carolina Schaefer, a imagem retrata um carinho verdadeiro entre a menina e seu animal de estimação.

- ÂNGELO DAUDT

RECADO DA REDAÇÃO

Por mais de uma década, muitos repórteres, editores, fotógrafos e professores percorreram a Avenida Leopoldo Wasun e seus arredores para contar uma história: as infinitas histórias do que é a Vila Brás, de quem vive nela e do que ela representa. Uma parceria de longos anos que se encaminha para o fim de uma jornada. Esta que continua, mas de cara nova, com um formato diferente, cheia de desafios e muitas conquistas. O que se registrou nesse período, nos inúmeros sábados em que os alunos frequentaram a Brás, foram momentos de alegria, tristeza, esperança, superação, sonhos e vontade de mudança. Com o olhar e percepção peculiares, no formato de texto e imagem, fica o legado em forma de jornal, as histórias dos moradores daquela vila de São Leopoldo, que acolheu a Unisinos e seus representantes, abrindo as portas, deixando que cada aluno entrasse na sua casa e soubesse um pouquinho mais de suas vidas. A última edição está com gostinho de quero mais. Daquela rotina que não deixaremos para trás. Foram anos de aprendizado, de convivência. E de problemas que se repetem. Mas também está registrado aqui, a comemoração do progresso de todo esse tempo de luta. Nas próximas páginas, você vai conhecer o universo das brincadeiras. Das lembranças de como brincar é bom. Dos momentos de lazer da comunidade, que mesmo provendo de pouco, faz muito para garantir o prazer de estar reunido com a família, com os amigos em momentos de diversão. E nada disso seria possível se não pensarmos no meio mais seguro de se viver. É outro assunto que tratamos aqui. Como a comunidade se sente neste aspecto, o seu modo de proteção, do que já conquistaram e da segurança que esperam no futuro. Como diz a música do Jota Quest: “Vivemos esperando dias melhores. Dias de paz, dias a mais, dias que não deixaremos para trás”. Dias melhores para sempre, com cara de saudade, da mudança, do crescimento. Que venham mais dez, vinte, um milhão de anos para a Brás continuar se superando. Foi bom estar com vocês, registrar suas vidas, uma parceria que acaba no papel, mas fica guardada no coração de cada um que teve a oportunidade de não contar apenas uma história, mas de também vivê-la. Fica aqui o nosso até breve! Muitos abraços e ótima leitura.

- JOANA DIAS EDITORA-CHEFE

ENFOQUE VILA BRÁS

O Enfoque Vila Brás é um jornal experimental dirigido à comunidade da Vila Brás, em São Leopoldo (RS). Com tiragem de mil exemplares, é publicado a cada dois meses e distribuído gratuitamente na região. A produção jornalística é realizada por alunos do Curso de Jornalismo da Unisinos São Leopoldo.

FALE CONOSCO (51) 3590 8463

Avenida Unisinos, 950 - Agexcom/ Área 3 - São Leopoldo/RS

enfoquevilabras@gmail.com

DATAS DE CIRCULAÇÃO 147

13 / 09 / 2014

148

04 / 10 / 2014

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NOVEMBRO

LEGENDAS - REPÓRTER

FOTÓGRAFO

EQUIPE REDAÇÃO – Redação Experimental em Jornal e Jornalismo Cidadão – Orientação: Luiz Antônio Nikão Duarte. Edição e Reportagem: Ângelo Daudt (fotografia), Audrey Lockmann Barbosa, Bruna Arndt, Eduardo Friedrich, Gabriela Boesel, Giovana Peinado, Joana Dias (chefia), Maurício Wolf, Natália Dalla Nora, Natália Mingotti e Sabrina Martins. Reportagem: Aline Casiragui, Camila Mayuri, Carolina Chaves, Cassio Pereira, Daiane Trein, Daniela Flores, Douglas Ripel, Fabricia Bogoni, Felipe Gaedke, Felipe Gaedke, Gabriela Clemente, Guilherme Neis, Izadora Meyer, Júlia Bondan, Juliana Borba, Karina Sgarbi, Karoline Cardoso, Luísa Venter, Matheus D’Avila, Méurin Fassini e Pedro Kessler. FOTOGRAFIA – Fotojornalismo – Orientação: Flávio Dutra. Fotos: Ana Fukui, Aline Santos, Beliza Lazzarotto, Betina Veppo, Bruna Mattana, Bruno Lois, Carolina Schaefer, Daniela Tremarin, Elizangela Basile, Fernanda Forner, Guilherme Ricardo, Graziele Iaronka, Jéssica Schaefer, Júlio Hanauer, Maria Ximena, Nathalia Feijó, Paola Sartori, Richard Bruno, Rudinei Machado, Tainá Hessler, Victória Freire e William Mansque. ARTE – Agência Experimental de Comunicação (Agexcom) – Projeto gráfico e arte-finalização: Marcelo Garcia. Diagramação: Gabriele Menezes. IMPRESSÃO – Grupo RBS. Tiragem: 1.000 exemplares. Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS. Avenida Unisinos, 950, Bairro Cristo Rei - São Leopoldo/RS. Telefone: (51) 3591 1122. E-mail: unisinos@unisinos.br. Reitor: Marcelo Fernandes de Aquino. Vice-reitor: José Ivo Follmann. Pró-reitor Acadêmico: Pedro Gilberto Gomes. Pró-reitor de Administração: João Zani. Diretor da Unidade de Graduação: Gustavo Borba. Gerente de Bacharelados: Gustavo Fischer. Coordenador do Curso de Jornalismo: Edelberto Behs.


DESLEIXO .3

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Praça enfrenta condições precárias

à Moradores reclamam da

TAINÁ HESSLER

falta de estrutura e do abandono do local

A

as que sempre viveram no bairro e que acompanharam a construção do local e a sua utilização inicial. A auxiliar de limpeza Andreia da Silva, 30 anos, e a técnica de enfermagem Carla Alves, 35, levam os filhos Vitor, 5 anos, e Leonardo, 4, para brincar. Elas contam que quando a praça foi inaugurada, há cerca de sete anos, a estrutura obviamente era melhor, e com isso era possível aproveitar mais o

espaço. “Eu fazia caminhadas com as minhas amigas, vinha aqui para tomar chimarrão, mas agora não tem mais segurança para isso.” Andreia relata um fato que marcou a insegurança no local. Há cerca de dois anos, um morador da vila foi morto quando estava sentado em um dos bancos da praça. A dona de casa Andrea Pereira, 41 anos, moradora do bairro há 27, sugere uma medida que poderia

ajudar no aumento da segurança. “Um dos problemas é que não há ninguém para cuidar desse lugar. Um simples zelador ajudaria bastante a controlar o movimento por aqui”. Ela afirma que nunca viu nenhum tipo de briga ou assalto dentro da praça, mas admite que não é um local seguro. Apesar disso, não deixa de levar as filhas Vitória e Stefani para utilizar os brinquedos do

CRIATIVIDADE

GRAZIELE IARONKA

importante a participação dos moradores da Vila Brás nas plenárias que ocorrerão em 2015, pois quanto mais pessoas se mobilizarem para defender essa demanda, maior a chance dela ser contemplada. Mais informações sobre o OP podem ser obtidas com a Prefeitura de São Leopoldo através dos telefones 3526 5400 e 35265401.

- DANIELA FLORES

Crianças da Vila se divertem no espaço idealizado por Racort

à

rua fechada para jogar futebol. “Trago meus primos Saimon, 5 anos, e Rian, de 3, para os brinquedos e jogo bola com o Alan”, conta Carlos. Racort, idealizador dos brinquedos e da goleira, é cauteloso com a segurança das crianças, e, além da colocação dos cones na rua, plantou algumas árvores para impedi-las de se aproximar do arroio. O comerciante se diz desencorajado para procurar ajuda pública. “Temos um vereador morando aqui perto, mas ele nunca se mostrou atento às dificuldades que enfrentamos para dar lazer para as crianças.” Racort também relata que nunca se preocupou em procurar a prefeitura, pois acredita que não receberá atenção. Em nota, a prefeitura de São Leopoldo diz que demandas como esta devem ser reivindicadas pela população nas plenárias do Orçamento Participativo, onde a comunidade de cada região aponta suas necessidades. Portanto, para que a reforma da praça ocorra, é

Bancos destruídos e brinquedos depredados são o que restou da praça

- DOUGLAS RIPEL

INFÂNCIA

Parque improvisado A falta de uma praça infantil estruturada no bairro não impede que a crianças brinquem graças à criatividade do comerciante Rodrigo Racort, 46 anos. O trabalho manual dele, um escorregador, uma mesa gigante e um pneu enterrado no chão faz a alegria da criançada da Rua 10. Racort já fez pesquisas de preços para melhorar o parque improvisado: “Procurei brinquedos em diversos lugares, mas os preços me fizeram desistir”. A habilidade do comerciante e a satisfação que sente ao ver as crianças se divertindo são os estímulos que ele usa para se colocar à frente de algumas ações que poderiam ser implantadas pelo município. Sua maior motivação, porém, está no filho Wesley, de 17 anos, acometido pela paralisia infantil. “Ele brinca no escorregador até cansar”, conta o pai orgulhoso. Crianças de diversas idades aprovam a iniciativa de Racort. Carlos Eduardo Sarath eAlan Henrique de Lima, ambos de 10 anos, aproveitam a

espaço. Andrea lamenta o baixo número de eventos realizadas lá, lembrando de algumas atividades que o local havia recebido. “Aqui na praça costumava ter cultos religiosos e também as festas do Dia das Crianças. Inclusive tivemos um show em um Natal. Ultimamente é difícil eles fazerem alguma coisa aqui”.

à

estrutura precária e a insegurança são os principais fatores que dificultam a utilização da única praça pública da Vila Brás. Os moradores do bairro lamentam a falta de cuidados com o local, e apontam para a necessidade de uma reforma. A estudante Ângela dos Santos, 17 anos, mora ao lado da praça há cerca de um mês, tempo suficiente para presenciar a realidade vivida no local. “Aqui não tem muita coisa, os brinquedos são velhos, vários bancos estão quebrados e o mato quase sempre está bem alto. Agora está assim porque faz pouco tempo que vieram aqui cortar.” Além do problema de estrutura, a jovem aponta para outra preocupação mais séria. “Outro dia a polícia veio aqui na entrada da praça e levou um guri que estava vendendo drogas.” De acordo com Ângela, durante o período da noite, um número considerável de jovens fica reunido na praça, conversando em pequenos grupos, mesmo não usando o local especificamente para atividades de lazer. A condição atual da praça desmotiva as pesso-

Imaginação como passatempo O quintal vira uma cozinha e uma caixa se transforma em avião. É dessa forma que as crianças costumavam brincar antes da tecnologia invadir os lares. Mas na Vila Brás essa realidade – que tem como maior e melhor ferramenta a imaginação – continua presente. Lucas, de 3 anos, ergue um pedaço de madeira e afirma: “A minha espada é a mais legal de todas”. E é dessa forma que os finais de semana são levados pelas crianças do bairro, cheio de criatividade. Arthur, 5 anos, também não perde tempo. A mãe, Patrícia dos Santos, fala que as crianças da rua costumam montar goleiras e jogar futebol no local, mas que, por enquanto, não deixa Arthur participar, pois acredita que ele ainda não tem idade para sair sozinho. Por isso, munido de alguns brinquedos, Arthur faz o pátio de casa virar uma grande estrada, na qual os carros e caminhões se movem.

A rua J, ou rua Três Marias, a mesma de Arthur, vira uma escolinha quando as primas Emily, Isabeli, Iasmin, Jociele, Camile e Jordana se reúnem. Por ser sem saída, as meninas, que têm entre 3 e 11 anos, improvisam tudo no meio da rua, montando a mesa com tijolos e alguns pedaços de madeira e não deixam que nada estrague a brincadeira. Elisângela Flores, mãe de Isabeli, conta que elas se reúnem todos os dias no fim da tarde para montar a escolinha. “Elas brincam que nem antigamente, as crianças já não querem mais isso, mas elas continuam a brincar que nem a gente brincava, usando a imaginação”, ressalta. Camile ajuda as menores no final, que ainda não sabem escrever o próprio nome, e avisa: “Quando eu crescer, quero ser uma professora de verdade”.

- IZADORA MEYER


4. ALTERNATIVA

Distração, só fora do bairro Poucos brinquedos que restam dividem espaço com lixo

à

as à Devido condições

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FERNANDA FORNER

precárias da única praça do bairro, moradores buscam alternativas para aproveitar o tempo livre

A

Praça da Paz deveria ser uma área de passatempo para os moradores da Vila Brás. Entretanto, basta ir até o local para perceber que as condições apresentadas estão longe de oferecer diversão. Localizada próxima à Avenida Leopoldo Wasun, é o único espaço público do bairro e, para muitos moradores, a única alternativa de lazer. Antes das depredações, a praça era conhecida por ser ponto de encontro de amigos e vizinhos e por reunir famílias nos finais de semana. Diferente de quando foi inaugurada, hoje a área parece estar abandonada. Dos brinquedos instalados, há apenas um balanço – os outros não estão mais lá –, uma gangorra e um escorregador. Os bancos quebrados dividem espaço com poças, lixo e o matagal que já toma conta. Além dessas condições, outro fator que distancia os moradores da praça é a constante presença de usuários de drogas. “Eu e minha família deixamos de ir lá porque sempre tem alguém usando algum tipo de droga. Tenho medo e isso não é uma situação boa pro meu filho

estar presenciando”, conta um morador. Por outro lado, há quem relembre que, antes das depredações, a praça era motivo de diversão e de união entre os vizinhos. “Logo que arrumaram, o povo se uniu, montou time de vôlei, todos participavam”, lembra a comerciante Diná Mousquer. ALTERNATIVAS DE LAZER Com poucas opções de entretenimento no bairro, cada morador encontra uma forma de diversão para o tempo livre. O Enfoque conversou com algumas dessas pessoas para saber qual a solução que elas encontraram para a situação.

- SABRINA MARTINS

l “Ali na praça tem bastante água, mato e lixo, mas mesmo assim, às vezes, eu vou lá jogar bola com as piazada. Quando dá, eu levo minha filha lá na praça da Scharlau, mas como é meio longe, não vamos sempre.”Carlos Oliveira, auxiliar de produção, 31 anos

l “Na praça nós não vamos e eu acabo ficando por casa mesmo. Estudo à noite e aproveito os passeios que fazemos com o colégio. Já fomos para o Gasômetro, em Porto Alegre. Outra coisa que eu faço para sair de casa e é ir à igreja.” Olívia de Araújo, dona de casa, 56 anos

l “A mãe diz que é perigoso ir na pracinha, aí eu jogo bola, pulo corda, brinco de mamãe e filhinha tudo aqui no pátio. Eu gostaria que lá tivesse uma casa na árvore.” Katieli Costa, 9 anos

RARIDADE

Animal de estimação atrai olhares curiosos ovelha Bolly para passear pelas ruas da Brás. “Quando levamos ela para passear no Acampamento Farroupilha, no Bairro Feitoria, em São Leopoldo, todos que passavam por ela se admiravam por eu tê-la como um animal de estimação”, diz. A ovelha é a diversão não só de Maísa, como também de seus irmãos, Matheus Pereira, de 9 anos e Guilherme Pereira, de 15 anos. “Minha mãe comprou a Bolly para mim em uma Chácara de Montenegro, quando ela ainda tinha apenas dois meses e meio de idade. Ela dorme comigo na minha cama e eu e meus irmãos damos leite pra ela na mamadeira”, destaca. No início, a convivência de diferentes animais, como gatos, cachorros, patos, galinhas e a ovelha Bolly foi complicada, mas com o tempo eles se acostumaram e hoje dividem o mesmo espaço pacificamente.

A alegria de Maísa é evidente quando o assunto é sobre sua ovelha de estimação Bolly

à

Ovelha Bolly faz sucesso entre os moradores da Vila Brás. Maísa Yasmin Pereira, 11 anos, tem vários animais de estimação. Entre eles, há quatro gatos, cinco cachorros e uma ovelha, com apenas quatro meses de idade. Bolly, como foi batizada, chama a atenção de todos os moradores da Vila Brás. “Quando as pessoas a enxergam, precisam olhar duas vezes para descobrirem se é mesmo uma ovelha ou se é um cachorro poodle, como ela se parece”, conta a menina, com um sorriso nos lábios. Quando Maísa não tem aula na Escola João Goulart, onde cursa o 5º ano do Ensino Fundamental, em seus momentos de lazer, ela participa de apresentações de dança em diferentes lugares espalhados pela região metropolitana, com o grupo “Explosão da Dança”, ou então leva sua

ALINE SANTOS

OVELHA DOLLY É A INSPIRAÇÃO DE MAÍSA De acordo com a veterinária Ursula Moroni, o fato de a criança interagir com um animal sempre se torna positivo, devido ao apego que esse sempre tende a desenvolver pelo seu dono. Além disso, também é bom porque a criança desenvolve noções de cuidados, como

com a alimentação, o abrigo, a higiene, entre outras. “O ideal é que a criança tenha animais de estimação a partir dos 5 anos de idade, pois nesta fase, a criança já aprendeu a diferenciar o que é carinho do que é maltrato”, afirma.

- BRUNA ARNDT

O nome da ovelha de Maísa foi inspirado na Dolly, aquela que foi clonada em 1996. Este procedimento foi realizado por pesquisadores do Instituto Roslin, da Escócia, a partir do núcleo de uma célula das glândulas mamárias de uma ovelha adulta, da raça Finn Dorset (cabeça

branca), que foi transferido para um oócito com núcleo removido de uma fêmea da raça ScottishBlackface (cabeça preta). Outra ovelha de cabeça preta gerou Dolly, que viveu 10 anos, quando precisou ser sacrificada, em 2003, por ter adquirido uma infecção pulmonar incurável.


INTEGRAÇÃO .5

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Horas vagas para convivência

rua ou em à Na casa, a ideia é

se divertir com os amigos

A

falta de locais adequados para o lazer dos moradores é um dos antigos problemas da Vila Brás. Apesar da falta de recursos é comum encontrarmos crianças brincando juntas na rua. Nem televisão, nem videogame, tão pouco computador, aqui a preferência das crianças e dos pais é unânime: brincadeiras com os amigos. Futebol, pega-pega, bicicleta, bambolê, bonecas são as mais comuns. Com o cuidado redobrado os pais apoiam e incentivam as brincadeiras saudáveis e boa convivência entre os vizinhos. Aline Unzer, 24 anos, dona de casa, é mãe de João Vitor, 6, e de Kamlily, 4. Para ela lugar de criança é fora de casa, “descobrindo o mundo”. “Não sou favorável ao uso da tecnologia para eles se entreterem. Convivendo com outros, mesmo que de idades diferentes, eles aprendem bem mais e se desenvolvem melhor”, observa.

Na casa de Neusa Vargas Ramos, 34 anos, cozinheira, ver televisão só com a permissão dela, em horário adequado e não por muito tempo. Leonardo, 12 anos, e Davi, 8, já estão acostumados. Leonardo até gostaria de ter um computador, mas não troca a brincadeira na rua por nada. “A rua não é o local mais seguro, mas não tem outro espaço. A gente - os pais - acaba se reunindo também e aproveitamos para conversar enquanto cuidamos deles, alertando para os carros”, relatou. Para Guilherme Silva de Oliveira, 9 anos, o videogame é muito legal, mas, às vezes, perde a graça, principalmente se ele está sozinho. “Não é legal brincar sozinho, gosto de videogame, mas prefiro andar de bicicleta ou jogar futebol com meus amigos”, disse. A irmã de Guilherme, Stephanie Lima, tem 21 anos e convive com o mesmo problema da falta de opção para o lazer. Apesar da diferença de idade, Stephanie também prefere atividades ao ar livre e passeios do que as redes sociais. “Não tem nada pra fazer aqui no bairro, às vezes, vamos para

crianças interagem com família e vizinhos

o centro, mas eu prefiro Porto Alegre, lá há muitas opções. Quando não dá pra sair o jeito é se reunir com as amigas, olhar um filme, conversar, tentar se divertir”, conta. O bairro conta apenas com uma praça que além de não oferecer muitos recursos está em péssimas condições. Bancos e brinquedos quebrados, grama alta, lixo, área alagadas, entre outros problemas acabam dificultando que moradores frequentem o local.

- NATÁLIA MINGOTTI

POSSIBILIDADE

Belchior Marques Goulart, ela tem, no entanto, contato semanal com a tecnologia em aula e não tem vontade de ter um computador agora: “Só na escola já está bom, em casa eu posso fazer outras coisas”, conta a menina. Entre suas brincadeiras preferidas, está se maquiar em frente ao espelho, brincar de bonecas e de escolinha com as amigas. “E na nossa escolinha de faz de conta também não tem computador, nós brincamos de pintar e de aprender a escrever. Eu gosto de ser a professora”, explica Julia. Ela ganhou dos padrinhos um quadro negro e uma caixa com giz, indispensáveis na escolinha improvisada na garagem da casa. Quando não está chovendo, Julia também gosta de brincar de pega-pega. Ela se considera feliz por ter brinquedos e amigos. No computador da escola, segundo ela, todos ficam só digitando e olhando para a tela e eles não brincam muito como fazem no recreio, analisa a jovem.

- GABRIELA BOESEL

VALORIZAÇÃO

Computador não faz falta para irmãs As novas tecnologias ainda não fazem parte da rotina das crianças da Vila Brás. Na família das irmãs HelenaAzevedo da Silva, 7, Gabriela Azevedo da Silva Azevedo, 9, e MariaAliceAzevedo da Silva, de 11 anos não é diferente. Sem computador, a diversão fica por conta das atividades no pátio da casa onde moram. Mesmo com aulas de informática na escola, elas ainda preferem brincar de boneca, de pega-pega, de esconde-esconde. A única tecnologia que elas têm disponível é o celular que, por muitas vezes, fica de lado para dar espaço às brincadeiras com os animais de estimação, duas cachorrinhas e dois porquinhos da Índia. Elas ainda se divertem com o mais novo brinquedo da casa, uma minicozinha que fica no quarto compartilhado, onde as três brincam de preparar comidas. As meninas, juntamente com seus pais, moravam no interior de Ijuí, onde tinham mais áreas externas para brincar. “Elas estavam acostumadas a brincar na rua, mas aqui elas brincam mais dentro de casa, mesmo“, explica a mãe Patrícia, que trabalha para uma família no município de Estância Velha. O pai João Carlos, que é segurança e trabalha durante a noite, cuida das crianças no período da tarde.

Helena, Gabriela e Maria Alice se contentam com brinquedos e animais em casa

à

Garotada se diverte sem tecnologia Com 12 anos, Leonardo Vargas Ramos diz que adora jogar na Internet. Mas sem computador em casa, o menino tem acesso somente quando está na escola, durante as aulas de informática. Mesmo com os jogos virtuais sendo sua atividade preferida, ele não sente falta da tecnologia no dia a dia: “Ah, prefiro jogar bola na rua!”, ressalta. Apesar de ser uma das brincadeiras mais tradicionais da infância, jogar bola na Vila Brás não é tão simples. Sem espaços adequados para a atividade, ele e os amigos costumam brincar na rua, na frente de casa. E entre um carro e outro, o jogo, que deveria ser uma diversão, acaba por se tornar uma perigosa e cansativa “brincadeira”. “A gente sempre tem que cuidar se vem carro, aí fica parando o jogo toda hora. E, às vezes, os carros nem param pra gente recolher a bola e sair da rua”, conta o menino. A falta de um computador em casa também é a realidade de Julia Moraes, de 9 anos. Estudante da E.M.E.F. João

à Independente da brincadeira,

GUILHERME RICARDO

CAROLINA SCHAEFER

Cientes da necessidade de um computador em casa para ajudar nos estudos das filhas, os pais, que hoje reformam a casa, querem dar um de presente para elas, mas as condições financeiras ainda não permitem. O pedido veio da mais velha, que está mais acostumada com a tecnologia, já que é a única das três filhas que possui um aparelho celular. Mas apesar de estar familiarizada com essas novidades, Maria gosta mesmo é de brincar de pega-pega: “É mais legal, porque é na rua”.

Helena, a mais nova, aproveita o tempo livre para brincar com os animais de estimação, e sua atividade preferida é dançar com a cachorrinha Nina. Já Gabriela adora pular corda: “É o que eu mais gosto de fazer”. Elas não sentem falta da tecnologia, pois a companhia dos pais e umas das outras é o suficiente. E o pai se orgulha em mostrar a união da família dentro de casa: “Elas são meus xodós, eu faço tudo por elas”, afirma ele.

- CAMILA MAYURI


6. DISPUTA

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Futebol divide espaço com os carros RUDINEI MACHADO

crianças jogam bola no meio da rua

A

ssim como muitos meninos brasileiros, Maikiel de Souza dos Santos sonha em ser jogador de futebol. Aos 11 anos, conta os minutos para o final da aula na Escola João Goulart para encontrar a bola, sua principal companheira. O problema é onde acontece esse encontro diário: sem um local adequado para praticar esportes, o menino acaba utilizando a rua onde mora na Vila Brás. Acompanhado de um vizinho, Maikiel passa horas batendo bola de um lado para o outro, dividindo espaço com os veículos que trafegam pelo local. “Quando a gente vê que tá vindo carro, o jogo para”, conta ele, enquanto mostra a bola surrada pelo atrito com o paralelepípedo da rua. O portão de uma das casas é utilizado como goleira. A cerca de 300 metros da casa de Maikiel está a chamada área de lazer da Vila Brás. Entretanto, os

espaços para a prática de esporte estão deteriorados e a insegurança toma conta dos moradores. “Minha vó não deixa a gente brincar lá”, conta. É comum ouvir relatos de outros moradores sobre consumo e venda de drogas na área de lazer. Pela televisão, Maikiel assiste jogadores desfilan-

do seu futebol por gramados impecáveis e sonha com uma partida em um local semelhante. “Aqui podia ter só umas goleiras. Nem precisava ter grama, podia ser areia mesmo”, reivindica. O motorista Maicon Murilo Santos, 21 anos, primo de Maikiel, também

se incomoda com a falta de um espaço para a prática esportiva. “A criançada joga na rua, mas não é certo. Rua é perigoso, é lugar de carro”, diz, enquanto observa os meninos correndo em frente à sua casa. Maicon, inclusive, feriu um dos pés recentemente, ao ignorar as recomenda-

EM FAMÍLIA

Chimarrão como convívio Costa, 58 anos, que cuida a semana toda do casal de netos de quatro anos, a ideia foi levá-los para participar da ação Escola Aberta, realizada todos os sábados à tarde na Escola João Belchior Marques Goulart. O programa incentiva a abertura das escolas aos finais de semana em unidades públicas de vulnerabilidade para promover atividades educativas, culturais e esportivas. “Eu comecei a levar eles no Escola Aberta e agoELIZANGELA BASILE

ra sempre querem ir. Lá eles jogam bola, brincam e usam a pracinha. Para adultos não tem atividades”, conta Gessi. Como fora da ação na escola as crianças não têm outro recurso, durante a semana e mesmo nos finais de semana que não participam do programa o jeito é Na falta de alternativas, familiares exercem a tradição como lazer

à

Estruturas típicas para o lazer, como parques, praças ou ciclovias, não são uma realidade na Brás. Cerca de 20 mil habitantes buscam, individualmente, atividades para ocupar o tempo livre. A roda de chimarrão tornou-se uma prática comum para as famílias que aos sábados pela manhã se reúnem na calçada em frente às casas. É o caso da família de Anajara da Luz, 46 anos, que afirma: “Não dá para ficar na praça, a população larga lixo lá, não há árvores com sombra, nem onde deixar as crianças”, diz ela, que mora há 30 anos no local com o marido Croaci Lima Cidade, 52 anos. “Tem que renovar a praça e colocar alguém para cuidar, porque se não logo as pessoas destroem”, completa ele. Para as crianças o problema da falta de atividades acaba parecendo maior. Entreter os pequenos de forma a mantê-los fora das ruas é uma atividade que requer criatividade por parte dos pais ou responsáveis. Na casa de Gessi Pereira

brincar em casa mesmo e no quintal. Maria Eduarda Timóteo Costa, 4 anos, gosta de brincar na areia do pátio da avó Gessi. Outra prática comum observada nas residências da Brás é a dos aparelhos de som em alto volume, em paralelo às movimentações de limpeza, incluindo varais cheios de roupas ao sol, aos sábados pela manhã. Opções diferentes, só fora da vila.

- GIOVANA PEINADO

Maikiel, de 11 anos, sonha em praticar o esporte nos campos exibidos na televisão

à

local à Sem adequado,

ções dos vizinhos e jogar futebol na praça da Brás. A teimosia resultou em um corte, provocado por uma das pedras depositadas no campo de terra. “É impossível jogar lá. Tem pedra, lixo, e o mato tomou conta”, conclui Maicon.

- CÁSSIO PEREIRA

ESPAÇO

Crianças sem locais recreativos Os moradores da Vila Brás reivindicam a implantação de espaços adequados para seus filhos, principalmente para a prática de esportes. O João Pedro, 3 anos, por exemplo, já anda de skate, patinete e bicicleta com a ajuda das rodinhas. No entanto, faltam locais para as atividades. “Temos que ir até o Centro para ele brincar”, afirma a mãe da criança, a técnica de eletromecânica Vanessa Thierru. Ela também comenta que a praça da Brás está sem condições mínimas. Já Márcio Siqueira, 12 anos, gosta de andar de bicicleta e, mesmo estudando na Escola João Goulart, joga futebol na quadra da escola Francisco Xavier. “A professora deixa a quadra aberta para a gente poder ir lá jogar depois da aula”, explica. Márcio está contente com as brincadeiras que tem à disposição na Vila

e, apesar de gostar de videogame, não possui um em casa, mas para isso ele tem uma solução. “Meu primo tem um, comprado do Paraguai. Às vezes, vou jogar na casa dele”, relata. Ao contrário dos meninos, Larissa Rodrigues, 12 anos, prefere os eletrônicos. A jovem mora na Brás com os pais e o irmão há cinco anos. A mãe, Alexsandra Rodrigues, comenta que a filha já abandonou as bonecas há muito tempo. “Ela tem de tudo: tablet, computador, videogame e bicicleta. Mas o que mais gosta de fazer é conversar com as amigas pelo celular”. Um dos motivos para a rotina caseira da menina está nos perigos das ruas. “A nossa via é muito movimentada. Não é adequada para brincadeiras”, diz Alexsandra.

- GUILHERME NEIS


MOVIMENTO .7

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

Dança mobiliza as famílias

embalo de à No diversos ritmos, a

mudança se configura nos palcos da vida

A

pós aguardar sua vez de ser chamada na fila de espera, no ano de 2009, para integrar o Grupo Explosão da Dança, Vanusa Chaves, 14 anos, estudante do oitavo ano do Ensino Fundamental, conta sobre como se inseriu e o que mudou na sua vida e nas de muitos que frequentam as aulas. “Eu não gostava muito de dançar, mas me inscrevi mesmo assim para participar. Ao fazer as aulas, mudei o pensamento que eu tinha sobre dança e passei a gostar disso”. Os moradores da Brás se envolvem com o grupo. O figurino dos dançarinos é composto por doações de toda a comunidade. Em uma sala da Igreja, as doações são recebidas por Maria Vilma, de 70 anos, que admira o grupo e ajuda na escolha das peças. “Aqui a gente recebe de todo o tipo de doações de roupas e sapatos. Eu já fui costureira e quando o pessoal da dança vem aqui, eu ajudo eles a escolherem as peças nas cores que a professora pede”, diz. Maria também conta que as roupas recebidas são vendidas para os moradores da Brás por valores entre R$ 0,50 a R$ 1, dependendo da peça e que as contribuições ficam para ajudar a Igreja. “Para o grupo de dança, é tudo doado, agora para a próxima apresentação deles, tem uma turma que tem que vir escolher peças nas cores azul e amarelo”, revela. “A partir das peças que a

gente ganha da Igreja, a gente monta o nosso figurino e também os cenários, que são feitos pelo coreógrafo Adriano Carvalho. Nós não compramos nada, todo o material usado pelo grupo nas nossas apresentações é feito por meio de doações”, conta a aluna Vanusa. Theresa Lencena se orgulha ao contar que os netos participam do grupo. “AEvelin, de 12 anos e o Gustavo, de 10, adoram participar da dança. Eles estudam de tarde e nos dias que eles dançam, a escola os libera mais cedo para participarem das aulas”, conta. “É lindo ver a apresentação deles, tu te encantas com o trabalho que é feito. O Gustavo refaz todos os passos em casa para me mostrar, é lindo de acompanhar”, revela a avó, orgulhosa. “Nós participamos de apresentações e competições de dança também. O espetáculo de final de ano será sobre desenhos animados, eu vou dançar em duas coreografias, a do ScoobyDoo e dos Flintstones. Vai ter também da Minnie e Simpsons no repertório”, comenta Vanusa. “Eu fiz muitos amigos e vi muita gente que saiu da rua, das drogas e hoje está no grupo dançando. A dança mudou completamente a minha vida e de toda a comunidade, pois as pessoas que estão aqui dançando têm vontade de estarem aqui, mudam o comportamento em casa e adquirem disciplina, a mesma que a gente precisa ter para dançar. Isso nos faz muito bem. Eu quero ser bailarina no futuro e estudar dança, para repassar isso para mais pessoas”, conclui a menina.

à Vanusa mostrando

BELISA LAZZAROTTO

alguns passos que pratica nas aulas

O GRUPO EXPLOSÃO O Grupo Explosão da Dança, criado em 2005, se mantém até hoje graças à força de vontade de seus fundadores, a professora e bailarina Graciela de Oliveira Souza e o marido - também coreógrafo - Adriano Teodomiro Guerra Carvalho. As aulas do grupo acontecem em uma sala cedida pela Igreja Comunidade Católica Cristo Operário

da Vila Brás, composto atualmente por 121 integrantes, de quatro até 30 anos de idade. O grupo é dividido em quatro turmas: pequenos (de 4 a 9 anos); intermediários (10 a 12 anos); médios (12 a 15 anos); e grandes (16 a 30 anos). Os ritmos abordados nas aulas são dança de rua, contemporâneo, jazz e danças populares.

- JOANA DIAS

ESPERANÇA

Divertimento de hoje, o sonho do amanhã Alguns adolescentes encontraram na dança uma forma de se divertir. Estudantes de 13 a 15 anos participam de um projeto desenvolvido na escola aberta, no qual são oferecidas aulas de danças como Street Dance e Break, todas as segundas-feiras, das 17h30 às 19h30. Cerca de 30 alunos, em duas turmas (uma de manhã e outra pela tarde). Os jovens se apresentaram em alguns eventos, mas não participaram ainda de competições. Leire Arlitssa, 13 anos, é uma das integrantes do projeto na sua escola. No grupo há cinco anos, conta que resolveu participar após seus professores lhe apresentarem os objetivos do projeto na dança. Mesmo sendo ainda cedo, ela já tem bem definido o que pretende para o seu futuro. Ela quer ser professora de dança e

quem sabe abrir o seu próprio grupo. “Quando eu danço, procuro superar ninguém mais além de mim”, afirma. Após completar 15 anos de idade, Leire pretende fazer parte do Grupo Explosão da Dança, que tem suas aulas nas salas cedidas pela Escola Municipal João Goulart, na Vila Brás e tem como professores Graciela de Oliveira Souza e Adriano Teodomiro Guerra Carvalho (Reportagem nesta página). Quem também descobriu na dança um futuro profissional foi o estudante Emanuel Batista Prates dos Anjos, 12 anos, que participa do programa há seis. O interesse pela dança surgiu porque seu irmão José William Batista Prates dos Anjos, 21 anos, era professor integrante do projeto. “Depois que casou, meu irmão teve que deixar a dança

e procurar um emprego para sustentar a família. Hoje ele é metalúrgico”, diz. Diferente do irmão mais velho, Emanuel pretende ter a dança como profissão, pois além de fazer parte do programa, o menino ainda participa do Grupo Explosão da Dança, no qual pratica o ritmo contemporâneo. “Quando danço, me sinto diferente, é como se estivesse em outro mundo”, afirma. Emanuel já participou de alguns festivais e no último, realizado em Curitiba, o garoto e seus colegas ficaram em quinto lugar. Mas os sonhos do menino não terminam por aí: pretende ainda participar do Festival de Dança de Joinville e no futuro, ser um professor e ter o seu próprio grupo de danças.

- CAROLINA CHAVES

Leire e

à Emanuel

enxergam na dança mais do que um divertimento: ambos sonham em montar seu próprio grupo

NATHALIA FEIJÓ


8. ENQUETE

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LE

O que você pensa sobre a Brás? Moradores contam como enxergam a Vila

“Eu acho legal morar aqui, mas a segurança é muito ruim. De vez em quando saímos com os amigos, vamos à escola aberta e é só o que tem pra fazer por aqui.” l Catiussa Rodrigues, 13 anos,

estudante. Voltou a morar na Brás há 6 meses

C

om aproximadamente 20 mil habitantes, a Vila Brás possui praticamente a infraestrutura de uma pequena cidade. Mercados, ferragens, posto de unidade básica de saúde, lavagens de automóveis e salões de beleza, são apenas alguns dos estabelecimentos presentes no bairro. E, por contarem com uma oferta abundante de produtos e serviços, muitos moradores não precisam se deslocar da Brás

para suprir suas necessidades. Considerando esse tempo de permanência na Vila, o Enfoque perguntou para diversos moradoes da Brás qual a sua relação com o local, com a segurança e com as opções de lazer disponíveis. - JÚLIA BONDAN - MAURÍCIO WOLF ANA FUKUI

“Pra mim tá bom. Segurança nós não temos, só Deus. Eu não mando nada, mas se mandasse, eu melhoraria a pobreza por aqui, que tem muito.”

“Olha, eu gosto daqui. A única coisa que eu acho que poderia melhorar é o policiamento. Falta um posto de polícia por aqui. Lazer mesmo não tem, pois a praça está abandonada.”

l Sebastião Tavares, 83 anos,

l Elisangela Marques, 33 anos, dona de

catador, mora na Brás há 26 anos

“Acho que poderia ter mais segurança, mas na nossa rua é bem tranquilo. Poderia ter uma creche também.”

“Eu gosto de morar aqui, acho tudo muito bom. Meu lazer é ir na igreja e tocar gaita no pátio de casa. Eu melhoraria a saúde, o posto de saúde.”

l Nelci Amaral, 39 anos, dona

l Nilta de Souza Petry, 72 anos,

l Ervino de Godoi, 65 anos,

aposentada, mora na Brás já 22 anos

l Marli Pereira, 46 anos,

dona de casa, mora na Brás há 23 anos

casa, mora na Brás há 30 anos.

“Não sei o que dizer, gosto de morar aqui. Não me sinto muito segura, mas até hoje nunca aconteceu nada comigo. Não costumo sair, tomo chimarrão na minha casa.”

de casa, mora na Brás há 30 anos

“Tinha que ter mais segurança, mais policiamento. Não tem nada pra fazer, a pracinha tá toda quebrada. Deveria ter umas oficinas pros jovens, pra ocupar.”

aposentado, mora na Brás há 20 anos

“A gente vê bastante polícia, a coisa melhorou muito. A vila tá bem tranquila. Tem bastante comércio, tem uma pizzaria que a gente vai bastante. Melhoraria a praça do bairro.” l Jakson Vitor, 16 anos, estudante,

mora na Brás há 3 meses (antes morou durante um ano)


.9

EOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

“Não tenho do que me queixar. Vou pra praia, deixo a casa sozinha, nunca mexeram em nada. Não tenho queixas da Brás. Lazer não tem, nós temos que levar nossos filhos para Novo Hamburgo em uma praça.” l Maria Miranda, 48 anos, industriária, 22 anos de Brás

“Já mudou muita coisa, algumas pra melhor e outras pra pior. A segurança piorou. Às vezes dá vontade de se mudar... Mas eu gosto muito de morar aqui, apesar de não ter muita coisa pra fazer.” l Andréia Cardoso, 40 anos, comerciante, mora na Brás há 30 anos

“A vila é muito boa, mas falta polícia. Lazer era na pracinha, mas não tem mais... Falta essa opção pras crianças.” l Alex Silva, 42 anos, trabalha

em uma padaria, mora na Brás há mais de 30 anos

“Eu gosto muito da Brás. Agora esta com bastante segurança. Lazer não tem muito, mas eu gosto de morar aqui.”

“A segurança é boa, a polícia volta e meia passa por aqui. O lazer é muito pouco, gosto de ir na igreja, me divirto com Jesus.”

“A Brás é boa. Moro há mais de 20 anos aqui e não tenho reclamações, nunca fui assaltada. O lazer é complicado, não tem praça.”

l Maura Batista da Silva, 62 anos,

l Derli Medeiros, 62 anos, comerciante,

l Ereni Muchenski Tavares, 52 anos,

“A Vila Brás é legal, eu gosto de morar aqui, dá pra ficar jogando bola e brincando com os amigos na rua. Podia ter uma pracinha e uma pista de skate.”

“Gosto daqui, a gente praticamente conhece todo mundo. A segurança é precária, a gente vê polícia, mas não quando precisa. Opção de lazer, só a praça, que tá quebrada.”

“Não temos queixas, as coisas melhoraram muito. Aqui na minha rua é tranquilo. Temos algumas opções de lazer, mas no centro. Gostamos de ir ao zoológico (em Sapucaia) e atividades no colégio.”

l Maikiel Eberson, 11 anos,

l Andréia Regina Pereira, 41 anos,

l Eduardo Rafael, 40 anos,

aposentada, 9 anos de Brás

estudante, nasceu na Brás

mora há mais de 20 anos na Brás

aposentada, mora na Brás há 27 anos

“Gosto de morar aqui, a gente conhece todo mundo. Não tem muita segurança, mas já foi bem pior. A gente tinha a praça, mas acabaram depredando. Eu sinto falta de uma praça, temos que ir em outros bairros.”

“Pra mim, é maravilhosa. Aqui, graças a Deus, é tudo tranquilo. Não temos praça, eu prefiro ficar em casa. A única coisa que estamos sempre tendo que reclamar é as enchentes, que sempre inunda tudo aqui. Mas mesmo com isso, não trocamos esse lugar por nada!”

l Cindy Cláudia, 18 anos, manicure e

l Regina da Silva Rodrigues, 34 anos,

estudante, mora na Brás há 17 anos

dona de casa, mora na Brás há 17 anos

dona de casa, mora na Brás há 27 anos

pavimentador, mora na Brás há 30 anos

“Eu gosto da Brás. Não tenho ideia de morar em outro ligar, a não ser que seja um sítio. A segurança é um problema de todos os lugares. Apesar dos problemas, me sinto seguro aqui. Posso sair e quando volto minha casa tá aqui, intacta. Lazer é um problema, coloquei balanço aqui em casa, uma casinha, desenvolver lazer dentro do pátio ou em outros bairros.” l Odair José, 31 anos, marceneiro,

mora na Brás há 25 anos


10. PASSATEMPO

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

Rua se torna pista de skate NATHALIA FEIJÓ

os impede de praticar esportes

A

pesar das poucas alternativas disponíveis de lazer na Vila Brás, alguns adolescentes descobrem formas de se divertir, mesmo que falta infraestrutura. É o caso da estudante Caroline Camargo, 13 anos, que se reúne com os amigos para praticar esporte. “Há um ano e meio ando de skate, mas nada sério”, diz. Assim como Caroline, o estudante Lucas Moraes, 14 anos, também comprou primeiro um skate mais acessível e em seguida convenceu os pais a lhe presentear com modelo profissional. O aprendizado acontece com os colegas que já têm mais experiência. “Não existe um instrutor, cada um vai ensinando para o outro o que sabe e vamos praticando juntos”, afirma. Lucas não é o único dos três filhos de Fabiane de Moraes, 32 anos, adepto ao esporte. Jonas, 10 anos, aproveita para treinar manobras com o irmão mais velho, enquanto o caçula Daniel com apenas 1,5 ano tenta acompanhar os irmãos e já mostra talento para o skate. Não existem rampas na Vila, o que obriga as crianças e adolescentes a utilizar a rua como pista. Realidade

que preocupa a mãe de Lucas, Fabiane de Moraes: “A praça está abandonada, não tem nenhum lugar para as crianças brincarem e na rua é muito perigoso, por causa dos carros”. De acordo com ela, eram três skates, mas um ficou completamente danificado após um carro passar por cima, o que aumentou seu receio em permitir que os filhos andem na avenida. Para Caroline a melhor

Caroline e Lucas são retratos de uma geração que aproveita o tempo livre para andar de skate. O pequeno Gabriel de 1,5 ano já ensaia as primeiras manobras

à

falta de à Ainfraestrutura não

opção é ir até o centro da cidade de São Leopoldo, onde existem rampas apropriadas. “Aqui não tem rampa andamos dentro da escola ou então tem que ir até o centro e praticar lá”, aponta. A estudante não pretende seguir carreira no esporte: “O skate é hobby eu quero mesmo é fazer curso de gastronomia”, revela.

- JULIANA BORBA

AVENTURA

Diversão radical atrai interesse BRUNA MATTANA

BRASIL É A SEGUNDA MAIOR POTÊNCIA

de andar e realizar manobras no skate. “Fazia um tempo que não praticava mais. Há uns meses atrás retornei com força total”, explica ele. Lucas conta que São Leopoldo não possui muitas rampas e que nelas não há possibili-

dade de realizar manobras diferenciadas. “Eu e meus amigos vamos aos finais de semana de trem para Porto Alegre, numa pista que tem bairro IAPI.” relata.

- ALINE CASIRAGHI

Com os skates embaixo do braço eles caminham até a pista mais próxima

à

Jonathan Giovane Moraes, 10 anos, é um dos vários jovens que usa do skate como meio de lazer. Ele aprendeu sozinho esse esporte radical meses atrás, na rua em frente à sua casa. “Também gosto de brincar de esconde-escode e jogar bola na praça com os meus amigos. Mas entre todas as atividades lazer, a minha preferida é o skate” – conta. Ao contrário da maioria dos seus amigos que gostam de futebol, Mateus da Costa Garcia, 12, também prefere se aventurar sobre as quatro rodas. “Através do skate, conheci muitas pessoas que compartilham do mesmo gosto que eu. Com eles vou para a pista, no bairro Santo Dumont, onde ficamos horas treinando e nos divertindo. Uma pena é que a pista só abre na parte da tarde”, reclama. Lucas de Oliveira dos Santos, 14, o mais velho do trio de amigos, é o mais experiente quando se trata

Segundo dados da Confederação Brasileira de Skate, atualmente o Brasil é a segunda maior potência mundial no esporte com 3.863.981 praticantes de. O número foi apurado pelo instituto Datafolha, encomendado pela Confederação Brasileira de Skate em parceria com algumas empresas. Porto Alegre é a capital com o maior número em todo País, com 16%, seguida por Curitiba e Florianópolis, com 15% cada, São Paulo, com 12% e Rio de Janeiro, com 10%. A pesquisa constatou também que entre os praticantes, 89% são homens e 11%,

mulheres. O Rio Grande do Sul é o que apresenta a maior taxa de praticantes do sexo masculino, 94%, e Pernambuco tem o maior índice de mulheres que andam de skate, 17%. A média de idade dos skatistas no País é de 15,4 anos, sendo que, nas faixas dos 14 aos 16 anos e dos 17 aos 20 anos, se encontram o maior número de praticantes do esporte, 25% e 24% respectivamente. O índice de praticantes entre 14 e 16 anos chega a 34% no Ceará e a 32% em Curitiba, enquanto que, na faixa dos 17 aos 20 anos, atinge 42% na Bahia e 31% em Porto Alegre.


HOBBY .11

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

atividades para melhorar a saúde

V

ôlei, dança, alongamentos e exercícios com bambolê e elástico. Essas são algumas atividades realizadas no grupo de ginástica da Vila Brás. A turma, que conta com a participação de 12 mulheres, se encontra na Associação de Moradores, nas quartas e sextas-feiras. Segundo a dona de casa Alba Borba da Rosa, 72 anos, os encontros são muito animados e a turma é bem unida. “Eu adoro participar do grupo, a gente fica com mais disposição para o serviço e se sente até mais nova”, brinca. O grupo de ginástica é uma forma de estímulo para que a terceira idade não pare, e elas seguem a regra à risca. Seguidamente se reúnem para participar de eventos fora da Brás. Alba lembra que a Oktoberfest de Maratá foi um dos destinos. Os equipamentos utilizados para os exercícios são simples: um cabo de vassoura e algumas garrafas pet com areia já bastam. Cada integrante do grupo tem seus próprios utensílios, que são levados para a aula. Pontual, Alba não per-

de uma aula de ginástica. E apesar dos encontros duas vezes por semana, ela não abre mão de praticar exercícios em casa. “É o que me deixa de pé e me auxilia a fazer o serviço da casa”, justifica. O casal Olíria de Aguiar Menguer, 67, e Nadyr Gargioni Menguer, 68, também não pensa em parar. Eles ajudam a organizar as festas da Comunidade Católica Cristo Operário e fazem parte do grupo que viaja para outros eventos. Olíria ainda participa do grupo de ginástica e de caminhadas do bairro. “Faço cursos de culinária e artesanato também, estou procurando sempre me atualizar”, comenta. Assim como Alba, quando tem um tempo livre ela aproveita a garagem de casa para se exercitar. SAUDADES DA GINÁSTICA Um problema no joelho afastou a aposentada Venância Aquistapaçe de Lima, 64 anos, das aulas de ginástica. Ela chegou a participar dos encontros do grupo, mas teve que parar, por recomendação médica. “Era bom e faz muita falta”, lamenta. A ginástica também foi uma oportunidade para criar novas amizades. Há dois anos na fila de espera por um transplante de fígado, Venância

JÚLIO HANAUER

divide seu tempo entre as tarefas de casa e visitas aos netos pequenos. “Adoro cuidar das crianças, é como uma terapia para mim”, destaca. Apesar de não praticar nenhuma atividade no momento, Venância sente falta de uma praça bem cuidada no bairro. “Um espaço com bancos para descansar e com brinquedos para as crianças seria bem legal”.

Venância (acima) aproveita o tempo livre para cuidar dos netos; Alba (ao lado) participa do grupo de ginástica da Vila

à

do à Idosos bairro buscam

A ordem é não parar

- DAIANE TREIN

RETRÔ

Jukebox, a queridinha da Vila amizade e uma confiança”, conta Costa. Niceas José Hartmann, 60 anos, é frequentador assíduo do bar há 14 anos. Mesmo não bebendo mais, ele continua indo até o local para conversar e tomar um refrigerante. “Eu tenho a rotina de vir aqui para ‘pitar’ um guaraná e conversar.” A convivência com Luiz, é tão grande que, quando o dono do bar precisa, Hartmannn assume os negócios. “Quando ele e a esposa têm que sair, eu fico aqui cuidando até voltarem”, diz. Somente com a jukebox Costa fatura R$ 500 por mês, por isso ele considera vantajoso ter a máquina, mesmo não sendo própria. “Essa máquina é alugada, eu não posso me desfazer dela por que o lucro é bom. O pessoal da empresa fica impressionado, pois esta é a que mais arrecada”, conta Costa. Luiz se orgulha em falar que o lazer dele é estar tra-

CAROLINA SCHAEFER

balhando no bar ao lado dos amigos. Às vezes, organiza um churrasco com todos - como no seu aniversário, no final de setembro. “Vamos ter um churrasco aqui porque meu aniversário foi dia 30, então a comemoração é de noite. Eu estou praticamente ganhando a festa por que cada um está ajudando a pagar um pouco”, diz Costa.

- KAROLINE CARDOSO

Luiz mostra orgulhoso o maior sucesso de seu bar

à

Localizado há 23 anos na Avenida Leopoldo Wasun, o Bar Costa virou ponto de encontro para casais e solteiros que gostam de jogar conversa fora, ouvir música e tomar uma cerveja. Um lugar simples, que chama a atenção por um item diferenciado, uma jukebox. A caixa de música, que num primeiro olhar aparenta ser um caça-níquel, é a preferida dos fregueses. Proprietário do bar, Luiz dos Santos Costa, 63 anos, conta que o aparelho é a principal atividade de lazer das noites. “Eu tenho uma mesa de sinuca, mas a jukebox é a sensação do bar. O pessoal vem pra conversar, tomar uma cerveja e escutar música.” A diversidade de clientes não é tão grande, a maioria são casais, mas isso não significa que o bar não tenha aqueles “clientes de fé”. “Aqui tenho muitos amigos, pois têm aqueles clientes que aparecem todos os dias e todos os finais de semana. Assim, criamos uma

CAUTELA

Lazer só em casa A Vila Brás tem somente uma praça em seu território, mas por motivos de segurança, os moradores do bairro optam por não utilizá-la. Desta forma, seus próprios lares tornaram-se seus refúgios também para o lazer. A família Rodrigues é um exemplo dessa situação. Ronaldo, 47 anos, motorista, conta que os problemas com as opções de entretenimento no bairro vão além da praça. “Simplesmente não existe nada para se fazer aqui. Não tem um restaurante sequer.” Pai de Nayla, 5 anos, diz que pela falta de opções e segurança no bairro, a casa é onde sua filha pode brincar: “Eu e minha esposa colocamos um balanço para a Nayla poder brincar em casa. É uma maneira segura, já que a rua é perigosa”. Para ele, o fato de as crianças do bairro não conseguirem se divertir

na rua também preocupa. “Eu me criei no bairro Guarani, em Novo Hamburgo, e moro aqui há 25 anos. No meu tempo, brincávamos de taco, carrinho de rolimã, de bolita e de futebol na rua. Hoje, as crianças ficam no computador, no celular e no videogame”, lembra. Situação parecida acontece com a promotora Kelly Rufino, 30 anos, que também recorre ao lazer residencial. Mãe de Larissa, 6 anos, ela conta que o espaço de diversão da filha é a calçada na frente de casa. “Aqui não temos opção. As crianças não têm onde brincar e não têm segurança. O jeito é a Larissa brincar na calçada, onde podemos enxergar ela”. Moradora da vila há 28 anos, Kelly conta que, quando pode, leva sua filha à Praça da Biblioteca, no centro de São Leopoldo.

- PEDRO KESSLER


12. IMPROVISO à Adastransformação vias em

espaços de diversão acaba com a tranquilidade dos pais

S

em locais próprios para o lazer, as vias da Vila Brás são transformadas na maior fonte de diversão dos pequenos, que dividem espaço com os carros. Qualquer objeto serve de brinquedo para as crianças. Pedaços de madeira são utilizados como armaduras e areia como matéria-prima para a construção de castelos. Com brinquedos abandonados e em mal estado de conservação, a praça que existe no local é pouco frequentada. Sem muitas alternativas, as crianças acabam brincando na rua, fato que preocupa os pais. Maria Castanho tem 33 anos e um filho de nove. Moradora da Rua 1, ela conta que Erik passa a maior parte do tempo dentro de casa jogando videogame. “Não tem lugar adequado para o futebol, então as crianças jogam bola na via, entre os carros. É perigoso, esse é o trajeto que os ônibus fazem e uma criança já até

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

Brincadeiras no asfalto foi atropelada. Deixo o meu filho sair para brincar quando há menos movimento, geralmente à noite”, explica. Apesar do perigo em brincar em meio ao trânsito, os primos André Carvalho, de 9 anos, e Victor Cauã Macedo, de 6, não se importam. Eles preferem as atividades ao ar livre e usam a via para dar vida à imaginação. Galhos soltos pelo chão servem como espadas, utilizadas no combate que é feito pelas calçadas e na beirada da rua. De espectadora, está a mãe de Victor Cauã, Marilice da Siva, que se preocupa com o movimento em frente ao loteamento Padre Orestes e vigia o filho e o sobrinho. “Temos que estar sempre cuidando, chamando a atenção. Já atropelaram uma criança que estava correndo no meio da rua. É complicado, porque os carros não respeitam nem os quebramolas, então sempre estamos com medo de que aconteça algo”, desabafa. As brincadeiras que envolvem corrida e agilidade são as que os pequenos mais gostam. Pega-pega, esconde-esconde, jogar futebol e andar de bicicleta e skate estão entre as preferências

do público infantil. Quanto mais eles se movimentam, no entanto, mais os pais ficam atentos. Enquanto as irmãs Brenda, de 7 anos, e Tailene, de 8, brincam na via, a mãe as chama o tempo todo. Frases como “vem mais para cá” e “sai daí” são comuns para Rosângela Nunes, de 33 anos. “Elas ficam correndo de um lado para outro, brincando, não posso desviar o olhar”, afirmou a moradora. A Escola Municipal de Ensino Fundamental João Goulart abre em alguns finais de semana e aparece como uma alternativa para a falta de lazer. Para não deixar que as crianças saiam sozinhas, porém, as mães preferem que elas brinquem na rua, onde estão próximos. Ângela Nunes, de 44 anos, precisa ter o cuidado redobrado com a filha Eduarda, que tem somente 2 anos, mas já pegou gosto pelas brincadeiras ao ar livre. “O que falta mesmo é um local para que nossos filhos possam se divertir com tranquilidade e segurança, sem que precisemos estar sempre com medo”, ressaltou.

JÉSSICA SCHAEFER

à Sem medo do

trânsito, os primos André Carvalho (no skate) e Victor Cauã Macedo preferem atividades ao ar livre

- NATÁLIA DALLA NORA

SINUCA

Entre uma jogada e outra Vamos jogando enquanto comemos”, ressalta Virgildo que, por enquanto, ainda não perdeu nenhuma. E o jogo flui. Termina um e começa outro. Enquanto alguns chegam, fazem uma partida e vão embora, tem quem se dedique. Jogos mais longos podem durar entre uma ou duas horas. “De vez em quando eu venho jogar, não é sempre. Costumo vir umas duas vezes por semana”, declara Carlos Alberto Flores, zelador, 58 anos, que costuma aproveitar também seu período de lazer jogando uma partida de sinuca. “Apostamos só fichinhas. Jogamos de dupla, dois contra dois, para nos entreter. É um momento de lazer, distração, se movimentar. Faz bem, tem uma turma boa”. Para Jairo Acauan, o jogo é bom para o bar. “Todos os dias o pessoal sai normalmente entre seis e sete horas da tarde do serviço e vem jogar. Até a meia noite sempre tem gente jogando. O público é variado, sempre tem gente diferente”, comenta Acauan. “A brincadeira é boa, o pessoal é organizado, dificilmente dá confusão. É bom, tranquilo”.

- ÂNGELO DAUDT

RUDINEI MACHADO

Carlos Alberto Flores aproveita suas horas de lazer concentrado no jogo enquanto Jairo cuida da clientela

à

Sinuca é um abrasileiramento do inglês “snooker”. Uma adaptação do jogo “pool” inventado na Grã-Bretanha por volta de 1875. Na Brás, é sinônimo de diversão. Há 30 anos no comando do Bar Acauan, na Avenida Leopoldo Wasun, Jairo Acauan começa a trabalhar às 7 horas. Abre as portas, e o jogo começa. Durante o expediente, que se estende até a meia noite, a mesa está em constante funcionamento, assim como a mesa do bar. A brincadeira acontece durante todos os dias da semana. Fichas e mais fichas são inseridas na mesa em um ambiente de descontração. Valendo o quê? Mais fichas - é claro! - porque o jogo não para. Virgildo Heinz, aposentado de 69 anos, é jogador assíduo. Tem seu próprio taco e pratica sempre que pode, para se divertir. Nesse jogo tem aposta. Rola o dinheiro? Não. Mas vale um galeto. O perdedor da melhor de cinco partidas é responsável pelo galeto do sábado ao meio dia. “Jogamos, vamos supor, por cinco quilos de galeto. O perdedor paga o almoço, e os amigos estiverem perto comem junto. Assamos aqui mesmo, na churrasqueira.


VULNERABILIDADE .13

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

de policiamento preocupam comerciantes

U

ma preocupação constante ronda os comerciantes da Vila Brás: a segurança. Crescem os relatos de assaltos aos mercados e o medo está cada vez mais presente. Dois assaltantes armados invadiram o Mercado e Açougue David Deniam em um final de tarde, renderam os proprietários e clientes e levaram o dinheiro de um dos caixas. Semanas depois, o mesmo aconteceu na Padaria Steinhaus. Marliene Gonçalves, 45 anos, que comanda ao lado do marido Neri o Mercado e Açougue David Deniam conta que os criminosos agiram rápido, já que havia muito movimento no mercado. “É importante que alguém tome uma providência, a Vila está cada vez mais violenta”, garante Marilene. Segundo ela, a culpa disso é a quantidade de pessoas estranhas fazendo parte da comunidade, já que há muita gente se mudando para a Brás. Ezequiel Hedlund Monteiro, 28 anos, proprietário da Padaria Steinhaus com a família, também atribui os assaltos a novos moradores: “Tem muita gente nova por aqui, que apareceram com as emendas de vilas próximas”.

Proprietário do Mercado e Açougue Kelly, Raul Danilo Berlitz, de 47 anos, não foi assaltado, mas já teve produtos roubados das prateleiras e também de lidar com pessoas estranhas rondando seu estabelecimento. “Gente da Vila não nos importuna. São os que vêm de fora que roubam produtos nas lojas, assaltam pessoas, mercados”, reforça Berlitz.

JÉSSICA SCHAEFER

Os comerciantes Raul Danilo Berlitz (ao lado), Neri e Marilene Gonçalves (no centro) e Ezequiel Monteiro (abaixo) sofrem com falta de segurança

à

de à Onda assaltos e falta

Insegurança no comércio

FALTA DE POLICIAMENTO Entre os comerciantes, a falta de policiamento é uma reclamação constante. “Não vejo policiamento nenhum. faz tempo que a questão da segurança não muda, não melhora nem piora”, afirma Monteiro. Segundo Berlitz, o foco da Polícia é outro: “Eles estão preocupados com os pontos de droga, mas não é isso que nos atinge”. Muitas vezes, os moradores têm de tomar suas próprias providências para garantir a segurança. “Nos defendemos sozinhos quando tem alguém rondando para assaltar ou roubando produtos. Não dá para esperar pela Polícia, a gente liga e eles demoram a aparecer, isso quando aparecem”, conta Berlitz. Em seu mercado, o comerciante instalou câmeras de segurança desde que o abriu.

- LUÍSA VENTER DA COSTA

POLICIAMENTO

Trinta anos de espera por posto da BM Um assunto recorrente na Vila Brás é a segurança. O policiamento realizado pela Brigada Militar é frequente, mas não existe um posto instalado no local. Essa é uma reivindicação antiga e muito debatida devido aos constantes assaltos que ocorrem. A gestão passada da associação de moradores realizou alguns pedidos relacionados ao posto, porém, nada de forma efetiva, somente na vontade de que tudo se concretizasse. Ainda não existe informação e previsão de onde podem ser as futuras instalações. A Secretaria Municipal de Segurança e Defesa Comunitária afirma que, nas reuniões do Gabinete de Gestão Integrada, não foi passada nenhuma pauta com relação direta à Vila Brás. Esse tipo de projeto exige o envolvimento e decisões de nível estadual. Conforme a Brigada Militar, está sen-

do estudada a implantação de módulos de policiamento comunitário no Vale do Sinos. Segundo o Comandante do 25º BPM, tenente-coronel Ari José Cassanta Chaves, de início, seriam 11 módulos espalhados pela região: “Havíamos pensado neste total para cobrir vários bairros, mas a prefeitura cogitou reduzir para quatro. Ainda estamos debatendo vários itens que envolvem esse tipo de convênio”, afirma. Para a futura instalação de um módulo de policiamento comunitário, é necessário que prefeitura e brigada militar concordem com a quantidade de instalações e policiais que ficarão à disposição da comunidade, além de as etapas para a realização do projeto e solidificação do convênio entre os órgãos responsáveis sejam concluídas. O desejo de antigos moradores de ter um policiamento

mais ostensivo é tão grande que, segundo eles, o terreno para a edificação do posto já existe: seria juntamente com a nova creche e estaria localizado no atual parque ao lado da escola João Goulart.

- AUDREY LOCKMANN

Evaldir de Azevedo

à (ao lado) é um

dos moradores que aguarda definição do posto da BM; Possível local da instalação policial (abaixo)

ALINE SANTOS


14. DISCRIÇÃO

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

Comunidade convive com o medo DANIELA TREMARIN

por receio

C

om frequência, moradores da Vila Brás afirmam que o bairro é um local bom de viver, mas que possui problemas, assim como os outros. A palavra segurança, ao invés de proporcionar a sensação de proteção, causa outro efeito nos moradores: medo. A insegurança é tanta que raramente algum deles fala a respeito do assunto. Maria, proprietária de uma loja de roupas no bairro costuma ficar atenta à movimentação da rua. “Alguém pode entrar, tentar fazer alguma coisa e, então, você fica com as mãos amarradas.” Apesar da loja estar atendendo, nem sempre a porta está aberta. “Trabalho de porta fechada porque não tem segurança”, desabafa. Há quatro anos com o negócio, Maria nunca foi assaltada, mas já viu uma loja vizinha ser invadida por assaltantes. “Chamamos policiamento, mas demoraram para vir”, conta. De acordo com a comerciante, a situação não está complicada apenas

para os donos de estabelecimentos comerciais. “Tem uma rua aqui perto com várias casas que estão à venda por causa de uma casa em que moram pessoas de fora envolvidas com

drogas. Não fazem nada para a gente, mas incomoda os vizinhos por causa das brigas e gritarias que acontecem ali”, observa. Ao entrar na rua citada por Maria, é possível perce-

ber as várias placas de “vende-se”. Ana mora próximo ao local apontado e prefere não se envolver, mas observa que alguma medida deveria ser tomada. “Essa rua era uma das melhores, mas a

PRUDÊNCIA

Moradias adotam precaução Hoje faço o que posso para evitar dar brechas”. Os cães são uma das principais ferramentas de segurança para alguns moradores. Soltos pelos pátios, aparecem

na maioria das casas. Jessi Ramos, 57 anos, moradora do bairro há 16, trabalha com materiais recicláveis que ficam expostos no quintal. Para evitar furtos da matéria, ela aposta na cadela Pretinha, de três anos, para a defesa MARIA XIMENA contra ações criminosas. “Foi uma forma que encontrei para evitar que as pessoas peguem as garrafas e todo o material plástico. Trabalho em casa e muita coisa fica na rua. Durante a noite ela cuida e nada aconteceu até agora. Além de vigiar o pátio, ela é companheira das crianças”, conta Jessi. Empresas de segurança privada só são utilizadas no bairro por estabelecimentos comerciais. Na avaliação dos moradores, o alto custo impede a contratação dos serviços. Para prevenir assaltos, as medidas são singelas, mas segundo eles, eficazes até o momento.

Grades altas dificultam ações de violência

à

Com temor de possíveis assaltos em suas residências, os moradores da Vila Brás desenvolveram uma série de maneiras de proteção das suas famílias: portões elevados, grades, arames farpados e cães patrulhando os pátios. Esse é um cenário comum nas ruas da comunidade. Ari dos Santos, 59 anos, mora no bairro há trinta anos e possui um estabelecimento comercial na Rua Quatorze Bis e apesar de nunca ter sido assaltado, ele sempre se precaveu. “Como moro no mesmo local onde tenho um mercado, tenho um pouco mais de cuidado. Minha segurança são as grades que estão aqui há muito tempo. Nunca tive problema algum com assaltos ou coisas do tipo. Tenho sorte!” - comenta. A experiência de Ari não é compartilhada por todos. João Silveira já passou pela situação de tentarem invadir a sua casa. Na oportunidade, ainda não morava na Vila Brás, mas o susto da situação fez com que tomasse medidas de segurança maiores. Na atual residência, os portões são reforçados e há cachorro no pátio. “Quem passa por isso uma vez não quer nem pensar em viver de novo. Na época não conseguiram entrar, só forçaram a porta, mas desistiram.

casa estragou as vendas do local e as pessoas foram embora daqui”. Assim como Maria, Ana adota cuidados como manter o portão da frente fechado. “Tem que ter cuidado. Fecho o portão

Maria trabalha com a porta fechada porque teme ser assaltada

à

depoimentos à Os são comedidos

o dia todo porque eles podem entrar para fugir da polícia, caso isso aconteça”, explica. As moradoras citadas não são as únicas que temem a violência, em alguns bares e bazares, por exemplo, os proprietários preferem não comentar sobre o assunto. O que pode se perceber é que há certa insegurança para viver e para falar também. _____________________ (*) Os nomes são fictícios para preservar as fontes

- FABRICIA BOGONI

ILUMINAÇÃO

Projeto prevê melhorias A segurança dos moradores também está relacionada com a iluminação das vias públicas do bairro. Na Brás, alguns moradores relatam que o serviço está melhorando, outros pedem por mudanças, reclamam das ruas escuras e do tempo de espera por atendimentos de manutenção. Roberto Rodrigues, morador há 10 anos, afirma que as mudanças são positivas: “Aqui na avenida está bem iluminado e os postes estão em bom estado”, diz. Já Lenir Silva, proprietária de um estabelecimento comercial, relata que não está vendo retorno da taxa de iluminação cobrada: “Nós pagamos iluminação pública, mas quando uma lâmpada queima, eles não consertam e ficamos no escuro”. Segundo Lenir, a luminária em frente à loja ficou queimada por três meses e neste período procurou diversas vezes os órgãos responsáveis. Com medo de assaltos, buscou uma alternativa para o problema: “Eu tive que instalar

uma lâmpada perto do portão porque a sensação de insegurança aumenta sem iluminação”, conta. De acordo com o Diretor de Iluminação Municipal, Volnei Tavares da Silva, um trabalho de revitalização foi iniciado no mês de setembro e prevê a substituição de pelo menos 30 luminárias das ruas transversais. As novas lâmpadas são de vapor de sódio de 100 watts, mais eficientes, com mais durabilidade e menos consumo energético. Ele explica que as lâmpadas antigas estão em condições precárias e que o projeto pretende diminuir os custos com estes serviços, melhorando o desempenho dos equipamentos . Ele pondera que o prazo de espera por atendimento é de 4 a 5 dias. SERVIÇOS – A Secretaria de Serviços Públicos recebe solicitações de serviços pelo telefone 0800-6443300 das 7h às 19h de segunda a sexta-feira e aos sábados, das 7h às 13h.

- MÉURIN FASSINI


CUIDADO .15

ENFOQUE VILA BRÁS | SÃO LEOPOLDO | NOVEMBRO / 2014

Em obras, mas sem proteção

residências, população não utiliza equipamentos de segurança

Q

uem percorre a Vila Brás percebe diversas casas e obras sendo feitas pelos próprios moradores. O operador de máquinas Luiz Flávio de Oliveira, 26 anos, é um desses exemplos. Ele e o amigo Paulo da Silva, 19 anos, trabalhavam numa manhã de sábado no local onde Luiz deseja construir sua casa. Segundo o operador de máquinas, em toda a área onde um dia estará sua residência, as famílias se apropriaram dos terrenos. “A gente está tentando legalizar essa situação e pagar, se for preciso, claro. Enquanto isso não acontece, eu vou aterrando meu terreno para que eu possa construir minha casa depois”, conta. Luiz Flávio e Paulo trabalhavam sem o uso de equipamentos de segurança. “Aqui, em obras particulares, a gente não utiliza. Mas sabemos da importância de usar luvas, botas e capacetes, porque conhecemos muitas histórias de pessoas que se machucaram e até morreram em acidentes de trabalho”, diz Luiz. O operador de máquinas costuma trabalhar com protetores oculares e outros aparatos de segurança, mas diz nunca ter sofrido nenhum tipo de acidente. “Lá na fábrica não é comum. No máximo um corte com estilete de vez em

quando, porque mexemos com embalagens.” Paulo da Silva é auxiliar de mestre de obras em São Leopoldo e Capão da Canoa. Nos locais em que trabalha, ele costuma utilizar cinto, botas, capacete, protetor de ouvido e luvas. “A gente utiliza esses elementos que são obrigatórios. Só nos descuidamos um pouco quando estamos fazendo algo para a família ou para nós mesmo”, diz ele. Segundo dados do Ministério da Previdência Social, em 2012 o setor da construção civil foi o terceiro com maior índice de acidentes de trabalho. Foram mais de 63 mil mortes em um ano. O setor com maior número de acidentes é o de Comércio e Reparação de Veículos Automotores, seguido pelo de Saúde e Serviços Sociais. A técnica em segurança do trabalho Roberta Pires destaca que, na maioria das vezes, os acidentes são causados pela negligência dos trabalhadores ou pela falta de orientação. “Acredito que, para reduzir esses índices de acidentes, seria importante ter mais escolas de capacitação gratuitas. Que as pessoas envolvidas nesses projetos, tanto como trabalhadoras ou como contratadas, se informassem dos riscos existentes na execução das tarefas.” Uma solução viável, na visão de Roberta, seria o Ministério do Trabalho disponibilizar uma equipe para a orientação da população em geral, além de aumentar o rigor na fiscalização.

BETINA VEPPO

Luiz e Paulo iniciam a construção da casa de Luiz

à

a construção à Para de suas próprias

RECOMENDAÇÕES Dicas de segurança do trabalho para quem faz sua própria obra: l Sempre utilizar calçado de segurança e luva; l Nunca trabalhar de bermudas e sem camisa; l Usar protetor solar; l Os equipamentos de segurança estão cada vez mais acessíveis. É preciso pesquisar e se informar; l Em construções de telhados ou

- GABRIELA CLEMENTE

Violência no rio afasta moradores densa existente entre o dique e o rio como rota de fuga: “eles usam o mato para se esconder”, confirma Andrade. O aposentado ainda relata que a policia costuma fazer rondas pela orla do rio, mas que os crimes continuam ocorrendo. “Não tem horário, o rio é perigoso o dia todo”, cita Andrade. Outro morador que também deixou de frequentar a praia da Brás é Gelson Alves, 33 anos. O comerciante que reside no bairro desde os sete anos confirma os relatos de violência na beira do rio e acrescenta: “seguido aparece um enforcado e outro esquartejado lá”. Alves, que costumava frequentar o local quando era criança, a fala que a poluição do rio e os seguidos casos de violência da praia o afastaram. “Eu geralmente vou mais pra

cima, em Barra do Ribeiro ou Tapes.” Porém, isso não parece incomodar Jair da Silva, 32 anos. O morador do bairro Santo Afonso, em Novo Hamburgo, que costuma ir pescar quando vai visitar seu irmão no bairro, afirma que jamais foi assaltado nem presenciou ou ouviu falar de ocorrências de violência na praia da Vila Brás. Silva relata, inclusive, que ele e alguns amigos costumam pescar no rio duas ou três vezes por mês e nunca tiveram problemas. O 25° Batalhão da Polícia Militar, órgão estadual responsável por garantir a segurança no local, foi procurado, porém, até a finalização desta edição, não havia se pronunciado sobre o caso.

- FELIPE GAEDKE

VICTÓRIA FREIRE

Prainha, antes sinônimo de lazer, tornou-se local hostil para as pessoas que residem na Vila Brás e nos bairros próximos

à

ORLA

O Vale do Rio dos Sinos tem esse nome em referência ao rio que se estende por toda a região, formando um vale fértil e verde. Porém, os moradores da Vila Brás já não podem mais usufruir desse afluente. Além do antigo problema da poluição, agora a margem do rio, que antigamente era sinônimo de lazer e fonte de alimento para os habitantes do bairro, se tornou mais um ponto de exclusão, onde a criminalidade é que dita as regras. De acordo com o aposentado Ivo Miranda Andrade, 63 anos, assaltos e outras modalidades de crimes mais pesados são comuns na antiga prainha da Brás. O ex-comerciante, que mora na Vila há 23 anos, afirma que, depois de cometerem o crime, os “malandros” utilizam a mata

que tenham um pé direito maior de 2m, deve ser feito um projeto mais aprofundado, pois uma queda dessa altura pode matar. É preciso instalar um ponto de ancoragem, de modo que se trabalhe sem correr perigo. E que o trabalhador utilize sempre o cinto de segurança adequado para cada situação.


ENFOQUE VILA BRÁS No horizonte, o futuro

SÃO LEOPOLDO / RS NOVEMBRO DE 2014

podem à Melhorias vir em apenas uma

EDIÇÃO

149 BRUNO LOIS

gestão administrativa

E

RESPOSTAS DA PREFEITURA De acordo com a Secretaria do Orçamento Participativo, por meio de sua assessoria de imprensa, a prefeitura não tem melhorias

previstas a serem realizadas na Vila Brás este ano. Em 2014, duas plenárias do Orçamento Participativo (OP) ocorreram na região, onde foram levantadas 32 demandas. Destas, 29 são para obras e viação, duas para saúde e uma para habitação. As reivindicações de obras, em sua maioria, são para calçamentos, sendo que 12 destas estão localizadas na Brás e na Chácara dos Leões. Na área da saúde, existe a necessidade de ampliação do posto e também do programa Estratégia Saúde da Família (ESF). Na habitação, a demanda apresentada é para regularização fundiária de terrenos na Brás. De acordo com a prefeitura, estas reivindicações passarão por estudo de viabilidade técnica e depois serão apresentadas aos delegados para seguirem o processo de encaminhamento para votação popular. Se aprovadas e votadas, entrarão no orçamento para execução no ano seguinte, em 2015. Quanto à regularização fundiária, a prefeitura informou que não tem a titularidade completa da área, e que a primeira etapa é transferir todo o território da Brás para o município. A questão será analisada a partir de março 2015.

DESENVOLVIMENTO É MOTIVO DE ORGULHO Ele, que viu grande parte do crescimento da Brás, comenta também a alegria que vê no rosto dos vizinhos hoje, ao comparar o que ocorria há duas décadas. “A vila mudou muito e as pessoas também. Elas ficaram mais vivas, mais felizes, com orgulho de morar aqui e com a vontade de evoluir também”, afirma Vargas. A industriária Lorena da Silva Fiuza, 49 anos, faz parte da nova fase da Brás. Há pouco mais de um mês ela mora em sua nova casa amarela, que integra um residencial colorido em meio à vila. Por quatro anos, esperou a conclusão da obra. “Eu morava em Novo Hamburgo e contava os dias para me mudar. Fico muito feliz de ver o lugar que escolhi pra viver ficando mais colorido, mais bonito. Espero que as coisas melhorem cada vez mais”, afirma ela, que adora receber os amigos e a família no seu novo lar. CRESCIMENTO X DESENVOLVIMENTO O professor da Unisinos explica que crescimen-

to e desenvolvimento são termos diferentes. Enquanto o primeiro representa quantidade de território e moradias expandida, o segundo significa qualidade de vida para a população. “Esse é o ponto agora. O poder público precisa ter um olhar diferenciado para estas áreas, com investimentos pontuais”, afirma Souza. Com regularização fundiária, melhores condições de transporte público e investimento em áreas de saúde e lazer, a Brás pode se tornar, em apenas quatro anos, um local ainda melhor para se viver. “O trem é um grande exemplo de desenvolvimento. Trouxe acessibilidade à população a um baixo custo, mas é só o começo de muitas outras obras que podem ocorrer na vila”, destaca. O QUE ESPERAR DO FUTURO? Se em uma gestão é possível trazer o desenvolvimento de que a Brás precisa, não é difícil imaginar o futuro da vila. Considerando a expectativa mais positiva, em que os administradores do município realmente voltem suas atenções para as demandas da população, quem sabe da-

qui a alguns anos a moradora possa sentar com a amiga para tomar o chimarrão da tarde em uma praça florida e repleta de árvores. As crianças poderão jogar bola no campinho devidamente sinalizado com as demarcações, além de ter escorregadores, gangorras, balanços e tantos outros brinquedos à sua disposição para fazer valer o direito de ser criança. O posto, quem sabe, não terá mais fila e o atendimento terá a qualidade que cada morador merece. A vida será mais segura com patrulhamento frequente, as enchentes não vão mais bater na porta das casas, o esgoto não será mais transmissor de doenças e a água e a luz não deixarão mais de chegar em cada residência. Mas para que tudo isso aconteça, para que o futuro da vila seja repleto de conquistas e qualidade de vida, é preciso que cada morador tenha sempre em mente o quanto é importante seu papel junto à administração pública. Presença massiva nas assembleias de OP, voto consciente em candidatos que se comprometam com as necessidades da vila e, claro, cada morador também precisa fazer a sua parte.

- KARINA SGARBI

José avalia o crescimento da Brás ao longo do passar dos anos

à

scorado na varanda de casa, no segundo andar da metalúrgica localizada à beira da Avenida Mauá, o empresário José Adair de Freitas Vargas, 52 anos, viu e continua observando a Brás crescer. Da estrada de chão ao asfalto, do esgoto a céu aberto ao encanamento, das casas cobertas com lona à estrutura reforçada por tijolos e telhas, ou mesmo das carroças antigas puxadas por cavalos magros, hoje contrapostas à rapidez do trem, tudo passou ali, debaixo de seus olhos. “Acho que as coisas aqui acontecem aos poucos. Quanto mais bonita foi ficando a avenida, mais os moradores passaram a cuidar dos seus terrenos. Antes havia muitos barracos, mas hoje são casas bonitas, bem cuidadas”, afirma. Primeiro, a Brás cresceu. Eram duas ou três casas que logo se multiplicaram. Com o aumento gradativo da população, novas necessidades surgiram. Água, esgoto, energia elétrica, posto de saúde, espaços de lazer. Aos poucos, algumas melhorias foram aparecendo e a vila foi ganhando ares de uma cidade, e não apenas de um pedaço de terra abandonado. Se hoje a Brás é marcada pelo potencial empreendedor de sua gente, o amanhã é aguardado com a expectativa de quem quer viver uma situação ainda melhor. Muitos dos espaços que existem hoje não são adequados à realidade dos moradores. Além disso, há demandas por saúde, mobilidade, lazer, segurança, além de outros itens básicos para o mínimo de qualidade de vida. Segundo o professor do mestrado profissional de Arquitetura e Urbanismo da Unisinos, André de Souza, o crescimento da vila não representou o seu desenvolvimento. Para que deixem de ser uma necessidade e se tornem realidade, as urgências da população precisam de atenção da administração pública. E quem tem o poder de cobrar as autoridades por isso é a própria população. “Em uma gestão é possível transformar a Vila Brás em termos urbanos, ambientais e sociais”, afirma.


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