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Ré em causa Própria

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Cantinho do João

Cantinho do João

Breve explicação da mediocridade

A Sociedade precisa de medíocres

“A sociedade necessita de medíocres que não ponham em questão os princípios fundamentais e eles aí estão: dirigem os países, as grandes empresas, os ministérios, etc. Eu oiço-os falar e pasmo não haver praticamente um único líder que não seja pateta, um único discurso que não seja um rol de lugares comuns. Mas os que giram em torno deles não são melhores. (...) Os homens excepcionais servem apenas para situações excepcionais, pois são os únicos capazes de as resolverem. Desaparece a situação excepcional e prescindimos deles.

(...) Temos medo do novo, do diferente, do que incomoda o sossego. A criatividade foi sempre uma ameaça tremenda: e então entronizamos meios-artistas, meios-cientistas, meiosescritores. Claro que há aqueles malucos como Picasso ou Miró e necessitamos de os ter no Zoológico do nosso espírito embora entreguemos o nosso dinheiro a imbecis oportunistas a que chamamos gestores.

E, claro, os gestores gastam mais do que gerem, com o seu português horrível e a sua habilidade de vendedores ambulantes: Porquê? Porque nos sossegam. Salazar sossegava.

(...) Apontem-me um que o tenha. Um só. Uma criatura sem humor é um ser horrível. (...) Há muitas crianças inteligentes e muitos adultos estúpidos, porque perdemos muitas crianças quando elas começaram a crescer. Por inveja, claro. Mas, sobretudo, por medo.” ANTÓNIO LOBO ANTUNES

RÉ EM CAUSA PRÓPRIA

Adelina Barradas de Oliveira

Ele já merecia um prémio nobel da literatura.

E não é tanto pelo como escreve, é pela forma como o escreve e, por escrever o que sentimos, mas não sabemos escrever como ele escreve. É pela evidência das realidades que coloca na escrita, pelas verdades que viveu e analisa, e deita cá para fora como quem viveu todas as vidas, como quem passou por todos os perfis e também pela falta deles. É pela forma livre como diz as verdades, pela forma calma como desmascara os mornos, a forma escrita como derruba os medíocres.

É pela forma como se está a borrifar para quem se julga dominante e dominador, como olha à distância para os que se enchem de vento e, vendo-os de longe, os vê de tão perto e tão a fundo. É pela forma com ele sabe que, mesmo que não o saibam ler, ou não queiram saber do que escreve, não estejam mesmo interessados, ele continuará a dizer o que muito bem entende de forma livre e não calculada, de forma lenta e crua como só ele faz. Acerta-me em cheio quando diz que a sociedade precisa dos medíocres, porque era isso que eu gostava de ter escrito, porque é isso que eu penso e não sei escrever. Eu gostava de ter dito que eles têm todas as vantagens sobre os outros, sobre aquilo que me ensinaram desde a escola primária. Ensinaramme a estudar os assuntos a fundo, a estar preparada para todas as perguntas, para todas as hipóteses, a ter ideias próprias a sobreviver, a saber e não a debitar, a explicar e não a repetir.... a ser franca, direta, honesta, leal.............. transparente. A ter a minha opinião ainda que errada porque ela é minha e sei defendê-la “com unhas e dentes”. Oh Ingenuidade!!!!

Os medíocres reconhecem-se e organizam-se. Num discurso não se mostram firmes nem nos olham diretamente nos olhos, não mostram o que sabem, nem são demasiado seguros de si. Não se apaixonam quando explicam algo ou querem convencer-nos de algo porque sabem que serão triturados, arremessados para o lado pelos que terão medo das mudanças que podiam fingir propôr.

RÉ EM CAUSA PRÓPRIA

Breve explicação da mediocridade

Fazem reflexões frágeis, ... delicadas, que não intimidam, não mostram segurança. Isso passou de moda, era aplaudido de pé, não! Era ovacionado. Agora as palmas, mesmo elas, são mornas, circunstanciais, socialmente corretas e politicamente dirigidas. Quem não corresponder ao perfil não pertence ao clã, é apelidado de perturbador e perigoso. Não deverá ser levado a sério porque não devolverá favores, simplesmente porque não os quer. Quer apenas aquilo a que por direito, e mérito próprio, é seu.

Pode ser tolerado. Mas, tem de cair em si, porque, já ninguém toma a Bastilha, já ninguém dá o corpo ao manifesto, já ninguém quer ser herói. Que démodé! Joana D´Arque ardeu na fogueira, Nuno Álvares Pereira teve a sorte de ainda ser canonizado em 2009. Mas, das táticas dele ninguém se lembra, Egas Moniz ofereceu a sua vida pelo seu Rei ao Rei de Castela, mas de mais como esses, já não rezará a História. Olhe à sua volta e descubra os medíocres. Se for medíocre são os seus pares. Se pretende fazer parte não acuse incapacidades, mas não mostre competências. Deixe que pensem que todos têm competência por si.

Saiba só empregar chavões e cumprimentar a pessoa certa no momento certo. A media é o seu padrão. Nem abaixo nem acima. Deixe de pensar em termos de superioridade de resultados e de mentes ou de pessoas, ou mesmo em termos de inferioridade, há uma mediocracia que grassa e que se vai apoderando de cargos de poder facilmente. Como são mais, ... é-lhes fácil singrar. Laurence J. Peter e Raymond Hull foram os primeiros a testemunhar a proliferação da mediocridade.

Lembram-se do Princípio de Peter? É implacável a sua clareza ou a sua crueza. Os supercompetentes são tão afastados como os incompetentes e os sistemas encorajam os médios de competência a ascenderem a cargos de poder. Com o seu ar modesto e humilde conquistam as massas e fazem “carreira”.

Já a frontalidade e a desenvoltura ou mesmo a competência e o saber fazer, assustam a maioria (dos medíocres ou analfabetos intelectuais).

Enzensberger diz-nos que se consideram bem informados, gravitam num Mundo que protege a sua forma de actuar por isso não pensam por si mesmos. Delegam o pensar a uma autoridade superior que ditará suas estratégias, sempre com foco em sua evolução profissional. A autocensura é obrigatória (ainda que não seja sincera), e apresentada como uma demonstração de astúcia.

Desde a publicação de “The Peter Principle”, a tendência de eliminar os não medíocres tem sido regularmente confirmada e hoje chegamos a um ponto onde a mediocridade é de facto até recomendada, enquanto a propensão para o trabalho bem feito é considerada um foco de problemas, de sobressaltos, de incómodos.

Fingir é o melhor remédio!

Não conte com propostas gloriosas ou originais. Será excluído Será encorajado a ver o inaceitável como inevitável e o repugnante como necessário. Criativo, nem pense nisso.

Sobretudo sorris, ria e siga em frente. Provoque medo, provoque qualquer coisa, mas provoque reações.

E volto a ler Lobo Antunes e a última frase das crianças.... Mas nunca se perca de si. Como diz Sílvia Chueire há um espaço de arbítrio - entre acaso, ética, responsabilidade e dever – uma fenda para a coragem. Não abdique.

“Quem não corresponder ao perfil não pertence ao clã, é apelidado de perturbador e perigoso. Não deverá ser levado a sério porque não devolverá favores, simplesmente porque não os quer. Quer apenas aquilo a que por direito, e mérito próprio, é seu.”

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