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Medidas anti SLAPPs Otília Leitão
from 49ª Edição
OTÍLIA LEITÃO
Jornalista e jurista, PHD em Ciências da Comunicação.
Medidas anti SLAPPs!
CONTRA ONDA DE CENSURA SOB A FORMA DE LITÍGIOS E PREVENÇÃO DE UM “ESTALO” NA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E NA DEMOCRACIA
A União Europeia prepara-se para emitir uma Diretiva sobre medidas anti-SLAPPs, para combate a processos judiciais abusivos que visam silenciar aqueles que ousam denunciar o que está mal em defesa do interesse público. Numa proposta modelo a EU, que tem uma visão alargada de informação e liberdade de expressão, pretende alertar os Estados membros para sensibilizar legisladores, juízes, advogados, jornalistas, ambientalistas, defensores dos direitos humanos e sociedade civil em geral, para o que designa “uma onda de censura sob a forma de litígios”. Tais estratégias “intimidatórias”, muitas vezes sob a forma de processos de difamação com pedidos de indemnizações colossais, levam aqueles que investigam ou criticam a calar-se, pedir desculpas ou a “corrigir” declarações, com medo, em prejuízo do estado democrático.
Mas afinal o que são SLAPPs?
O termo, acrónimo de Strategic Lawsuit Against Public Participation, foi introduzido em 1996 pelos académicos George Pring e Penélope Canan, da Universidade de Denver. Na sua obra SLAPPs: Getting Sued for Speaking Out, os autores explicam as principais características e perigos dessas estratégicas. Há quem utilizando a sua tradução literal, lhe chame um” estalo” na democracia, pelo impacto de tais estratagemas jurídico-legais sobre a crítica, a verdade e a liberdade, tão necessárias à saúde do discurso público. No conceito americano essas estratégias são atentatórias da liberdade de expressão e ilegais em vários Estados. Geralmente são ações eficazes, porque, mais do que ganhar a causa em tribunal com todos os seus custos, esgotamento de recursos e meios, visam destruir as vidas pessoais. Pring definiu que deve ser uma questão de interesse público a que vai distinguir os processos judiciais legítimos daqueles que visam impedir o discurso público. A característica principal das SLAPPs, além do equilíbrio desigual de poderes entre o autor e o réu, é a tendência de transferir o debate da esfera política para a jurídica, com ações judiciais em resposta aos esforços para responsabilizar os poderosos. Os autores Dwigt H. Merriam e Jeffrey A. Benson consideram um ataque à saúde do diálogo público e da Constituição e incluem também a crítica contra o eleitorado, uma comunicação contra algum membro do governo ou outras personalidades oficiais. A SLAPP mais vulgar assume a forma de um processo de difamação pois pretende diminuir a estima, o respeito, a boa vontade e confiança, com o objetivo de picar o adversário, trazer um efeito derrogatório, sentimentos ou opiniões desagradáveis contra a pessoa ou grupo. Muitas vezes a pessoa acusada desiste de se defender pela morosidade do litígio, como aconteceu com o caso italiano de Nello Trocchia, processado por danos
à reputação e com uma exigência de 38 milhões de euros, em abril de 2018. O pedido foi rejeitado pelo tribunal civil de Nápoles em dezembro de 2021, três anos e meio depois.
Na Europa as SLAPPs preferem os media para abafar corrupção e discriminação
Ao contrário dos Estados Unidos da América, onde pelo menos dezanove estados têm medidas antiSLAPs, na Europa não existem leis específicas. O mais recente relatório anual da Plataforma do Conselho da Europa para a proteção e segurança dos jornalistas (2021), alerta para o crescente aumento das SLAPSs. Também o relator especial das Nações Unidas para os direitos humanos, Clement Nyaletsossi Voule, notou o crescer de ações de empresas contra ambientalistas e Dunja Mijatović, comissário do Conselho da Europa para os direitos humanos, corroborou essa preocupação alertando ser a altura para agir contra tais práticas. Um estudo da OSCE sobre os media e o abuso do sistema judicial (2021), elaborado pelo CASE - Coalition Against SLAPPs, grupo de organizações não governamentais, base de consulta pela Comissão Europeia, concluiu que os alvos principais são os jornalistas e os media. Os seus perseguidores são políticos e gente do mundo dos negócios. Os assuntos têm um carácter internacional e dizem respeito à governabilidade, corrupção, negócios, discriminação, às polícias e à segurança. A pesquisa In Europe: How The EU Can Protect Watchdogs From an Abusive Lawsuits, efetuada em 31 países incluindo Portugal, identificou 530 casos entre 2010 e 2021. O Reino Unido e a França surgem em primeiro lugar e com processos de carácter internacional. Neles se verificam uma relação de poder muito díspar, pois quem mais coloca os litígios são empresários (34/%), políticos (24%), figuras públicas e organizações.
Anti SLAPPs versus SLAPPs não dispensam exigências de rigor, ética e independência
A necessidade de medidas anti-SLAPPs fez-se sentir depois do assassínio, em Malta, da jornalista de investigação Daphne Caruana Galizia, em outubro de 2017.
O Conselho da Europa revelou em 2020 que, mesmo depois da sua morte, alguns das 40 ações que lhe foram movidas persistem e estão pendentes contra seu marido e três filhos. Os alertas sobre este tipo de litígios têm sido assinalados por diversos países e, em 2018, a Resolução do Parlamento Europeu sobre Media Pluralism and Media Freedom in the European Union, de 3 de maio, preconizou a elaboração de Alguns casos europeus
Na Polónia e desde 2015, o segundo maior diário recebeu mais de 55 ameaças de ações judiciais por parte de várias pessoas, incluindo membros do partido no poder; Na Eslovénia , em 2020, três jornalistas foram alvo de 13 processos de difamação cada, por denunciarem fraudes fiscais; Em França, em 2018, empresário Vincent Bolloré e o seu grupo empresarial arrastaram jornalistas e ONGs ((Mediapart, L’Obs e Le Point) a tribunais, para que deixassem de escrever sobre os seus interesses em África. Ainda neste país, Valérie Murat, ativista ambiental, deverá defender-se das ações movidas pelo Conseil Interprofessionnel du Vin de Bordeaux (CIVB) por ter denunciado os perigosos tóxicos utilizados e chamado a atenção para a lavagem verde de várias vinhas de Bordelais, que vendem vinhos com um rótulo de cultivo particularmente ecológico (Haute Valeur Environnementale), apesar de estarem contaminados com mais de 28 pesticidas diferentes. Em Espanha, um produtor de carne pediu 1 milhão de euros de indenização a um ativista ambiental, por criticar as suas práticas de gestão de resíduos; Em Portugal a produtora de pasta de eucalipto Celtejo (grupo Altri) moveu uma ação contra o ativista Arlindo Marques, que acusou a empresa de poluir o rio Tejo. Desde 2015, que Marques publicava vídeos e provas fotográficas da poluição do rio nas redes sociais, encaminhando-as para as autoridades competentes. A empresa exigia 250 mil euros de indemnização, numa disputa que terminou em 2019. Um outro caso refere-se a Pedro Triguinho, ambientalista, por ter denunciado a fabricante de óleos vegetais, Fabrióleo, como um verdadeiro ‘cancro’ poluidor”. Foi absolvido, mas seguiu-se outro processo, da mesma empresa, por denúncias feitas em 2017, no final de uma manifestação do movimento Protejo, no Terreiro do Paço, em Lisboa.
uma Diretiva sobre leis que contrariem o alargar do fenómeno das SLAPPs na Europa. O CE diz que este problema não diz respeito apenas à imprensa, mas a todos aqueles que falam pelo interesse público e responsabilizam os poderes. Todos correm o risco de se tornar o alvo de “SLAPPs”. O CE considera que estes processos ameaçam o estado de direito, ao impedirem que alguns se manifestem contra atividades ilegais e casos de corrupção. Na medida em que abusam das leis e dos tribunais, essas ações também representam uma sobrecarga para os sistemas de justiça e representam uma ameaça à confiança mútua e à cooperação entre os tribunais dos países da
Otília Leitão
O INTERESSE PÚBLICO NA ÉTICA E DEONTOLOGIA DOS JORNALISTAS
UE. Tais estratégias também desencorajam aqueles que pretendem realizar livremente o seu trabalho, sobretudo em países onde o risco de serem processados é maior, dificultando a sua liberdade de movimento. PORTUGAL: há medo de bulies
Em Portugal as ações estratégicas para silenciar a crítica começam a evidenciar-se perante processos de investigação e, embora não se saiba se são deliberadas, porque legais, algumas suscitam uma específica reflexão, pois não podemos perder de vista a exigência de rigor e ética daqueles que denunciam em nome do interesse público, nomeadamente os Jornalistas. O país foi colocado quarto lugar, num concurso europeu para chamar a atenção dos maiores agressores legais, pela Coalition Against SLAPPs in Europe (CASE) que promoveu em 2021 o European SLAPP Contest. Nele ficou registada a empresária Isabel dos Santos, na categoria internacional “concedida aos esforços mais desavergonhados de um reclamante internacional para usar os tribunais europeus para silenciar críticas e dissidências”. A filha do ex-presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, foi referida no início de 2020 pelos Luanda Leaks, e deu origem uma série de investigações criminais em empresas associadas em Portugal, Angola e Holanda. A CASE recorda que, alguns meses antes dessa divulgação, a empresária processou a exeurodeputada portuguesa Ana Gomes que a acusou de lavagem de dinheiro, alegando que a sua reputação e bom nome foram prejudicados. Em 2018 o Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas alertou para estes processos no que considerou “Bulling económico” e deu exemplo da TVI, alvo de processos indemnizatórios na sequência da emissão do trabalho de investigação das jornalistas Judite França e Alexandra Borges, intitulado ‘O segredo dos deuses’.
Neste eram relatados factos de interesse público sobre responsáveis da Igreja Universal do Reino de Deus num processo pouco claro de adoções de crianças. Outros jornalistas têm sido alvo de ações idênticas, nomeadamente uma ação apresentada contra o jornalista José António Cerejo e o jornal Público, a propósito de uma investigação sobre o comportamento do ex-primeiro ministro José Sócrates quando era deputado do PS por Castelo Branco. Este ameaçou, já em 2022, processar diversos media e jornalistas sobre a cobertura do processo judicial por corrupção, “Operação Marquês”, em que está envolvido. Na sua posição o CDSJ alertou também o poder políticoinstitucional, entre os quais o Governo, Assembleia da República, Entidade Reguladora para a Comunicação Social e a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista para a necessidade de darem atenção e procurarem limitar, este fenómeno, de facto e de direito, que põe em causa o saudável funcionamento da democracia. Apelou ainda ao Conselho Superior de Magistratura para que esteja atento sobre a forma como esta pressão é exercida. Num debate sobre Bullying Económico, em 2021, o CDSJ evidenciou a preocupação pela pressão económica exercida através de instrumentos jurídicos, sobre os jornalistas e os órgãos de comunicação social, a qual condiciona fortemente a investigação jornalística.
Em 12 de Junho de 2019, a Federação Internacional de Jornalistas aprovou uma Carta de Ética Global na qual atualiza o código de Ética de Bordéus de 1954. Composta de 16 pontos e abrangendo 37 itens sobre aspetos de uma conduta desejável, evoca o direito de todos à livre informação no âmbito do artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e proclama que “a responsabilidade do jornalista com o público tem prioridade sobre qualquer outra responsabilidade, em particular para com seus empregadores e autoridades públicas”. Recorda que o jornalista deve respeito à verdade à proteção das fontes e à não discriminação. Código Deontológico do Sindicato dos Jornalistas portugueses, com 11 pontos, tem quase tantos deveres (34) quanto a Carta de Ética Global. Ambos os documentos relativamente à ética e conduta dos jornalistas contêm: “ o direito de investigar livremente os factos de interesse público”; O dever de “não suprimir informações essenciais”; o dever de “verificação dos factos” e “o respeito pela dignidade”. O jornalista “digno desse nome, não deve ser compelido a desempenhar atos contrários às suas convicções ou à sua consciência”.
O professor Jónatas Machado, da Universidade de Coimbra, lembrou que as técnicas usadas são o aproveitamento da morosidade da justiça e dos custos da defesa, fazendo gastar tempo e energias com diferentes tipos de queixas junto de entidades reguladoras. O Professor explicou que se usa muitas vezes o atentado ao bom nome, reputação e à privacidade
para se exigirem indemnizações muito pesadas. O objetivo será a “retaliação” e “punir o crítico”, dissuadindo, não só aquele que criticou, mas também todos os outros que poderiam criticar, considerou. Esta, disse, é uma forma muito grave de atentado à liberdade de expressão que pretende “aniquilar” o adversário, e “uma ameaça à cidadania e à participação democrática”. Jonatas Machado defendeu que uma aposta na legislação anti-SLAPP daria aos juízes meios para despistar este tipo de ações. Ao mesmo tempo, argumentou, os jornalistas e os cidadãos deveriam gozar de uma “imunidade” semelhante à dos políticos, sempre que se discutam temas de “relevante interesse público”. Os mecanismos anti-SLAPP e a prova de mérito
Embora nenhum estado-membro da União Europeia tenha desenvolvido ainda uma estrutura de combate às SLAPPs, como as legislações dos EUA, Canadá e Austrália que já apresentam um particular desenvolvimento jurídico, vários textos aprovados no âmbito do Conselho da Europa referem-se ao problema, ou de outras formas de procedimentos intimidativos ou vexatórios intentados contra media e jornalistas, incluindo online.
Nos Estados Unidos, o Colorado, um dos dezanove Estados que assinaram uma lei anti-SLAPP para proteger a liberdade de expressão em assuntos públicos, aprovou legislação para prevenir os media e jornalistas da ameaça financeira de casos de difamação sem fundamento, proteções essenciais para a recolha de notícias sem medos. Um requerente que apresentar um caso sem mérito e que os tribunais rejeitem ao abrigo de uma lei anti-SLAPP, pode ser condenado a reembolsar as custas judiciais sofridas pelo réu na sua defesa. Um dos casos mais famosos de ações abusivas ocorreu com Oprah Winfrey em 1996, depois de um show intitulado “Dangerous Food”, no qual a autora convidou especialistas da doença das vacas loucas, a comentarem, e disse na altura que não comeria outro hambúrguer. Os fazendeiros pediram mais de 12 milhões de dólares, por danos. Na Europa, a Recomendação sobre as funções e responsabilidades dos intermediários da Internet, adotada pelo Comitê de Ministros em março de 2018, estabelece a seguinte obrigação: “As autoridades nacionais devem considerar a adoção de legislação adequada para evitar litígios estratégicos contra a participação pública (SLAPP) ou abusivos e vexatórios, litígio utilizado com o objetivo de restringir o direito à liberdade de expressão de usuários, provedores de conteúdo e intermediários”. Também a Declaração do Comitê de Ministros sobre a utilidade das normas internacionais relativas à busca oportunista de jurisdição em casos de difamação (2012), trata de um aspeto específico das SLAPPs: “Turismo judicial”, uma tática amplamente utilizada de buscar um foro de fácil apreensão e que se considere o mais apto, para proferir a decisão mais favorável. O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) já apreciou vários litígios sobre o equilíbrio entre a liberdade dos media e a proteção da reputação individual. Por exemplo, em 2017 o Tribunal julgou uma ação de difamação contra um editor do jornal diário irlandês, Herald, condenado a pagar mais de um milhão de euros. Alegou que a condenação foi excessiva e violou o direito à liberdade de expressão. Na sua deliberação o TEDH clarificou que não é necessário decidir se a indemnização por danos, impugnada, teve, de facto, um efeito assustador na imprensa: “Por uma questão de princípio as indemnizações imprevisíveis, em casos de difamação, são consideradas capazes de ter tal efeito e, portanto, exigem o escrutínio mais cuidadoso (...)”.
A Diretiva futura contra “ações judiciais abusivas”
Em 2020 e na sequência de consultas a profissionais do direito, académicos, organizações dos direitos humanos, a União Europeia esboçou uma Diretiva Modelo anti-SLAPP, personalizada. É proposto que a definição e o método de análise adotado forneça aos legisladores uma base sólida para um futuro instrumento e reitera a necessidade premente de novas medidas com vista a salvaguardar o mercado interno e o Estado de direito na União Europeia. Sheldrick, em Blocking Public Participation: The Use of Strategic Litigation to Silence Political Expression, refere que o modelo substitui Strategig Lawsuit Public Participation, (na sua tradução, Ação Estratégica), por “Ação Judicial Abusiva Contra a Participação Pública”. Trata-se de uma nuance já que tais ações são legais. A proposta fornece uma narrativa da natureza do que são processos judiciais relevantes e o efeito inibidor que elas têm sobre a participação pública. De acordo com o modelo elaborado, “ação judicial abusiva” refere-se a uma reclamação que surge de uma participação pública de alguém na defesa de
Medidas anti SLAPPs!
Otília Leitão
assuntos de interesse público. É manifestamente infundada ou caracterizada por elementos indicativos de abuso de direitos ou de leis de processo e, portanto, usa o processo judicial para fins que não sejam genuinamente afirmar, reivindicar ou exercer um direito. À laia de conclusão notamos que para a União Europeia, o fluxo livre de informações e ideias está no cerne da própria noção de democracia, sendo necessário salvaguardar um espaço público pluralista em que os cidadãos possam participar de uma forma informada nas decisões que os afetam. Também o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem defendido nas suas deliberações que conceder indemnizações excessivamente elevadas pode ter um efeito negativo na liberdade de expressão, pelo que considera que os Estados têm a obrigação de criar um ambiente propício à participação nos debates públicos de todos os interessados, permitindolhes expressar suas opiniões e ideias sem medo. Diremos que, como a democracia e o Estado de direito precisam de defender-se de ameaças constantes, esperamos que os legisladores se inspirem nessas propostas para estabelecer regras para combater esses processos maliciosos e garantir o debate público sobre questões de interesse geral.
Resultados de um inquérito
SLAPPs! para que vos quero?
LEIS ANTI-SLAPPS E EDUCAÇÃO ÉTICA DOS CIDADÃOS SERÃO ANTÍDOTOS
Para compreender a perceção dos cidadãos sobre o que são as SLAPPs e a importância no seu combate, lançámos um inquérito com cinco questões que foi colocado na rede social Facebook e em grupos de jornalistas, ambientalistas, advogados e defensores dos direitos humanos. O inquérito esteve online de 20 de março a 30 de março. Obteve-se uma amostra, de conveniência, de 127 respostas. A análise descritiva, da amostra, destaca que mais de metade dos respondentes são mulheres (60,6%). Os homens representam 39,4%, das pessoas que preencheram o questionário. No que diz respeito às idades, sobressarem as pessoas entre os 26 e 52 anos e dos 52 aos 78 anos. 89% dos participantes possui o ensino superior e os restantes 11% têm o ensino secundário.
Participaram jornalistas, magistrados, advogados, professores, administrativos sociólogos, assessores, juristas, engenheiros agrícolas, técnicos de sustentabilidade, enfermeiros, médicos, empresários, funcionários públicos e outras não especificadas.
Menos de metade conhece o termo SLAPP
Sobre o conhecimento do termo SLAPPs (acrónimo de Strategic Lawsuit Against Public Participation), verificou-se que a maioria dos respondentes desconhecem esse termo (66%,1). Os que conhecem este termo representam 33,9%.
Leis anti-SLAPP e sensibilização
Convidados a sugerir medidas que contrariem tais processos judiciais estratégicos ou abusivos contra, 70,9% dos respondentes defendeu a criação de leis para o efeito. Quase metade dos participantes no inquérito sugeriu que os magistrados devem ser sensibilizados para o problema (49,6%). Outro tanto (47,2%), preconiza que se fomentem medidas dissuasoras no sentido de evitar que tais processos prossigam. Em quarto lugar surgiu a importância da sensibilização de jornalistas para o problema das SLAPPs (31,4%), seguindo-se um maior conhecimento do tema pelos ativistas de direitos humanos (14,2) e ambientalistas (7,9%). Outras medidas sugeridas pelos participantes, e em igual percentagem, apontam para a transparência de processos, educação ética aos cidadãos, educação no ensino universitário, sensibilização de advogados e mudança de regime político (0,8%).
Medidas anti SLAPPs!
Otília Leitão
Quando instados a comentar se os jornalistas precisam de proteção no exercício do direito a Informar, os participantes, uma larga maioria (84,3%) confirmou que os jornalistas precisam de proteção no exercício da sua atividade. 15,7% dos respondentes disseram que os jornalistas não precisam de proteção.
Sobre a equação da trilogia do Direito à Informação, a Informar e ser Informado, enquanto direitos fundamentais, 68% dos inquiridos confirmaram com um “Sim”, que estes direitos são direitos fundamentais. Outros respondentes, em percentagens inferiores, manifestaram a sua concordância com expressões: “absolutamente”, “sim, mas com limitações”, “completamente”, “sem abusos”, “constitucionalmente”. Tais resultado, leva-nos a inferir que todos os participantes no inquérito concordam que estes direitos dão fundamentais.
Dos inquiridos, 88,2% disseram desconhecer a existência de processos de SLAPPs em Portugal. Apenas 11,8% disseram ter conhecimento deste tipo de estratégias intimidatórias.
Convidados a partilharem, sucintamente, os casos que conheciam, obtivemos a partilha de doze pessoas
Algumas partilhas indicam situações já referidas pela nossa investigação como o caso de Luanda leaks/ Isabel dos Santos e dos guardiões do Tejo, mas do conjunto das respostas surgem outras que indiciam estratégias limitadoras da liberdade de expressão. “um juiz desembargador residente no interior profundo do país que põe ações contra jornalistas em tribunal muito recôndito e pede indemnizações de centenas de milhares de euros” exemplifica um dos participantes. Outro exemplo citado relaciona-se com “atentados ambientais em que se denunciam crimes ambientais e depois quem denuncia sofre retaliações”.
“A participação em assembleias gerais via digital ou presencial que limitam a participação de quem não tem acesso a meios digitais ou vive longe do local da AG.”, foi também uma circunstância cerceadora da liberdade de expressão.
Outra partilha refere que “o próprio Estado, consciente do seu dever de proteção social aos contribuintes, sobrecarrega a justiça com processos que estão perdidos à partida. Os processos da Segurança Social, são a pandemia na justiça”.
Um “Juiz que presidiu ao julgamento, não assinou as respetivas Atas, nem a Meritíssima que assinou esses documentos compareceu a qualquer uma das citadas audiências”, assim como “alguns artigos de jornalistas, são pagos no sentido de influenciar a opinião”, são apontados como um exemplo de estratégias cerceadoras do apuramento da verdade.
Por último foi partilhado o facto de funcionários de uma autarquia terem denunciado casos de corrupção durante uma assembleia geral, e depois sere surpreendidos com processos disciplinares, sendo obrigados a desmentir o que disseram e acusados de terem o “complexo de Deus”.
Dos resultados aqui demonstrados, e numa espécie de analogia, concluímos que a maior parte das pessoas desconhece não só o termo SLAPPs mas também o tipo do seu conteúdo. A maioria concorda que são necessárias leis no combate a este fenómeno, mas preconiza também a sensibilização de profissionais e de educação ética dos cidadãos. Todos concordam que o Direito à informação de Informar e ser Informado são fundamentais e uma larga maioria considera que os jornalistas precisam de proteção no exercício de informar.