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BREVE HISTÓRICO SEXUAL
Como qualquer coisa que tem seu sentido de “normalidade“ retirado, a história da homossexualidade no Brasil sempre foi encoberta e/ou diminuída, tratada como uma consequência recente de um mundo globalizado. Fato é que, até onde se tem registros, existem relatos homoafetivos no país desde a sua colonização e, muito provavelmente, antes também.
Historicamente, a pegação entre homens em espaços públicos no meio urbano do Rio de Janeiro, se dava por lugares específicos: zonas e “buracos”. Curiosamente, esses lugares eram bastante conhecidos, como o Campo de Santana, por exemplo, que durante os séculos XVIII e XIX era famoso por abrigar o flerte entre cavalheiros. O Centro do Rio era lugar ideal para essas práticas que aconteciam abertamente nas ruas, pois na metade do século XX, o bairro se encontrava abandonado pelo Estado devido ao foco de expansão da cidade em direção às zonas Sul e Norte.
A atual região do Aeroporto Santos Dumont, apelidada de Via Ápia, foi um dos pontos de encontro mais conhecidos nos anos 60 ao receber diversas visitas noturnas de homens para encontros momentâneos na rua. Buraco do Cauby, buraco da Maysa e buraco da Rua da Quitanda são apenas mais alguns nomes entre muitos outros que durante os anos 80 viviam entre “normalidade” e perversão. Esses lugares, como quase tudo na vida, tiveram seu auge e sua decadência.
3 MOREIRA, Antônio Carlos. Só para Cavalheiros: Crônicas Urbanas do Jornal Lampião. Rio de Janeiro, 1997.
Mapeamento Via Ápia
Porém, alguns acontecimentos fizeram com que esses lugares perdessem sua vitalidade. A presença da criminalidade e a repressão policial constantemente entravam em conflito com os homens envolvidos à essas práticas na rua, ocasionando violência, prisões e, em alguns casos, mortes. A retomada de investimentos no Centro e o aumento de estabelecimentos voltados para sexo entre homens (cinemas pornô, saunas e bares gays), contribuíram para a diluição de alguns pontos de pegação. Esses lugares foram apresentados como alternativas para encontros mais privados, ajudando a popularizar o sexo entre homens, mas também a vulgarizá-los.
Mas, apesar dessas práticas sexuais entre homens em espaços públicos poderem ser controladas, elas sempre aconteceram e possivelmente sempre vão acontecer, porém, ocupando outros lugares a partir de brechas. O escritor e curador Stephen Wright define a dinâmica de como operam as “brechas”:
“Essas folgas [brechas] na ação normativa (às vezes chamada de vazios legais) emergem rapidamente, mas são prontamente bloqueadas, o que torna o uso de brechas um modo particularmente dinâmico de operação em ambientes vigiados. Os usuários dessas práticas sabem por experiência e observação que, embora seja possível e divertido driblar as autoridades por um tempo, no momento em que a brecha é descoberta, sua janela de oportunidade já começa a se fechar e é hora de partir pra outra.”
Em uma existência considerada como “anormal”, a utilização das brechas é necessária para manter vivo o direito de exercício. Dessa forma, podemos entender as brechas como uma condição necessária para que essas práticas sexuais aconteçam representando assim um lugar de resistência. Vamos visualizar melhor essa dinâmica a seguir.
4 WRIGHT, Stephen. Para um léxico de usos. São Paulo: Editora Aurora, 2016.