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Caso 11 – Problema do movimento uniforme

Caso 11 – Problema do movimento uniforme

Figura 11 - Gráfico do espaço pelo tempo

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O caso 11 refere-se à emissão de uma indicação circunstancial semelhante à ocorrida no caso 5, podendo mesmo substituí-la. Entretanto, em vez do modo de representação puramente gestual do caso 5, a ocorrência agora em análise emprega o modo de representação 3-D, mediante uso de uma régua e representação sonora.

A situação de ensino que originou a emissão da indicação circunstancial foi a seguinte. Em aulas teóricas para o ensino médio que tratavam do conteúdo de cinemática foi objeto de estudo o conceito de velocidade instantânea e, particularmente, como avaliá-la mediante tangentes de gráficos de espaço versus tempo. Em uma atividade de exercícios do professor com toda a classe para aplicar os conceitos estudados, o professor pediu para que fosse examinado um gráfico desenhado na lousa, conforme figura 11, que tratava do movimento realizado por um móvel no espaço em função do tempo. O gráfico compõe-se de uma função horária não linear, outra linear e uma função constante que correspondem a movimentos com velocidade variável, constante e nula no tempo, respectivamente. A intenção do professor com o exercício foi observar se os estudantes reconheciam que no trecho da função linear o movimento é uniforme, pois a velocidade do móvel aí é constante no tempo, dado que nos instantes dessa função as tangentes são constantes.

Em certo momento da explicação do exercício e antes da ocorrência da indicação circunstancial, o professor emitiu um sinal na forma de ato sêmico de ordem e informação para a classe da seguinte forma: (P) “determinem (no gráfico) os instantes em que o movimento do móvel é uniforme”. Percebida a dificuldade dos alunos em reconhecer a mensagem desse sinal, o professor emite outros sinais na forma de ato sêmico de interrogação: (P – “ Lembram o que vimos? A velocidade em um instante t no gráfico do espaço pelo tempo significa que se deve prestar atenção em quê? O que é que tem a ver com velocidade quando se tem um gráfico do espaço pelo tempo? Como a gente pode ver a velocidade, como se pode obter ela?”). Quase todos os alunos permaneceram ainda em silêncio e um aluno incorretamente afirmou que as velocidades precisavam ser achadas pelo espaço divido por cada intervalo de tempo dos trechos, ou seja, pela velocidade média. Em relação aos atos sêmicos de interrogação empregados neste momento temos o que Coutinho e Almeida (2014) classificam como questionamento fechado de baixo nível, com característica, tão somente, de resgatar informações memorizadas dos sujeitos.

Diante da incorreta resposta obtida de dois estudantes e falta de respostas dos demais, evidências estas, respectivamente, de estados de “má e não compreensão” da mensagem por detrás do sinal, na sequência o professor pegou uma régua e sem dizer palavra alguma tangenciou lentamente com a mesma vários instantes dos trechos em todo o gráfico. Ante essa ação, alguns estudantes responderam prontamente que a velocidade tinha a ver com inclinação ou tangente. Imediatamente em seguida, repetiu a mesma ação, mas nos instantes do trecho linear o professor começou a bater a régua com força na lousa para fazer bastante barulho, tendo como objetivo atrair a atenção dos estudantes para essa parte do gráfico e realçar as tangentes nos seus intervalos t1 e t2, ao mesmo tempo em que lança a pergunta: (P) E que mais devemos considerar neste intervalo t1, t2? Alguns alunos respondem: (Al0) “Tangentes.”; (Al1) “As tangentes são sempre iguais porque são velocidades constantes; (Al2) “Porque as tangentes são iguais as velocidades também, tudo igual, é movimento uniforme; (Al0) Movimento com velocidade constante, não é professor?”

Como se constata pelo relato da dinâmica discursiva ocorrida, por meio da demonstração dos gestos com a régua e batidas fortes na lousa houve por parte do professor, respectivamente, conjugação de modos de representação 3-D e sonoro com objetivo de introduzir no discurso signos do tipo indicações

circunstanciais. Esses signos são assim qualificados, pois possuem função de auxiliar a contextualizar, por restrição e direcionamento, a mensagem por detrás do sinal inicial - “determinem os instantes em que o movimento do móvel é uniforme” -, visto o professor ter percebido sua incompletude para os estudantes. Além disso, aparecerem na interlocução de maneira enviesada, porquanto sua mensagem é transmitida indiretamente com vistas a superar a mensagem inacabada do sinal. Essa tipificação é vista com clareza quando contrapomos esse signo com uma presumível emissão imediata e direta de um sinal, como, por exemplo: “Vocês devem ver as tangentes nos instantes de tempo no gráfico, pois elas fornecem as velocidades instantâneas e, com isso, conseguem verificar que no intervalo de tempo t1 a t2 o movimento é uniforme porque as tangentes não variam”.

A persistência da palavra “por detrás” do sinal se justifica em razão do seguinte motivo. É essencial notar que a mensagem “strito sensu” do signo não está vinculada à frase “ipsis litteris’ “determinem os instantes em que o movimento do móvel é uniforme”. Esta é conhecida e evidente para os estudantes, pois não deve haver problemas com a semântica de suas palavras isoladas e nem o que quer dizer a proposição como um todo. De fato, “por detrás” enfatiza o sentido segundo da mensagem e que pertence à subclasse do plano do significado das tangentes como conceito avaliador de velocidades em gráficos e, se constantes, qualifica movimentos como uniformes, que é o objetivo em foco.

Em relação ainda aos termos contextualizar e restrição acima, sublinha-se que o papel da indicação circunstancial é impulsionar a tomada de consciência dos estudantes de que a possibilidade a realizar do movimento uniforme deveria não ser aquela formada pela delimitação da classe mais geral das possibilidades dos conceitos de tangentes para determinação das velocidades instantâneas (V(t) = tgθ (t)), mas para a reduzida subclasse das tangentes que não variam no tempo (tgθ (t) = constante = velocidade = movimento uniforme) entre os vários e disponíveis intervalos de tempos mostrados no gráfico. Com ambas essas possibilidades em jogo no plano do indicante dos gestos com a régua e das batidas fortes no intervalo de tempo de interesse, o professor mirou direcionar a atenção dos estudantes com o fim de reforçar e estabelecer um universo de discurso em que tangentes no gráfico equivalem a velocidades que não deveriam variar para levar ao fechamento da mensagem do sinal e, por conseguinte, a conclusão do movimento uniforme procurado.

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