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Considerações finais

Firmado nos estudos da semiótica e concentrado em uma transposição didática fundada em uma leitura dos conceitos da Comunicação Mensagens e Sinais do trabalho de Luis J. Prieto de 1973, as ideias aqui desenvolvidas propuseram um olhar analítico para perscrutar, entender e caracterizar certas diligências e articulações discursivas que são levadas a cabo por professores comprometidos com um ensino reflexivo de seus estudantes, durante atuações em sala de aula. Notadamente, as diligências e articulações decorreram de interações comunicativas em que a opção pedagógica se voltou para dinâmicas discursivas dialógicas e de autoridade com embasamento em questionamentos propaladas como resultado de investigações da educação científica. Motivados por esse interesse, expôs-se e discutiu-se objetos semióticos que costumam sobrevir durante a interlocução instrucional sempre que estejam postas as referidas composições comunicativas, posto que tais objetos permanecem como constituintes intrínsecos de suas organizações, quando se confere primazia à diálogos com objetivo de propiciar a reflexão autônoma dos aprendizes, tendo em conta a construção do conhecimento científico em nível escolar. Em particular, destacou-se o objeto semiótico redefinido e denominado por nós de indicação circunstancial, cuja natureza sígnica oferece importante implicação para uma aprendizagem com significação. Ao ser fomentado pelo professor durante a interlocução com os estudantes, tal objeto opera como signo indicante de modo a acompanhar e auxiliar a transmissão dos sinais com a finalidade de circunstanciá-los e assisti-los no entendimento de suas mensagens. Sinais e indicações circunstanciais atuam em conjunto para compor e dar formatação a um arranjo de uma estrutura discursiva com a finalidade de aprimoramento do conhecimento do estudante que está sob processo de ensino. Como mencionado, o estatuto do signo de tipo indicação circunstancial é o de tomar parte de dinâmicas de conversação entre professor e estudantes. Seu papel é contextualizar e completar a mensagem emitida pelo sinal,

tendo sempre em consideração uma apropriação insatisfatória da mensagem pelo aprendiz, visando se contrapor às suas incompreensões. Todavia, distintamente da mensagem direta que supostamente deveria transmitir o significado acabado de um sinal, mas que efetivamente deixou de cumprir esse intento, a indicação circunstancial é um signo com característica singular. Isto porque é da sua natureza na composição discursiva encaminhar o raciocínio na direção do fechamento conclusivo da mensagem do sinal, não de maneira direta no entanto, como seria próprio do sinal, mas tergiversada de modo a oferecer apenas indicativos e sugestões na forma de atos sêmicos de informação e interrogação suplementares para incitar o raciocínio autônomo do aprendiz, mediante inferências, rumo à compreensão do que está sendo comunicado, e que se encontra não compreendido ou mal compreendido pela mensagem do sinal.

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Casos apresentados neste livro ilustram e ratificam o afirmado de que as indicações circunstanciais emergem dos mais distintos conteúdos, sendo que sua natureza, entretanto, depende unicamente do formato do momento dialógico da interação professor e estudantes, ou seja, da didática utilizada no momento instrucional. Para cada um dos casos, mostrou-se a separação e a distinção entre os signos sinal e indicação circunstancial no discurso, os modos representacionais variados que comparecem, origem da emissão, funções sêmicas de cada signo, papel instrucional e cognitivo das indicações circunstanciais, e, por fim, efetividade de entendimento. Quanto ao último aspecto relacionado compreensão da mensagem do sinal, evidenciou-se exemplos em que uma única indicação circunstancial cumpriu sua função de aclarar a mensagem do sinal, enquanto em outros isso não foi possível observar, necessitando emissão de mais de uma indicação circunstancial, como o caso 12 revela. Em relação à procedência ou origem da emissão, há exemplos que exibem situações onde a indicação circunstancial sai diretamente do próprio professor ou indiretamente mediante um artefato que ele aproveita, como o acontecido no caso 8. Neste, em particular, o instrumento proveta teve atributo de emissor da indicação circunstancial.

Apesar de não ter sido constatado pelo estudo, é admissível uma situação em que a emissão da indicação circunstancial parta dos estudantes. Ocorrência

esta que poderia ser aproveitada pelo professor para leva-los à compreensão do sinal.

Uma diferente conjectura tem a ver com a intencionalidade ou não do emprego das indicações circunstanciais. Tal quesito tem implicação com a utilização das mesmas em condições quotidianas de sala de aula, empreendimento nada simples de ser conduzido. Um acontecimento particularmente frequente refere-se à ação do professor frente às ocorrências de ensino imprevistas de sala de aula e que permitem abrir espaço durante o processo de interlocução para a instalação de indicações circunstanciais, mesmo que ele não as tenha pensado usar em seu planejamento. Considerada essa possibilidade, há, por exemplo, aqueles que possuem habilidades discursivas inatas que se servem naturalmente e irrefletidamente de indicações circunstanciais. Tais profissionais não merecem maior apontamento dado que já é inata às suas práxis instruir mediante esse encaminhamento.

Por outro lado, para os que não possuam tais destrezas comunicativas, mas que estão convencidos com um formato de ensino reflexivo, aberto, questionador e debatedor, condições para compreensão profunda dos sinais comunicados e que encontram no artifício cognitivo da indicação circunstancial papel importante para essa concretização, podem vir a se tornar cada vez mais hábeis no dia a dia na sua utilização quando se aproveitam de condições imprevistas na sala de aula. Inclusive, a experiência adquirida através das mesmas pode vir a ser empregada de maneira refletida em ocasiões semelhantes com futuras turmas. Logo, a vivência passada torna-se referência para que se opere as indicações circunstanciais com presteza e desenvoltura. Isso porque o professor pode antever dificuldades dos estudantes em pontos específicos do conteúdo e, em razão disso, fica preparado para enfrentá-las com o uso de indicações circunstanciais planejadas. De fato, nesse sentido, os professores se permitem provocar os alunos, indagando-os para, em seguida, emitir indicações circunstanciais a fim de que a aprendizagem se torne substantiva, apesar da indagação não sair espontaneamente dos estudantes. O caso 3 serve como referência para ilustrar isso. Suponhamos que nele não houvesse ocorrido o questionamento de um estudante. O professor, por experiência, poderia antecipar a colocação da problematização da área envolvida para a determinação da pressão interna do gás

da seringa, fazendo uso de um sinal na forma de ato sêmico de interrogação. A partir deste poderia concatenar indicações circunstanciais semelhantes às acontecidas no caso em pauta para conduzir os estudantes por conta própria à compreensão da mensagem do sinal.

Outra ponderação diz respeito a lançar uma indicação circunstancial que o professor supõe ser efetiva para completar a mensagem do sinal, mas que se mostra falsa nesse sentido. Isso pode vir a acontecer de duas maneiras. Uma primeira ocorre quando o professor entende incorretamente que a dificuldade do seu estudante está em um determinado sinal, mas que de fato se encontra em outro. Nesse caso, a emissão da indicação circunstancial é imprópria. A segunda maneira aparece no momento em que ele pressupõe um conhecimento do escolar que este não possui. No exemplo do caso 2 o professor acertou ao partir da provável presunção de que os alunos para os quais estava ensinando já sabiam como fazer para medir uma mesa maior do que a régua e que, consequentemente, conseguiriam associar este conhecimento para medição do volume do líquido, superando assim a dúvida de como obtê-lo. Todavia, tal presunção poderia se mostrar errada em outra situação distinta e a indicação circunstancial seria ineficaz nesse caso. Por fim, como em toda atividade de ensino, não se deve esperar por resultados sempre positivos na sua utilização, como as limitações apresentadas fazem demonstrar.

É preciso lembrar, ainda, que o estudo se circunscreveu ao ensino dos conteúdos de física, mas em princípio o instrumento da indicação circunstancial não tem porque não ser voltado e aplicado a outras disciplinas. Como vimos, a justificativa para isso vem em razão do elemento semiótico da indicação circunstancial e congêneres serem originários do campo Análise de Discurso, que procura esclarecer o funcionamento dos seus mecanismos para explicar como os sentidos são produzidos. Como atribuição, o campo Análise de Discurso volta-se para os mecanismos através dos quais são postos em jogo determinado processo de significação, sem necessariamente buscar o sentido do texto (SUASSUNA, 2008). Ainda que a funcionalidade das entidades indicações circunstanciais nascidas dos sinais permaneça inerente a um tipo de interlocução discursiva, sua funcionalidade e estrutura de conversação independem do

assunto ou disciplina tratados. Logo, sua transferência para ensinos de biologia, química, entre outros, deveria se fazer sem maiores dificuldades.

Enfim, gira em torno da utilização educacional do objeto estruturante do tipo discursivo indicações circunstanciais, um instrumento semiótico fundamental para ativar pensamentos de alto nível dos aprendizes. Na medida em que o professor promover encaminhamentos dialógicos por meio desse instrumento, estará potencializando inferências para encaminhar raciocínios independentes com fins de apropriação pelos estudantes de conceitos científicos. Essa é uma condição basilar para levar à aquisição de conhecimentos científicos muito além da superficialidade. Decerto, o emprego de indicações circunstanciais impulsiona maior qualidade da aprendizagem, meta que deveria estar no horizonte de todos aqueles que pretendem um ensino de excelência.

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