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1.4.2.2 Riscos não financeiros

Pode distinguir-se entre risco de liquidez de mercado e risco de liquidez de financiamento (refere-se à incapacidade de cumprir obrigações de pagamento). Em alguns casos, por exemplo no mercado de um instrumento financeiro (ações, obrigações…), pode secar completamente, resultando na incapacidade total de negociar o ativo. Para os gestores de carteiras de ativos financeiros, se pretendem vender títulos nessas circunstâncias, os vendedores podem encontrar o mercado sem compradores a preços aceitáveis, particularmente em períodos de alto stresse de mercado.

Uma das melhores formas de medir a liquidez é através da monitorização dos volumes de transações, com a regra de que quanto maior o volume médio de transações, mais líquido será o ativo negociado. Mas os padrões históricos do volume podem não se repetir nos momentos em que a liquidez é mais necessária.

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O risco de liquidez é um problema sério e frequentemente difícil de observar e quantificar. As avaliações de liquidez que deixam de considerar os problemas que podem surgir durante os períodos de pressão do mercado são incompletas do ponto de vista da gestão de risco.

1.4.2.2 Riscos não financeiros

Há uma série de riscos que são normalmente classificados como de natureza não financeira, que surgem de uma variedade de fontes, internas e externas.

a) Risco operacional

É o risco de perda resultante de falhas (físicas, técnicas) ou insuficiências nos processos internos, sistemas e pessoas (exemplo, fraude interna, erros de processo e gestão de transações, etc.), ou de eventos externos (exemplos: catástrofes com danos nos ativos físicos ou vandalismo e terrorismo). Decorre de fatores como falhas no sistema de informação, nos sistemas de reporte, nos processos operativos ou de insuficiências dos mecanismos de controlo interno.

As falhas informáticas são bastante comuns (incluindo bugs, vírus e problemas de hardware), mas o desenvolvimento de sistemas de backup e procedimentos de recuperação reduziu o seu impacto nos últimos anos. Bugs e vírus de tecnologia são potencialmente arriscados, mas são controláveis com uma equipa, software e sistemas adequados. Até as pequenas empresas aprenderam a fazer backup de arquivos e retirá-los das suas instalações. As empresas maiores têm práticas de gestão de risco de computadores muito mais abrangentes.

As falhas humanas incluem os erros não intencionais normalmente administráveis que ocorrem em todos os negócios, junto com incidências mais críticas e potencialmente desastrosas de má conduta intencional. Também as práticas laborais e segurança do ambiente de trabalho que incluam atos inconsistentes como a regulamentação sobre acordos

laborais, segurança do ambiente de trabalho e discriminação de funcionários são considerados riscos operacionais.

A definição de risco operacional inclui perdas de eventos externos. Por exemplo, as empresas são ameaçadas por interrupções nos negócios decorrentes do estado do tempo, podendo ter de fechar temporariamente e sofrer sérios danos a longo prazo. Embora o tempo seja uma força externa que está fora do controlo da organização, isso não a isenta de ter os procedimentos internos apropriados para gerir esses problemas. Procedimentos simples e de baixo custo, como ter geradores, dormitórios e alimentos disponíveis, podem ajudar a manter os funcionários por perto e a trabalhar quando as estradas estão fechadas e a eletricidade desligada. As companhias aéreas são particularmente experientes em ajustar rapidamente os seus horários ao estado do tempo e às previsões meteorológicas adversas. Deixar de reagir aos avisos de furacões e a tempestades de neve pode resultar em perdas.

O seguro geralmente cobre danos causados por incêndios, inundações, colheitas, e outros tipos de desastres naturais, mas fornece apenas uma compensação em dinheiro pelas perdas. Portanto, a maioria das empresas possui recursos de backup que podem ser ativados nesses casos. Em alguns casos, as empresas gerem o risco operacional por meio de contratos de seguros, que envolvem uma transferência de risco. Também alguns tipos de contratos de derivados compensam por perdas operacionais (derivados de tempo e catástrofes), mas são pouco eficazes e o mercado ainda não se desenvolveu suficientemente.

A maioria das empresas gere o risco operacional monitorizando os seus sistemas, tomando ações preventivas e tendo um plano em vigor para reagir se tais eventos ocorrerem.

Damodaran, adaptando o quadro de Basileia II às empresas não financeiras, inclui na categoria de risco operacional, o risco de negócio. Este surge associado às escolhas (para criar vantagem competitiva e criar valor para os acionistas) efetuadas no âmbito da gestão da empresa. Faz parte integrante do core business da empresa. Está ligado ao mercado específico em que a empresa opera, incluindo a procura, as inovações tecnológicas, design de produtos, marketing, alterações no comportamento da concorrência, etc. As empresas que operam na mesma linha de negócio, geralmente têm riscos de negócio semelhantes. É o risco de que alterações nas variáveis de um plano de negócios possam inviabilizá-lo. Inclui riscos quantificáveis, tais como o ciclo de negócios e a procura, e riscos não quantificáveis, tais como alterações no comportamento competitivo ou na tecnologia. O risco de negócio pode ser definido como o conjunto de riscos que são parte integrante do core business da empresa, podendo ser identificados numa análise estratégica da empresa e alguns podem ser mitigados. Surge associado aos resultados operacionais, que são arriscados, porque as receitas são arriscadas e os custos de produção também, dependendo de um grande número de fatores, incluindo condições económicas, dinâmica do setor e atuação dos concorrentes, regulamentação, etc. Portanto, os preços dos bens ou serviços oferecidos pelas empresas ou a quantidade vendida podem ser diferentes do esperado. O risco das vendas está ligado à incerteza em relação ao preço e quantidade de bens e serviços. O risco operacional é atribuído

à estrutura de custos operacionais, em particular a utilização de operações a custo fixo. O risco do negócio é, portanto, a combinação do risco de vendas e do risco operacional.

b) Risco de modelo

Um modelo refere-se a um método quantitativo, sistema ou estratégia que aplica técnicas estatísticas, económicas e financeiras para processar dados e obter estimativas. A utilização de modelos tem benefícios inquestionáveis, entre os quais, a automatização da tomada de decisões, que por sua vez facilita a melhoria da eficiência através da redução de custos, mas também a objetividade na tomada de decisão. O risco de modelo é o conjunto de possíveis consequências adversas derivadas de decisões baseadas em modelos. É entendido como as perdas (económicas, reputacionais, etc.) decorrentes de resultados e relatórios incorretos de modelos, ou do seu uso inadequado. O risco de modelo pode provir de três fontes fundamentais: carência de dados, erros metodológicos ou uso inadequado.

Nos últimos anos, observou-se uma tendência nas instituições financeiras para uma maior utilização de modelos para a tomada de decisões, impulsionada pela regulamentação, mas que se manifesta em todos os âmbitos da gestão (através de algoritmos estatísticos ou conjuntos de regras). Também se ampliou o uso de plataformas eletrónicas que executam de forma automática ordens de trading programadas sem intervenção manual (algorithmic trading). Os modelos de avaliação de produtos ou instrumentos financeiros também estão disseminados (exemplos: Black-Scholes; Monte Carlo; CAPM; etc.). Mas o seu uso estendeu-se às empresas não financeiras. No âmbito comercial, permite-se ao cliente selecionar as características de um produto, e o sistema determina a viabilidade da oferta e preço. Em muitos casos, o modelo faz uma série de perguntas ao cliente e oferece a melhor configuração para as suas características. Por outro lado, têm sido frequentemente utilizados em campanhas comerciais, determinando de forma automática as ações de vinculação e fidelização de clientes, incluindo a venda cruzada de produtos e serviços.

c) Risco de liquidação

Trata-se de um risco relacionado com o risco de incumprimento, mas que lida com a liquidação dos pagamentos que ocorrem imediatamente antes do incumprimento. Por exemplo, os pagamentos associados à compra e venda de títulos, como ações e outros tipos de títulos, juntamente com as transferências em dinheiro executadas para swaps, forwards, opções e outros derivados, são designados genericamente de liquidações.

O processo de liquidação de um contrato envolve uma ou ambas as partes fazendo pagamentos e/ou transferências de ativos para a outra parte. Define-se risco de liquidação o risco de que uma parte esteja em processo de pagamento à contraparte e ao mesmo tempo declare falência. Nesse ponto, a contraparte não recebe o montante, exceto possivelmente mais tarde, por meio de um processo de falência normalmente lento e complexo. Embora as consequências financeiras sejam altas, a origem do risco é o tempo do próprio processo de

pagamento. Note-se que a liquidação também pode falhar devido a problemas operacionais, mesmo quando a contraparte merece crédito, mas o risco, nesse caso, seria considerado um risco operacional.

No entanto, a falência não ocorre com frequência. Além disso, na liquidação contínua em que, por exemplo, os pagamentos dos contratos de câmbio são executados simultaneamente, esse risco é mitigado.

d) Risco regulatório

É o risco associado à incerteza de como uma transação será regulada ou à possibilidade de alterações nos regulamentos. Os mercados financeiros de ações, títulos, futuros e derivados negociados em bolsa, são geralmente regulamentados. No que diz respeito aos derivados, as empresas são reguladas de outras formas, podendo ter as transações com derivados reguladas de forma indireta. A regulação é uma fonte de incerteza. Os mercados regulamentados estão sempre sujeitos ao risco de o regime regulamentar existente se tornar mais oneroso ou mais restritivo.

e) Risco legal/contratual

Quase todas as transações, financeiras e não financeiras, estão sujeitas a alguma forma de lei contratual. Qualquer contrato tem duas partes, cada uma obrigada a fazer algo pela outra. Se uma parte deixar de cumprir, o contrato pode ser revogado e pode envolver litígio, especialmente se ocorrerem perdas significativas. A principal preocupação jurídica é que os termos de um contrato possam não ser mantidos pelo sistema jurídico. Por exemplo, quando uma identifica uma questão legal que interpreta como dando o direito à recusa de pagamento.

O litígio normalmente envolve incerteza, porque até mesmo um caso aparentemente fácil pode ser dirimido em tribunal. Isto cria uma forma de risco contratual: a possibilidade de perda decorrente do incumprimento de um contrato no qual uma empresa tem interesses.

f) Risco fiscal

O risco fiscal surge devido à incerteza associada às leis fiscais. A legislação tributária que cobre a propriedade e as transacções, pode ser complexa, e a tributação, por exemplo, das transações de derivados, é uma área de ainda mais confusão e incerteza.

As decisões fiscais esclarecem os assuntos ocasionalmente, mas noutras ocasiões, confundem ainda mais. Além disso, a política tributária frequentemente falha em acompanhar as inovações, por exemplo, nos instrumentos financeiros.

Em alguns casos, as transações que parecem inicialmente isentas de tributação podem ser posteriormente consideradas tributáveis, criando assim uma despesa futura.

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