Se não é a canção nacional, para lá caminha: a presentificação da nação na construção do samba e do

Page 114

português que compõe o argumento central de Rocha Peixoto acerca do estado letárgico da sociedade portuguesa consubstanciada no fado. Atento a esses elementos da obra de Teófilo Braga somados à influência de Oliveira Martins assinalada anteriormente, pode-se, agora, investigar em profundidade os textos de Rocha Peixoto. Conforme se afirmou, serão analisadas duas versões d’O Cruel e Triste Fado: a primeira, publicada no jornal A República Portugueza em 1890, e o opúsculo impresso pela Imprensa Lusitana em 1896.

2.2. A mais imprevista, intensa e dramatica feição: a primeira versão de 1890

Na primeira versão d’O Cruel e Triste Fado, publicada no jornal portuense A República Portugueza de 6 de dezembro de 1890, Rocha Peixoto assina o texto sob o pseudônimo de Crimmel.349 Trata-se de um artigo curto, estampado em duas colunas de uma mesma página do combativo jornal do Porto. Não por acaso, o teor do texto é bastante agressivo, característica que, de forma alguma, constitui uma exceção na imprensa da época. Contudo, não deixa de ser curioso que, embora não exclua o tom rude, amenize-o nas versões posteriores. No início do texto ele afirma que um povo manifesta de forma espontânea e despercebida as características intrínsecas que já introjetara como naturalmente suas. Seriam essas expressões o objeto de trabalho dos etnógrafos: á generalidade do publico passam de largo factos que, pormenorizando a vida social d’um povo no que ella tem de mais flagrante e caracteristico, lhe imprimem a mais imprevista, intensa e dramática feição. Será, porém, base para maçorraes divagações dos ethnologistas esse acaso, a sorte, o fado que, em todas as nossas acções, compromissos e acontecimentos capitães da vida, intervem cruel ou felizmente produzindo alanceantes magas ou originando reaes venturas.350

Como se nota na citação, o autor utiliza o significado latino da expressão fado, como sinônimo de “acaso”, “sorte”, “destino”. Só no decorrer do texto o termo recebe a alcunha musical. Viu-se anteriormente que, para Teófilo Braga, a poesia popular surge como “fatalidade

349 350

CRIMMEL. A República Portugueza, Porto, 1º ano, nº 67, 6 de dezembro de 1890, p. 1. CRIMMEL. A República Portugueza, Porto, 1º ano, nº 67, 6 de dezembro de 1890, p. 1. 114


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.