Brasil
martina cavalcanti revista@cidadenova.org.br
Vidas secas
Betto Silva | Norte Energia
em plena Amazônia Casas de um dos Reassentamentos Urbanos Coletivos construídos em Altamira/PA
IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS Enquanto a usina de Belo Monte aguarda o alagamento do rio Xingu para se tornar a terceira maior hidrelétrica do mundo, moradores ribeirinhos são removidos sob a previsão de um futuro árido na região mais úmida do país
“T
enho 46 anos e mais de 35 como barqueiro. Comecei com nove anos ajudando meus pais. Sou filho do rio Xingu. Nasci na beira do rio, debaixo de um pé de caju. Hoje continuo aqui, mas, ao invés de vida, só vejo destruição.” A incerteza sobre o amanhã move e comove o barqueiro Antônio Gomes Xavier, removido da beira do rio Xingu por conta da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, que promete ser a terceira maior do mundo, atrás da chinesa Três Gargantas e da binacional Itaipu. As obras iniciadas em 2011 levaram mais de 7 mil famílias a uma mudança repentina. A vida, antes irrigada pelo rio, está se tornando cada vez mais árida. “Não tem mais passageiro para levar de barco. Fico pensando na
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Cidade Nova • Novembro 2015 • nº 11
minha vida, como vou conseguir dinheiro para manter minha família. Não sei mais o que fazer. Minha tristeza é essa. E isso não é só eu, não. É todo mundo que trabalha aqui no rio.” Profissões que deixam de existir, separação de amigos e parentes, insegurança, casas que não respeitam o modo de vida local e falta de acesso à infraestrutura são alguns dos elementos que compõem o cenário enfrentado atualmente pelos habitantes de Altamira (PA). Tudo parecia caminhar bem em 2011, quando a concessionária Norte Energia teve que assinar um documento chamado Projeto Básico Ambiental (PBA), que lista uma série de condições para a execução da obra. Entre elas, a garantia de moradia e produção no mínimo semelhantes
em relação às que as famílias removidas dispunham antes da implantação do empreendimento. A promessa encheu os moradores de esperança. Em agosto, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Na turais Renováveis (Ibama) determinou que a empresa suspendesse o processo de realocação de famílias justamente pelo descumprimento desse e de outros compromissos. A história de Antônio evidencia o descaso. Seu ofício de transportar em barcos gente que morava nas ilhas ao longo do rio até a beira do Xingu, onde começa a cidade de Altamira, não tem mais razão de ser, já que quase todo mundo foi removido dessas áreas. Nenhuma compensação foi oferecida a ele, que contabiliza o prejuízo: “Nosso ganho diminuiu 90%