Quilombos esquecidos

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martina cavalcanti revista@cidadenova.org.br

Valter Campanato | Agência Brasil

cn em série Conflito no campo

Quilombo Kalunga, Comunidade Vão das Almas em Cavalcante (GO)

Quilombos esquecidos TERRA Mesmo com o direito garantido pela Constituição, pouco mais de 190 das 2.600 comunidades reconhecidas como quilombolas tiveram sua terra titulada. A indefinição gera mais violência no campo e desigualdade social

A

noite de 28 de agosto de 2014 ainda ressoa na memória de Maiza Barbosa da Paixão, 36 anos. Foi quando o programa de rádio A Voz do Brasil anunciou o reconhecimento de 24 comunidades quilombolas pela Fundação Palmares. Entre elas, estava a de Curral de Fora, na Bahia, onde Maiza vive com 300 famílias. O anúncio, recebido com felicidade pela comunidade, foi resultado de um processo de cinco anos na vida de Maiza e de mais de 128 na história nacional. Mas, até que essas

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Cidade Nova • Novembro 2016 • nº 11

famílias possam chamar a terra de “sua”, o caminho ainda será longo. Desde a abolição da escravidão, em 1888, muitos quilombolas lutam para conquistar a libertação do território onde seguem a tradição de cultivar alimentos e cultura. Para sanar a dívida centenária, a Constituição de 1988 garantiu o direito de propriedade e titulação aos “remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras”. Porém, nessa época, apenas 44 territórios foram titulados.

Em 2003, o Decreto 4.887 reforçou a necessidade da titulação, tarefa deixada a cargo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Desde então, das 2.600 comunidades reconhecidas pela Palmares – como a que vive Maiza –, apenas 7% receberam títulos (196) e uma parcela ainda menor (33) foi regularizada pelo governo federal. Segundo a organização Terra de Direitos, se o poder público mantiver o ritmo atual, apenas daqui a 970 anos a questão quilombola será resolvida.


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