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Observação

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Finalmente no rumo certo

A Decisão Final de Investimento do projecto da Área 1 da Bacia do Rovuma vai mudar a face de Moçambique. Como há anos já sabíamos, apesar de só agora finalmente termos percebido quando isso irá acontecer. Os primeiros passos da maior transformação da história do país já começaram a ser dados. Saiba quais serão os próximos e com que consequências

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“um momento histórico para moçam-

bique”. Foi a expressão mais ouvida no dia 18 de Junho, na cerimónia de apresentação da Decisão Final de Investimento do projecto da Área 1 Moçambique LNG, liderada pela Anadarko, “e o início do caminho para a criação de milhares de postos de trabalho, de um crescimento económico significativo e a confirmação do potencial para ser um dos maiores fornecedores mundiais de energia limpa durante décadas. É realmente um dos projectos mais importantes e transformadores da história do nosso país.” É na pequena península de Afungi (distrito de Palma), em Cabo Delgado, que moram as esperanças de um país que é grande mas quer ser maior. Com uma extensão calculada de sete mil hectares, é ali que a multinacional norte-americana pretende desenvolver um parque industrial para o processamento de gás natural liquefeito (LNG), que envolverá dois trens de GNL de 6,44 milhões de toneladas por ano de capacidade, cada um conectado aos campos de produção marítima por meio de um gasoduto de 40 quilómetros. A ‘colheita’, ou o gás, será extraído de um conjunto de 20 poços

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biliões de pés cúbicos (Tcf) Os recursOs recuperáveis de gás natural na área 1, Onde a anadarkO vai desenvOlver um dOs maiOres prOjectOs de gnl dO mundO. O prOjectO de explOraçãO custa entre 20 e 25 mil milhões de dólares e é O maiOr investimentO privadO de sempre em áfrica

submarinos, alguns deles preparados para produzir 2 mil milhões de pés cúbicos diários. O plano de desenvolvimento prevê, ainda, duas linhas de liquefação, instaladas em terra e está previsto o desenvolvimento de uma linha de abastecimento de gás doméstico para o mercado nacional. O investimento, já o sabemos, fica num valor entre os 20 e os 25 mil milhões de dólares. “Agora, o presente encontra-se com o futuro para projectar os caminhos que irão alavancar Moçambique na região e no mundo. Será o nossos legado para o futuro”. O impacto será tangível e cria expectativas para o futuro. Só com a receita das royalties e mais-valias negociadas com o consórcio da Área 1, será gerada uma receita, partir de 2025, ano de início da exportação efectiva, uma receita a rondar os 2,1 mil milhões de dólares por ano, ao longo de trinta anos. Claro que o que fazer com essa receita, merece debate, e o presidente não a esqueceu, no seu discurso. Já lá vamos. Voltando ao negócio, o anúncio do dia 18 de Junho sublinhou uma convicção que tem vindo a ganhar forma nos últimos meses: a indústria do GNL está a responder

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a uma perspectiva do aumento da demanda global, particularmente proveniente da Ásia, apesar da quebra nos preços da commodity registada neste ano (apesar da subida da cotação do gás nos mercados nos últimos dias do mês). A prova-lo, a corrida dos maiores produtores de GNL em aprovarem mega projectos antes que o mercado seja considerado excessivamente suprido. Só nos últimos nove meses, de Outubro para cá, quando a Royal Dutch Shell assinou seu projecto de 14 mtpa de LNG no Canadá, um total de 60 mtpa (milhões de toneladas por ano) em capacidade de liquefação, incluindo os 12,88 mtpa da Anadarko, foram anunciados o que desencadeou uma onda há muito aguardada de aprovações de projectos de produção. Moçambique agradece esta boa onda.

Quando a FDi passou a ser DFi O momento histórico, em que a sigla em inglês passa a ser dizível em português. A final Investment Decision, passou a ser Decisão Final de Investimento. Os prenúncios sucederam-se, nos últimos meses. Em Setembro passado, Gonzalo Cabrera, global manager de GNL e análise de mercado da Anadarko, sublinhava o arranque do projecto e da construção de habitações (fase do reassentamento) mas colocava o foco na conclusão dos SPAs (Sales purchase Agreements, ou contratos de venda, em português). Essas garantias de venda, a longo prazo, mostraram-se essenciais para funcionar como colateral na, também ela mega-operação de busca de financiamento de 14 mil milhões de dólares (os restantes, resultam de capitais próprios da Anadarko e parceiros de concessão). A esse nível, contratos de venda como os recentemente alcançados com a Jera, de Taiwan, ou a Pertamina, a empresa de energia estatal indonésia foram decisivos. “Espera-se que sejam dos mercados de gás natural que mais crescem na Ásia”, escrevia Mitch Ingram, vice-presidente executivo da Anadarko International, aquando do fecho dos acordos de venda, numa nota publicada pela petrolífera. Mas, para lá desses dois acordos firmados há poucos meses, só no neste primeiro semestre do ano, a Anadarko anunciou SPA’s com outros gigantes como a Bharat, a Shell, a Tokyo Gas e Centrica ou a chinesa CNOOC, a maioria deles por períodos longos que variam entre os 15 e os 20 anos. Frank Harris, director da Wood Mackenzie, consultora especializada em recursos energéticos, enumera como “os acordos comerciais flexíveis, incluindo um acordo de compra inovador com a Tokyo Gas e a Centrica, foram fundamentais para garantir ao projecto uma lista de clientes de alta qualidade num mercado lotado de GNL.”

WAlker Al

CEO da anadardo

“Projectos desta magnitude requerem coordenação, planeamento e execução, um trabalho de amor de mais de uma década. Este é um milestone para o pais, a região e o mundo, um momento transformativo cujas receitas podem ter impacto global”

momento em movimento Foi um movimento que prenunciou o momento que se seguiria, com oclusão no dia 18 de Junho. Mas, ainda antes da cereja no topo do bolo, e do anúncio da DFI, ainda, o Conselho de Ministros de Moçambique aprovava a estrutura de financiamento do projecto GNL Golfinho

Atum, e o investimento total entre os 20 e os 25 mil milhões de dólares financiados, num acordo de financiamento que não pressupõe qualquer garantia soberana por parte do Estado. Na tenda erigida na Universidade Eduardo Mondlane para acolher a celebração, Al Walker, o chairman e CEO da Anadarko, falava de “um processo longo que representa não a oportunidade de uma geração, mas a oportunidade de uma vida”. E continuava referindo que, ao longo de anos, se assistiu a “um modelo de colaboração em projecto entre o INP, o Ministério dos Recursos Minerais e Energia e os povos da península de Afungi e de Cabo Delgado. Projectos desta magnitude requerem coordenação, planeamento e execução, um trabalho de amor de mais de uma década. Este é um milestone para o pais, a região e o mundo, um momento transformativo cujas receitas podem ter impacto global. Cm o tempo o PIB de Moçambique irá duplicar, serão criados milhares de empregos o que irá gerar sustentabilidade. Em termos ambientais, numa altura em que o mundo procura novas fontes energéticas, o LNG está bem posicionado a esse nível e servirá de catalizador para novas oportunidades no downstream”, enunciou o CEO de uma empresa que, no final de 2018, tinha aproximadamente 1,47 mil milhões de barris de reservas comprovadas, tornando-se uma das maiores em atividade na exploração e produção e que passa, também ela, por uma fase de mudança, com a aquisição por parte da Occidental Petroleum Corporation que já anunciou a venda dos activos de oil&gas da Anadarko em África (entre os quais Moçambique), ao grupo Total, por 8,8 mil milhões de dólares. Walker não foi o único exultante. “Este é um dos projectos mais significativos que a empresa já realizou, e isso é verdade não apenas pelo tamanho do esforço, mas também por seu valor transformacional óbvio para este país e para o mundo”, dizia Tatsuo Yasunaga, CEO da japonesa Mitsui, o segundo operador da Área 1, com uma quota de 20%. “Continua a ser uma grande fonte de orgulho para a nossa empresa e os nossos colaboradores o papel que ajudámos a desempenhar para tornar este anúncio possível. Agora é hora de executar, e acredito que esta parceria está bem posicionada para fazer exactamente isso. ”

engenharia financeira Esta DFI tem, em si, toda uma engenhosa e intrincada formulação. Da negociação, à concretização e implementação passo a passo, de uma forma tão estratégica quanto complexa. A começar pelo facto de a construção levada a cabo pela joint venture em que a Anadarko (Área 1) ter ligação com a da Área 4 (Exxon Mobil-Eni), nomeadamente ao nível dos projectos onshore de GNL. É que os operadores da Área 1 são responsáveis pela construção de instalações de apoio a serem partilhadas entre as áreas, incluindo uma instalação de descarregamento e um terminal marítimo de GNL. O que abre, naturalmente, mais uma porta para o próximo DFI a ser revelado, crê-se que no próximo trimestre, pela joint venture da Área 4, (Moçambique

O que MOçaMbique ganha cOM a Área 1?

Para além dos investimentos sociais já anunciados, como o reassentamento das populações, há outros benefícios directos para a economia local e nacional

25 000 000

de dólares de investimento directo

2 100 000

milhões de dólares por ano em mais valias

45 000

empregos na construção e na fase de implementação 5 000

empregos directos para moçambicanos 300

MMcf/d para rede de gás doméstico na fase 2 100

MMcf/d para rede de gás doméstico na fase 1

50%

dos fornecedores ou cerca de 960 empresas, serão nacionais

Nação

OS OpeRADOReD DA ÁReA 1

a anadarko Moçambique área 1 é uma subsidiária integral da anadarko Petroleum Corporation, e o operador maioritário da área offshore

Em %

anadarko

mitsui e&p mozambique área 1 enh rovuma área 1

ongc videsh

beas rovuma energy mozambique

indústria extractiva

bprl ventures mozambique b.v. pttep mozambique area 1 26,5 20

15

10

10

10

10

8.5

FONTE Anadarko

O histórico acordo de financiamento ratificado por Max Tonela e Al Walker na presença do presidente Nyusi não pressupõe qualquer garantia por parte do estado Moçambicano

Rovuma Venture SpA), e que está projectada para uma capacidade máxima de 15 mtpa por ano, mas que, numa primeira fase ficará pelos 12. Essa planta produziria, liquefazia e comercializaria gás de três reservatórios no bloco offshore da Área 4, sendo que dois deles reservatórios atravessam a fronteira com a Área 1 adjacente. Esse DFI, tem um investimento previsto que anda na casa dos 23 mil milhões de dólares e tem início de produção prevista para 2025. E é claro que toda a operação se segue a uma outra, ocorrida em 2017, anunciada pelo consórcio Eni- ExxonMobil, o projecto de GNL flutuante offshore de Coral Sul, na Área 4, com capacidade de até 3,4 mtpa por ano. “Com o forte crescimento da demanda de GNL na Ásia, agora chegou a vez de Moçambique”, escreve Jon Lawrence, analista da equipe de offshore da Wood Mackenzie para a África subsaariana. “Com 20 mil milhões de de dólares, a FID de hoje é a maior investimento já registada em petróleo e gás na África Subsaariana. E Moçambique vai ficar com duas das três operações mais valiosas valiosas do ano na área do a tónica no impacto macro económico, e em algumas acções a seguir. “Acreditamos que o Banco de Moçambique pode continuar os cortes nas taxas de juro de política monetária, interrompidos em Dezembro de 2018, com efeitos positivos sobre o financiamento das empresas e sobre o rendimento das famílias”, defendeu. Fausio Mussa, economista chefe do Standard Bank, alinha pelo mesmo diapasão. “em função do volume de entrada de fundos que resultam do investimento, o Banco Central estaria confortado em fazer um corte na taxa de juro, dependendo da magnitude dos fundos que ficarão disponíveis no mercado moçambicano”. As empresas agradeceriam, e é por isso que a banca vem esperando, por uma espécie de onda de choque positiva dos mega investimentos, que se sucedam em outros, de média dimensão, esses sim alavancados pela banca nacional. Ao nível cambial, prevê-se, igualmente, um impacto imediato com algum benefício para a economia moçambicana, ou seja, “a melhoria das perspectivas de estabilidade macroeconómica, através da estabilização da moeda e da inflação”. No entanto, tal como Aisen, recomenda “cautela na gestão de expectativas”, até porque, refere, “há um impacto que pode ser imediatos e outro podem ocorrer num longo período”, indicou. Olhando ao quadro global, é mesmo preciso ter

petróleo e gás, logo a seguir ao Arctic LNG-2 na Rússia, a fase dois do projecto Novatek anunciada em Abril, avaliada 25,5 mil milhões de dólares, que terá capacidade anual de produção de 19,8 milhões de tmpa.

‘2 bis’ de receita anual para o estado. e com tendência a aumentar Claro que com um investimento já garantido desta dimensão, e um outro quase da mesma dimensão a ser fechado nos próximos meses, a economia se vai ressentir. O FMI prevê crescimento económico para Moçambique na casa dos dois dígitos a partir de 2023, quando se iniciar a produção de FGNL (plataforma flutuante que será a primeira a entrar em funcionamento, em Novembro de 2022) do consórcio liderado pela ENI, na bacia do Rovuma. E com um crescimento na casa dos 11%, em pouco mais de uma década o PIB actual irá duplicar. No entanto, Ari Aisen, representante do FMI em Moçambique, é cauteloso, e diz que a arrecadação de receitas para os cofres do Estado “ainda levará algum tempo”, diz. E coloca

Nação

UM pROCeSSO LONGO... MAS COM FIM (OU pRINCÍpIO) À VISTA

Quase uma década e meia irá passar entre a descoberta das terceiras maiores reservas de gás natural do mundo e a exportação da primeira remessa de GNL

2010

ano da descoberta de uma das mais importantes descobertas de gás natural nos últimos 20 anos na área Offshore 1 da Bacia Hidrográfica do rovuma.

2017

Finalização dos contratos com o Governo e início da operação de reassentamento.

2018

Fase de encerramento dos financiamentos, dos contratos de construção e de preparação do local de construção.

2019

anúncio da Decisão Final de Investimento a 18 de Junho. até ao fim do ano prevê-se o início da megaconstrução Onshore e Offshore.

2020-22

Fase de assinaturas dos contratos de distribuição, continuação da construção, início do drilling e do recrutamento massivo.

2024

Em finais do ano, ainda sem data marcada, acontecerá o primeiro shipping de Gnl Aumento exponencial da receita do estado e uma anunciada duplicação do pIB nos próximos dez anos levantará o desafio do desenvolvimento, já que o crescimento, esse, tem data marcada

calma, assegura. “O impacto sobre a actividade económica no geral só será relevante a partir do momento em que o país começar a exportar o gás natural, entre finais de 2023 e 2025: Aí poderemos ver a tal aceleração do PIB“, concluiu. A tal, que será impulsionada pelo aumento da receita. A partir de 2025, o país começa a ter uma receita a rondar os 2,1 mil milhões de dólares por ano (só com a Área 1) e prevê-se que, a partir do início da década de 2030 (e com o aumento gradual de produção que também está previsto), a receita do Estado atinja os 3 mil milhões de dólares anuais. Depois, a criação de postos de trabalho é sempre um contribuinte indirecto do crescimento e ela foi muito mencionada na apresentação do DFI, com o projecto GNL Golfinho Atum a empregar já hoje mais de 2 000 pessoas, 800 das quais originárias de Palma, estima-se que no total, o projecto venha a criar mais de 5 000 postos de trabalho directo e 45 000 empregos indirectos. Karen Kelley, secretária adjunta do comercio dos Estados Unidos voltava à história. “A Anadarko fez história para Moçambique e os EUA”. O presidente Nyusi não esqueceu esse princípio e o o “interesse em que se invista no capital humano porque é através do conhecimento que o filho de um operário se pode tornar presidente. Há 960 empresas moçambicanas aptas a fazer negócios com a Anadarko e seus parceiros na fase de construção. É uma oportunidade única de agregar valor aos mega projectos e de fazer crescer a economia, e diminuir as desigualdades sociais apostando na agricultura, turismo, infra-estruturas, educação e saúde. Os resultados não sao para hoje ou amanha, virão a seu tempo. Levará tempo até ao retorno do investimento feito”, discursou, relembrando alguns dos grandes desígnios do país, quando a riqueza prometida pelo gás natural ainda estava longe de ser realidade. Voltando à história, esta está só no princípio, numa espécie de era uma vez de um presente que não se repete. Se vai ser conto de fadas ou livro do desassossego, só o tempo o dirá.

Na voz de...

“Estamos obrigados a uma gEstão consciEntE dos rEcursos”

omar mithá PCA da ENH - Empresa Nacional de Hidrocarbonetos

a decisão final de investi-

mento (dfi) da Anadarko, na Bacia do Rovuma, dissipa todas as dúvidas sobre a concretização do arranque, dentro de quatro anos, da produção e exportação de gás natural liquefeito. Ao mesmo tempo, começa a atribuir-se sentido prioritário a todas as discussões sobre o pós-exploração, nomeadamente o velho tema sobre o que fazer para tornar as receitas do gás num veículo efectivo de promoção do desenvolvimento. Para o PCA da ENH, Omar Mithá, os cerca de 25 mil milhões de dólares que a Anadarko vai investir no seu projecto da Área 1 terão “efeitos transformadores significativos na economia e na sociedade.”

Depois da DFI anunciada em Junho passado, deixa de haver dúvidas de que Moçambique se vai transformar numa potência energética de nível mundial, concorda?

A DFI é um sinal inequívoco de que este projecto será implementado e está pronto para ser desenvolvido, já que encerra em si uma etapa de muita complexidade. Primeiro tecnológica, depois na garantia da venda do gás que será produzido e na questão do financiamento, uma vez que estes projectos têm grande necessidade de alavancagem financeira externa). Portanto, quando se chega a esta fase, todas as etapas críticas necessárias para a sua implementação estão prontas. é um projecto com amplitude substancial, com efeitos transformativos sobre a economia moçambicana, que serve para sinalizar ao mundo que Moçambique passa a ser uma grande província de petróleo e gás a partir deste momento.

E agora, o que se segue?

O ano de 2022 dará início à produção do projecto do barco flutuante que está neste momento em contrução e provavelmente com grau de acabamento acima de um terço. já o da Anadarko poderá levar 4 anos de construção podendo iniciar-se a produção até 2024. Depois o da Exxon Mobil provavelmente estará em funcionamento em 2025. teremos três anos consecutivos em que poderemos ver concretizarem-se três projectos multimilionários...

... Que fazem o país entrar na tabela, e logo pelo topo, dos maiores exportadores de gás do mundo. Estamos preparados para isto?

A decisão da Anadarko mostra que Moçambique é capaz de acolher e estruturar grandes investimentos. No mercado internacional, estes factores

OPRIMEIRO DEsAFIO é, DE FACtO, sABER ONDEIREMOs BusCAR gRANDE PARtEDOs BENEFíCIOs. NuMAPRIMEIRA FAsE, PRECIsAMOs DE sABER quANtOs MOçAMBICANOs PODERãO sER EMPREguEs NOPERíODODE CONstRuçãODOs PROjECtOs

levam a que as reservas de gás que temos sejam vistas como alternativas ao abastecimento dos mercados do Oriente, nomeadamente o japão, China, Coreia do sul e índia. é também uma alternativa importante para as economias que estão preocupadas com a segurança energética nas próximas décadas. Deste modo, entrando no mercado concorrencial, Moçambique passará a ser um dos maiores produtores de LNg do mundo, de facto.

Nesta altura, que números são possíveis avançar sobre os investimentos da Anadarko, bem como o impacto no crescimento económico da entrada em operação dos projectos das outras empresas (ENI e Exxon Mobil)?

temos um projecto cuja DFI foi tomada em 2017 e que está neste momento em fase de construção, que é o do barco flutuante da Área 4 em que a ENI é o operador. também na Área 4 temos um projecto em terra cuja operação técnica está com a Exxon Mobil, com capacidade de 15,6 milhões de toneladas por ano; e um terceiro projecto, na Área 1, operado pela Anadarko, também onshore, cujo investimento poderá estar orçado em 25 mil milhões de dólares para a produção de dois

Na voz de...

módulos de LNg. são no total três projectos com capacidade de 30 milhões de toneladas por ano, uma quantidade sem precedentes em toda a África subsaariana. O impacto destes projectos será um crescimento económico substancial. Na fase de investimento, terão eco na procura de bens e serviços, na criação de emprego e, por arrastamento, ao nível do consumo. Na fase operacional é expectável um crescimento significativo do PIB através do canal das exportações e de alguns investimentos, e depois pelo canal fiscal, podendo desencadear um processo de despesas públicas em infra-estruturas e outros meios que vão estimular a procura agregada. No seu conjunto, os projectos, que estão orçados em cerca de 70 mil milhões de dólares, terão grande impacto na economia, apesar de serem de capital intensivo.

A projecção do crescimento do PIB pelo FMI, logo no ano do início da produção, de 11,1% e com tendência a aumentar, vai mudar o país, e a sua economia, tal como os conhecemos. Estamos preparados?

A dimensão dos projectos é fora do comum porque os investimentos são massivos. é verdade que não vão ocorrer no mesmo ano, mas acumulados quadriplicam o valor do PIB actual. Na fase de exploração, grande parte do gás será exportada ao abrigo de contratos de cerca de 25 anos, numa altura em que as importações serão relativamente menores (uma vez que será posterior à fase da compra de equipamentos pesados), o que melhora os benefícios internos na óptica do rendimento nacional líquido. .

Há alguns anos o Governo elaborou um plano de formação no exterior, à luz do qual enviou jovens estudantes para se formarem em

“PARAEvItARAMALDIçãODOs RECuRsOs sERÁ IMPORtANtE quEAs DEsPEsAs quEFOREMAPROvADAs sEjAMCONsCIENtEs, BEMEstuDADAs E quENãO sEjAM APROPRIADAs POR uM gRuPODEPEssOAs”

diversos países. Existe algum feedback sobre a disponibilidade desta mão-de-obra para estes projectos?

A este nível, o primeiro desafio é, de facto, saber onde é que iremos buscar grande parte dos benefícios. E numa primeira fase, precisamos de saber quantos moçambicanos poderão ser empregues no período de construção dos projectos, que é a fase em que há maior procura de mão-de-obra diversificada ao nível das empreitadas que estão a ser elaboradas. Penso que aí Moçambique poderá ter uma grande oportunidade, mas é preciso formar pessoas e, neste momento, há um grande esforço do Ministério do trabalho, Emprego e segurança social, Ministério dos Recursos Minerais e Energia e das próprias multinacionais no sentido de estabelecer balizas e termos de referência para formar moçambicanos que possam questão de timing terá de ser mais bem definida e, a partir daí, os programas, a escalonagem do tempo e as acções de formação no sentido de fazer coincidir com a real procura.

substituir estrangeiros no período de construção.

E é aqui onde começa a discussão sobre os desafios que esta grande oportunidade impõe às empresas nacionais, nomeadamente as PME. A janela de oportunidade que elas têm neste mega negócio é, de facto, assim tão alargada?

é necessário começar a preparar as PME para que sejam certificadas, e para estarem à altura dos desafios, já que o sector petrolífero tem elevados graus de exigência, quer em termos de timing, quer de standard. Há que se fazer bem a gestão das expectativas, porque se a preparação das PME não for consistente com a procura de bens e serviços das operadoras, irá ter de se recorrer ao capital importado. E se isso for por via de empréstimos pode criar problemas financeiros. Assim, com esta DFI, a

Sente que todo o quadro preparatório para que o gás não seja uma maldição (exemplos disso há pelo mundo) está a ser tomado em conta? Que aspectos críticos se levantam nesta altura sobre esta questão?

Estão a ser tomados em conta, porque há um sério envolvimento ao mais alto nível. Ainda recentemente, na conferência organizada pelo Banco Mundial, FMI e Banco de Moçambique, debatemos com profundidade a questão dos fundos soberanos. Como gerir as nossas reservas cambiais é um tema importantíssimo para o nosso futuro. temos de reconhecer que Moçambique é um país com problemas reais de pobreza.

Faltam infra-estruturas, está em situação líquida negativa em termos de balanço e tudo isso vai exigir que grande parte desses fundos sejam alocados à saúde, educação e, fundamentalmente, para colmatar a pobreza absoluta e outras deficiências que temos no país, até provocadas por catástrofes como o Idai, ou a prevenir eventos futuros. Creio que a médio e longo prazo, com poupanças feitas, com um fundo e uma política de estabilidade bem estabelecida, será possível alocar com transparência esses fundos em função dessa política de investimentos. Para evitar a maldição dos recursos será importante que as despesas que forem aprovadas sejam conscientes, muito bem estudadas e que não sejam apropriadas por um grupo de pessoas e que depois não provoquem outros problemas que vemos em determinados países.

Ao nível local, em Palma, haverá uma mega-operação de reassentamento, numa zona assolada por ataques armados. É este o primeiro grande obstáculo do projecto?

Palma terá casas melhoradas com toda a rede de infra-estruturas necessárias. Não será uma cidade de prédios, mas as casas serão de alvenaria com pavimentação das estradas e ordenamento territorial de primeiro grau. será um exemplo do impacto directo mesmo antes de começar a construção das plantas de gNL. Nessa fase, os jovens de Palma terão emprego. Alguns dos hotéis a serem construídos na região estão já esgotados porque alguns operadores já reservaram alojamento antecipadamente. Portanto, já há impacto positivo da presença destes projectos. Paralelamente, na região de Afungi, será construída numa área de 18 mil hectares (além dos 7 mil onde serão erguidas as duas unidades de produção de GNL) a cidade de gás, que vai contemplar a zona industrial, residencial e de lazer. Os grandes desafios são evidentes porque a região de Palma não tem infra-estruturas nem mão-de-obra qualificada, daí que movimentar para lá 6 000 pessoas e material pesado, sem portos suficientes para receber a carga, pode trazer constrangimentos que serão gradualmente colmatados à medida que for havendo capacidade das infra-estruturas. quanto aos ataques armados, não posso fazer muitos comentários porque é uma questão sensível. Mas a segurança é um aspecto crítico e está claro que os ataques dos insurgentes são uma acção de pura sabotagem, já que não têm demonstrado qualquer legitimidade ou linha política, nem qualquer ligação religiosa. Eu próprio sou natural da Mocímboa da Praia e nunca convivemos com problemas destes, ao ponto de pôr em causa a segurança de pessoas inocentes. Interpreto isto como uma acção de sabotagem. As forças armadas estão a trabalhar no terreno.

Ao contrário do que se poderia esperar, os ataques não interferiram nas decisões de investimento das multinacionais. Que leitura faz desta (aparente) contradição?

é sinal de que as multinacionais estão confiantes no processo. Temos de confiar nas Forças Armadas! Moçambique é um país independente, soberano, com boas relações com os países vizinhos e não temos razões para duvidar que as acções que temos desenvolvido de ponto de vista de defesa terão sucesso no Norte de Cabo Delgado. vamos dizimar os insurgentes.

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