E&M_Edição 52_Agosto 2022 • O que mudou no Standard?

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MOÇAMBIQUE

CONTEÚDO LOCAL ELMAR MOURÃO DEFENDE QUE A PRIORIDADE DEVE SER A ORDEM INSTITUCIONAL E NÃO A LEI NAÇÃO COMO ORIENTAR A POLÍTICA SALARIAL NO CONTEXTO DE BAIXA PRODUTIVIDADE? INOVAÇÕES DAQUI AS TRANSFORMAÇÕES DO MERCADO FINANCEIRO GLOBAL NO FUTURO FACIM “VAMOS APROVEITAR PARA NOS REERGUERMOS”, GIL BIRES

BERNARDO APARÍCIO

O QUE MUDOU NO STANDARD?

Pouco mais de um ano depois da exclusão do Standard Bank do mercado cambial interbancário, o novo CEO considera “justa” a manutenção da interdição e diz que, depois de tudo o que já se alterou, “o banco sairá mais forte”

EDIÇÃO AGOSTO - SETEMBRO 25/08 a 25/09 • Ano 05 • Nº 52 2022 • Preço 250MZN



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OBSERVAÇÃO Estímulo à economia Eficácia do pacote anunciado pelo Presidente da República divide opiniões no seio da sociedade

10 OPINIÃO

71ÓCIO

72 Escape À descoberta dos mistérios de Salamanga, província de Maputo 74 Gourmet Ao sabor das iguarias do Memories Gastro Bar, na cidade de Maputo 75 Adega Que tal experimentar o recém-premiado Gin Benefício? 77 Arte Insegurança em Cabo Delgado retratada em 18 telas na exposição “Êxodo” 78 Ao volante do híbrido D28 Formentor, 100% Eléctrico

MDR “A Nova Lei de Electricidade: Considerações Gerais”, Tiago Mendes & Mónica Moti Guerra, MDR Advogados

12 CONTEÚDO LOCAL Elmar Mourão defende que a prioridade do País não deve ser a Lei, mas a definição de regras institucionais

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OPINIÃO

EY “Impacto da Pandemia na Qualidade de Crédito dos Bancos em Moçambique”, Severino Mateus, senior manager da EY Assurance

20 MACRO Governo quer acelerar projecto de gás veicular para minimizar impacto da subida do preço dos combustíveis

24 OPINIÃO ABSA “Cadeias de Valor Como Impulsionadoras do Desenvolvimento Sustentável”, Januário Valente, Direcção da Banca de Retalho e de Negócios do Absa Bank Moç.

26 NAÇÃO SALÁRIOS 28 Produtividade Especialistas admitem que não há margens para salários altos com baixa produtividade 34 Opinião “Impacto do Programa Medidas de Aceleração Económica a Médio e Longo Prazo”, Wilson Tomás, Research Banco Big 36 Entrevista “Faltam estudos que ajudem a entender a dinâmica dos salários em Moçambique”, Eugénia Pião, senior manager da Ernst & Young 40 Lá Fora A crise está a obrigar muitos governos africanos a adoptarem regras salariais improvisadas

44 OPINIÃO

46 CEO TALKS Bernardo Aparício, CEO do Standard Bank, revela que a interdição da instituição no mercdo cambial interbancário contribuiu para o seu fortalecimento no mercado

53 ESPECIAL INOVAÇÕES DAQUI 54 O Futuro do dinheiro O mundo pode assistir, em breve, à multiplicação da variedade de moedas e ao fim das fronteiras monetárias 58 Feira TraceMarket Quando a inovação está focada nos alimentos que garantem saúde em bem-estar às pessoas

62 OPINIÃO As Fraudes Bancárias Mais Frequentes em Moçambique, Francisco Lourenço, Fraud Unit Manager na FNB Moç.

64 MERCADO E FINANÇAS FACIM abre a 57.ª edição com inovações inspiradas pela crise e a necessidade de acelerar a retoma

68 BAZARKETING

“Impacto da Gestão Eficaz da Saúde e Segurança no Trabalho, na Competitividade das Empresas e na Economia”, Hélio

“A Importância do Cliente”, Thiago Fonseca, sócio e director de criação da Agência GOLO, PCA Grupo LOCAL

Matlonhane, consultor e gestor da Insite Moçambique

de Comunicação SGPS, Lda.


EDITORIAL

Celso Chambisso Editor da Economia & Mercado

Segredos Por Trás das Políticas Salariais

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ecentemente, o Governo anunciou a entrada em vigor de uma Tabela Salarial Única que previa a uniformização dos critérios de definição das regras na matéria de fixação e revisão de salários e remunerações na função pública. Mais do que isso, o instrumento previa o aumento do ordenado dos funcionários públicos em 100%. Isso trouxe, naturalmente, grande expectativa e ansiedade no seio da classe trabalhadora. Longe de pretendermos estender o debate sobre a Tabela Salarial Única – até porque muito sobre o assunto já foi dito e ainda será abordado, visto que a iniciativa ainda está a ser alvo de intervenção – o tema despertou o interesse em abordar o que norteia a política salarial em Moçambique. No sector público e no privado. Partindo do princípio defendido por vários estudiosos, com destaque para os do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) – de que a maior parte dos empregos existentes em Moçambique são precários e oferecem salários muito baixos – a questão de peso é: por onde começar? Aumenta-se o salário para tentar obter ganhos de produtividade e de competitividade ou o caminho correcto é o contrário? Por outras palavras, são os baixos salários que originam a baixa produtividade ou é a baixa produtividade que leva ao fraco poder de compra e à pobreza? A E&M ouviu vários especialistas, todos a apontarem falhas na abor-

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dagem deste tema. A Consultora Ernst & Young, na voz da respectiva Senior Manager, Eugénia Pião, denuncia a falta de estudos especializados sobre como lidar com matérias relativas à remuneração de pessoas (como acontece noutras realidades) entre os grandes motivos da desorganização do mercado nacional. A especialista ajuda também a perceber a diferença de dinâmicas que existe entre o sector público e o privado. Já a principal organização sindical do País, a OTM-CS, assume que não se consegue tomar decisões consistentes sobre o que as pessoas devem ganhar como remuneração, porque falta capacidade de transformar em emprego o grande potencial que existe em trabalho. André Mandlate, secretário para as relações jurídico-laborais da OTM-CS, dá a entender que o que falta é, principalmente, a produtividade. Mas não é apenas em Moçambique que a complexidade deste tema cria desequilíbrios e, em alguns casos, grandes agitações. A E&M faz uma visita a alguns países de África e constata que a improvisação é o denominador comum. Sufocadas pela subida da inflação, face ao aumento dos preços de combustíveis e dos alimentos, as populações vêem nos ajustes salariais a esperança de sobrevivência.

25 AGOSTO | 25 SETEMBRO 2022 • Nº 52

DIRECTOR EXECUTIVO Pedro Cativelos pedro.cativelos@media4development.com EDITOR EXECUTIVO Celso Chambisso JORNALISTAS Ana Mangana, Hermenegildo Langa, Nário Sixpene, Ricardo David Lopes, Rogério Macambize, Rui Trindade, Yana de Almeida, Filomena Bande PAGINAÇÃO José Mundundo FOTOGRAFIA Mariano Silva REVISÃO Manuela Rodrigues dos Santos ÁREA COMERCIAL Enídia Nipita Enidia.Nipita@media4development.com CONSELHO CONSULTIVO Alda Salomão, Andreia Narigão, António Souto; Bernardo Aparício, Denise Branco, Fabrícia de Almeida Henriques, Frederico Silva, Hermano Juvane, Iacumba Ali Aiuba, João Gomes, Narciso Matos, Rogério Samo Gudo, Salim Cripton Valá, Sérgio Nicolini ADMINISTRAÇÃO, REDACÇÃO E PUBLICIDADE Media4Development Rua Ângelo Azarias Chichava nº 311 A — Sommerschield, Maputo – Moçambique; marketing@media4development.com IMPRESSÃO E ACABAMENTO Minerva Print - Maputo - Moçambique TIRAGEM 4 500 exemplares EXPLORAÇÃO EDITORIAL E COMERCIAL EM MOÇAMBIQUE Media4Development NÚMERO DE REGISTO 01/GABINFO-DEPC/2018

Pressionadas, as autoridades, mesmo que com orçamentos sem grandes margens, são obrigadas a responder com medidas extraordinárias, pouco estudadas, e cujos resultados poderão vir a ser uma (má) notícia nos próximos tempos. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



OBSERVAÇÃO

Moçambique, 2022

Estímulos à Economia Vão ou não Resultar? Quando se temia que a economia entrasse em recessão perante a crescente inflação provocada pela guerra na Ucrânia, e quando já cresciam as críticas à política restritiva do Banco de Moçambique, o Governo decidiu intervir a favor do estímulo ao crescimento. No pacote de 20 medidas anunciadas a 9 de Agosto, o destaque vai para os incentivos fiscais, principalmente a redução do IVA de 17% para 16% e a isenção de impostos na importação de bens ligados à agricultura, aquacultura e transportes. Está também prevista a criação de um fundo de financiamento para as PME avaliado em 250 milhões de dólares. Entretanto, a eficácia das medidas anunciadas pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, divide opiniões. Enquanto parte dos economistas, representantes de instituições multilaterais e empresários acreditam que a iniciativa é acertada, outra parte dos fazedores de opinião não deposita fé no alívio à pressão sobre o custo de vida. Não é consensual, por exemplo, que a redução de um ponto percentual no IVA seja suficiente para causar impacto no custo de bens e serviços. A menos que o IVA seja fixado nos 14%. Os partidos da oposição são parte dos que desacreditam a iniciativa do Executivo, considerando as medidas “decepcionantes”, já que “não resolvem o problema da fome e da pobreza”, sendo por isso “cosméticas”. Os próximos tempos encarregar-se-ão de mostrar de que lado está a razão. FOTOGRAFIA D.R.

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RADAR

Economia

Produto Interno Bruto de Moçambique cresceu 4,14% no primeiro semestre de 2022 A economia moçambicana registou um crescimento na ordem de 4,37% no primeiro semestre do ano em curso, um indicador que confirma a tendência de recuperação iniciada em 2021, quando a economia cresceu 2,1 %, depois de uma contracção de 1,2% em 2020. Os dados foram anunciados pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, durante a reunião de negócios da Agenda Africana, que teve lugar recentemente na cidade de Maputo. De acordo com o chefe de Estado, o crescimento reportado este ano poderá ser reafirmado no segundo semestre e foi dinamizado pela agricultura e pecuária, com uma contribuição de quase 24%, comércio e serviços com um peso de 14,4%, transporte, logística e comunicações com 9,6%, e indús-

Panorama

Ministério da Economia prevê derrapagem do metical nos próximos cinco anos Segundo o relatório sobre a execução do Plano Económico e Social e Orçamento do Estado, avançado pelo Ministério da Economia e Finanças, há uma forte possibilidade de a moeda moçambicana perder valor ao longo dos próximos cinco anos. O documento refere que, relativamente aos riscos macroeconómicos, são identificadas três fontes que poderão criar desvios orçamentais caso se materializem, nomeadamente o abrandamento do crescimento económico, a vulnerabilidade da taxa de câmbio e uma inflação acelerada a médio e longo prazo. De acordo com o Ministério da Economia, o sector empresarial do Estado, que representa mais de 12% do PIB, em conjunto com os fenómenos e desastres naturais, são o que tornam a economia nacional cada vez mais vulnerável a estes riscos. No entanto, e para evitar os cenários acima descritos, o Executivo criou políticas económicas que resultaram no aumento da produção nos principais sectores da actividade e disponibilizou um fundo para responder aos desafios do sector empresarial do Estado.

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tria transformadora com um peso de 8,4%. O Presidente disse ainda que a taxa de inflação média anual passou para 7,2% em Junho deste ano, apesar da diferença de um dígito revelar uma tendência de crescimento em comparação com os 5,7% em 2021. Apesar desta taxa de crescimento representar um desempenho satisfatório em termos de números, prevalecem preocupações importantes no que diz respeito à sua tradução no bem-estar das populações, isto é, não tem reflexos visíveis na ampliação dos postos de trabalho e na qualidade de vida das pessoas. Outro desafio da actualidade tem que ver com a rápida subida da inflação – que levou o Governo a aprovar um pacote de metidas de mitigação dos seus impactos.

Taxas de juro

Banco de Moçambique e AMB mantêm prime rate em 20,60% pelo segundo mês consecutivo O Banco de Moçambique (BM) e a Associação Moçambicana de Bancos (AMB) fixaram, em 20,6%, a prime rate que irá vigorar nas instituições de crédito no mês de Agosto, mantendo-a inalterada e elevada pelo segundo mês consecutivo. Até Setembro de 2021, a prime rate situava-se nos 18,6%, nível que permaneceu até Abril de 2022. Com as recentes crises de combustíveis e de alimentos originadas pelo conflito na Ucrânia, o BM e a AMB subiram a taxa para 19,10% em Maio e, em Junho, a prime rate

subiu novamente para 20,6%. A prime rate é a única taxa de referência para as operações de crédito de taxa de juro variável. Esta taxa aplica-se às operações de crédito contratualizadas entre as instituições de crédito, sociedades financeiras e clientes, acrescida de uma margem (spread) que será adicionada ou subtraída mediante a análise de risco de cada categoria de crédito ou operação em concreto. É, portanto, um sinalizador das taxas de juro praticadas pelas instituições de crédito no mercado.

Preços

Inflação atinge novos máximos e chega a 11,77%

O Instituto Nacional de Estatística (INE) anunciou a subida da inflação homóloga em Julho para 11,77 %, o valor mais alto dos últimos quatro anos e nove meses. Em termos cumulativos, de Janeiro a Julho do

ano em curso, o País registou um aumento de preços na ordem de 7,1%, saindo dos 6,44% apresentados no mês anterior. De acordo com o Banco de Moçambique, os sucessivos aumentos dos custos que se verificam desde o início deste ano, ao nível global e nacional, estão associados aos custos de combustíveis e produtos alimentares. As divisões de transportes, com cerca de 19,1%, e de alimentação e bebidas não-alcoólicas, com 17,24%, foram, em termos homólogos, as que registaram maior variação de preços, sendo Nampula a cidade mais cara do País. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


Desenvolvimento

Organização Internacional do Trabalho apoia Moçambique na promoção da empregabilidade

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) anunciou, recentemente, a disponibilidade de 18 milhões de dólares para apoiar a elaboração e implementação de acções, políticas e medidas com vista à promoção do trabalho e empregabilidade em Moçambique. A iniciativa, a ser implementada através

do projecto ‘Moz Trabalha’, já está na sua segunda fase, terá a duração de cinco anos e será financiada pela Agência Sueca para o Desenvolvimento Internacional. As intervenções do projecto ‘Moz Trabalha’ visam a criação de empregos produtivos e trabalho decente para os moçambicanos, particularmente para os jovens e para os que vivem na pobreza. As intervenções serão sempre ancoradas nas prioridades nacionais estabelecidas pelo Governo e centrar-se-ão em resultados que sejam sustentáveis e utilizem uma abordagem que promova a satisfação estrutural, que caracterizará todas as intervenções. Terão também primazia na intervenção do projecto, a ênfase no diálogo social, criação de emprego, disseminação das normas internacionais de trabalho e promoção da igualdade de género.

Fraudes económicas

Moçambique quer reaver fortunas escondidas nos diversos paraísos fiscais pelo mundo

O País está a desencadear procedimentos legais de natureza internacional com vista a recuperar as fortunas de empresários eventualmente escondidas nos paraísos fiscais. A diligência foi anunciada pela directora do Gabinete Central de Recuperação de Activos da Procuradoria-Geral da República, Amélia Machava, justificando que tal facto surge em virtude de haver fortes indícios da existência de capitais de www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

certos empresários ocultados em paraísos fiscais. A ideia é, segundo a fonte, trazer esse dinheiro para servir o País. Um paraíso fiscal, também conhecido por refúgio fiscal, é uma jurisdição onde a lei facilita a aplicação de capitais estrangeiros, com taxas de tributação muito baixas ou nulas. As empresas e contas bancárias abertas em territórios beneficiários do estatuto de paraíso fiscal costumam ser chamadas de offshore.

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OPINIÃO

A Nova Lei de Electricidade: Considerações Gerais

N Tiago Arouca Mendes • Managing Partner & Mónica Moti Guerra • Advogada Sénior • MDR Advogados

“Em termos gerais, a Nova Lei de Electricidade, mantendo os traços gerais da organização e funcionamento do Sistema Eléctrico Nacional, estabelece condições para uma maior e efectiva participação do sector privado no fornecimento de energia eléctrica...”

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o dia 11 de Outubro de 2022 entrará em vigor a Nova Lei de Electricidade, aprovada pela Lei n.º 12/2022, de 11 de Julho, e revogando assim a Lei n.º 21/97, de 1 de Outubro (“Lei de Electricidade”), bem como toda a legislação que contrarie o novo diploma. A Nova Lei de Electricidade visa adequar o quadro legal do sector da electricidade à actual dinâmica social, técnica e financeira, assim como adequar o sector aos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para a concretização da Agenda 2030, com vista a garantir o acesso universal à energia de qualidade, eficiente, viável e limpa e ao aproveitamento do elevado e diversificado potencial das fontes energéticas que o País possui, com destaque para as energias renováveis, diminuindo, deste modo, o recurso a fontes energéticas fósseis e consequente emissão de gases com efeito estufa. Com a nova Lei de Electricidade consolida-se o regime jurídico relativo à produção, armazenamento, transporte e consumo da energia eléctrica, salvaguardando os interesses do Estado, dos investidores e dos consumidores. Entre outras novidades, cria-se a possibilidade de produção de energia eléctrica através de sistemas híbridos. Destacam-se, ainda, as seguintes alterações em relação à actual Lei de Electricidade: • A eliminação da referência, do Conselho Nacional de Electricidade, extinto pela Lei n.º 11/2017, de 8 de Setembro, que criou a Autoridade Reguladora da Energia (ARENE), que é, desde então, a entidade com poder de supervisão, de regulação, de representação, de fiscalização e de sanção relativamente à actividade de fornecimento de energia eléctrica e à operação do sistema e do mercado, bem como de zelar pela defesa dos direitos dos consumidores e demais intervenientes do Sistema Eléctrico Nacional (art. 6.º da Nova Lei de Electricidade); • É criada a figura do Gestor do Sistema Eléctrico Nacional, que garante a operacionalidade e a expansão

do serviço público de fornecimento de energia eléctrica e exerce as funções de i) Operação de Sistema – gestão e condução técnica da produção da rede de transporte e das interligações com países vizinhos, garantindo o equilíbrio entre a produção e o consumo de electricidade, ii) Operação de Mercado – gestão e condução das actividades de contratação e de relação comercial com o mercado eléctrico nacional e regional, de forma criar uma plataforma eficiente para a transacção da electricidade e para o fornecimento de serviços do sistema, e iii) Planeamento do Sistema Eléctrico Nacional, nos termos previstos no n.º 2 do art. 8.º da Nova Lei de Electricidade e em cumprimento das directrizes do Conselho de Ministros (arts. 7.º e 8.º da Nova Lei de Electricidade); • Competirá ao Conselho de Ministros aprovar o estatuto, definir os poderes, as competências e a estrutura orgânica do Gestor do Sistema Eléctrico Nacional que será uma pessoa colectiva de direito público, com autonomia administrativa, financeira e patrimonial; • É criado o Cadastro Energético que consiste numa base de dados da matriz do Sistema Eléctrico Nacional ou com ele relacionada, da qual deverá constar informação sobre a actividade de fornecimento de energia ou de prestação de serviços energéticos, a respectiva suspensão, modificação, prorrogação e extinção, bem como outros dados e informações indicados no n.º 2 do artigo 9.º da Nova Lei de Electricidade (art. 9.º da Nova Lei de Electricidade); • São determinadas as entidades responsáveis pela tramitação dos pedidos de concessão. Ao abrigo do n.º 1 do artigo 11.º da Nova Lei de Electricidade, o pedido de concessão para a produção, transporte, distribuição, comercialização, importação e exportação de energia eléctrica deve ser dirigido ao ministro que superintende a área da energia e é tramitado junto da ARENE; • Mantendo-se a regra da atribuição de concessões mediante concurso púwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


A nova Lei de Electricidade entra em vigor já no próximo dia 11 de Outubro

blico, passam a ser organizados, instruídos e tramitados pela ARENE; Admite-se também a atribuição de concessões por ajuste directo em situações excepcionais, como os casos em que os concursos públicos ficam desertos ou quando se trate de produção de energia eléctrica com recurso a bens que não são do domínio público, entre outros (art. 12.º da Nova Lei de Electricidade); • Previsão expressa da determinação do prazo das concessões de acordo com o estabelecido nos termos da legislação sobre Parcerias Público-Privadas, a qual define, por seu turno, prazos de duração em função da atractividade económico-financeira do empreendimento, do tempo necessário para a sua implementação e o período de recuperação do capital investido, não podendo, em todo o caso, exceder o prazo máximo de 30 anos, quando se trate de contrato de concessão de empreendimento de raiz (art. 16.º da Nova Lei de Electricidade e art. 22.º da Lei n.º 15/2011, de 10 de Agosto); • A importação e exportação de energia eléctrica deve cumprir os requiwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

sitos técnicos e operacionais estabelecidos no Código da Rede Eléctrica Nacional (arts. 18.º e 19.º da Nova Lei de Electricidade); • No seguimento da entrada em vigor do Decreto n.º 93/2021, de 10 de Dezembro, que aprovou o regulamento de acesso à energia nas zonas fora da rede, é criado o regime das mini-redes, definidas como os sistemas integrados de instalações eléctricas de produção, distribuição e comercialização de electricidade, podendo incluir armazenamento e usando fontes de energia renovável, com potência instalada igual ou inferior a 10 Mw, não ligado à rede eléctrica nacional. O estabelecimento de mini-redes que envolvam produção de electricidade carecem de concessão (art. 20.º da Nova Lei de Electricidade); • A actividade de armazenamento de energia eléctrica foi adicionada ao âmbito de aplicação da lei, que prevê que o armazenamento pode ter lugar de forma autónoma ou integrada com as actividades de fornecimento de energia, sendo que as regras e normas sobre os Sistemas de Armazenamento de Energia deverão constar de

regulamentação específica (arts. 2.º e 21.º da Nova Lei de Electricidade); • Os serviços suplementares, tecnicamente indispensáveis à gestão do Sistema Eléctrico Nacional, passam a estar previstos por lei e serão objecto de regulamentação específica (art. 23.º da Nova Lei de Electricidade); • Os direitos e obrigações do consumidor passam a estar regulados e incluem, nomeadamente o direito à informação e à protecção relativa a cláusulas ou condições abusivas, bem como à indemnização dos danos que resultem do fornecimento de bens ou prestação de serviços defeituosos (art. 24.º da Nova Lei de Electricidade); • Explicitação de causas de extinção da concessão, entre as quais, por acordo das partes e pela ocorrência de um evento de força maior insusceptível de reparação ou mitigação (art. 32.º da Nova Lei de Electricidade); • É criado o Fundo de Desmobilização, no qual a concessionária deverá depositar periodicamente fundos destinados a cobrir os custos previstos para a desmobilização, a serem depositados numa conta bancária remunerada a juros, aberta pela concessionária num banco comercial em Moçambique, (art. 35.º da Nova Lei de Electricidade); • Estabelecimento do regime de tarifas, de preços e taxas aplicável no âmbito do Sistema Eléctrico Nacional (arts. 39.º a 42.º da Nova Lei de Electricidade); • Novas previsões em matéria de resolução de litígios (art. 51.º da Nova Lei de Electricidade). Em termos gerais, a Nova Lei de Electricidade, mantendo os traços gerais da organização e funcionamento do Sistema Eléctrico Nacional, estabelece condições para uma maior e efectiva participação do sector privado no fornecimento de energia eléctrica e na implementação de projectos ligados às energias novas e renováveis, bem como maior transparência nos processos de obtenção de concessões. Espera-se que este seja um impulso que permita alcançar um dos objectivos estratégicos do Governo, nomeadamente atingir dois milhões de novas ligações até 2024, beneficiando, deste modo, mais de dez milhões de Moçambicanos e aumentando a ligação de energia de 34% para 64% da população, alargando as condições de abertura do mercado de produção e fornecimento de electricidade ao sector privado. Continua assim a corrida para chegarmos à meta de acesso universal à energia até 2030.

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CONTEÚDO LOCAL

“Não Será Uma Lei que Vai Determinar o Sucesso do Conteúdo Local” Enquanto o Governo, o sector privado e a sociedade civil exigem a aprovação urgente da Lei do Conteúdo Local, o especialista no assunto, Elmar Mourão, defende que, por mais que esta seja criada, sem regras, metodologias e fiscalização, não será possível maximizar o aproveitamento interno da posse de recursos naturais Texto Nário Sixpene • Fotografia Mariano Silva & D.R

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lmar Mourão é um profissional com mais de 30 anos de carreira no sector do Oil & Gás. É representante credenciado e actua como membro do Comité de Conteúdo Local dos Organismos de Certificação na ANP – Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível. Trabalhou em empresas do ramo petrolífero actuando em diversas refinarias, plataformas de produção, plataformas de perfuração e completação, terminais e estações de petróleo e gás. É especialista em Conteúdo Local. Portanto, uma voz que, baseada na experiência do Brasil e de outras partes do mundo, fala com propriedade o que muito poucos disseram até agora: a preocupação da sociedade moçambicana não tem de ser a criação de uma Lei e, sim, de uma entidade que vá trabalhar com o Conteúdo Local no sector do Oil & Gas. Que diferenças é que nota em Moçambique desde que veio pela primeira vez? Quando cá estive pela primeira vez, em 2018, estava a discutir-se a minuta da Lei de Conteúdo Local. Tinha recebido o draft, num primeiro evento que foi realizado pela embaixada do Brasil. Estava presente o ministro dos Recursos Minerais e Energia e outras autoridades do Governo. Era o momento em que se estava a discutir a ideia e eu percebi que não havia muitos avanços naquela altu-

ra. Agora, sinto que o assunto já é debatido, mas ainda sem uma base já definida. Na minha óptica, o Conteúdo Local requer detalhes que têm de ser definidos e que devem ser comuns, não só para o Governo, como para os agentes reguladores, concessionárias e empresas locais. Isso tem de estar definido independentemente de existir ou não uma lei. Por exemplo, o Brasil não tem uma lei de Conteúdo Local, mas existem regras e fiscalização das mesmas. É que uma lei sem regras e respectiva fiscalização não surte nenhum efeito. Por isso, o meu entendimento é o de que, hoje, é o momento de se criar regras e metodologias, independentemente de haver ou não uma lei, e que nela podem, ou não, estar inseridas. Enquanto especialista, creio que tais regras não devem estar, necessariamente, inseridas na lei, porque esta não é susceptível de mudar com facilidade para acompanhar a dinâmica da rápida mudança dos mercados no sector do Oil & Gas. Ou seja, a lei não determina tudo, só enquadra. Depois há normas que dependem da área, é isso? Sim. Se se optar por criar uma lei de Conteúdo Local, num cenário em que há necessidades e posicionamentos diferentes, então, esta não vai alcançar todos os posicionamentos, pois estará incompleta. Isto acontece porque a lei é rígida. Como é que se altera? Tem de ir de novo à Presidência e enfrentar todo um processo complexo, longo e demorado,

“Uma lei sem regras e fiscalização não tem efeito nenhum. O meu entendimento é o de que hoje é o momento de se criar regras e metodologias”

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ao passo que um instrumento instrutivo não. Uma agência pode publicar um novo instrutivo. O que é o “Instrutivo”? Cada país tem um termo, um nome. Em Angola (de onde regressei recentemente), o nome aplicado é ‘instrutivo’. No Brasil , chamamos de ‘resolução’. Indo à explicação, posso dizer que, por exemplo, em Angola, temos, no petróleo, a Agência Nacional do Petróleo. Imaginemos que o Governo decide que quem vai cuidar do segmento do petróleo é esta agência e que cada agência reguladora do seu segmento é que toma decisões no sector a que diz respeito. Então, na agricultura será a agência ou o ministério que responde pela agricultura. A partir daí, imaginando que no petróleo seja o INP, então este certamente terá algum instrumento legal, judicial, etc., que seja publicado. Não sei qual é o termo que usam aqui em Moçambique, mas diz respeito à metodologia publicada e que é utilizada numa determinada área. Moçambique caminha muito para a questão da Lei nos últimos anos. Está a debater-se a falta de uma lei e tem-se referido, aliás, que é por culpa disso que ainda não há Conteúdo Local propriamente dito. Afinal, isto não é bem assim… Não, não é. Tanto que no Brasil não existe Lei de Conteúdo Local, mas as normas são muito bem institucionalizadas. Lá funciona por segmentos. Por exemplo, a ANP (Agência Nacional de Petróleo) é que coloca essas metodologias e regras, chamadas de ‘resolução’. Recentemente, foi feita uma resolução que é constantemente ajustada. Repito: se fosse uma lei teríamos de passar pelo Congresso Nacional por ser infinitamente mais rígida. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


compromisso do Conteúdo Local mínimo que tem de ser atingido em cada índice. Então, ao firmar o contrato, já se assina que a operadora tem de entregar 15% em geologia, 20% em perfuração, 30% no equipamento, 40% nos índices. A partir daí, a agência é que vai fiscalizar a operadora e esta, ao contratar quem ela precisar para executar determinado serviço, vai ter de demandar Conteúdo Local, porque ela é que tem de entregar o comprovativo, e isso é medido através de dinheiro. Por exemplo, no caso de Moçambique, a questão seria: quanto, em meticais, a multinacional investiu em geologia? Depois tem de comprovar quantos desses meticais foi investimento local, e quantos representaram investimento estrangeiro. E como é que se chega a essa medição? Nós não certificamos as empresas, mas sim a execução. Verifica-se, por exemplo, se o estudo de geologia foi realizado por um moçambicano ou por um geólogo estrangeiro; se o serviço foi feito aqui ou em Houston; onde foram processados os dados… Então, a operadora tem de entregar um relatório simples com duas colunas, que digam quanto, em meticais, estão certificados nacionais e a quantia de dinheiro internacional para a agência. E esta vai fazer contas que apuram o índice de conteúdo local de geologia naquele serviço ou bloco.

Qual é a sua definição de Conteúdo Local? Terei de responder de duas formas. Uma é o que eu penso e a outra é, tecnicamente, o que eu acho. Conteúdo Local tem de ser uma ferramenta que vai alocar desenvolvimento ao segmento de cada sector. Conteúdo Local tem de traduzir-se em dinheiro. Então, não se pode medir por pessoa ou por empresa porque, tecnicamente, não terá sucesso. Tomemos o seguinte cenário: à luz da lei, determina-se que seja contratada uma empresa de Moçambique para executar um determinado serviço. A concessionária contrata e, imaginando que a empresa não tenha condições de executar, a operadora é, ainda assim, obrigada a contratar. E, se assim o fizer, terá atingido o Conteúdo Local? Não, porque esta empresa moçambicana, para executar o serviço, vai ter de subcontratar alguém que faça o trabalho e, provavelmente, será um estrangeiro. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

Então, o Conteúdo Local, parecendo, erradamente, que atende à imposição da lei, terá um efeito nulo. Onde estará o conteúdo local? Em nós, trabalhadores? É que, para trabalhar, terá de estar capacitado. Logo, mandar alguém para ser capacitado é uma redundância, afinal, como poderia trabalhar como técnico se não tem capacidade técnica? Fica subentendido que para trabalhar deve ter capacidade. Qual é o modelo que funciona no Brasil? Algumas informações e medidas são de interesses diferentes para o Governo e para a Agência Nacional do Petróleo. É importante eles saberem, para uma melhor tomada de decisões, quanto está a ser investido em geologia, na pesquisa, se tem ou não gás, quanto está a ser investido depois na inspecção, no estudo sísmico e na perfuração. No Brasil, quando as operadoras ganham um bloco de concessão, já têm o

Se há fiscalização também há medidas de prestação de contas, obviamente… Sim. No momento em que se verifica a execução, vai se verificar tambéma aplicação do Conteúdo Local porque, quando no primeiro contrato a operadora não atinge a meta, por exemplo, em geologia, pode receber uma multa. Assim, no contrato seguinte, vai se preocupar em encontrar geólogos locais, trazer um centro de geologia ao País para poder atingir o Conteúdo Local gerando emprego e treinamento de pessoas. É assim que se multiplica o conteúdo local. O Brasil não possui nenhuma lei, mas é um caso de sucesso. Qual é o modelo de Conteúdo Local do Brasil e como se saiu bem? Quando o Brasil implementou a Lei de Conteúdo Local fez exactamente o mesmo papel: buscar exemplos do mundo onde existia esta realidade. Países desenvolvidos que não precisam de ter como objectivo a capacitação, treinamento e educação – refiro-me aos Estados Unidos, Noruega, Inglaterra, entre outros. Não precisam, pois não têm as carências que os nossos países têm. São

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tal vá dizer: “eu tenho, eu cumpro e está aqui a plataforma. Eu amo Moçambique. É muito simples para mim, porque eu trabalhei 20 anos nisto, todos os dias”. Os modelos não podem ser replicados, porque são realidades diferentes, mas os objectivos podem ser comuns. Por exemplo, o Governo pode ter como objectivo, daqui a 30 anos, estar com uma indústria a este nível. Temos, então, de traçar o caminho para chegar a esse objectivo, e aí o Conteúdo Local é uma excelente ferramenta, mas desde que tenha a regra de como chegar aqui, senão passam 30 sem chegar a lado algum. Por exemplo, no Brasil não tínhamos fábricas de equipamentos submarinos, mas hoje exportamos para os Estados Unidos.

“Se não forem claramente definidos os objectivos no quadro do Conteúdo Local, mesmo que passem 30 anos, o gás não trará nenhum avanço” objectivos diferentes, por exemplo, o Governo da Noruega não precisa de se preocupar em capacitar para a educação. A população já é educada, já tem acesso à educação de qualidade. O Brasil, assim como Moçambique e Angola, não têm. Os países emergentes, de um modo geral, não têm. Em Angola, a necessidade que o Governo tem de fazer com que o Conteúdo Local invista na formação passou a ser um investimento das operadoras, custeado pela riqueza do recurso natural. Não sai de uma forma directa dos cofres do Governo, então é uma medida inteligente. Quando o Brasil foi fazer as pesquisas percebeu que o melhor modelo para o país seria este. O Conteúdo Local no Brasil começou a ser obrigatório em 2006. Antes disso não tinha regras nem metodologia. Qual foi o ponto de mudança no Brasil em 2006? Foi quando foram criadas as agências reguladoras para tirar a dependência concentrada na Petrobras, que é uma entidade que, em Angola, corresponde à Sonangol, e em Moçambique é similar à

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Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH). É que havia um pequeno conflito político equiparado a uma eventual oposição entre a ENH e o Instituto Nacional de Petróleos (INP). Uma empresa que, ao mesmo tempo, é operadora, é reguladora e ela mesma fiscaliza pode até resultar de ponto de vista estratégico, mas não no nosso mundo. Na Noruega conseguiriam, talvez. Não no Brasil, nem em Moçambique. Então, ao separar já se pode notar a diferença e foi o que se notou recentemente. Em 2018, em Moçambique, seria o INP. Hoje já não tenho a certeza disso, porque vi outros grupos a tentarem protagonismo no quadro do Conteúdo Local. E isso é o que o Governo não pode deixar que aconteça. A disputa interna para o controlo do Conteúdo Local é satisfatória para as operadoras porque elas é que vão ditando as regras do jogo. A Total está a lançar agora uma plataforma de Conteúdo Local que agrega todos. Mas quem deve coordenar este movimento? Essa plataforma é para a Total e não para o Governo. Imagino que a To-

Para o caso de Moçambique, o que seria determinante para o sucesso do Conteúdo Local? O primeiro passo é definir qual é a entidade que vai ser a responsável por cada segmento, nomeadamente a agricultura, construção civil, petróleo, etc. Um dos primeiros passos é também definir o dono do Conteúdo Local e depois as regras, a metodologia, o número de contratações ou o número de empregos gerados. Por exemplo, pode-se decidir que queremos medir a quantidade de equipamentos que são comprados ou os equipamentos fabricados. Se não houver fábrica, então não se pode medir isso, mas começa-se a forçar para que a manutenção seja feita em Moçambique. Isto é, a operadora vai ter de trazer gente de fora para capacitar nacionais e permitir que a manutenção seja feita dentro do País. Aqui começa-se a desenvolver a indústria, mas a manutenção já estará desenvolvida. Isso é que é apaixonante de ver no Conteúdo Local. Eu vivi isso no Brasil, sei que isso é verdadeiro. Hoje fabricamos tudo no Brasil, com a melhor tecnologia possível e fornecemos para outros países, inclusive no Golfo do México e em África. O sector privado tem estado a fazer muita pressão para a criação do Conteúdo Local. Quem determina a sua criação? O sector privado ou Governo? O que eu percebo dos empresários é que eles acham que a Lei do Conteúdo Local vai fazer com que ganhem dinheiro e contratos. Por isso estão à espera da lei. Mas o caminho que se tem de trilhar é o contrário: é o empresário que tem de provar que é capaz de fazer o Conteúdo Local. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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OPINIÃO

Severino Mateus • Senior Manager EY, Assurance

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e acordo com dados do Banco Mundial, Moçambique registou um crescimento económico médio acima de 7% entre 2001 e 2015. Esta tendência veio a abrandar de 2016 a 2021 com taxas de crescimento a variar num intervalo de -1,2% e 3,8%, sendo a mais baixa registada em 2020. Este abrandamento económico teve como principais causas a instabilidade político-militar na região centro do País, a suspensão do apoio externo e, por fim, as medidas de confinamento adoptadas por vários governos/países com objectivo de conter o surto do covid-19 e evitar o colapso dos sistemas de saúde. As medidas restritivas tiveram impactos directos nas cadeias de distribuição e produção, na restrição de viagens e no cancelamento de vários eventos, com impacto directo na restauração e turismo. A pandemia do covid-19 e a qualidade do crédito O desempenho dos principais sectores da actividade económica é um indicador relevante para avaliar a capacidade dos mutuários liquidarem as suas obrigações junto dos seus financiadores, o qual, por sua vez, impacta directamente a qualidade do crédito concedido pelos Bancos. Desde a sua declaração como pandemia em 11 de Março de 2020, o covid-19 colocou à prova a performance dos principais sectores da economia, desde o produtivo até ao de serviços. Os mais afectados em 2020, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística, foram os sectores da “Hotelaria e Turismo” e “Indústria Extractiva”, cujas retracções foram, respectivamente, de 22% e 15%. No entanto, em 2021, apesar de se verificar uma inversão desta tendência em parte significativa dos sectores de actividade, os sectores da “Hotelaria e Turismo” e da “Indústria Extractiva” mantiveram-se em posições negativas de 1% e 0.6%, respectivamente.

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Impacto da Pandemia na Qualidade de Crédito dos Bancos em Moçambique Qual foi o impacto da pandemia do covid-19 no sector financeiro, nomeadamente sobre as imparidades dos Bancos? As empresas, no geral, ao prepararem as suas demonstrações financeiras, devem estimar as quantias recuperáveis dos seus activos e, caso estas sejam inferiores às quantias registadas contabilisticamente, os diferenciais devem ser reconhecidos como uma perda por imparidade, impactando as respectivas situações patrimoniais. A Norma Internacional de Relato Financeiro 9 (IFRS9) trouxe uma nova abordagem de reconhecimento destas “perdas por imparidade”. Esta abordagem, contrariamente à Norma Internacional de Contabilidade 39 (IAS39), na qual as perdas por imparidade eram reconhecidas quando incorridas, estabelece que as mesmas sejam reconhecidas numa perspectiva de futuro, recorrendo a ponderadores que incorporem os respectivos riscos de ocorrência de um incumprimento. A pandemia de covid-19 trouxe incertezas quanto à fiabilidade de alguns indicadores que eram utilizados para a determinação das perdas por imparidade, obrigando muitas das instituições a calibrarem os seus modelos de apuramento de imparidade para incorporarem factores de ris-

cos adicionais trazidos pela pandemia. Para minimizar o seu impacto, nomeadamente sobre a degradação da qualidade do crédito concedido, as instituições bancárias concederam moratórias que consistiram no alargamento do prazo de pagamento, carências no pagamento do capital financiado, bem como a redução de taxas de juro. A título de exemplo, o Banco de Moçambique disponibilizou, em Março de 2020, uma linha de crédito de 500 milhões de dólares aos Bancos comerciais com o objectivo de financiar a aquisição de bens primários destinados a reduzir os impactos sociais causados pela pandemia. Paralelamente, o Governo moçambicano lançou uma linha de crédito para combater a pandemia no montante de 1 bilião de meticais destinado a apoiar as micro, pequenas e médias empresas, afectadas, ou aquelas que, mesmo não estando afectadas, poderiam contribuir para o aumento da produção e geração de empregos. O gráfico abaixo sumariza, de forma agregada, a informação dos cinco maiores bancos do país (Millennium bim, Banco Comercial e de Investimentos, Standard Bank, Moza Banco e Absa Bank), cujo volume de activos representa uma quota de mercado que excede 80% em 2021.

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O Banco de Moçambique disponibilizou, em Março de 2020 uma linha de crédito de 500 milhões de dólares aos Bancos comerciais Como pode ser verificado, no triénio em análise, o volume de crédito a clientes aumentou em cerca de 17 mil milhões de meticais (+8.6%), enquanto que o nível de perdas por imparidade reconhecidas manteve-se estável, apresentando, no período em análise, um crescimento ligeiro de cerca de 400 milhões de meticais (+2%). Com esta evolução do crédito concedido e de imparidades registadas, o rácio de cobertura “melhora” ligeiramente, passando de 9% em 2019 para 8,5% em 2021. A nível do mercado europeu o “crédito concedido a clientes” e as “perdas por imparidade”, no triénio compreendido entre 2019 e 2021, tiveram comportamentos distintos face à realidade moçambicana. Conforme pode ser confirmado no quadro abaixo, apesar do crescimento de 15% do “crédito a clientes”, as “perdas por imparidade” aumentaram significativamente mais (cerca de +93%), evidenciando uma clara deterioração do crédito e prudência nas expectativas de recuperação.

“A pandemia de Covid-19 trouxe incertezas quanto à fiabilidade de alguns indicadores que eram utilizados para a determinação das perdas por imparidade...” Comparando os dois mercados, nota-se que os indicadores em análise não sofreram uma degradação significativa em Moçambique. A resiliência do sector financeiro moçambicano é visível, devendo-se sobretudo à distância das zonas mais impactadas (e consequente menor risco de contágio e exposição), às medidas de confinamento menos restritivas, a baixa exposição a sectores de logística e turismo e, por fim, às iniciativas do regulador e dos bancos tendentes a encontrar pontos de equilíbrio entre a situação financeira dos mutuá-

rios e o reembolso das prestações de crédito. Neste contexto, pode concluir-se que a pandemia não teve impactos muito expressivos na qualidade de crédito dos Bancos em Moçambique. Expectativas futuras Apesar da melhoria da situação sanitária, causada pela pandemia de covid-19, e das perspectivas de crescimento económico de Moçambique nos próximos anos, impulsionadas pelo início da extracção do gás na Bacia do Rovuma, surgiram alguns eventos recentes, nomeadamente o conflito militar que opõe a Rússia à Ucrânia e a instabilidade militar que se vive na região de Cabo Delgado, no norte de Moçambique, que trazem alguma incerteza quanto ao desempenho futuro da economia moçambicana. Face ao contexto peculiar que se vive, deve existir uma contínua monitorização, principalmente dos potenciais efeitos que os referidos eventos possam vir a ter na cadeia de produção, canais de distribuição, variação do preço de commodities (ex. cereais) e na redução das transacções comerciais com os países envolvidos no referido conflito, impactando sobretudo a capacidade dos mutuários honrarem os seus compromissos e, por conseguinte, a qualidade do crédito.

Obtido através do quociente entre o “crédito concedido a clientes” e as “perdas por imparidade” 2 Obtido através do quociente entre o “crédito malparado” e o “crédito concedido a clientes” 1

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NÚMEROS EM CONTA

Quem são os Maiores Produtores de Gás do Mundo? Os preços do gás natural subiram, e não foi pouco, desde a invasão russa da Ucrânia, agravando uma situação de abastecimento que já se estava a degradar desde a pandemia. Pior ainda: Moscovo reduziu, desde então, as exportações de gás para a Europa para níveis mínimos plurianuais, fazendo subir o preço do gás europeu para quase dez vezes a sua média anterior à guerra. O gás natural faz parte de quase todos os aspectos da nossa vida quotidiana, sendo utilizado para cozinhar, para aquecimento e refrigeração, produção de electricidade, combustível para veículos motorizados, fertilizantes, e ainda no fabrico de plásticos, só para citar alguns exemplos. Este combustível é um gás hidrocarbónico natural fóssil não renovável (embora menos poluente do que o petróleo), que se forma abaixo da superfície

da Terra. Embora existam grandes quantidades de gás natural, elas encontram-se em áreas remotas e, para facilitar o transporte e reduzir o volume, o gás natural é frequentemente convertido em gás natural liquefeito (GNL), num processo chamado de liquefacção. Apesar dos esforços globais para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, o consumo de gás natural atingiu um novo recorde em 2021, ultrapassando em 3,3% o anterior máximo, estabelecido em 2019. Apesar de se esperar que a procura diminua ligeiramente em 2022 e permaneça moderada até 2025, de acordo com a Agência Internacional de Energia, utilizando dados da Statistical Review of World Energy da BP, a infografia esboça o contexto no mercado do gás ao visualizar os maiores produtores mundiais de gás em 2021.

Produção em milhares de milhões de metros cúbicos

CANADÁ 172.3

EUA 934.2

O consumo doméstico representa 88% do total do consumo.

NORUEGA 114.3

ARGÉLIA 100.8 EGIPTO 67.8

NIGÉRIA 45.9

INDONÉSIA

59.3

UZBEQUISTÃO

50.9

TURQUEMENISTÃO

CATAR

RÚSSIA 701.7

É o maior exportador mundial de gás natural. A Alemanha, por exemplo, depende da Rússia em mais de metade do seu consumo.

MALÁSIA

74.2

79.3

177

CHINA 209.2

ARÁBIA SAUDITA 177.3 EMIRADOS

ÁRABES UNIDOS 177.3

IRÃO 256.7

O RESTO DO MUNDO 671,8 em mil milhões de metros cúbicos

AUSTRÁLIA 147.2

FONTE BP Statistical Review of World Energy

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MACRO

Gás Veicular. Quando a Possibilidade Limita a Oportunidade Se o País tivesse acelerado a conversão de viaturas para o gás, seguramente que a subida do preço dos combustíveis não seria tão penalizadora. É oportuno ainda fazê-lo, mas não há dinheiro. Ainda assim, o Governo “sonha alto” e promete mudanças já no próximo ano Texto Anderson Cossa • Fotografia D.R

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Governo precisa de, pelo menos, 30 milhões de dólares para instalar postos de abastecimento de Gás Natural Veicular (GNV) ao longo de toda a Estrada Nacional Número 1 (N1). Neste momento, dispõe de apenas cinco milhões e, mesmo sem qualquer ideia de onde ir buscar os restantes 25 milhões, o Executivo promete que vai cumprir o objectivo até 2026. Como começa esta história? Em 2008, para minorar o impacto da subida acentuada do preço dos combustíveis fósseis, o Governo decidiu introduzir o gás veicular. O plano estratégico preconizava que, em dez anos – até 2018, portanto –, seriam transformadas até 40 mil viaturas

“muito optimista”, e que era preciso continuar a correr em busca da celeridade. Na mesma linha, o director nacional de Hidrocarbonetos e Combustíveis, Moisés Paulino, em entrevista à E&M, diz que está na hora de estender o projecto para além da Cidade e Província de Maputo. “Queremos expandir estas infra-estruturas ao longo da N1, numa primeira fase, e na segunda fase, em todas as sedes provinciais e distritais para dar oportunidade aos moçambicanos e à economia de terem combustível alternativo”, revelou o director nacional dos Hidrocarbonetos e Combustíveis. Para que tal seja possível, o Governo, através do Ministério dos Recursos Minerais

Só 3000 viaturas foram convertidas em 14 anos, um número muito abaixo das 40 mil que tinham sido projectadas até 2018, portanto há quatro anos para passarem a funcionar a gás. Nesse período, equacionavam-se 70 postos de abastecimento com cobertura nacional. Mas, hoje, o número de utilizadores desta alternativa anda à volta de 3000 viaturas e apenas seis postos de abastecimento, sendo que está para breve a abertura do sétimo posto no distrito de Marracuene, todos eles com capacidade acumulada de cerca de 7000 viaturas. Ou seja, além de não se ter verificado a evolução que se esperava, ainda há muita capacidade instalada por explorar. Em entrevista à E&M, há dois meses, João das Neves, director-executivo da Autogás, empresa responsável pelo projecto de conversão de viaturas, assumiu que o plano estratégico inicial era

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e Energia, precisa de recursos. São cerca de 30 milhões dólares. Neste momento, há garantia de apenas “cinco milhões de dólares, que estão depositados no Banco Nacional de Investimento (BNI) e vamos usar esses fundos, que são do Governo, com a comparticipação da Sasol. Vamos construir postos de abastecimento de gás natural veicular na Manhiça, Xai-Xai, Maxixe e Vilanculos”, garante o responsável. A expansão de postos de abastecimento de gás natural não será uma medida isolada. “Vamos construir centros de conversão de viaturas para passarem a usar gás. A ideia é que o condutor saia de Maputo para Inhambane, por exemplo, com a garantia de que, ao longo do www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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públicos de passageiros. “Estes são os custos que nós captamos no mercado, mas, com este fundo, a nossa ideia é de ir fazendo uma gestão que vá, mais ou menos, ao encontro das necessidades do cidadão. Portanto, vamos reduzir esses valores para serem apetecíveis. Se a pessoa quiser converter a sua viatura não tem de pensar, por exemplo, em gastar 49 mil meticais. Terá, sim, de pensar nos 30 mil ou 20 mil meticais, que são muito mais acessíveis através de poupanças periódicas. A mesma regra é válida para todas as categorias de veículos”, esclareceu a fonte.

Actualmente, o País dispõe de apenas seis postos de abastecimento de gás veicular, pelo que a sua expansão vai exigir a criação de muitos outros percurso, terá onde abastecer”, acrescentou. A Direcção Nacional dos Hidrocarbonetos e Combustíveis diz que está a promover a iniciativa e “há parceiros que estão interessados em apoiar”. Além disso, “vamos trabalhar com os sul-coreanos, que têm uma grande experiência no ramo do uso de gás veicular. Estamos, também, a tentar angariar mais fundos para fazer com que este projecto avance rapidamente”, referiu Paulino, acrescentando que se todas as projecções forem concretizadas, “nos próximos choques de oferta de combustíveis no mercado internacional já teremos uma alternativa que nos vai minimizar o impacto da subida do preço. A economia não vai ficar refém, como está hoje, da gasolina e do gasóleo”. Quanto custa o gás veicular? Os custos de Gás Natural Veicular começam com a montagem do próprio posto de abastecimento. A construção de raiz custa cerca de um milhão de dólares, mas, para poupar nos custos, o Ministério dos Recursos Minerais e Energia recorre a uma estratégia. “O que nós fazemos é usar os postos de abastecimen-

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tos já existentes, que são do Fundo Nacional de Energia (FUNAE) e da Petromoc, para anexar a nossa infra-estrutura. Recorrendo a este método, gastaremos cerca de 700 mil dólares. Isto será mais fácil porque, ao longo da N1, temos muitos destes estabelecimentos”, explicou o director nacional dos Hidrocarbonetos e Combustíveis. Mas não é só por qui que terminam as despesas com o gás veicular. Para que o condutor possa usar esta alternativa tem de fazer alguns investimentos na conversão da sua viatura. Por exemplo, “um kit de conversão para uma viatura ligeira está entre 49 mil meticais e 75 mil meticais. Para mini-bus está entre 65 mil e 120 mil meticais. Converter um autocarro custa aproximadamente 250 mil meticais. A construção de um centro de conversão, incluindo os seus acessórios, custa cerca de 460 mil dólares (quase 30 milhões de meticais ao câmbio actual)”. Moisés Paulino reconhece que os preços de conversão são muito elevados e explica a estratégia do Executivo para atrair mais condutores a optarem pelo gás natural, sobretudo os transportes

Tudo pode mudar a partir de 2023 O dinheiro disponível [para instalar postos de abastecimento de Gás Natural Veicular (GNV)], como já referimos, são só cinco milhões de dólares. O Ministério dos Recursos Minerais e Energia acredita que, num cenário favorável, precisa de 30 milhões de dólares. Então, o défice a considerar, actualmente, está na casa dos 25 milhões. Ainda assim, o sonho fala mais alto. “Até ao primeiro semestre de 2023 vamos chegar a Vilanculos, em Inhambane. No segundo semestre, os condutores que converterem as suas viaturas poderão sair de Maputo seguros, pois teremos postos de abastecimento em Maputo, cidade e província, Gaza e Inhambane”, prometeu, convicto, o director dos Hidrocarbonetos e Combustíveis. Mas o olhar do Executivo não se limita à zona Sul. Ainda no próximo ano, “se conseguirmos chegar a Sofala, seria um sucesso. Queremos atacar a cidade da Beira e, gradualmente, irmos subindo para o Norte”. O actual cenário internacional de subida do preço dos combustíveis deverá servir como impulsionador do projecto, mas o seu auge será mesmo em 2025 ou 2026. “Neste período, queremos fechar toda a N1. Estaremos em Pemba e, sendo possível, também no Niassa. Isto vai ajudar, além dos transportados, que são os passageiros e os transportadores, a própria economia”, referiu. Quanto ao número de postos de abastecimento a serem instalados, Moisés Paulino explica que o facto de um carro movido a gás poder percorrer entre 200 e 250 quilómetros leva a que, em cada 200 quilómetros, tenha de haver um posto de abastecimento. O director nacional de Hidrocarbonetos e Combustíveis refere ainda que, depois da promoção da campanha por parte do Governo, poderão ser os empresários do ramo dos combustíveis a assumir o negócio. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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OPINIÃO

Januário Valente Júnior • Responsável do segmento Comercial da Direcção da Banca de Retalho e de Negócios do Absa Bank Moçambique

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os últimos tempos, a banca tem-se tornado cada vez mais um parceiro de negócios e não apenas um prestador de serviços, apresentando soluções “fora da caixa”, devidamente customizadas, ajustadas às necessidades de cada cliente. Para dar resposta a esta mudança de paradigma, os bancos comerciais passaram a investir no conhecimento de toda a cadeia produtiva do cliente e numa abordagem mais relacional e menos transaccional. Este modelo dá uma vantagem competitiva quando o objectivo passa por ser o banco preferencial, servindo o ciclo da empresa, tentando desta forma mitigar os riscos inerentes à sua operação, por ausência de informação necessária para uma análise de risco convencional. Este novo modelo relacional que temos vindo a acompanhar na banca comercial nacional, coloca novos desafios sobre o sector, obrigando-o a capacitar-se com expertise e a apresentar soluções alternativas, abandonando por completo o conceito “one size fits all”, demonstrando a sua capacidade de servir cada vez mais e melhor o mercado, com soluções financeiras estruturadas e personalizadas que apoiam a cadeia de valor de uma forma transversal. No entanto, no seio das Pequenas e Médias Empresas (PME), partes integrantes da cadeia de valor de grandes multinacionais, o acesso ao financiamento continua a ser um tema de debate, onde a inexistência de informações objectivas, credíveis e transparentes torna a análise de risco e crédito, por parte dos Bancos Comerciais, um desafio constante. Para responder a isto, tor-

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Cadeias de Valor Como Impulsionadoras do Desenvolvimento Sustentável na-se imperioso e urgente explorar alternativas que permitam, não apenas capitalizar um conjunto de oportunidades que possam surgir dentro do actual cenário de constantes mudanças e incertezas, como ainda a necessidade de triangulação, como se de uma “chave-mestra” se tratasse, por forma a reduzir os riscos associados quando analisada uma PME já estabelecida ou em crescimento de forma isolada. Para contor-

“É urgente que estas PME, que integram as cadeia de valor de grandes multinacionais, possam capacitarse para responder às exigências globais, e aqui refiro-me ao cumprimento dos ODS e à aquisição de certificações...” nar esta situação, uma das alternativas passa pela banca, no geral, olhar para o risco de uma forma mais ampla e global, analisando oportunidades para a transferência de risco entre os diversos participantes na Cadeia de Valor. Ainda, analisando pelo mesmo prisma, a apreciação do risco de crédito fica facilitada pelo simples facto de haver uma certeza sobre a fonte de pagamento, existindo até, em certa medida, um conforto e desta forma uma análi-

se mais simplificada da capacidade financeira de uma determinada empresa. Não obstante, continua a ser fundamental o encorajamento às PME para que estas invistam na sua capacitação. Actualmente, a existência das incubadoras e/ou aceleradoras, que permitem a estas empresas terem acesso à literacia financeira, torna-se absolutamente necessária, como alavanca para operarem num mercado competitivo e globalizado e alcançarem, por essa via, o tão almejado crescimento empresarial. Importa ainda referir, a igual necessidade das PME investirem na inovação, adoptando novas tecnologias no seu negócio, colocando-as sob pressão financeira, onde é dado ênfase ao papel da banca na concepção de propostas de valor adequadas, dando espaço para a criação de parcerias estratégicas com e entre empresas de outros sectores. Adicionalmente, é igualmente urgente que estas PME, que integram as cadeia de valor de grandes multinacionais, possam rapidamente capacitar-se para responder às exigências globais, e aqui refiro-me ao cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável e à aquisição de certificações para que possam competir em “pé de igualdade” com as empresas globais que se instalam localmente. Em suma, neste panorama é necessário ter uma visão 360º do negócio, onde não se olha apenas para o negócio das grandes empresas, mas também para a sua cadeia de valor como um todo, desde clientes a fornecedores e consequentemente para as suas derivações, para que todos possam contribuir para o desenvolvimento sustentável do tecido empresarial local nas suas diferentes dimensões. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL

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O Preço da Improdutividade A reforma salarial na função pública já a ser ensaiada pelo Governo levanta questões que, apesar de importantes, poucas vezes são aprofundadas: porque se discutem aumentos salariais mesmo quando a produtividade da economia cai? Como chegar à fórmula justa para remunerar de acordo com o desempenho de uma empresa ou da economia? Qual é a factura que o País paga pelo desequilíbrio entre o que se deve pagar e os ganhos de produtividade? Como é que estas questões são e deveriam ser tratadas em Moçambique… e lá fora? Texto Celso Chambisso • Fotografia Istock & D.R. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

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NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL

É

habitual dizer-se que determinada empresa “paga mal”, que a função pública “atribui maus salários”, ou ainda que em Moçambique os salários são demasiado baixos em comparação com os da região. Tudo isto pode ser verdade. Mas dificilmente se ouve alguém questionar em que medida os salários condizem ou não com a produtividade da economia, ou qual é o conjunto de implicações e como dar a volta por cima. Antes, importa esclarecer o peso que a força de trabalho assalariada nacional tem na economia. A estimativa apresentada pela Organização dos Trabalhadores de Moçambique Central Sindical (OTM-CS) indica que há, no País, cerca de cinco milhões de trabalhadores assalariados, com ou sem contratos de trabalho formais, sejam do sector público ou privado. Parece irrisório, se considerarmos o universo dos cerca de 30 milhões de moçambicanos, mas acaba por ser significativo tomando em consideração a estrutura da força de trabalho nacional. Embora seja difícil ter acesso a dados consistentes para aferir o peso deste grupo, a E&M recorreu a um cálculo simples (infelizmente com alguns dados por actualizar), mas que pode dar alguma noção sobre a representatividade da força de trabalho assalariada. Considerando cerca de 60% da população activa nacional (quase 18 milhões de pessoas), segundo dados de INE de 2017, e uma taxa de desemprego de cerca de 20% da população activa (3,6 milhões de pessoas), chega-se à conclusão que a força de trabalho no activo é de cerca de 14,4 milhões de pessoas. Destes, os cinco milhões de assalariados em Moçambique perfazem 35% da força de trabalho. É um peso importante. Nos últimos dias, entretanto, o tema dos salários ganhou destaque com o recente anúncio da reforma salarial na função pública, que previa uma Tabela Salarial Única cuja grande novidade era a possibilidade de dobrar o salário dos funcionários públicos. A ideia central era corrigir a regulamentação dispersa a que está sujeita a definição dos salários e remunerações, e estabelecer critérios consistentes, passando a incorporar, na equação, elementos que incluem o tempo de serviço, de carreira, idade, qualificação académica e outros. Mas a produtividade parece ter sido, como sempre, posta de lado. E a questão é: Começa-se por definir salários atractivos em busca da produtivida-

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É difícil saber se o nível de salários que se paga em Moçambique é baixo ou não, dada a fraca produtividade e a falta de estudos sobre o tema

de ou faz-se o contrário? Por exemplo, de onde virão os recursos que permitem duplicar salários no quadro da reforma? A realidade Economistas concordam que, não havendo ganhos de produtividade, não pode haver aumentos salariais. Ou seja, é da produção adicional que se obtêm recursos que vão permitir os ajustes salariais. Mas “é difícil fazer essa relação porque o sector público nacional não é produtivo. É mais administrativo e prestador de serviços. A sua cobertura sala-

rial vem dos impostos”, esclarece André Mandlate, secretário para as relações jurídico-laborais e sociais ao nível da Organização dos Trabalhadores de Moçambique – Central Sindical (OTM-CS). O responsável, que reconhece que os salários mais competitivos estão no sector privado, afirma que é também no privado onde ocorrem os salários mínimos mais baixos. E, numa situação em que o sector público emprega menos do que o privado, “preocupa-nos que o mínimo deste sector, que depende do imposto pago no privado, suba muito em relação ao salário do próprio privado”, www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


“REFORMA VAI EQUILIBRAR CONTAS PÚBLICAS” O FMI acredita que a reforma que o Governo está a preparar vai corrigir desequilíbrios nos gastos públicos a médio prazo, segundo o seu representante no País, Alexis Meyer-Cirkel Em que medida os ajustes no quadro da Tabela Salarial Única estão alinhados ou não com as recomendações do FMI a este propósito? O princípio de reforma segue as discussões que tivemos com o Governo no contexto do nosso programa de assistência técnica. Achamos que os planos do Governo encontram um equilíbrio entre ser justo com os funcionários públicos, com uma ambiciosa, mas inevitável, reforma que permitirá um melhor controlo dos gastos públicos no longo prazo. A simplificação da tabela salarial facilitará a mobilidade dos funcionários em todo o sector público e deve eliminar dinâmicas de aumento inconsistentes. Isso dará ao Governo melhor controlo sobre a folha salarial, equilibrando restrições financeiras com a necessidade de atrair funcionários mais qualificados e garantindo que o público seja bem servido. Quais são os riscos de aumentar salários quando a economia não apresenta ganhos de produtividade? É uma medida sustentável? A proporção dos salários em relação ao PIB realmente aumentará no curto prazo, mas em dois ou três anos esperamos que diminua. Um objectivo do Governo foi salvaguardar que todos os funcionários públicos tenham, ao menos, a mesma

admitiu. André Mandlate também entende que uma oferta salarial atractiva é um bom ponto de partida para o aumento da produtividade. Como é que isso se faz? “Uma empresa não pode começar actividades para pagar os primeiros salários com o que se vai produzir. É preciso que construa um plano salarial de médio prazo e que não dependa da produtividade, para permitir que, no momento em que comece a ter retornos, tenha já definida uma posição salarial que estimule a produtividade”, explicou. É da mesma opinião o economista Michael Sambo, pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), que destaca que salários baixíssimos pagos, sobretudo, no aparelho do Estado podem causar letargia no processo de trabalho e fazer com que a produção e produtividade dos indivíduos seja cada vez menor por causa da desmotivação. “Há necessidade de se atriwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

buir salários compatíveis tanto com as funções que cada um desempenha, como para cobrir necessidades básicas essenciais. O salário deve obedecer a alguma escala e políticas de progressão salarial”, defende. Ambos são a favor dos aumentos anuais dos salários, independentemente do nível de produtividade e das condições macroeconómicas. E André Mandlate advoga que, não havendo orçamento para ajustar salários de categoria média ou intermediária, a opção válida seria estabilizá-los com pacotes sociais, através de ofertas ou regalias como pequenos subsídios de transporte e comunicação entre outros, que ajudem o trabalhador a poupar os seus recursos. “Os empregadores mais inteligentes nem esperam uma negociação assim que acontece o ajustamento do salário mínimo. Reúnem as outras categorias para fazer ajustamentos proporcionais”, observou.

remuneração comparando com sua situação antes da reforma. Isso aumentou levemente o envelope de gastos no ano específico da implementação da reforma. A médio e longo prazo, um melhor controlo da remuneração do sector público permitirá ao Governo priorizar os gastos de forma mais eficaz e controlar melhor o défice fiscal. No entanto, vale a pena notar que Moçambique tem, actualmente, um dos rácios de massa salarial em relação ao PIB mais elevados da África Subsaariana e levar essa questão a sério é importante.

Alexis Cirkel-Meyer, representante do FMI

Salários maiores que a produtividade… e a perda de competitividade Nos últimos cinco anos, a economia apresentou taxas de crescimento modestas, o que indica estagnação e até queda da produtividade. Nesse mesmo período, os salários na função pública aumentaram continuamente (ver gráfico da página 32). Mesmo considerando que o sector público e o privado seguem regras salariais distintas, e que as empresas estabelecem padrões de remuneração geralmente superiores ao mínimo nacional, pode-se concluir que o fenómeno do aumento dos salários em cenário de fraca produção deu-se também ao nível do sector privado. É que, segundo a consultora Ernst & Young, “por norma, os salários são definidos por uma componente fixa nos dois sectores, e que é determinada pelo Estado”. E qual é o resultado disso? Em Moçambique não existem pesquisas que abordem a relação destes indicadores.

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NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL

DIFERENÇAS ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO As regras salariais do sector público são distintas das do privado. Em Moçambique, o sector privado é mais competitivo porque toma os salários também como factor de retenção de talentos. As organizações nivelam os seus números em função dos praticados nas similares do ramo, o que não acontece no sector público, embora este seja visto como o que oferece maior segurança contra a perda de emprego. Ainda assim, nos últimos anos assistese a uma grande fuga de quadros do público para o privado, segundo a Ernst & Young. O motivo não é apenas a busca de salários mais altos, mas de empregos que facilitem maior aquisição de conhecimento e progressão na carreira.

Mas há, pelo mundo, informações que podem ajudar a fazer uma leitura sobre as consequências cá no País. António Bernardo, gestor português que preside à consultora alemã Roland Berger no Brasil e América Latina, em entrevista ao jornal “Isto é Dinheiro”, revelou que, entre 2005 e 2015, a produtividade real do Brasil foi de 9%. Nesse período, o aumento real de salários foi de 29%. Ou seja, o aumento de salários foi mais de três vezes maior que o aumento da produtividade. O pesquisador concluiu que “a competitividade do Brasil decresceu fortemente”. O mesmo não aconteceu no México onde, no mesmo período, o aumento de produtividade tinha sido o dobro do aumento dos salários, em termos reais, nem na Alemanha, onde, nos últimos 30 anos, o aumento de produtividade está acima do dos salários. A ideia não é eliminar a subida dos salários, mas “se

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O aumento dos salários não tem sido acompanhado pelo aumento da produtividade. E a competitividade da economia vai caindo

os salários subirem e a produtividade subir mais, não haverá problemas”, segundo António Bernardo, que destaca que, se isso não acontece, a economia passa a enfrentar dificuldades em exportar porque o custo de produção torna-se superior ao de outros países, dada a subida do custo do trabalho (salários). Em Moçambique, certamente, a própria fraca produtividade já põe em causa a competitividade. Mas pode-se equacionar uma agravante: é que os salários também crescem sem serem acom-

panhados pelo correspondente aumento da produtividade. E a competitividade da economia, medida pelo Índice de Competitividade Global, vai caindo ano após ano, sendo historicamente das mais baixas do mundo. Preservar o princípio da justiça social O economista Fásio Mussá concorda que é preciso observar todos os imperativos da competitividade e evitar onerar o custo do trabalho. “Mas devemos lembrar-nos que somos seres humanos www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


BAIXA PRODUTIVIDADE… BAIXOS SALÁRIOS

Os salários mínimos não são 100% representativos do que se passa no mercado, mas são um indicativo importante para percebê-lo, em linhas gerais. E estes indicam-nos o quanto a actual capacidade de produção está longe de cobrir as necessidades básicas. Só há uma maneira de melhorar estes indicadores: “pôr a mão na massa”

Agricultura

Electricidade, gás e água

5200

8900

30

Pesca

5820

Construção Civil

Mil Meticais

9325

Valor do cabaz básico mais humilde para uma família de cinco membros, calculada pela Organização dos Trabalhadores de Moçambique-Central Sindical

Mineração (Grandes Empresas)

Serviços Não Financeiros

10353

7774

Indústria Transformadora

Serviços Financeiros

7450

e, como tal, vivemos sempre dentro da pressão da inflação”, adverte. O economista considera que o que se tem notado é que o aumento do salário não permite repor o poder de compra que se perde com a inflação. É que, mesmo que se faça um ajuste salarial em 100% das camadas sociais de menor rendimento, que são as mais necessitadas, a inflação acumulada facilmente retira este efeito porque depois fica-se muito tempo sem se fazer o ajuste salarial com a regularidade e magnitude capazes de manter o poder de compra das pessoas. Reconhece, entretanto, que isto tudo reflecte o fraco crescimento da produtividade e da competitividade. O economista lembrou a grande preocupação que o FMI tem demonstrado em relação a esta matéria, no sentido de reduzir o rácio dos salários em relação ao PIB. Ou seja, o FMI é a favor de www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

14340 reformas da massa salarial para que, ao longo do tempo, se reduza a pressão sobre as finanças que remuneram os funcionários públicos levando a uma convergência da massa salarial em relação ao PIB para níveis médios observados na região. Em 2019, por exemplo, esta organização propunha que o aumento salarial não ultrapassasse os 5%. Fáusio Mussá entende a pertinência destas intervenções, mas reitera que, “ao se fazerem análises desta natureza, é importante que nos lembremos que somos humanos e não nos apegarmos demais apenas aos números”. Por isso, é importante aumentar mais o salário das camadas mais pobres em nome da “justiça social”. Espaço orçamental “apertado”. Como contornar? Assumir que é necessário buscar recursos para aumentar salários numa ba-

FONTE OTM-CS

se periódica, mesmo sem o aumento da produção, pressupõe algum tipo de pressão sobre o orçamento, quer de ponto de vista empresarial quer nacional. No caso da reforma salarial que o Governo já está a preparar, ficou uma grande dúvida sobre o espaço orçamental que alimentaria a duplicação dos salários. E, enquanto o próprio Governo não esclarece, o economista Michael Sambo apresenta algumas ideias. “Há categorias de governação mais alta com subsídios exagerados, em alguns casos superiores aos salários fixados. Aqui existe espaço para retirar parte desses subsídios e agregar onde realmente é preciso. Se temos indivíduos com grandes responsabilidades ao nível da produção, a auferir salários mínimos e sem nenhum subsídio ou isenção, abre-se espaço de se fazer reformas à política salarial”, argumentou o pesquisador.

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NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL RISCO PARA A COMPETITIVIDADE? Nos últimos cinco anos, a economia não apresentou taxas de crescimento animadoras, mas as despesas com salários e outras remunerações cresceram continuamente

2018 2,9 88,4 8,3

2019 2,2 100,7 9,9

2020 -1,23 118 11,7

2021 2,16 127 11,2

2022 2,9 147 13 Cres. PIB (%) Despesas com Salários e Remunerações (Mil milhões Mt) (% do PIB) FONTE Orçamento do Estado dos anos 2018 até 2022

Além disso, prosseguiu, a mais recente revisão da política salarial pública é anunciada num momento marcado pelo início da captação do gás, que traz expectativas de ganhos significativos. É muito provável que o adiantamento da Tabela Salarial Única esteja também a perspectivar os ganhos que virão da exploração do gás, “o que não seria mau porque é uma forma de redistribuir a riqueza na economia, mas não deve perigar o factor reinvestimento para a promoção de um desenvolvimento com uma base cada vez mais alargada”, concluiu. Negociação dos mínimos Todos os anos os sindicatos e o patronato se sentam à mesma mesa para de-

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cidir os ajustes salariais na função pública. Geralmente, o resultado não agrada à classe trabalhadora. O salário nunca sobe o suficiente para responder à subida dos preços. A fraca produtividade é a principal razão, mas existem outros aspectos, complexos, que entram na equação. De acordo com a OTM-CS, o sistema que preconiza a negociação salarial obedece a um comando operacionalizado pela Comissão Consultiva do Trabalho, que orienta os seguintes procedimentos: faz-se uma análise do balanço do plano económico do ano anterior tendo em conta o PIB sectorial e a inflação média. A partir daí, constrói-se o factor negocial. O movimento sindical procura

aliar a outros elementos como o cabaz óptimo para uma família de cinco pessoas, actualmente avaliado em 30 025 meticais. O principal objectivo, no entanto, não é o aumento do salário como tal, mas a recuperação do poder de compra perdido no ano anterior. “Este é o ponto que muita gente não entende”, de acordo com André Mandlate. Assim, para um salário mínimo que esteja entre 4800 meticais e 7000, o trabalhador cobre até dez dias de consumo, o que acaba por contribuir para os elevados índices de informalidade. Uma vez negociados todos os aspectos relevantes, conclui-se, mais uma vez, que a solução contra o empobrecimento dos trabalhadores está do lado da produção. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



OPINIÃO

Wilson Tomás • Research Banco Big

O

crescimento da actividade económica em Moçambique nos últimos anos foi afectado negativamente por diversos eventos internos e externos, que resultaram numa desaceleração das taxas de crescimento do PIB e, consequentemente, da base de tributação. Desde a retirada do apoio externo por parte das instituições multilaterais e doadores em 2016, a redução do investimento directo estrangeiro e, mais recentemente, os efeitos das restrições impostas pela pandemia de covid-19, reduziram a capacidade de arrecadação de receitas do Estado. Por outro lado, os desastres naturais que têm assolado o País anualmente e o conflito armado em Cabo Delgado têm colocado uma maior pressão sobre a Despesa do Estado. Após o período de recessão que se registou em 2020, em que o PIB anual contraiu -1,2%, o ano de 2021 apresentou-se como um ano de recuperação, tendo a economia crescido +2,2% apesar dos vários desafios. Esta tendência de recuperação do crescimento tem continuado a solidificar-se, ainda que de forma tímida, tendo a economia registado um crescimento acumulado de 4,37% no primeiro semestre de 2022, em resultado do contínuo desempenho positivo do sector primário, com maior destaque para o ramo da Indústria de Extração Mineira, seguido dos ramos da Agricultura, Pecuária, Caça, Silvicultura, Exploração Florestal, Pesca e Aquacultura. Diante desta conjuntura, o Governo de Moçambique criou e tornou público um novo programa de políticas que visa melhorar o actual cenário de crescimento e desempenho económico, que, segundo o Governo, se tem mantido abaixo do seu potencial. Este programa, denominado de Programa de Medidas de Aceleração Económica (PAE), foi anunciado pelo Presidente da República no início de Agosto e inclui, para além de incentivos fiscais, medidas de desburocratização e reestruturação dos serviços

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Impacto do Programa ‘Medidas de Aceleração Económica a Médio e Longo Prazo’ públicos. Destaca-se a redução da taxa de IVA de 17% para 16% e a isenção de taxas aduaneiras nas importações para os sectores de agricultura e electrificação rural, como forma de impulsionar as energias renováveis. O Programa propõe ainda a redução da taxa de IRPC de 32% para 10% para os sectores da Agricultura, Aquacultura e Transportes, e a criação de um fundo de garantia mutuária de USD 250 milhões para fomentar o acesso ao crédito por parte das pequenas e médias empresas (PME) do País, que actuam nos sectores da Agricultura, Piscicultura, Comercialização e Processamento Agrícola, Turismo e Habitação. Estas medidas e os estímulos fiscais que foram definidos no programa poderão fornecer um impulso importante para uma expansão da actividade económi-

“É necessário reconhecer que o sector privado terá um papel preponderante na implementação das medidas do presente programa” ca nos sectores abrangidos a médio prazo, através do robustecimento das cadeias de valor e uma estruturação e expansão do mercado do sector primário. O fundo de garantia, à medida que for sendo utilizado pelas empresas, poderá suportar as elevadas necessidades de financiamento das empresas moçambicanas e contribuir para o seu crescimento, fomentando assim a produção e a prestação de serviços a nível nacional. Daí, é expectável que os sectores intermédios, como o dos Transportes, aumentem e melhorem as suas capacidades para trazer mais eficiência na prestação de serviços, contribuindo para a proliferação de um mercado mais direccionado para a comercialização de produtos produzi-

dos localmente, e a médio/longo prazo para o crescimento da indústria transformadora e de exportação. O sector da Agricultura, que emprega a maioria da população moçambicana e que apresentou um crescimento de USD 127 milhões no valor das exportações no primeiro semestre deste ano, face ao período homólogo, é um exemplo claro de um domínio que beneficiou das estratégias adoptadas no âmbito do programa Sustenta, que tem como principal objectivo fortalecer a capacidade dos pequenos agricultores, estando assim bem posicionado para tirar partido deste programa de estímulos. No que diz respeito aos recursos naturais extraídos no País, o aumento da alocação da percentagem de receitas fiscais para o desenvolvimento das províncias onde a extracção ocorre, de 2,5% para 10%, poderá acelerar o processo de expansão e desenvolvimento socioeconómico destas províncias, atenuando assim as tensões associadas às desigualdades económicas. Nas primeiras reacções ao programa, o sector empresarial privado do País, representado pela CTA, respondeu favoravelmente ao programa, referindo que este representa um reforço da confiança do diálogo público e privado, e reconhecendo que endereça várias questões que vinham sendo colocadas pelo sector privado há vários anos. Contudo, e apesar do seu potencial, é necessário reconhecer que o sector privado terá um papel preponderante no que diz respeito à implementação das medidas do presente programa. Para além da aprovação deste, e para que se materialize de forma eficaz, a responsabilidade irá recair, em certa medida, sobre as empresas, tornando-se agora necessário que estas organizações se preparem adequadamente, de modo a reunirem as condições para a implementação do programa, em linha com a expectativa do Governo que prevê que este esteja funcional num período de dois anos. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL

“Faltam Estudos Que Ajudem a Entender a Dinâmica dos Salários” Eugénia Pião, senior manager da consultora Ernst & Young, observou o comportamento das empresas nacionais e descortinou os factores que, na sua óptica, dificultam a transformação dos salários em instrumentos efectivos de promoção do crescimento e da competitividade da economia Texto Celso Chambisso • Fotografia Mariano Silva

P

ara perceber melhor a realidade do mercado, principalmente ao nível do sector privado, a E&M ouviu a Ernst & Young (EY), nesta entrevista a Eugénia Pião, senior manager da consultora e com muitas valências. É especialista com competências em áreas que incluem a gestão de Recursos Humanos, Desenvolvimento Estratégico de Pessoas e Negócios, Consultoria e Gestão de Mudanças, Desenvolvimento de Liderança, Actividades de Integração de Equipas, Treinamento Corporativo e Diversidade e Inclusão Oratória. A especialista introduz a noção de “salário emocional”, para explicar que a solução para os baixos salários não reside apenas nos números, mas numa postura que ainda tem de ser adoptada e que vai exigir a sensibilização das empresas e um estudo baseado na realidade nacional destas matérias. Como é feita a dinâmica da política remuneratória em economias de pouca produtividade, na lógica funcionamento das instituições em Moçambique? Por norma, os salários são definidos por uma componente fixa e, em Moçambique, a componente fixa, quer no sector público, quer no sector privado, é determinada pelo Estado. O Estado determina os salários mínimos e, enquanto tal funciona como uma lei no sector público, o privado utiliza a mesma base para definir a sua política de remuneração estratégica. Isto, por um lado, é positivo no sentido de que, aparentemente, gera alguma harmonização nas prá-

ticas salariais, ou seja, não há uma grande variação entre as práticas de ambos os sectores. Pode também ser positivo nas economias em que o sector público paga melhor, e são muitas. Mas, em Moçambique, verifica-se o contrário, porque um aparelho do Estado que tem grandes despesas apenas com remunerações torna-se pouco competitivo. E, ao influenciar o sector privado a adoptar as mesmas práticas, os mesmos níveis salariais e os mesmos pacotes de benefícios, torna o privado também menos competitivo. Apesar dessa relação inercial, nota-se que o sector privado tem uma estrutura salarial mais alta que a do público. Estando no mesmo País, com os mesmos pressupostos macroeconómicos, de competências e até de produtividade – que são tomados em conta na definição dos salários – o que determina esta diferença? Existe, realmente, uma grande disparidade para as mesmas funções entre duas pessoas, em que uma recebe no sector privado e outra no sector público, sem pôr em causa o mérito profissional, as competências e formações. Tomemos como exemplo um médico ou um professor: o que ganham na tabela do privado pode ser o dobro ou triplo do que está na tabela pública. Esta circunstância fica ainda pior quando não há uma regulamentação neste aspecto, que faz uma análise da inflação do mercado, dos custos de bens de primeira necessidade e, por isso, não consegue pro-

“Vou falar da experiência da EY: sempre que vamos para um mercado fazer um estudo salarial temos uma missão de formação e sensibilização às empresas contactadas para participarem”

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duzir um alinhamento entre os aumentos salariais e os índices de inflação. Obviamente que isto faz com que a classe trabalhadora veja diminuído o seu poder de compra e isso gera, naturalmente, insatisfação em termos de motivação, mas gera também, em termos económicos, um fraco poder de compra, o que significa que a economia vai também ressentir-se. A EY, baseando-se na realidade das empresas e organizações com que trabalha, começou a sentir que, actualmente em Moçambique, o trabalhador tem o salário como sua primeira prática de remuneração, mas não só: existe a componente ‘salário emocional’ que, muitas vezes, é responsável pela retenção de talentos, o que acontece mais no sector privado. Ou seja, neste sector, o salário é tomado como importante factor de competitividade. E temos ainda o outro lado, em que as pessoas acreditam que, quando fazem uma carreira profissional na função pública, têm estabilidade, segurança, etc., mas de que segurança e estabilidade se está a falar? É apenas uma prática salarial. Em termos de carreira profissional e de progressão, não há nada contemplado. Na função pública as progressões de carreira e o pacote salarial associado são quase inexistentes. A meritocracia, muitas vezes, faz-se pelo tempo de serviço. Isto é, quem está há mais tempo ganha uma progressão e, com isso, vem uma equiparação salarial. Como consultora de renome e com contacto com várias realidades, a EY conhece o caminho que leva a uma melhor definição das regras salariais. O que faz falta em Moçambique e que é bem feito lá fora? As empresas moçambicanas não têm o hábito de encomendar estudos locais relacionados com salários. Muitas vezes compram estudos de empresas da África do Sul e usam para o mercado nacional, www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


o que resulta em falácias, porque esses estudos não descrevem a realidade local e acabam por fazer com que as empresas se orientem com base em dados errados sobre as remunerações e a política salarial. Existem muitas empresas dentro do mercado que fazem esses estudos e a E&Y faz parte destas, mas a dificuldade que encontramos é que as empresas de um dado segmento respondam, participem e correspondam ao estudo da empresa que encomenda. Isto é, as empresas similares da que encomenda o estudo recusam-se, normalmente, a participar, têm dificuldade em confiar e em partilhar dados que são de natureza sensível e nós entendemos isso. Por isso, as empresas que trabalham com essas análises estão obrigadas a um código de ética, deontologia, confidencialidade e sigilo profissional. Portanto, nós próprios seríamos os primeiros prejudicados se não tratássemos com a devida confidencialidade os dados que são partilhados connosco. Então é resultado disso tudo o que vemos? Falta de políticas consistenwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

tes, grandes disparidades salariais, baixa competitividade das empresas e da economia? Sim. As empresas e as organizações acabam por não ter noção de como se posicionam no seu próprio segmento dentro do mercado, até que ponto são competitivas e concorrenciais com as congéneres em termos da estatura salarial, e depois tendem a comparar funções que não são comparáveis entre si. Por exemplo, o contabilista de uma determinada empresa aufere um salário igual ao do contabilista de outra empresa. Mas quando vamos analisar o descritivo de funções – a maioria das empresas nem tem as funções devidamente catalogadas por não ter um qualificador das mesmas – acabamos por comparar funções que não são comparáveis. Quero com isto dizer que, numa das empresas, o contabilista pode exercer a função de um director financeiro e tem autonomia para a tomada de decisão, enquanto que o outro não faz mais do que classificar alguns documentos contabilísticos. Mas ambos com o mesmo ordenado. São todas estas falácias que acabam por impor que haja um erro nas

práticas de remuneração no mercado e, nomeadamente, entre funções. O que devia acontecer era delegar nas empresas habilitadas e acreditadas para fazer este trabalho tão sensível, e com a devida qualidade. Por onde deve começar a mudança? Vou falar da experiência da EY: sempre que vamos para um mercado fazer um estudo salarial temos uma missão de formação e sensibilização às empresas contactadas para participarem. Temos, primeiro, de sensibilizar, explicar qual é o âmbito, quais as vantagens, a confiança que devem depositar na empresa, os objectivos do trabalho, os benefícios que existem em fazer estudos salariais. Temos de ter a noção de que depois de um, dois ou mesmo cinco anos, aquela lógica de análise do estudo continua a ser válida e a empresa pode utilizá-la pegando nos valores que foram obtidos. Assim, se quiser corrigir os salários, com base em estudos deste tipo, basta acrescentar os níveis de inflação do País naquele ano e alguns poucos factores. Mas aquele investimento é algo que terá retorno a médio e longo prazo, que ga-

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sional, num determinado clima organizacional que lhe proporciona bem-estar e alguma felicidade. É que, hoje em dia, esta geração é diferente da passada, que priorizava o que se chama de ‘emprego para a vida’. Esta geração tem como perspectiva conciliar a sua carreira profissional com a vida pessoal. Procura sempre evoluir, adquirir novas experiências e competências profissionais, mas sempre a acompanhar com a vida pessoal. Portanto, já é comum ver colaboradores, e até candidatos, que estão na disposição de, em termos financeiros, receber um pouco menos do que recebiam numa dada organização ou posição, porque sabem que, se forem para uma outra empresa ou outra posição, vão ter uma série de benefícios e regalias aos níveis social e pessoal que para eles representam um ganho.

“A questão do salário emocional (com custos reduzidos), bom ambiente organizacional e bem-estar do colaborador é muito importante para a saúde e próprio crescimento da empresa” rante à empresa perfeita noção de onde se situa no seu segmento no mercado e quais são os factores de atracção e retenção de talentos. Como disse, infelizmente, não há uma regulamentação que evite que sejam vendidos dados de outras geografias que não tenham cabimento em Moçambique e que, supostamente, levam aqui alguma adaptação, personalização e uma normalização dos dados no nosso mercado, mas que nós sabemos que estão a prejudicar a tomada de decisões nessas empresas. Nota-se, hoje em dia, uma crescente modernização da actividade empresarial que é resultado de um maior acesso à informação sobre boas práticas empresariais. Creio

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que, ao nível das boas práticas de definição de salários competitivos, já exista esta noção e tenha tendência a crescer. Ou não? Hoje em dia, por força também de alguns ensinamentos que as multinacionais e organizações internacionais têm trazido para o mercado, mas também a experiência que muitos gestores de topo das empresas que temos no País já tiveram em projectos integrados de profissionais no estrangeiro, nós já estamos a começar o que é a tendência noutras geografias. Algumas empresas estrangeiras já atribuem, além do salário remunerável ou financeiro como tal, o salário emocional, que são as contrapartidas que o colaborador sente que recebe ao trabalhar num determinado ambiente profis-

Em resumo, o sector público paga mal, o privado já começa a ter a noção da necessidade de melhorar esta questão, sobretudo para reter talentos, mas o País carece de estudos sérios para orientar o mercado em busca de competitividade... Qual será a tendência? Em algumas geografias, já existe um cargo designado por Chief Happiness Officer, que é uma figura que zela pela felicidade e bom clima organizacional. Algumas empresas preferem ter alguém com especialização nessa vertente em vez de fazer um aumento de percentagens salariais porque vêem que, de facto, a questão do salário emocional, o bom ambiente organizacional e o bem-estar do colaborador é muito importante para a saúde e para o próprio crescimento da empresa, muitas vezes com custos muito reduzidos ou mesmo sem custos para a organização. Por exemplo, o director-geral felicitar o colaborador no seu aniversário ou dar uma folga, ou, em vez de dar um dia de licença de paternidade, como é previsto, dar dois ou três... Isto é algo que tem impacto. São coisas que representam muito para a autoestima, reconhecimento e valorização que o colaborador sente e que, na hora de pensar em sair da organização, leva em conta. Os colaboradores consideram a forma como são tratados e considerados e, se e quando a empresa viver algum tipo de crise e não puder fazer um aumento salarial, ou precise que o colaborador faça um esforço extra, este não se sentirá a perder e criará um espírito de amor à camisola. É esta que deve ser a tendência. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



NAÇÃO | POLÍTICA SALARIAL

Contas e Mais Contas. Os Salários da Crise Quatro meses de crise alimentar podem estar a ser tão ou mais severos para África do que dois anos e meio de covid-19. Ameaças de fome extrema empurram os países a improvisarem a procura de manterem o pão na mesa das famílias. Os próximos tempos encarregar-se-ão de revelar o resultado dos esforços feitos Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

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os mais estáveis aos mais vulneráveis, os países africanos entraram neste ano num ambiente de instabilidade deteriorado pela guerra na Ucrânia. Com a inflação a crescer continuamente e a exacerbar as já conhecidas carências internas, há que tomar medidas. Mas os orçamentos públicos não dão grandes margens de manobra. O que fazer? Com que armas lutar? Como dar poder de compra a um sector público que não consegue trabalhar o suficiente para gerar ganhos de produtividade? A experiência, no terreno, é testemunha da grande dificuldade que África tem para responder a estas questões. Angola teve de excluir “chefes” para ajustar em 50% Se tivesse de incluir titulares de cargos políticos, lideranças e chefias, pro-

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vavelmente não haveria cabimento orçamental capaz de suportar um aumento salarial nesta magnitude. Terá sido assim que pensou o Executivo angolano quando tomou esta decisão, em finais de Janeiro deste ano, com a intenção de “devolver o poder de compra das famílias angolanas, afectadas pela conjuntura económica do país”, segundo o Presidente de Angola, João Lourenço. Para se chegar a este aumento, o Executivo teve de realizar um estudo em que participaram os parceiros sociais do Governo, entre os quais as principais forças sindicais do país. “Aí ficou perfeitamente ajustado entre as partes, que, quer nos vários sectores – da agricultura, a título de exemplo, – sairíamos dos 21 454 kwanzas (cerca de 3100 meticais) para 32 181,15 kwanzas (4600 meticais); passaríamos, nos transportes, serviços e indústria transformadora, como salário mínimo de 26 817 kwanzas

(3900 meticais) para 40 226,00 Kwanzas (5800 meticais), no comércio e indústria de 32 000 kwanzas (4600 meticais) para 48 271 kwanzas (7000 meticais)”, referiu a ministra angolana das Finanças, Vera Daves. Do ponto de vista estratégico, “o que se entendeu é que deveríamos, numa primeira fase, prosseguir uma abordagem que permitisse, pela primeira vez, termos uma diferenciação positiva, isto é, dentro dos vários cenários feitos, e de acordo com as nossas disponibilidades financeiras, deveríamos impactar mais nas classes mais baixas, para podermos ir diminuindo percentualmente as classes mais altas”, salientou a governante. Ainda assim, e apesar de a economia angolana ser quase cinco vezes a de Moçambique em termos de PIB (Angola produziu, em 2020, 62,3 mil milhões de dólares e Moçambique apenas 14 mil milhões de dólares), os salários míniwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


A SOLUÇÃO DE CADA UM A experiência mostra que nenhuma estratégia é eficaz e que a crise fala mais alto, já que se verifica, por toda a parte, fortes indícios de manifestações populares contra a perda do poder de compra Ajuste salarial de 50% para funcionários públicos excepto dirigentes políticos e chefes.

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Ruanda tenta travar “empobrecimento” da Educação Depois de o jornal ruandês “The New Times” ter reportado que mil professores abandonam a profissão mensalmente em busca de melhores fontes de renda – lembrando que o ajuste dos salários destes profissionais era de 10% anuais desde Março de 2019 – o Governo daquele país decidiu fazer aumentos de, até, 88% a partir de Agosto corrente. No âmbito das novas revisões, os professores do ensino secundário também terão o seu salário aumentado em 40%, segundo o Ministério da Educação do Ruanda, na sua página oficial no Twitter, de 1 de Agosto. O comunicado observou que os salários líquidos dos titulares de certificados na profissão de docência, que actualmente começam em 50,8 www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

francos ruandeses (FRW), equivalentes a pouco mais de 3000 meticais, ascenderão a cerca de 110 mil FRW (quase 6000 meticais). “Os salários dos directores de escolas, vice-directores de escolas e do pessoal de apoio que trabalha em escolas públicas e subsidiadas pelo Governo foram também revistos em alta. Estas decisões entram em vigor a partir do pagamento dos salários dos professores de Agosto de 2022”, acrescentou a declaração. A iniciativa do Governo de aumentar o salário dos professores do ensino primário em 88% e o dos professores do ensino secundário em 40% é uma tentativa de reter os profissionais no sector e contribuir para uma educação de qualidade, segundo o Primeiro-Ministro, Edouard Ngirente. No Zimbabué, nem a duplicação do salário resulta Num país em que a inflação média anual voltou a bater máximos históri-

é

mos do sector público dos dois países, pelo menos na base, são similares.

Ruan

Zimbabu

Desde logo as autoridades deixaram claro que não haverá aumento de salários este ano.

Aumento em 88% do salário dos professores no nível básico e 40% do nível secundário.

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Salários foram ajustados em 6,9% e, pela primeira vez, numa tabela uniformizada.

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Proposta de aumento de 100% foi rejeitada devido à inflação que está acima dos 100%. cos de, até, 131% em Abril, em termos homólogos, o Governo propôs um aumento salarial de 100%, em Julho, que foi rejeitado pelos os funcionários públicos, sob a bandeira da Confederação dos Sindicatos do Sector Público. Os trabalhadores estão a exigir salários em dólares dos EUA com um valor cambial equivalente aos níveis anteriores a Outubro de 2018 (provavelmente com valor cambial mais apetecível), a implementação de benefícios não-salariais, a inclusão dos trabalhadores na governação dos fundos de pensões e a necessidade de um subsídio médico universal para todos os funcionários públicos. Assim, os funcionários públicos zimbabueanos terão de esperar até Setembro pelo anúncio dos novos salários por parte do ministro das finanças, Mthuli Ncube que, no entanto, adianta que não tem capacidade para pagar a tota-

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NAÇÃO | OUTLOOK 2022

No Zimbabué, a crise atingiu todos os sectores incluindo as farmas. Com a inflação a disparar, nem o dobro dos salários propostos pelo Governo consegue aliviar a tensão da classe trabalhadora lidade dos salários em dólares americanos, mas garante que vai averiguar se existe margem para utilizar uma parte das despesas em salários na moeda norte-americana. África do Sul implementou uma espécie de “TSU” Enquanto em Moçambique é aguardada com ansiedade, na África do Sul, talvez por ser o país mais industrializado do continente, a uniformização da tabela salarial já é uma realidade desde Fevereiro deste ano. Com efeito, o salário mínimo subiu para 23,19 rands por hora (equivalente 73 meticais/hora, 580 meticais por dia e cerca de 18,5 mil meticais por mês), um aumento de 6,9% em relação a 2021. A subida entrou em vigor no dia 1 de Março e é igual para todas as categorias. Ao contrário dos anos anteriores, não estão previstas excepções para grupos específicos de trabalhadores, como refere o documento que actualiza o salário mínimo. Assim, o salário dos trabalha-

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dores agrícolas e domésticos também é fixado em 23,19 rands por hora, como parte de um esforço de equiparação. Isto representa um aumento de 21,5% no caso do salário dos trabalhadores domésticos, que, por lei, auferiam, em 2021, menos do que os restantes trabalhadores. Cabo Verde nem vai poder improvisar Em Junho, o sindicato dos trabalhadores chegou a clamar por um ajuste salarial modesto, de apenas 5% do salário. Era insuficiente, mas já ninguém conseguia olhar para a possibilidade de conseguir mais do que isso. As centrais sindicais do país pressionavam para conseguir apenas isso – 5% do aumento salarial. Mas o Governo já havia reiterado que não há condições nem para tal. Na altura, a secretária-geral da União dos Trabalhadores de Cabo Verde - Central Sindical (UNTC-CS) afirmava que não se compreendia que se estivesse a dizer que não havia condições objectivas para a atribuição de aumentos, com graves problemas para as famílias, en-

quanto no seio da classe política “não se nota nenhuma solidariedade, neste caso, redução de custos com as respectivas mordomias”. Estava instalado o braço-de-ferro. Na mesma linha, o presidente do sindicato independente, Gilberto Lima, considerava que o Executivo deveria implementar mecanismos que permitissem dar margem de manobra às famílias na reposição de algum poder de compra. “Um reajuste salarial que o país possa suportar este momento de crise e que seja feito de forma diferencial, neste caso, atribuir maior percentagem para os que usufruem do salário mínimo”, defendeu. Mas, em contra-mão, não estava apenas o Governo. Alguns economistas entendiam, igualmente, não haver grande margem de manobra, neste momento, para que se procedesse à alteração do quadro salarial para “aliviar o fôlego em termos de poder de compra da classe trabalhadora”. De facto, este ano não se está à espera de que venha a acontecer qualquer ajuste salarial em Cabo Verde, devido, segundo o Governo, à situação pandémica, de seca, e agora da guerra na Ucrânia. Entretanto, os parceiros sociais de Cabo Verde analisam, neste mês de Agosto, as políticas de rendimento e preços, entre elas a eventualidade de aumentos salariais para 2023. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022



OPINIÃO

Impacto da Gestão Eficaz da Saúde e Segurança no Trabalho, na Competitividade das Empresas e na Economia Nacional – Números da OMS

O Hélio Matlonhane • Consultor e Gestor de Projectos da Insite Moçambique

“Estima-se que os acidentes e doenças profissionais contribuam para uma perda de 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) global anual”

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s acidentes de trabalho e doenças profissionais resultantes da actividade laboral sempre constituíram grande preocupação de sociedades, trabalhadores, empregadores e organizações de vários países e contextos socioeconómicos. As condições de trabalho injustas e deploráveis fizeram com que, em Junho de 1919, fosse criada, em Versalhes, pela Conferência da Paz, a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Em 1998, através da Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho, os países-membros do tratado de Versalhes comprometeram-se a desenvolver o quadro legal em respeito aos princípios fundamentais no trabalho, assim como a eliminar as formas de trabalho forçado/ obrigatório, a abolir o trabalho infantil e a eliminar a discriminação no acesso ao emprego. Moçambique, como país ratificador das convenções da OIT, envidou os esforços que resultaram em alterações no seu quadro legal, tendo como premissa as convenções ratificadas e, também, a evolução económica, social e política do País. Em Moçambique, a Lei do Trabalho - Lei n.º 23/2007 de 1 de Agosto - actualizada pela última vez em 2007, cujo capítulo VI é relativo à higiene, segurança e saúde dos trabalhadores, estabelece como premissa que o empregador deve proporcionar aos seus trabalhadores boas condições físicas, ambientais e morais de trabalho, informá-los sobre os riscos do seu posto de trabalho e instruí-los sobre o adequado cumprimento das regras de higiene e segurança no trabalho. A Lei aplica-se às relações jurídicas de trabalho subordinado estabelecidas entre empregadores e trabalhadores assalariados, nacionais e estrangeiros, a laborar em associações, organizações não-governamentais e no sector cooperativo, de todos os ramos de actividade e indiferentemente da dimensão da Organização. Não obstante a preocupação e os esforços no sentido de aumentar a regulação do mercado e a pro-

tecção dos trabalhadores, as estimativas globais apontadas pelo Congresso ICOH 2022 (International Congress on Occupational Health – Congresso Internacional em Saúde Ocupacional), dão conta de 2,9 milhões de mortes anuais devido a acidentes de trabalho e doenças profissionais e, pelo menos, 402 milhões de lesões profissionais não fatais por ano. As estimativas conjuntas da OMS e OIT, através da avaliação da combinação de factores de risco e do impacto na saúde, referem que as doenças profissionais foram responsáveis por 81% de todas as mortes relacionadas com o trabalho, sendo os restantes 19% devido a acidentes ocorridos no local de trabalho. A nível nacional, os dados estatísticos da Inspecção Geral do Trabalho (IGT) revelam que, em 2019, 523 acidentes de trabalho resultaram em incapacidade temporária, 41 em incapacidade permanente parcial, dois em incapacidade permanente total e sete em morte. Em 2021, 22 pessoas perderam a vida em resultado de 604 acidentes de trabalho, uma subida do número de óbitos em comparação com o ano anterior, em que ocorreram 16 mortes em 642 incidentes. Como principais causas, aponta-se a inobservância das regras de protecção e segurança no local de trabalho. É fundamental ter em conta que a ocorrência de acidentes de trabalho e doenças profissionais, além de causar sofrimento humano imensurável, também implica grandes perdas económicas para as empresas e economia em geral, tanto pelos custos directos associados (custos com seguros, cuidados de saúde, perda de produção, reparações, redução da capacidade de trabalho, maior absentismo, pensões e indemnizações), como pelos indirectos/ocultos (perdas de produtividade associadas a incapacidade permanente, custos com rotatividade de pessoal, com perda de pessoal qualificado, clientes insatisfeitos, atrasos na programação dos trabalhos e danos à reputação), que contribuem igualmente para o impacto económico negativo. Estima-se que os acidentes e doenças profissionais contribuam para uma perda de 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) glowww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


A implementação dos Sistemas de Segurança no Trabalho é um imperativo nas organizações

bal anual. Nos últimos dois anos, a pandemia do covid-19 agudizou as perdas económicas das empresas/da economia mundial e deu origem a inúmeros desafios novos relativamente à Saúde e Segurança no Trabalho (SST). O cenário parece, pois, indicar que as empresas devem estar cada vez mais preparadas para lidar com diferentes eventos e desafios com impacto em escala na Saúde e Segurança no Trabalho. Face ao contexto descrito, compete às organizações repensar a Saúde e Segurança no Trabalho como factor diferencial, assegurando o cumprimento, além da conformidade com os regulamentos de SST, que é o mínimo necessário. Porém, a criação da cultura de prevenção e Segurança no Trabalho e a formação do trabalhador constituem ainda um desafio para muitas empresas, incluindo as que se encontram em países mais desenvolvidos. A integração de sistemas de gestão de SST na estrutura de gestão da empresa é a chave para controlar os riscos e reduzir as doenças e acidentes relacionados com o trabalho, uma vez que promove uma abordagem pro-activa e preventiva da SST, com base na melhoria contínua. Quaisquer medidas implementadas com esta abordagem contribuem não só para melhorar o desempenho em SST, como também noutros aspectos que refletem a produtividade e competitividade da empresa em processos de procuwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

rement dos chamados mega projectos (grandes investimentos) e na prestação de serviços a empresas com elevados padrões de exigência. A nível internacional existem diversas normas para a implementação de Sistemas de Gestão da SST, sendo a ISO 45001:2018 uma das normas com maior expressão e reconhecimento. De acordo com dados da ISO de Setembro de 2021, existem mais de 250 mil sites certificados pela norma ISO 45001 no mundo, o que, considerando que a publicação da mesma ocorreu apenas em 2018 e que a certificação não é ainda um imperativo legal, pode ser um bom indicador do interesse crescente das Organizações pelo tema. De facto, sublinhando-se que não é ainda um imperativo ou obrigação legal das empresas, a certificação da gestão da SST é uma componente estratégica e de gestão das Organizações. Promovendo uma abordagem proactiva e permitindo o reconhecimento da gestão por uma entidade terceira parte, que atesta que a organização busca continuamente a melhoria das condições de trabalho, contribui para o aumento da confiança dos clientes e das partes interessadas na empresa. Em Moçambique, contudo, os dados recolhidos junto de 187 gestores num estudo sobre Higiene e Segurança no Trabalho realizado em 2017 dão uma indicação clara de que há poucas empresas

que possuem um planeamento estruturado/sistematizado para a identificação de necessidades e realização de acções de formação sobre SST, envolvendo os trabalhadores na elaboração e cumprimento do plano definido. Em termos legais, o envolvimento dos trabalhadores pode ser assegurado através da criação das comissões de SST (composta por representantes dos trabalhadores e da entidade empregadora), que têm como objectivo vigiar o cumprimento das normas de SST, investigar as causas de acidentes e incidentes, organizar métodos de prevenção e assegurar a higiene no local de trabalho. Na perspectiva da norma ISO 45001, a consulta e participação dos trabalhadores no sistema de gestão de SST é igualmente um requisito crucial. Partindo do pressuposto que não basta ter documentos devidamente estruturados se os colaboradores não os souberem interpretar, a formação e consulta e participação dos colaboradores são uma base fundamental para que as políticas, procedimentos de gestão de SST e operacionais sejam cumpridos. Liderança, compromisso e uma cultura positiva de SST, em que o ambiente de trabalho seguro e saudável é valorizado e promovido pela gestão e pelos trabalhadores, é fundamental para a implementação e manutenção da eficácia e eficiência de um sistema de gestão de SST. Em locais de trabalho com uma forte cultura positiva de Saúde e Segurança no Trabalho, entre vários outros benefícios, as pessoas sentem-se confortáveis para contribuir sobre eventuais perigos e riscos no local de trabalho, assegurando a melhoria contínua das condições de trabalho. Consequentemente, verifica-se um aumento da motivação e compromisso dos colaboradores, da confiança dos investidores e da sociedade, da produtividade, do potencial de manutenção de clientes e da conquista de novos mercados. A gestão da SST agrega, pois, valor aos produtos e serviços da organização, aumentando a competitividade da empresa. Em suma, dar a prioridade adequada à prevenção de acidentes e doenças profissionais e realizar investimentos adequados em Saúde e Segurança no Trabalho irá assegurar uma mão-de-obra saudável. Trabalhadores mais saudáveis e mais felizes irão, por sua vez, contribuir para uma maior produtividade, melhor qualidade e maior rentabilidade empresarial, gerando um ciclo de crescimento e evolução das empresas/organizações que conduzirá a economias mais sustentáveis.

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CEO TALKS

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BERNARDO STOFFEL APARICIO CEO do Standard Bank desde Abril de 2022 CARREIRA: Tem mais de 20 anos de banca, tendo iniciado na Caixa - Banco de Investimento, passando pelo Banesto e até entrar no Barclays, como Head of Debt and Finance, em 2009. Em 2013 muda-se para Londres, onde esteve até chegar a Moçambique, há 9 anos, como director da área de Investment Banking. Foi Head of Corporate and Investment Banking do Absa Bank Moçambique entre 2016 e 2022.

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“Foi um ‘Terramoto’, mas Saímos Mais Fortes Dele” Pouco mais de um ano depois da exclusão do Standard Bank do mercado cambial interbancário, e a entrar no sexto mês de mandato enquanto CEO do banco, Bernardo Aparício aborda, pela primeira vez, como a instituição está a trabalhar “conjuntamente com o regulador para melhorar os processos”, considera “justa” a manutenção da interdição aplicada pelo Banco Central, em Julho passado e, olhando para a frente, não tem dúvidas de que “o banco já está mais forte, depois de todo este processo”. Texto Pedro Cativelos • Fotografia Mariano Silva Temos de começar por falar sobre o que se passou há pouco mais de um ano, e não lhe queria chamar ‘terramoto’, mas não andaremos longe disso. O Bernardo não estava cá, portanto eu não lhe vou perguntar pela situação em específico. Vou, sim, questioná-lo sobre o que é que mudou desde aí até hoje? Começa muito pela colaboração próxima entre o Standard Bank e o Banco Central, a avaliação das causas do problema e da suspensão. Quando se tem um ‘terramoto’ deste género, e eu acho que a palavra é inteiramente essa, por se tratar de um banco com 128 anos de História e um orgu-

estávamos a operar para sanear alguns dos problemas. A inibição do mercado cambial interbancário mantém-se, ainda assim. Porquê? É algo que é, neste momento, constante na nossa operação. Tem sido um trabalho que tem vindo a decorrer nos últimos 12 meses e como, foi público há poucas semanas, esse trabalho ainda não está concluído, daí a razão para a extensão da suspensão. Mas o Banco Central, nas conversas que tem tido connosco, tem tido uma comunicação que tem sido muito transparente, aberta e constante. Chegámos à conclusão que há ainda

“São múltiplas as intervenções que estão a ser feitas e chegámos à conclusão que ainda era cedo para levantar a suspensão, mas as duas entidades estão perfeitamente de acordo que tudo o que tinha de ser resolvido já está...”

lho muito grande nela, foi preciso parar um pouco e perceber quais é que foram as causas fundamentais que levaram à suspensão. O trabalho conjunto entre o Banco de Moçambique e o Standard Bank começou imediatamente a seguir à suspensão. Implicou uma série de modificações nos nossos processos, seguir uma lista bastante extensa de alterações e, principalmente, insistir na melhoria do ambiente de controlo. Começando por assumir que houve algumas coisas que não correram bem. No início, tentámos perceber qual era a raiz do problema, o que é que não estava a correr bem e, depois, iniciar um trabalho conjunto de alterações à forma como www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

situações que é preciso trabalhar, porque implicam alterações de sistemas, de políticas e procedimentos. São múltiplas as intervenções que estão a ser feitas e chegámos à conclusão que ainda era cedo para levantar a suspensão, mas as duas entidades estão perfeitamente de acordo que tudo o que tinha que ser resolvido até aqui já está resolvido. Portanto, eu, das conversas que tive com o Banco Central, partilho a opinião de que a extensão da suspensão se deve manter. Continuamos diariamente a trabalhar e há aqui um ponto muito importante, que é: hoje em dia, o banco [central] reconhece que temos de continuar a servir os clientes. A suspensão interbancária é um tema muito específico, não nos permite

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CEO TALKS fazer câmbios com os outros bancos, mas a operação cambial decorre de forma absolutamente normal com os clientes. E, a esse respeito, continuamos a apoiar os importadores e exportadores, cumprindo com as restrições em termos de taxas de referência e tudo o que o que isso implica. Concorda com a visão de que há aqui um outro lado, ou perspectiva, de que se tudo isto se tivesse passado com outro banco menos estável, provavelmente o impacto na operação teria sido (ainda) muito maior ao nível operacional, da perda de clientes, etc? Uma das coisas que me surpreenderam foi, sem dúvida essa, e nos meus primeiros três meses enquanto CEO do Standard Bank constatei precisamente quão fortes são os alicerces do banco. Há alguns alicerces fundamentais neste banco. Um é o próprio banco, com um balanço muito saudável, bem capitalizado, com bastante liquidez e uma capacidade de geração de receitas, eu diria, bastante saudável, fruto desse balanço forte e de uma forte carteira de clientes. Depois, a força da marca, a sua História. E a marca, para mim, não é só aquilo que vemos no marketing e no branding, mas o respeito, a confiança e a lealdade que os clientes têm para connosco. Isso eu já tinha reparado quando estava do lado de fora, mas cá dentro, é impressionante. Os clientes não abandonaram o banco porque confiaram que, apesar de ter havido situações que precisavam de ser alteradas, a génese do banco e a sua solidez não estavam em causa. Pertencemos a um grupo sólido que é o maior grupo financeiro em África, com políticas muito marcadas, fortes e ajustadas ao sector em que estamos. Depois, o terceiro pilar é a equipa, que está totalmente comprometida com o banco. E isso, que pude constatar, é uma das coisas que mais me orgulham e que, para ser justo, já existia fruto do trabalho que foi feito pelos meus antecessores. Temos uma equipa que está muito comprometida em manter este banco como um dos maiores de Moçambique. É por ter estes três alicerces muito fortes que o barco não abanou, e a postura foi a de ‘como é que melhoramos e nos tornamos mais fortes com isto?’. E a resposta foi: a trabalhar. Com o regulador, em termos de cumprimento da regulação, e internamente, a fazer os ajustamentos que temos que fazer e por aí fora. Em termos de imagem, dir-se-ia que, com as devidas distâncias, foi uma espécie de stress test em tempo real, em que o banco foi colocado à prova, é is-

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so? Pelo que diz, a ideia com que se fica é que acredita que o banco sairá mais forte desta situação, concorda? Sim. Vamos sair mais fortes e muito mais confiantes, estamos a ajustar os projectos para gerir muito melhor o risco, melhorar os sistemas para progredir à velocidade que queremos. Portanto, acredito que sairemos mais fortes, mas temos de fazer o trabalho de casa. Estando há poucos meses no cargo, gostaria de lhe perguntar qual é que foi o primeiro pensamento que teve quando lhe anunciaram que foi escolhido para o cargo? Não vou esconder que tinha o sonho de ser CEO do banco. Nunca o escondi, de resto. E quem comigo trabalhava sabia-o. A primeira coisa que me ocorreu quando o Dr. Tomaz Salomão me ligou a fazer o convit foi, sem dúvida, o concretizar de um sonho. Mas depois, imediatamente, veio o peso das várias responsabilidades que implica esta posição. A responsabilidade sobre 1400 colaboradores que, todos os dias, dependem das decisões que nós tomamos, a responsabilidade sobre o capital dos accionistas, a responsabilidade que o próprio regulador nos impõe enquanto banco sistémico, a responsabilidade que temos quando somos um operador relevante numa economia como a de Moçambique, a responsabilidade de continuar a apoiar a economia. Ou seja... foi tudo isso. Trabalho em banca

há 20 anos, mas, já quando estava na faculdade, era este o meu sonho e concretizá-lo num banco com a dimensão e importância deste é muito relevante. Depois de termos olhado para este passado de curto prazo, e olhando para a frente, quais é que são as principais linhas orientadoras do que é que vai ser o Standard Bank nos próximos tempos no decorrer do seu mandato? Temos aqui dois momentos em que continuamos muito focados. No curto prazo, em continuar a trabalhar em conjunto com o Banco Central para resolver este tema; no médio e longo prazos, o caminho passa por executar a estratégia que tem sido desenhada no grupo, de sermos um banco universal e que tem Moçambique como a sua casa, que quer fazer parte do desenvolvimento do País, e que quer estar presente na economia, desde as grandes empresas até ao sector informal. Temos uma posição muito relevante de liderança no segmento das grandes empresas nacionais e internacionais, fruto do trabalho que tem sido feito ao longo de muitos anos e há vários CEOs antes de mim. Portanto, o facto de fazermos parte de um grupo que tem este foco, também em todo o continente, ajuda muito em termos de sinergias, a trazer soluções para as multinacionais, a fomentar o investimento estrangeiro, o financiamento dos grandes projectos – no qual temos um papel muito relevante por exemplo, nos megaprojecwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


to em mercados ainda pouco amadurecidos, como o crédito à habitação ou leasing. Ouvi-o também, recentemente, falar da importância económica do mercado informal, falando de como a banca poderia ser, também a esse nível, um parceiro. Em que medida? A economia informal é gigantesca, como sabemos, e, na minha opinião, não precisa de ser totalmente informal do ponto de vista de fluxos financeiros. Enquanto grupo, e ao nível de África, estamos a olhar também para isso e como vamos conseguir chegar a esse segmento informal e trazer esses fluxos para dentro dos ecossistemas formais, sem necessidade de, necessariamente, formalizar essa economia. Estamos a falar de muitos milhões de pes-

de que, quando o Banco Central aplica a sua política monetária, está a pensar nestes 35 milhões de moçambicanos. Depois, em cima disto, os bancos aplicam um prémio de risco, que tem um objectivo: remunerar o capital investido. E essa remuneração tem de ser acima do custo de capital que, em Moçambique, está muito condicionado por uma série de factores, como o rating externo, a instabilidade e a volatilidade dos mercados que impatam todos nas taxas de juro. Depois, há a própria dimensão do mercado. O custo de operar, muitas vezes com recursos escassos, aumenta o preço desses recursos. E o prémio de custo está muito ligado a todos estes componentes que são associados ao risco de operar em Moçambique.

“Quando o Banco Central aplica a sua política monetária, está a pensar nos 35 milhões de moçambicanos. Depois, em cima disto, os bancos aplicam um prémio de risco para remunerar o capital investido”

tos de gás natural da bacia do Rovuma. Depois, o envolvimento muito relevante que temos tido também no sector mineiro e no das infra-estruturas, apoiando projectos como o Porto de Maputo, ou do Porto e a linha férrea de Nacala. Tudo isto está dentro do nosso ADN. Tem posto a tónica nas PME ultimamente, o que é, aliás, uma tendência generalizada na banca, e que foge um pouco ao segmento do banco, normalmente mais focado nas grandes empresas. Porquê? É importante perceber que estas grandes empresas fazem parte de ecossistemas que incluem muitos outros agentes económicos, nomeadamente as MPME. E está na nossa estratégia apostar fortemente em fazer crescer esse segmento usando aquilo que aprendemos com as grandes empresas, usando tecnologia para que o custo de servir seja adequado a essas MPME, continuar a apostar muito no trade finance, precisamente para quem vive muito das importações e exportações. Costumo dizer que o nosso papel é fazer o ecossistema mais eficiente, como? Se nós servirmos todo o ecossistema, das grandes às pequenas empresas, conseguimos ver todos os fluxos de caixa, avaliar melhor o risco. Depois, temos a parte dos indivíduos que também são agentes económicos, muitas vezes dentro deste sistema. Só desta forma se poderá começar o caminho de promover o acesso ao crédiwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

soas, o que revela o quão importante é trazê-las para o campo de inclusão financeira. Por fim, do nosso lado, e continuando na questão do risco, a utilização e tratamento de dados que nós geramos, enquanto instituição financeira, é que vai permitir baixar o risco e tornar o sistema muito mais eficiente nas receitas, utilizando a big data analytics. Várias pessoas na área financeira têm falado disso e considero que é um dos grandes desafios de todo o sector. Usando os dados de todos os agentes económicos, conseguimos tomar decisões muito mais eficientes e com muito menos risco

Como se resolve esta questão, então? Temos todos de trabalhar, quer a parte do Governo, quer o sector privado, para melhorar o ambiente de negócios, e termos um upgrade do rating, que depois se vai reflectir no nosso custo de capital e, naturalmente, em taxas de juro mais baixas. Volto a dizer: nós, os bancos, acabamos por ser o veículo de transmissão, quer da política monetária, quer do risco do País na economia, e só trabalhando todos juntos podemos resolver os problemas fundamentais desta economia e ver as taxas de juro baixar.

A questão do risco leva-nos a um dos grandes pontos de discussão dos útimos anos, que tem alimentado divisões entre empresas e o sistema financeiro: as taxas de juro. Não faltam empresas e empresários que digam isso ao longo dos últimos anos mas, na verdade, é importante clarificar uma coisa: os bancos são um mecanismo de transmissão de política monetária que o Banco Central define. E a política monetária tem um objectivo. No caso do nosso Banco Central, ele é muito claro: manter a inflação controlada. E isso tem sido bem conseguido e eficaz. Quem tem, hoje em dia, acesso a crédito no País será, talvez, um milhão de pessoas. Mas há 35 milhões de moçambicanos que podem potencialmente sofrer com a inflação. É preciso ter a noção

Recentemente, foi anunciado um Fundo de Garantia, medida que tem sido bem acolhida pelo empresariado e por alguns bancos. Considera-o uma boa ideia? Sem dúvida, o Fundo de Garantia permite reduzir o risco, e precisamos de ter menos capital associado a esse risco. Logo, torna-se mais barato e aliciante para os bancos. Mas, acima de tudo, é uma ideia muito boa, que terá, certamente, pelos valores envolvidos (200 milhões de dólares) um impacto grande num segmento que, muitas vezes, não tem acesso a crédito para crescer, que é o sector de que falávamos das MPME. A Associação Moçambicana de Bancos, de cuja direcção o Standard Bank faz parte, em conjunto com o Banco Mundial e Ministério das Finanças, já estavam

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CEO TALKS

a trabalhar no conceito há algum tempo e ficámos muito satisfeitos por ver que foi uma das medidas anunciadas pelo Presidente da República. Se olharmos três anos para trás, não tínhamos pandemia, não tínhamos guerra na Ucrânia, nem inflação. Com isto, juntamente com a instabilidade no Norte que paralisou os dois maiores projectos de investimento, e os efeitos dos ciclones, o grande salto da economia moçambicana foi sendo adiado. Como é que vê a dinâmica da economia moçambicana nos próximos anos? Sendo verdade tudo isso, mas olhando para o futuro, acho que há aqui vários indicadores bastante positivos. A exportação de Coral Sul está prestes a acontecer, e um projecto daquela dimensão (sete mil milhões de dólares de investimento) para uma economia de 14 ‘bis’ é muito grande. A fase de desenvolvimento foi relativamente rápida para um projecto daqueles, o barco foi construído e entregue dentro dos prazos previstos e já está, hoje, ali, a produzir gás liquefeito, prevendo-se as primeiras exportações já no último tri-

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“Existem alguns sinais de que, no início de 2023, o desenvolvimento do projecto da TotalEnergies também possa reiniciar, fruto do grande trabalho do Estado e dos seus parceiros em tornar aquela região estável” mestre deste ano. Isto mostra que Moçambique é um país que está preparado para fazer parte dos grandes exportadores de energia do mundo. Mas temos tido outros sinais encorajadores, como o acordo com o FMI que é muito relevante, como o selo de que todos esperávamos para que os investidores possam voltar, e o sinal de que existe uma estratégia clara de gestão de finanças públicas. Depois, existe um pacote muito grande do Banco Mundial, numa série de áreas, entre elas o Fundo de Garantia, de que falávamos. E esse é um pacote que dá apoio directo à economia, para além de ter uma parte de componente de apoio ao OE. Existem alguns sinais de que, no início de 2023, o desenvolvimento do projecto da TotalEnergies na Área 1 também possa reiniciar, fruto do grande trabalho do Estado e dos seus parceiros em tornar aque-

la região mais estável. Tudo isto combinado, e com mais este anúncio do Presidente da República do plano de fomento económico, com 20 medidas concretas, só pode dar-nos boas perspectivas para o futuro a curto e médio prazo. Passámos os últimos sete anos com um crescimento muito baixo, em média de 2,8%, com a população a crescer a 3,5%, ou seja, na prática, temos perdido poder de compra. Esperamos que estas medidas nos voltem a trazer para os níveis de crescimento que Moçambique tem o potencial para alcançar, e que já teve no passado. Creio que vamos estar acima dos 5% de crescimento do PIB já em 2024. Em que ponto de maturidade está, em sua opinião, o sistema financeiro actualmente? Temos um sistema muito sólido. Houve uma série de alterações regulamenwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


sos clientes para que possam, através das nossas plataformas digitais, aceder não só aos produtos que desenvolvemos, mas aos dos nossos parceiros. É essa evolução que o grupo está a fazer. Ou seja, começa tudo numa jornada de transformação digital das pessoas, das plataformas, de reduzir a quantidade de plataformas que temos e que já estão obsoletas, e de criar uma mais ajustada aos novos tempos, e preparada para que, quando o cliente precisar de algo – desde comprar um carro, uma casa, um computador, ir de férias ou pagar a escola dos filhos – possa ter ali uma série de soluções. Sabemos que existem ainda hoje alguns desafios a este nível, nomeadamente na legislação sobre como tratar os dados dos clientes, onde armazenar, onde tratar e por aí fora. Essa é uma lacuna que está já bem identificada pelo Governo e com o qual nós esperamos ansiosamente que haja avanços.

tares com o aumento do capital mínimo dos bancos, dos rácios de capital, ou intervenções que o Banco Central teve de fazer em algumas instituições financeiras. É preciso dar o exemplo para depois todos os outros seguirem. E basta olhar para os rácios de capital dos bancos, que estão quase todos, pelo menos, 3% acima do mínimo regulatório, o que permite absorver potenciais perdas e atenuar a volatilidade do mercado. Depois, mesmo do ponto de vista de regulação, tem havido grandes avanços em vários temas da regulação do sistema financeiro, como a recente aprovação da Lei de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento ao Terrorismo. Estas são alterações que vieram colocar o sistema financeiro moçambicano ao nível das melhores práticas mundiais, conjugado com um regulador que é muito activo em perceber se os players do mercado estão a cumprir com a regulação. Pessoalmente, o que hoje notamos é que as conversações entre as nossas equipas e as da regulação tanto podiam ser em Maputo, como em Joanesburgo ou Nova Iorque. Os temas que são debatidos www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

entre nós e o Banco Central, ao nível deste tipo de regulação, têm por base as melhores práticas. E, mesmo assim, a banca ainda está longe de ser universal, ou transversal a toda a população... Há um espaço grande para crescer, porque continua a haver uma faixa enorme da população que não está ainda abrangida pelos serviços financeiros. Uma das coisas que mais me surpreenderam quando entrei no banco foi o projecto que o grupo anunciou, em que vai embarcar numa jornada de transformação digital. Chamamos-lhe “Future Ready Transformation”, e terá uma componente grande de formação e acesso das nossas pessoas a plataformas de conhecimento que não tínhamos no passado, e muito viradas para as novas tecnologias, para a blockchain, para a inteligência artificial e para o marketing digital. Mas está em curso a jornada de transformação, de passarmos de um banco para sermos uma plataforma que agrega serviços financeiros e não financeiros de acordo com as necessidades do cliente. Temos de nos posicionar junto dos nos-

Se daqui a um ano estivermos a conversar, e lhe pedir um balanço dos últimos meses, o que é espera, ou gostaria, de me dizer nessa altura? Olhe, eu gostava de lhe dizer que já se nota a transformação em que estamos a embarcar, a digital e a de sairmos das notícias pelas razões erradas. Gostava que, daqui um ano, o mercado começasse já a sentir o efeito de muitas das ideias e produtos em que temos estado a trabalhar. Volto a dizer que uma das coisas que me surpreenderam quando aqui cheguei foi constatar que há muita gente jovem, com muito talento, que está a trabalhar em coisas muito interessantes. Gostaria muito que, nessa altura, estivéssemos a falar já de fazer o terceiro e o quarto projectos de gás natural e não apenas o primeiro e o segundo. E de estar aqui a falar do progresso e dos resultados do Fundo de Garantia e do papel que teve no desenvolvimento das Pequenas e Médias Empresas em Moçambique. E espero estar aqui também a anunciar as coisas novas que vamos fazer ao nível do segmento das pequenas empresas, que é de todos, do que é que no nosso portefólio estará a crescer mais, mas também nos clientes particulares. Espero ter já caminhos implementados para trazer o mercado informal para o sistema, e continuar a dizer que continuamos sólidos financeiramente, que o banco continua com uma marca muito forte alicerçada em pessoas muito comprometidas. Espero, por fim, não estragar o que está muito bem feito aqui no banco e construir em cima dessa boa base.

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especial inovações daqui 54 ODOFUTURO DINHEIRO O mundo caminha rapidamente para uma era em que os bancos centrais não mais serão responsáveis por todas as regras do sector financeiro. Haverá uma grande variedade de moedas sem fronteira monetária e mudanças radicais na forma como lidamos com o dinheiro. E isso pode acontecer dentro de até dez anos, segundo analistas.

58 TRACEMARKET

Quando a inovação está voltada para a produção

de alimentos que garantem saúde e bem-estar

60 PANORAMA As notícias da inovação em Moçambique, África e no Mundo


MERCADO FINANCEIRO

Tokens… o Futuro do Dinheiro As mudanças tecnológicas no mercado financeiro estão a acontecer com tanta rapidez e ninguém é capaz de dizer com certeza como será o futuro do dinheiro. Mas vários especialistas pelo mundo já adiantam que, nos próximos cinco a dez anos, é possível que as fronteiras monetárias fiquem mais ténues. Afinal, a transformação está apenas a começar TEXTO Celso Chambisso • FOTOGRAFIA D.R.

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studiosos de todo o mundo prevêem que será possível tokenizar tudo: trabalho, casa e captar valores, por exemplo, para ampliar um pequeno negócio. Estes especialistas, a representarem diversas áreas, desde as criptomoedas a bancos digitais, concordam em dois pontos: o mundo financeiro já está em transformação e será muito diferente nos próximos anos. Num período de cinco a dez anos, o dinheiro mudará de forma, as fronteiras monetárias ficarão mais ténues, a variedade de moedas vai multiplicar-se, cada vez mais as trocas de valor serão instantâneas, e até mesmo cidades virtuais ou “meta países” corporativos poderão abrigar unidades próprias de pagamento. Nesse novo universo, tecnologias como a DeFi, NFT, criptomoedas, stablecoins, CBDC (Central Bank Digital Currency), metaverso e blockchain ditam as

zada com o nome de Diem. A ideia continua viva, mas enfrenta a resistência de vários bancos centrais no mundo. Tudo isto é tão complexo, que começa a fazer sentido quando se explicam alguns conceitos utilizados neste contexto e os aspectos de segurança que começam a ser uma grande preocupação nesta “confusão” de ideias misturadas. Afinal, tudo começa com a possibilidade de digitalizar activos reais.

Tokens… e 'tokenização' de activos

Um token é uma chave electrónica, um pedaço de código que representa algum activo. Quando se fala sobre tokens na blockchain, agrega-se algumas características da tecnologia, sendo as principais a imutabilidade, a segurança e a transparência. Além disso, os tokens têm a característica de serem descentralizados, seguindo as regras dos seus smart contracts na rede.

Nesse novo universo, tecnologias como a DeFi, NFT, criptomoedas, stablecoins, CBDC, metaverso e blockchain ditam as regras do jogo financeiro

regras do jogo financeiro. Segundo o autor do livro “O Futuro do Dinheiro”, Rudá Pellini, “o dinheiro pode tornar-se num livre mercado onde vence o melhor”. Conforme o especialista, “caminhamos para isso, ou seja, ter diferentes tipos de moedas virtuais no mundo, como as emitidas por corporações”. O especialista lembra que a própria Meta, controladora do Facebook, num passado recente anunciou a criação de uma moeda virtual para ser usada no seu ecossistema de redes sociais, bapti-

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Já a tokenização de activos é a transformação de um activo real num activo digital, fragmentado em unidades criptografadas (os tokens). As transacções desses tokens ocorrem dentro de uma blockchain, que é uma rede computacional descentralizada de registo público e seguem algumas funcionalidades de comunicação e interacção pré-programadas na sua origem. Esses tokens são criados de tal forma que podem ser subdivididos, negociados e armazenados em tecnologia de www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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MERCADO FINANCEIRO ATÉ ONDE OS TOKENS PODEM CHEGAR? contabilidade descentralizada (DLT). Entre os exemplos de activos reais que podem ser tokenizados estão os imóveis, empreendimentos da economia real, obras de arte, metais preciosos, etc. Já entre os activos não tangíveis que podem ser tokenizados, podemos citar os NFT, acções de empresas, moedas digitais dos bancos centrais (CBDC), patentes, propriedades intelectuais, royalties, entre outras possibilidades.

Como é que tudo isto deve funcionar?

Toda a fase de crescimento exponencial de uma tecnologia é sucedida por uma etapa de consolidação e amadurecimento. Mas como seria em relação à tokenização? Simples: a utilização completa em todos os sectores. Por exemplo, existem, actualmente, grandes redes de retalho que utilizam os tokens para promoverem programas de relacionamento e oferecerem descontos e promoções como forma de atracção e fidelização de clientes. Entretanto, outros sectores bem

mais complexos também exploram as oportunidades da tokenização. O mercado imobiliário, por exemplo, começa a desenvolver os primeiros projectos com a missão de desburocratizar e democratizar o acesso a empreendimentos. A indústria de mineração, por sua vez, utiliza os tokens para facilitar a negociação de metais preciosos. Já as empresas de automóveis fazem a antecipação de recebíveis com recurso a essa tecnologia.

Será através dos NFT, que são uma espécie de revolução dos tokens no mercado financeiro. Para um mercado tão virtual, nada melhor do que um exemplo para elucidar o que será tendência num futuro breve. De acordo com o portal “The Block Crypto” – uma importante fonte de pesquisas sobre activos digitais – um dos exemplos que podemos utilizar é o de uma plateia que assiste ao leilão de um quadro numa galeria de arte. A obra é apenas uma moldura com fundo branco onde se lê “não acredito que esses idiotas realmente compraram esta porcaria”. A cena aparece numa ilustração do artista britânico Banksy, lançada em 2006. O preço? Até 95 mil dólares por uma das 980 impressões originais. Não à toa. É que “Idiotas” tornou-se numa das críticas mais famosas ao mercado de arte – e, principalmente, às cifras astronómicas que ele movimenta. Já em 2021, uma empresa de blockchain dos Estados Unidos resolveu arrematar um dos originais de “Idiotas” e queimá-lo numa transmissão ao vivo. Era mais do que uma crítica a Banksy: o vídeo que registou a performance foi, depois, vendido no formato de “token digital” por 380 mil dólares. O anónimo que comprou o vídeo não ganhou direito de fazer um download, de guardar o arquivo no computador, e de qualquer pessoa poder assisti-lo, gratuitamente, no YouTube. O que ele adquiriu foi um contrato que lhe permite dizer que é dono do clip. Moral da história: O mercado de arte continua a fazer girar muito dinheiro, mesmo quando não tem grande mérito. Mas, agora, os entusiastas têm uma ferramenta mais moderna para isso: os tais NFT. NFT é a sigla em inglês para non-fungible token, ou token não fungível. Isto é, que não tem um substituto correspondente, só existe um único exemplar daquele tipo. Sendo uma chave de segurança que serve como um certificado de

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autenticidade digital, os tokens garantem que algo do mundo real ou do virtual pertence a uma pessoa, e somente a ela. Cada token funciona como uma chave para abrir um cofre. Mas, a cada vez que alguém abre o cofre, a chave muda. Isso acontece porque, em vez de serem contratos escritos em papel, os tokens digitais são registados num outro tipo de cartório: a blockchain. A função deste sistema garante que os tokens são exemplares únicos (sem cópia possível) e, ao mesmo tempo, transferíveis. Os tokens que mais circulam pela blockchain não são exactamente contratos. São “tokens de pagamento” – as criptomoedas, como a bitcoin e o ethereum. Como um banco de dados virtual, a blockchain cria um novo registo cada vez que uma bitcoin muda de mãos. Isso garante que cada fracção de bitcoin na carteira virtual pertence apenas a um proprietário, até o momento em que decida vendê-los (ou comprar algo com eles). Os NFT, em regra, são negociados na rede de blockchain do ethereum, e, como as criptomoedas, ficam guardados em carteiras virtuais. É esta a tendência que se vai generalizar e mudar o panorama global do mercado financeiro, possibilitando a abertura de novos horizontes de investimento e permitir a pessoas comuns lucrar até com royalties de músicas e transferências de jogadores de futebol.

Uma tendência com muito espaço por explorar

Estudos apontam que ainda há um grande espaço de crescimento e consolidação dos tokens. Diversos sectores começam a explorar as possibilidades que esse conceito tem a oferecer nos seus modelos de negócio. Para se ter uma ideia, um levantamento da consultora MarketsandMarkets estima que o mercado global de tokenização deve crescer 19% ao ano até 2026. O sector vai passar de 2,3 mil milhões de dólares, em 2021, para 5,6 mil milhões daqui a quatro anos. O crescimento deve ser impulsionado justamente pelo amplo espaço de adesão entre os consumidores, o que faz com que diferentes empresas comecem a investir seriamente neste mercado. Ainda assim, é importante ressalvar o baixo número de empresas e, principalmente, de profissionais dedicados a facilitar este procedimento, bem como a necessidade de actualizar os marcos regulatórios que regem temas como Tecnologia e Finanças. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

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TRACEMARKET

TRACEMARKET

Uma 'Conferência' de Inovação em Saúde e Bem-estar Duas vezes por mês, no primeiro e no último sábado, a Tracemarket junta, em Maputo, pesquisadores da área alimentar numa feira que procura induzir as famílias a adoptarem hábitos de consumo alimentar e de medicamentos que melhorem a qualidade de vida TEXTO Hélio Nguane • FOTOGRAFIA Mariano Silva

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raceMarket é uma marca famosa pelo mundo. A mais destacada poderá ser a de Seattle, nos Estados Unidos, que produz comida artesanal, rápida, local e amiga do planeta, e que serve pequeno-almoço e almoço todos os dias. Os menus deste restaurante são inspirados no que os americanos chamam de “generosidade regional do Noroeste do Pacífico”. São habilmente elaborados por Ross Lewis – um importante chef irlandês premiado com uma estrela Michelin (o mais importante galardão de reconhe-

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cimento à excelência de hotéis e restaurantes do mundo). Talvez inspirado no TraceMarket americano, cá em Moçambique existe uma feira com a mesma designação, mas com particularidades ligeiramente diferentes, de acordo com a respectiva coordenadora e fundadora, Aline Belfiore. “A feira começou em 2018 motivada pelas lacunas do mercado em termos de saúde e bem-estar, no que diz respeito à adopção de hábitos de vida saudável. O conceito da feira é criar um mercado que, apesar de pequeno, seja completo, com todas as ofertas de produ-

tos alimentares 100% naturais, sem glúten, sem lactose e sem açúcar”, explicou Aline Belfiore. A feira, que congrega cerca de 20 expositores, tem ofertas para os veganos, vegetarianos e todos os tipos de preferências alimentares, com uma gama variada de farinhas sem aditivos nem conservantes. “Todo o tipo de produtos que temos têm estas características e o objectivo é continuar a descobrir produtores que invistam na pesquisa deste tipo de alimentos e suplementos, para participarem na feira e facilitar o alcance dos consumidores”, revelou a coordenadora do www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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PROJECTO Feira TraceMarket ÁREA Alimentar ANO DE CRIAÇÃO 2018 FUNDADORA Aline Belfiore LOCAL Cidade de Maputo PERIODICIDADE Bimensal

TraceMarket. Um dos participantes assíduos na feira TarceMarket é o projecto Nutrivos que, segundo a responsável, Ima Feia, opera há cerca de um ano no mercado, tendo sido criado para oferecer produtos alimentares nutricionalmente mais ricos do que os normalmente encontrados no mercado. Fabrica biscoitos, barras alimentares, apas, barritas, etc. “Notamos um número cada vez maior de pessoas que procuram alimentos sem açúcar, quer por parte de quem pretende evitar a diabetes, quer de quem procura perder peso. Por isso concentramo-nos muito na produção de alimentos sem www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

açúcar”, esclareceu a responsável. Na TraceMarket, a inovação não se limita apenas aos alimentos. Há uma linha de produtos de medicina que fazem a diferença na qualidade de vida, e que incluem elementos botânicos na base de cremes e produtos para banhos. Um dos fornecedores é a empresa In Saúde Natural, cuja vocação é trabalhar com produtos naturais para produzir medicamentos e suplementos. “Temos produtos contra a diabetes, cólicas, osteoporose e até cancros (desde que não tenham atingido a fase de metástase). A nossa aposta é melhorar a qualidade da

saúde naquilo que se chama fitoterapia”, explicou Luís Mabjaia, proprietário da empresa. Já que estamos a falar em saúde e bem-estar, a feira estende o seu âmbito para além das comidas e remédios. Abre-se aos produtos de artesanato como capulanas, combinados e outros artigos que dificilmente se conseguem obter numa loja convencional. Mais do que isso, a TraceMarket é um espaço de convívio social. E os preços? São de mercado, acessíveis a todos os bolsos, garantem os expositores. Mas porquê a preocupação com os custos, se a saúde não tem preço?!

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PANORAMA

Administração Pública

Governo quer operacionalizar sistema de certificação digital Trata-se de uma plataforma digital que garante a interoperabilidade dos sistemas das entidades certificadoras e que visa a operacionalização do Sistema de Certificação Digital de Moçambique (SCDM), que está a ser trabalhado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES), através do Instituto Nacional de Tecnologias de Informação e Comunicação (INTIC), em parceria com algumas universidades brasileiras. O director nacional de Sistemas de Informação, Estudos e Projectos no MCTES, Constantino Sotomane, afirma que o SCDM permite a integração de novas plataformas digi-

Transportes

Polícia de Trânsito testa novo equipamento de fiscalização rodoviárias A Polícia de Trânsito está a testar um equipamento capaz de registar várias transgressões, de uma vez, das regras de condução em diferentes viaturas. A máquina consegue controlar o excesso de velocidade, o uso de telefone durante a condução, a não utilização do cinto de segurança e a mudança de direcção sem a devida sinalização. Segundo explica o Conselho Administrativo da Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento (EMME), o instrumento em teste faz, em simultâneo, a leitura de oito viaturas em paralelo e oito em sistema longitudinal, é à prova de água, suporta níveis altos de calor e ainda tem uma câmara com alta resolução capaz de identificar um condutor que tenha cometido uma infracção. Ao contrário da máquina usada actualmente, a nova proposta não precisa de um operador de vigia, podendo a polícia montar o equipamento, ausentar-se e, mais tarde, fazer o levantamento das violações cometidas. Ainda dentro do pacote de reforço da segurança rodoviária, estão previstas viaturas com câmaras móveis que farão o registo e identificação de todas as infracções que são cometidas. O instrumento custa cerca de 60 mil dólares (3,8 milhões de meticais) e, em caso de aprovação, será montado em quatro zonas da Província de Maputo.

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tais de entidades públicas e privadas, tais como o sistema de registo e identificação dos membros das comunidades académica e científica de Moçambique, através da utilização de tecnologias emergentes para identidade electrónica. O SCDM vai também ser usado nos documentos de identificação formal e funcional, como o bilhete de identidade, a carta de condução, cartões profissionais, cartões de banco, entre outros, e funcionará como meio de colaboração e partilha na forma cada vez mais social e participativa da comunidade académica nacional e internacional.

Healthtechs

Engenheira nigeriana cria sutiã que detecta cancro de mama

Bolarinwa Kemisola, nigeriana formada em engenharia robótica, desenvolveu um sutiã que pode detectar cancro da mama. Com 14 sensores, o sutiã inteligente inclui um sistema de conexão via

USB e uma app, que permitem verificar os resultados e enviá-los a um médico. Em apenas 30 minutos de utilização, os pequenos sensores de ultrassom do protótipo fazem um scan aos seios e revelam a localização de um possível tumor, definindo se este é benigno ou maligno. A engenheira e pesquisadora explicou que “quando surge um tumor, a área ao redor dele enche-se de vasos sanguíneos para ‘alimentá-lo’. É assim que o cancro cresce. Essa super vascularização pode ser detectada por um aumento de temperatura – mas que geralmente é imperceptível sem equipamentos muito específicos”, explicou Bolarinwa Kemisola.

Agritechs

Aerobotics lança nova plataforma para agricultores A empresa sul-africana Aerobotics lançou uma nova plataforma de gestão de rendimento, que utiliza imagens aéreas de zangões e satélites, e mistura-as com algoritmos de aprendizagem de máquinas para fornecer, aos agricultores, serviços de detecção precoce de problemas para optimizar o desempenho das colheitas. A aplicação Aeroview, baseada em nuvens, fornece aos agricultores conhecimentos, mapeamento de olheiros e outras ferramentas para mitigar os danos causados por pragas e doenças às culturas de árvores e vinhas. A aplicação móvel permite ainda que os agricultores captem informação de rendimento no terreno, ajudan-

do a informar recomendações e importantes decisões de gestão para atingir os rendimentos alvo. O produto de rendimento mais recente utiliza métricas de desempenho de árvores, vinhas ou arbustos para estabelecer locais de amostragem representativos na nova plataforma de gestão do rendimento. No campo, os produtores e as suas equipas são guiados para cada árvore, videira ou arbusto geo-referenciado utilizando a aplicação onde as contagens e tamanhos de rendimento são registados digitalmente, antes de serem extrapolados para relatórios ao nível da variedade e de bloco na plataforma. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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OPINIÃO

Francisco Lourenço • Fraud Unit Manager at FNB Mozambique

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erante um panorama de fraude em rápida evolução, suportado nas mais recentes tecnologias e com um modus operandi em constante aperfeiçoamento, é imperioso que as empresas e indivíduos se mantenham alerta para se prevenirem de esquemas fraudulentos susceptíveis de acarretar prejuízos financeiros consideráveis para além dos potenciais danos reputacionais. Lourenço Francisco, gestor da Unidade de Prevenção de Fraudes no FNB Moçambique, afirma que, “considerando os avanços tecnológicos e a natureza sofisticada dos esquemas que ocorrem nos dias de hoje, é imprescindível a adopção de regras de detecção e prevenção de fraudes. Como tal, numa tentativa de se protegerem impõe-se, às empresas e indivíduos, a necessidade de se manterem constantemente actualizados sobre as tendências e esquemas fraudulentos em rápida evolução. É imperioso para as empresas investirem tempo, esforço e recursos passíveis de preparar os seus Colaboradores para detectar a fraude de forma atempada e eficiente”. Paralelamente ao crescente uso de canais digitais, Moçambique tem presenciado níveis de fraude e burla frequentes. De acordo com Lourenço, os esquemas mais recorrentes registados em Moçambique são os seguintes: Actualização de dados da empresa e/ou indivíduos (KYC) – os Clientes recebem uma SMS e/ou e-mail supostamente do seu Banco, informando-os que se encontra em processo de actualização dos dados dos Clientes, instruindo-os para que abram um link para o efeito. A página recria o site oficial do banco, mas é uma farsa. Os Clientes são incitados a fornecer informações sobre as suas contas e cartões, e é aqui que o fraudador se apodera dos dados fornecidos e faz uso deles. Não partilhe, em circunstância alguma, informação de identificação e credenciação por essas vias. Em caso de dúvida deverá contactar o seu Banco. Telefone perdido e roubado – é enviada uma SMS solicitando, ao Cliente, para clicar num link para activar a aplicação “Find My Phone”, mesmo tendo o telefone consigo. Ao clicar no link, o Cliente

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As Fraudes Bancárias Mais Frequentes em Moçambique permite o acesso ao seu telemóvel, comprometendo os seus dados pessoais e bancários. E-mail institucional comprometido – é utilizado um malware, por vezes combinado com técnicas de engenharia social, a fim de conseguir acesso a contas de e-mail institucionais e falsificar facturas e dados bancários dos fornecedores. As empresas são frequentemente vítimas deste esquema. O objectivo é levá-las a fazer pagamentos em contas bancárias fraudulentas. É fundamental que confirme pedidos de alteração de dados bancários junto de um contacto conhecido antes de passar a utilizar os dados supostamente actualizados. Roubo de credenciais de acesso ao Internet Banking – os fraudadores conseguem aceder às credenciais de Internet Banking do Cliente com o intuito de efectuar transacções usando os fundos da conta do mesmo. Como o fazem? Um momento de distracção é suficien-

“Todo o cuidado é pouco, principalmente em questões sensíveis como a protecção de credenciais dos canais digitais de acesso ao Banco...” te: ao aceder à Internet Banking na presença de estranhos, gravar as credenciais de acesso no navegador, esquecer-se de “sair” da página ao terminar as operações ou mesmo escrever as credenciais num papel, o utilizador fragiliza a segurança das credenciais bancárias do Cliente. Por outro lado, e para fechar o ciclo, os fraudadores obtêm a segunda via do cartão SIM do Cliente junto às operadoras de telefonia móvel, com o número associado à sua conta bancária, e passam a receber os códigos de validação OTP para confirmar as transacções que efectuam. Golpes em concursos públicos – muitas vezes os fraudadores fazem-se passar por representantes de instituições do Estado com vista a obterem aceosso a dados de empresas, detalhes bancários, bens e serviços, levando-os a

acreditar que ganharam um concurso/contrato. Recomendamos muito cuidado com pedidos de apresentação de propostas de serviços e custos não solicitados. Nos casos em que tenha recebido um pedido de orçamento ou de proposta, é aconselhável contactar o departamento para validar o pedido e manter-se a par sobre os critérios destas entidades para a aquisição de bens e serviços. Visitar o website do concurso do Governo para obter informações sobre o processo de concurso deve ser parte do due diligence. Acesso remoto – ocorre quando os infractores acedem ao dispositivo ou perfil do Cliente, permitindo a instalação de ferramentas de acesso remoto. Daí não ser aconselhável utilizar redes públicas de Wi-fi para aceder a contas bancárias. Convém, igualmente, anular ou apagar sempre as ferramentas de acesso desconhecidas instaladas no telefone. Troca de cartão nas ATM – é comum os fraudadores fazerem-se passar por indivíduos prestáveis e prontos a ajudar os utilizadores de ATM que enfrentam dificuldades nas realização de operações. Facilmente conseguem trocar o cartão do utilizador, obter acesso ao PIN do cartão e efectuar transacções fraudulentas na conta do utilizador enganado. Phishing, Vishing e Smishing – são esquemas de fraude de identidade comuns, geralmente executados por e-mail, voz ou texto, ou uma combinação de todos os canais de comunicação. Os infractores utilizam vários métodos para obter dados individuais ou institucionais sensíveis a fim de os utilizar em actividades criminosas. “Todo o cuidado é pouco, principalmente em questões sensíveis como a protecção de credenciais dos canais digitais de acesso ao banco, no uso de ATM, presença de estranhos dispostos a “ajudar” e comportamento da rede do telemóvel. É imprescindível que contacte o seu Banco se suspeitar que o número associado à sua conta bancária tenha sido trocado, ou se ficar sem rede por largos minutos. Implementar medidas de segurança adequadas e manter-se a par das evoluções mais recentes são medidas inteligente para ajudar a salvaguardar as empresas e os indivíduos contra as tentativas de fraude recorrentes”, concluiu Lourenço Francisco. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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MERCADO & FINANÇAS

“Queremos Aproveitar a Feira Para nos Reerguermos” Já na sua 57.ª edição, a maior feira agro-industrial do País introduz inovações inspiradas pela crise do covid-19 e pela mais recente instabilidade que se abate sobre a economia global. A estratégia, agora, é transformar desafios em oportunidades, segundo o director-geral da APIEX, Gil Bires Texto Celso Chambisso • Fotografia D.R

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balanço da Feira Internacional de Maputo (FACIM) 2021 mostra o quanto a pandemia limitou o papel deste evento enquanto local de promoção do crescimento socioeconómico, através da interacção dos homens de negócios nacionais e estrangeiros. No que diz respeito ao número de expositores, teve a participação de 569 nacionais, contra 1550 inicialmente projectados. Os expositores estrangeiros ficaram-se nos 44 (19 participações em formato virtual e 25 em formato presencial), contra 24 projectados. Em relação aos países participantes da Feira, as estatísticas apontam para um total de 13, sendo quatro em formato virtual (Brasil, Coreia do Sul, Índia e Zimbabué) e nove em presencial (África do Sul, Tanzânia, Portugal, Espanha, França, Itália, Grécia, Finlândia, Reino Unido), numa projecção de 24 países esperados. A relação de visitantes da FACIM 2021 aponta para 22 314 participantes virtuais, numa projecção de 70 000, e 5400 presenciais, contra 5250 projectados. O relatório aponta ainda para um total de 622 bolsas de contacto realizadas nos diversos domínios, dos quais resultaram em 24 intenções de parcerias por firmar, incluindo acções de capacitação técnica para os profissionais de diversos sectores de actividade. Contada a história de 2021, resta saber o que se pensa para a edição que vem a seguir, entre os dias 29 de Agosto e 4 de Setembro, sobretudo numa altura em que o mundo vive outro tipo de ameaças que se sobrepõem ao quase enfraquecido covid-19, como a guerra na Ucrânia. É o que nos revela, a seguir, o director-geral da Agência para a Promoção de Exportações (APIEX), Gil Bires.

Esta edição da FACIM segue-se a momentos de instabilidade imposta pela pandemia do covid-19,

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em que tudo estava fechado, tendo impedido a realização da edição de 2020 e condicionado a de 2021 a um formato híbrido. Que formato irá seguir a de 2022 e que sinal estão a receber relativamente ao interesse do empresariado? Comparativamente à edição do ano passado, nesta regressamos ao modelo tradicional que é mais presencial do que virtual. Teremos a componente híbrida, sobretudo para os habituais seminários temáticos que abordam várias questões

“Prevemos um pavilhão que deve destacar a inovação tecnológica, a que vamos chamar de Pavilhão do Empreendedorismo, Ciência e Tecnologia, para trazer à FACIM as várias iniciativas empreendedoras que vão surgindo no mercado” sectoriais e a estratégia é garantir uma participação o mais ampla possível. Acreditamos que esta edição da Feira terá uma grande participação do tecido empresarial, tanto nacional quanto estrangeira, e a todos os níveis, tendo em consideração o ambiente que vivemos, que é de uma gradual reabertura das economias nacional e mundial face à pandemia do covid-19.

Há sinais de que a crise imposta pela pandemia e pelas ameaças globais ao comércio internacional inspiraram inovações na forma como

o País pretende vender a sua imagem e potencialidades nesta Feira… Sim. Há uma forte aposta na componente de inovação com destaque para um pavilhão exclusivo para os exportadores onde pretendemos destacar o potencial de exportação que o País tem. Teremos também um pavilhão dedicado ao sector financeiro, incluindo as seguradoras, que devem integrar expositores de diversas dimensões. Estou a falar de microsseguradoras, bancos, instituições de microcrédito, etc., para divulgarem as suas actividades de forma mais ampla possível. Além disso, prevemos um pavilhão que deve destacar a inovação tecnológica, a que vamos chamar de Pavilhão do Empreendedorismo, Ciência e Tecnologia, para trazer à FACIM as várias iniciativas empreendedoras que vão surgindo no mercado. Outras inovações exclusivas para esta edição dizem respeito à facilitação de negócios. No caso da APIEX, teremos um stand de divulgação de informação e assistência aos investidores. Isto é, se alguém quiser saber quais são as condições para investir no País pode obter a informação com alguma facilidade neste local e obter melhor orientação. Além disso, serão instalados balcões de atendimento único que, na FACIM, facilitarão a obtenção de licenças para instalar uma empresa e começar um negócio. No quadro da certificação de qualidade, o Instituto Nacional de Normalização e Qualidade (INNOQ) também estará na Feira para garantir apoio às empresas nacionais e assegurar a competitividade dos seus negócios. Prevemos, igualmente, um espaço para o registo de marcas através do Instituto da Propriedade Industrial, lembrando que esta é uma das questões-chave para a melhoria do ambiente de negócio no País, sendo, por isso, um importante factor de atracção de investimentos. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


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MERCADO & FINANÇAS

A REANIMAÇÃO DA FEIRA O adormecer do covid-19 trará de volta os grandes protagonistas da FACIM, com uma participação melhor que a de 2021

Expositores nacionais 1750

569

Expositores estrangeiros 30

44

Países 20

13

Visitantes 50 000

22 314 2021

2022 Projecções FONTE APIEX

Qual é a razão de fundo para a escolha dos sectores da exportação, financeiro e de tecnologia para estarem isolados em

pavilhões exclusivos?

Foi baseado nos objectivos da FACIM, que são o de expor as potencialidades para a produção e exportação de bens e serviços e promover oportunidades de negócios e de investimentos nos diversos segmentos da economia. Acreditamos que o sector financeiro tem estado a crescer de forma significativa e, por isso, é importante que tenha espaço privilegiado para expor os seus bens e serviços, e interagir com potenciais investidores partilhando informações e oportunidades. O mesmo acontece com a componente da inovação tecnológica e empreendedorismo, que tem estado a trazer várias iniciativas novas para o mercado nos últimos anos, a exemplo das várias startups que proporcionam mudanças rápidas no sector de serviços. Entendemos que estas iniciativas merecem um espaço igualmente privilegia-

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“Esperamos uma forte participação de expositores nacionais por termos regressado ao formato presencial, a começar pela presença de todas as províncias... e forte presença estrangeira” do para poderem afirmar-se, estabelecer parcerias e negócios.

O que se pode esperar da adesão dos expositores nacionais e estrangeiros, quer individuais, quer empresas, depois de se ter assistido a uma interrupção em 2020 e a uma edição a meio gás no ano passado, e tendo em conta que a pandemia ainda é uma ameaça e que o comércio mundial vive em ambiente de instabilidade e incerteza? Esperamos uma forte participação de expositores nacionais por termos regressado ao formato presencial, a começar pela presença de todas as províncias sem falar nos pavilhões onde estarão os expositores sectoriais, nomeadamente os representantes dos diferentes Ministérios. Também esperamos uma forte presença estrangeira. Em termos de números, projectamos a participação de cerca de 20 países e 30 empresas estrangeiras e os dados que temos até agora (duas semanas antes do ar-

ranque do evento e uma semana antes do fim das inscrições) indica que iremos atingir esta meta, porque já estamos próximos desses números. Também esperamos 1750 empresas nacionais e 50 mil visitantes.

Esta perspectiva de melhoria na participação, quer nacional, quer estrangeira, está, de algum modo, relacionada com a vontade que os países e empresas têm de alargar os seus horizontes de expansão para responder ao fenómeno da crise global, por exemplo, combustíveis e alimentos? O factor ‘relançamento’ está na circusntância de a economia nacional estar a dar sinais positivos e nós estamos a tentar aproveitar esta fase de retoma. O mercado de feiras e exposições, ao nível global, foi severamente afectado pelos efeitos do covid-19. Muitos países não realizaram feiras. No nosso caso, em particular, não realizámos a edição da FACIM de 2020 www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


e no ano seguinte foi no formato híbrido. Em resultado disso, face aos cenários da retoma da economia global e da nossa economia, obviamente que o trabalho que estamos a fazer é o de capitalizar este contexto de retoma e aproveitarmos a FACIM para promover a imagem do País como destino preferencial de investimentos, promover o potencial de exportações, parcerias empresariais e criar oportunidades para que as Pequenas e Médias Empresas nacionais tirem vantagens da Feira.

Como têm sido medidos os resultados da Feira olhando para os objectivos para que foi criada? E qual tem sido o impacto em concreto? Nos últimos anos, temos apostado em sistematizar os resultados em termos de propostas de investimentos e de negócios que resultam da organização da Feira. Em relação ao ano passado, por exemplo, e apesar de ter sido uma edição com as limitações que já referi, temos a lista de oportunidades de investimentos e que resultaram na concretização de alguns projectos. É verdade que o processo de aprovação de um projecto não é automático, mas existem propostas concretas de investimento externo que foram submetidas à aprovação, existem as que estão em processo de avaliação e que resultaram da participação na FACIM. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

OP


BAZARKETING

A Importância do Cliente.

A

Thiago Fonseca • Sócio e Director de Criação da Agência GOLO PCA Grupo LOCAL de Comunicação SGPS, Lda.

“Tudo é ousado a quem nada se atreve”. Fernando Pessoa não era uma pessoa qualquer. Talvez por isso ele também, para quem não sabe, trabalhou numa Agência de Publicidade.

lgumas vezes penso como faria se um dia fosse eu o Cliente de uma Agência. Neste artigo partilho dicas baseadas em mais de 25 anos a trabalhar do lado da Agência. E, baseado nessa experiência, o que têm em comum os anunciantes que conseguiram os melhores resultados para o seu negócio. O marketing é o pilar principal da gestão moderna. Não se admire se fizer um curso moderno de gestão de empresas, um MBA ou qualquer outro e vir que o marketing é a cadeira nuclear. E, por isso, a importância do cliente. A importância dos líderes e principais decision makers das empresas e organizações terem isto em conta. Porque devem acompanhar de muito perto o seu marketing no dia-a-dia. E estar envolvidos nas principais decisões e até nos mais pequenos aspectos da comunicação da sua marca. Envolvidos, sobretudo, de perto na relação com a sua Agência. Quando isto acontece, por norma, as campanhas são mais fortes e geram mais resultados para o Cliente. Porque, quando as equipes de decisão e aprovação são extensas e há demasiados intervenientes menos preparados nos processos, por norma, os resultados não são os mesmos. O conhecimento estratégico do CEO da Empresa, do MD, do dono ou do principal responsável sobre o marketing e a partilha dessa visão directamente com a Agência é crucial para se obterem os resultados pretendidos. Inspiração Uma Agência vive de inspiração. Por isso é muito importante o cliente saber e conseguir inspirar a Agência com quem trabalha. A comunicação e a publicidade são a arte da persuasão e da sedução. Isso transforma a Agência num fornecedor diferente. Estratégico. Um parceiro crucial.

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O principal papel da Agência é ajudar o cliente a atrair consumidores para a sua marca e fazer com que queiram consumir os seus produtos. Por isso, uma Agência é movida sobretudo por inspiração. Clientes que sabem o papel de inspirar a sua Agência têm melhores e maiores resultados. Quando isso não acontece, acontece o contrário. Clientes que tratam a sua Agência como um mero fornecedor não podem esperar o mesmo resultado. Mesmo que os líderes dos dois lados, Cliente e Agência, tenham uma boa relação. É fundamental que as equipas de ambos os lados, a todos os níveis hierárquicos, tenham uma boa energia na relação. Essa boa energia é o combustível principal que inspira os profissionais a fazerem o melhor trabalho. E isso, quando acontece, traduz-se em resultados intangíveis. Outro factor que leva qualquer cliente a ter melhores resultados é a confiança na Agência. Ou, por outras palavras, não tenha grandes expectativas após a sua equipa de marketing fazer 30 reverts por um simples post nas redes sociais. Isto desgasta e desmotiva qualquer pessoa. Ter confiança é saber dar espaço e liberdade às Agências para criar. Supervisionar os aspectos mais importantes da marca e do produto, mas não tentar fazer o trabalho da Agência. É preciso saber o momento certo de passar a estafeta. E não correr atrás do colega de equipa agarrado a ela. Isso só faz atrasar e perder a competição. Um bom cliente torna a sua Agência melhor. Ensina as suas equipas a não criarem. Mas sim a criar uma Agência melhor. Outro aspecto, que é consequência dos enumerados acima, é a amizade entre as pessoas das duas instituições. A expressão das melhores relações traduz-se numa amizade forte. E isto é válido e verdadeiro porque são seres humanos que convivem diariamente. Os melhores ‘cases’ de marketing www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2021


Ilustração de Maisa Chaves

acontecem quando há parceria, amizade e cumplicidade. E isto só cresce e se constrói ao longo do tempo. Não pode ser uma relação de cima para baixo. Tem de ser ao mesmo nível. E amizade é sinónimo de respeito. As melhores campanhas feitas foram para clientes que se tornaram verdadeiros amigos. E não apenas amizade entre o director-geral e a Direcção da Agência. Mas também ao nível das equipas e dos profissionais. Quando isto acontece deixa de haver Cliente e Agência. Há apenas colegas e bons amigos. Motivação. Este ponto leva a outro. A motivação. E motivar é um pilar da liderança. Os melhores líderes são servos das suas equipas. E a equipa da Agência é uma extensão da de marketing do Cliente. Não há Agências perfeitas nem Clientes perfeitos. No dia-a-dia, nesta profissão ofegante, podem acontecer erwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2021

ros. E quando acontecem é preciso saber apontar, mas com tacto. Assim como o contrário é mais importante ainda. Quando acontecem os bons trabalhos não se esquecer de saber elogiar. Porque isso cria motivação para fazer melhor. Trabalhar em marketing é uma profissão exaustiva. É normal ter de se trabalhar mais horas do que se imagina. Não é como na função pública. Mais um aspecto que não é comum ser levado em conta, é que um bom Cliente ajuda a sua Agência a crescer. Porque o ponto principal de contratar uma Agência é ter um parceiro que ajude a fazer crescer o seu negócio. E, por isso, é justo que a Agência possa participar desse crescimento. É importante também apostar em relações duradouras. Os melhores e maiores ‘cases’ do mundo no marketing são assim. Porque a aprendizagem e o conhecimento que se adquire ao longo do tempo são preciosos. E o tempo também é importante para se conseguir todos os aspectos descritos

acima. Confiança, boas relações, bons resultados. Partilhe os aspectos mais importantes da sua estratégia com a sua Agência. É preciso largar os dados para se poder jogar. “Tudo é ousado a quem nada se atreve”. Fernando Pessoa não era uma pessoa qualquer. Talvez por isso ele também, para quem não sabe, trabalhou numa Agência de Publicidade. E por isso a ousadia é outra importante característica dos melhores clientes. A coragem para conseguir ter campanhas que se destaquem chama a atenção para a sua marca. Por outro lado, fazer com que a sua Agência trabalhe com medo e inibições resulta em trabalho banal. Mais do mesmo. No fecho de contas, a conclusão é só uma se o objectivo são melhores resultados. O Cliente é muito importante para a Agência. Se não for assim e da melhor forma possível, como se diz numa expressão bem local moçambicana, “não há como”.

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ócio

(neg)ócio s.m. do latim negação do ócio

72 Uma visita à Salamanga, na província de Maputo

g

e 74 Ao sabor das delícias do Memories Gastrobar, no coração de Maputo

75 Os benefícios de cada uma das três variedades do “Gin Benefício”


Salamanga

Na Outra Margem TEMPLO HINDU

É PROIBIDO IR A SALAMANGA E NÃO CONHECER ESTE SANTUÁRIO

e

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o rio maputo corre na pressa de SALAMANGA ser baía. O castanho que nos deixa ver é a revelação da terra que leva dentro. O rio olha para baixo, como se ignorasse o azul, que tem extensão nos mares, sempre espelhos do céu. Há mais de cem anos, às margens do rio estava Kalidas, quase um homem, quase um Deus, um santo, o santo restante. Deixou-se ficar, pernas cruzadas, as mãos sobre o joelho, olhar contemplativo, meditativo. Contam-se milagres dessa aparição. Vestiu terras distantes do rio de água, para kulungwanas de adeus à seca. E depois foi a voz que fez nascer o templo. Esfumou-se envolto no mesmo manto de mistério da sua chegada, a caminhar sobre as águas, uma pluma ou Jesus. Pouco se soube do seu passado, como pouco se soube do seu futuro, apenas daquela eternidade breve. Hoje, dentro do templo, há um busto de um “homem barbudo” em posição

meditativa, Kalidas, o santo que fez nascer o templo de Salamanga, como a pedra sagrada fez nascer o templo da Ilha de Moçambique. O templo, o segundo em Moçambique (e pensa-se que também em África), começou a ser erguido em 1908 pelas mãos de Kalane Megdji, avô do escritor Calane da Silva (1945 -2021), quando Salamanga tinha apenas dezenas de indianos dedicados ao comércio nas cantinas que ainda hoje marcam a paisagem local. O chão tem a cor vermelho-terra, nas paredes estão incrustados pedaços de azulejos coloridos, como se reunissem toda a energia do mundo. E, no cimo, quatro pavões, o arco-íris de plumas, a ave do Deus Krishna, iluminação de consciência, transformadora do negativo em positivo, do sofrimento em beleza, do mal em bem, o milagre da vida. Chandracin Lala e a esposa Rachila Manilal estão no templo para um ritual que se repe-

do Rio te desde sempre. Antes das estradas e das pontes, quando um batelão à manivela os colocava, vindos da Catembe, na outra margem do rio Maputo. Fazem promessas ao futuro, pedem bênçãos aos deuses, às árvores, aos animais. “Deus está em tudo”, dizem-nos. Também por isso regam a árvore sagrada no pátio, que cresce numa verticalidade militar, como se quisesse levar os pedidos de benção aos ouvidos de Deus, sem mais atalhos. Dentro do templo, há um espaço de adoração a Ganesha, corpo de homem, cabeça de elefante. E a história desta metamorfose podia ser trágica, se não fosse sobre os milagres do arrependimento. Ei-la pela voz de Chandracin: “sem saber que se tratava do filho, o deus Shiva decepou a cabeça de Ganesha.

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Quando soube da mulher, Parvati, de quem se tratava, mandou-o trazer a cabeça do primeiro ser vivo que encontrasse pelo caminho para voltar a dar vida ao filho. Quis o destino que fosse um elefante. E o pai prometeu que, apesar da transfiguração, seria sempre adorado. Ganesha é sempre o primeiro a ser lembrado em todas as cerimónias do hinduísmo, simboliza inteligência”. E assim se institui o elefante no sagrado do hinduísmo. E a Reserva dos Elefantes não fica distante de Salamanga. E não é estranho que Salamanga seja também nome de uma povoação na Índia. Isto anda mesmo tudo ligado. Mas a história do nome desta Salamanga chega pela voz de Edmundo Santaca (n.1947). Tem uma rosa no casaco e uma bengala a apoiar-lhe os passos, o que sugere o ar aristocrático de um descendente da família real, Santaca, a que pertence. No original, conta, seria Sialamanga, que teria sido mandado para ser senhor daquelas terras pelo pai, o chefe tradicional Maputo, o mesmo que deu nome ao rio e à cidade. “Os portugueses, por não conseguirem dizer Sialamanga, chamaram Salamanga”, diz-nos, entre os gritos dos feirantes de rua na Vila. O cheiro do pão invade a rua. A padaria, que existe desde 1950, encontra-se nos fundos de um edifício de 1895 que já funcionou como escritório de transportes fluviais. Na padaria, sempre nas mãos da mesma família, não há fornos eléctricos ou a gás. É pão a lenha, as paredes engolem o trigo e devolvem o pão. “ A obrigação é manter o pão como está”, contam-nos Basílio Jaminadas e Maria Otília Jaminadas, o casal proprietário da padaria. São mil pães por dia, todos os dias. E sempre com a mesma fórmula: trigo, água e sal. E o peso para saciar a fome do mundo. Texto Elton Pila Fotografia Yassmin Forte www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

A Reserva dos Elefantes fica ali perto e constitui uma das atracções imperdíveis para quem gosta de manter contacto com a natureza no seu sentido mais puro ROTEIRO COMO IR Salamanga fica a 119 km da cidade de Maputo. Uma viagem de carro permite que aproveite a paisagem.

O QUE FAZER Ver o rio Maputo de perto. Com sorte, ainda emergem hipopótamos. Visitar o templo hindu e estar em contacto com uma outra energia. A Reserva dos Elefantes não fica distante, pode sempre visitar.

ONDE COMER Pode comer nas tascas da vila e ter experiência de conversas locais. Mas experimentar o pão de Salamanga é irremediável.

ONDE DORMIR A viagem de Maputo a Salamanga pode ser feita em poucas horas. Mas pode sempre dormir nos hotéis da Ponta de Ouro ou Ponta Malongane.

CUIDADOS A TER O rio não permite banhos. Esteja atento ao trânsito no meio do caminho, pois podem passar manadas de bois.

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MEMORIES GASTROBAR

Av. Kenneth Kaunda, 45 Maputo

g certamente que, muitos dos que passam, diariamente, pela Praça do Destacamento Feminino, bem no centro de Maputo, não se terão dado conta de um dos mais recentes espaços gastronómicos da capital. A novidade dá pelo de Memories Gastro Bar. A primeira surpresa que o cliente poderá experimentar quando ali vai pela primeira vez é a dimensão, quase majestática, do espaço, uma realidade aumentada por um dos principais temperos de uma refeição ao ar livre, uma vista larga sobre o recorte da Baía de Maputo. Parte da zona exterior é abraçada por uma portentosa árvore que, ao contrário do que seria de esperar de um espaço tão vasto, acaba por torná-lo acolhedor devido à presença de tão distinto elemento natural. Poder-se-ia suspeitar de algum incómodo provocado pelo ‘pesado’ tráfego circundan-

Um Lugar Para Saborear Novas te, mas, surpreendentemente, este passa quase desapercebido. O mérito é do espaço, que consome parte dos sentidos, direccionados pela música ambiente não excessivamente alta, que elimina os restantes vestígios da azáfama da rodovia ali mesmo ao lado. Mas há mais surpresas, e ainda nem chegámos ao prato principal. O atendimento é competente, com o cuidado de facilitar a experiência do cliente. Entrando na gastronomia, a ementa é diversificada e pouco comum na oferta existente em Maputo, no que respeita às opções disponíveis. Depois, o número de pratos colocados à disposição não é excessivo, o que não permite a mínima dispersão, garantindo, também, consistência. A elegância da decoração e os pequenos pormenores são

A elegância da decoração e os pequenos pormenores são elementos que também surpreendem pelo seu requinte ... este novo espaço foi pensado sem deixar nada ao acaso

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elementos que também surpreendem pelo seu requinte e bom gosto, pelo que ficamos com a sensação de que este novo espaço foi pensado sem deixar nada ao acaso. A carta de vinhos, essencialmente sul-africanos monocasta, faz inveja a qualquer restaurante de renome e no Memories não deixa também de surpreender. Esqueça o comum vinho da casa que encontra em qualquer restaurante. Aqui é-lhe facultada a opção de beber à taça algumas das 25 referências de vinhos disponíveis na carta. De entre as várias opções de entradas, uma boa escolha é o ceviche de peixe. Para quem aprecia o exercício da degustação pode encontrar os paladares subtis que tornam esta entrada tão distinta, no aroma fresco do funcho e no crocante do caviar entrelaçados, na medida certa. Relativamente aos pratos principais pode optar entre dez escolhas possíveis de carne e peixe, numa ementa em que pontificam as opções com base mediterrânica, mas onde os mariscos marcam lu-

Memórias

gar em vários dos pratos. Optámos pelo “Surf and Turf”, prato composto por uma suculenta lagosta previamente retirada da casca acompanhada de um naco de fillet grelhado no ponto, e igualmente suculento, e por um prato de borrego com puré de maçã. O degustar de um rodízio de sabores e apontamentos apaladados fazem-nos querer voltar para experimentar as restantes opções da ementa. Se pretende ficar a conhecer esta dica que lhe aqui lhe deixamos, principalmente se for fim-de-semana, aconselhamos a reservar mesa com antecedência, pois o que experienciámos é certamente um bom augúrio para uma grande afluência ao espaço. Com ambiente selecto e distinto, o Memories é isto mesmo – um espaço para ficar na memória de quem o visita e deixar a imensa vontade de regressar para apreciar o que há de bom da vida: excelente vista, boa comida e a companhia de amigos e família. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022


O gin português que ganhou três medalhas de prata na quinta edição do London Spirits Competition. Tem três receitas diferenciadas, três personalidades diferentes, mas a mesma base de destilação

Gin Benefício: o Amargo, Resinoso, o gin português de flor de cânhamo, de nome Benefício, ganhou três medalhas de prata na quinta edição do London Spirits Competition, nas três versões disponíveis: Herbal, Estival e Delicado. Os fundadores da marca, Paulo Fernandes e Ricardo Nunes, referem que Benefício é a marca de gin português que resulta de um laboratório de inovação com modelo de produção limitada, em que os produtos são fruto de um processo de fabrico que utiliza métodos artesanais e sustentáveis. A escolha da flor do cânhamo como botânico protagonista da variedade de gins prendeu-se com o facto de ser “uma planta curiosa e com sabores muito herbáceos”, para tanto, sabendo de antemão que “a base do gin é amarga, resinosa, ligeiramente adstringente” e, dado “o carácter herbáceo do cânhamo”, seria necessário “compensar com frescura e doçura” e “dar alguma complexidade ao gin para que os apreciadores e conhecedores tivessem motivo de conversa e desafios na sua degustação”, consideram os fundadores. E acrescentam que todos os botânicos usados na produção do gin Benefício são produtos agrícolas e naturais. “Fazemos questão de não usar qualquer tipo de essências, aditivos, corantes e conservantes nos mesmos”. Benefício possui três variações - Herbal, Estival e Delicado – que nascem de três receitas diferenciadas, com personalidades diferentes, mas a mesma base de destilação. Esta resulta, como não poderia deixar de ser, no zimbro, para além de uma infusão de dez botânicos, entre os quais a erva príncipe, cardamomo e gengibre. O destilado assenta num álcool neutro de base cereal de acordo com o método London Dry, em que o álcool base de origem agrícola a 96% possui teor de metanol inferior a 5gr./hl. e água pura por filtração de osmose inversa para a diluição, tanto do álcool neutro para maceração, como para o acerto do grau final dos gins. Descobrimos que na referência Herbal residem os seguintes elementos: lima, que constitui o elemento principal da frescura, e erva príncipe, que aporta equilíbrio ao toque herbáceo do cânhamo. Já o cardamomo, “clássico dos gins britânicos”, é usado “para apelar à memória dos consumidores” e informar “o cérebro que estão a beber gin” e, em simultâneo, oferecer “mais uma pitada de frescura”. O gengibre confere “um toque de picante com um travo cítrico e leve e acrescenta complexidade, pois confunde-se com a sensação picante do álcool”. Notam ainda que “o “picante do gengibre se sente no fundo da boca, ao invés do álcool, que invade a boca toda”. Por sua vez, a pimenta da Jamaica e o chá preto “actuam em conjunwww.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

e Ligeiramente Adstringente

Derivado da Flor do Cânhamo! to,” mas “passam despercebidos à maioria dos palatos”. “Identificam-se nas notas mais quentes do gin e o grande segredo é a sua capacidade de aglutinar os sabores todos e fazê-los perdurar no tempo”. Já no caso do Estival, para além dos botânicos e outros elementos referidos, acrescentam-se o basílico e o rosmaninho que, juntamente com a erva príncipe, “complementam o cânhamo e o gin da base com um bouquet mediterrânico, herbáceo e floral”. Finalmente, o Delicado é construído com base em laranja doce, que “atenua a adstringência da base do gin e dos herbáceos, dando um carácter mais suave”, bem como o chá verde, “usado para complementar o cânhamo e equilibrar a doçura da laranja”. Para além do chá preto, o gengibre aporta “um toque de picante com travo cítrico e leve”, sendo que este elemento, na referência Delicado, não é tão intenso como no Herbal. O gin Benefício ganhou reconhecimento através da obtenção das medalhas de prata na London Spirits Competition, numa altura em que está a apostar no crescimento orgânico em Portugal, mas não esquecendo o processo de internacionalização para vários mercados.

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“ÊXODO”

A exposição está patente na Galeria da Fundação Fernando Leite Couto até 03 de Setembro do corrente ano

“Êxodo”: Uma Migração as cores alegres contrastam com os semblantes preo-

cupados das “gentes” representadas nas telas. Transmitem a alegria que há muito se foi, ao mesmo que carregam a preocupação e incerteza do futuro de Cabo Delgado. A Fundação Fernando Leite Couto inaugurou, recentemente, a individual de pintura intitulada “Êxodo” da autoria de Álvaro Ferrinho, ou, simplesmente, Vito Ferrinho, como é conhecido no meio artístico. Recorrendo ao acrílico sobre tela, Vito Ferrinho retrata, em 18 obras de cores vibrantes, o quotidiano da população de Cabo Delgado, quer nas suas rotinas de trabalho, quer nos seus movimentos de “partida” e “chegada” em busca de um local mais seguro para se acomodar. O título da exposição representa esses deslocamentos tanto de ida quanto de regresso da população. O brilho das telas convida-nos a sair de dentro de nós mesmos rumo ao conhecimento do outro, que, num silêncio gritante, clama por ajuda. A ideia da exposição conta com o engajamento da Associação Acácia, que quis ampliar a voz das populações deslocadas no norte do País. www.economiaemercado.co.mz | Agosto 2022

Artística em Direcção

“A Associação Acácia, ao sentir a dor da população deslocada de Pemba, procurou instituições que pudessem ajudar-nos. Deste modo, contactámos a Associação Pantera e, através dela, conseguimos sensibilizar a voz de um artista moçambicano que está fora de Moçambique, oriundo do norte do País. Vito Ferrinho transformou a dor das populações nestas obras de arte”, explicou Carlos Macuo, da Associação Acácia. Nascido em Pemba, em 1962, e radicado há duas décadas em Estocolmo, na Suécia, Vito Ferrinho sente, do outro lado do mundo, as dores de Cabo Delgado. Embora ausente no momento da inauguração da exposição, o artista mostrou, nas notas introdutórias escritas que acompanham a exposição, a sua alegria e satisfação de fazer parte desta iniciativa. “Quando fui convidado para este projecto, imediatamente percebi que ele já estava em mim. Todas as imagens, dores e a tentativa de encontrar na variação das cores algo que fosse visto como o reflexo da

à Solidariedade força e beleza do povo de Cabo Delgado saíram da minha alma para as telas. Esta foi a maneira que encontrei de homenagear a grandeza dessa gente sofrida”, descreve Vito Ferrinho. O valor das obras será canalizado para o Instituto Nacional de Gestão de Risco de Desastres (INGD), para apoiar as vítimas de terrorismo em Cabo Delgado. Para a Fundação Fernando Leite Couto, a parceria com a Associação Acácia serviu para unir a arte ao sentido de responsabilidade social e, por isso, é bastante oportuna. “Para nós foi uma boa escolha da parte da Associação Acácia propor-nos esta parceria de celebrar a arte e, ao mesmo tempo, gerar renda com a finalidade de apoiar as gentes de Cabo Delgado em função dos deslocamentos que têm acontecido”, afirmou Sara Jona Laisse, directora-executiva da Fundação.

O título da exposição “Êxodo” representa os deslocamentos tanto de ida quanto de regresso da população de Cabo Delgado em busca de um lugar seguro para viver. O valor das obras irá apoiar as vítimas de terrorismo

TEXTO Yana de Almeida FOTOGRAFIA Mariano Silva

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HÍBRIDO D28 FORMENTOR

Navegar em Modo 100% Eléctrico A MARCA ESPANHOLA DE CARROS “CUPRA” investiu na sustentabili-

Potência máxima: 400cv Velocidade de cruzeiro: 25 nós Tanque de combustível: 420l Passageiros: Dez

v

dade, aliando-se à empresa De Antonio Yachts, que produz iates de alta performance. Isto acontece pela segunda vez depois da colaboração no D28 Formentor, para a criação do seu primeiro barco electrificado, o D28 Formentor e-hybrid, considerado com sendo de alta performance, inspirado no primeiro modelo desenhado e desenvolvido para a marca, o Cupra Formentor. A versão híbrida do Formentor D28, que será apresentada oficialmente no início de 2023, conta com um motor capaz de debitar 400 cavalos (cv) de potência e dois propulsores eléctricos de 15kW, que permitem à embarcação navegar em modo de combustão ou em modo totalmente eléctrico.

com o Híbrido D28 Formentor Possui um banco de até seis baterias, que lhe dá um alcance, em modo eléctrico, de, até, 12 milhas, com cerca de duas horas de navegação a uma velocidade de cruzeiro de seis nós e uma velocidade máxima de oito nós. “Adoramos trazer a nossa performance para outros territórios. De Antonio é o parceiro perfeito para ser o desafiante não convencional num ambiente completamente diferente no mar. Agora, estamos a dar mais um passo com uma versão híbrida do D28 Formentor “, sublinhou Antonino Labate, director global de Estratégia, Desenvolvimento de Negócios e Operações da Cupra. A combinação de motores eléctricos e o motor de

popa central permite ao usuário realizar uma navegação livre de emissões em áreas próximas à costa, entradas e saídas de portos, bem de como áreas sensíveis e protegidas, sem abrir mão, ao mesmo tempo, do desempenho desportivo e segurança proporcionada pelo motor de popa a gasolina de 400cv para navegação em mar aberto, condições adversas e longas distâncias, e um alcance combinado de quase 200 milhas. Além da electrificação, a nova embarcação resultante da parceria com a De Antonio tem também um design muito moderno, uma cor retirada da paleta da Cupra, o cinzento grafeno, a condizer com estofos no mesmo tom e deck em teca sintética.

A combinação de motores eléctricos e motor de popa central permite realizar uma navegação livre de emissões em áreas próximas à costa, entradas e saídas dos portos

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