MERGULHO DIÁRIO
Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação da UFJF • Juiz de Fora, 16 de Março de 2017 • Edição 06
manifestações
CONTRA A REFORMA mobiliza trabalhadores pelo futuro
Foto: Leandro Barbosa
DA PREVIDÊNCIA
Maior manifestação desde as diretas mobiliza cerca de 15 mil pessoas em Juiz de Fora 1
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Juiz de Fora, 16 de Março de 2017
EDITORIAL
EXPEDIENTE
DE COSTAS PARA AS RUAS Quando o ‘grande jornalismo’ não faz mais sentido Quarta-feira, 15 de março de 2017 Vinte e três estados e o Distrito Federal acordaram diante de um dos maiores protestos populares dos últimos anos. Professores, rodoviários, servidores públicos, bancários, metalúrgicos, operários e outros trabalhadores foram às ruas do país com um só objetivo: lutar para garantir condições razoáveis de emprego e defender o direito a uma velhice digna estabelecida pela Constituição Federal de 1988. Alheia à magnitude do fato, a grande imprensa preferiu ignorar as vozes das ruas, dissonantes do seu discurso, e se manteve envolta no seu vaidoso tradicionalismo. Na edição daquele dia do Bom Dia Brasil, da TV Globo, enquanto as ruas começavam a dizer não às reformas trabalhista e previdenciária, Chico Pinheiro dava pulinhos no final do principal telejornal das manhãs da Globo, em comemoração ao dia de São Longuinho. Conhecido pelo jeito irreverente e descontraído, o showman escrachou que o ‘grande jornalismo’ já não faz mais sentido. Tendo em vista a penetração da TV no país (dados de 2013 do
IBGE dão conta de que 96% da população têm acesso a televisão aberta), há que se considerar que a maioria dos brasileiros se informa através desse serviço. Nesse sentido, caberia então ao telejornalismo o papel de informar a grande massa. No entanto, a repercussão nesse meio ficou restrita a entradas curtas ao longo da programação, encontrando mais espaço apenas nos principais telejornais noturnos, o que não significou um enquadramento próximo à realidade das ruas. Restou ao público acompanhar a movimentação pelas redes sociais. Os grupos independentes e a mídia alternativa mostraram de perto os protestos em tempo real. Ciente do seu poderio e hegemonia na comunicação, a grande mídia ignorou os anseios do trabalhador e solidificou o discurso de Temer, aposentado aos 55 anos. Privilegiou-se a parte prejudicada em detrimento da legitimidade do movimento que luta pela aposentaria antes dos 70. O ‘grande jornalismo’ virou as costas para aquilo que divulga como seu principal diferencial: o compromisso com a verdade.
Jornal Laboratório da Faculdade de Jornalismo da Universidade Federal de Juiz de Fora, produzido pelos alunos da disciplina de Técnica de Produção em Jornalismo Impresso Reitor Profº Dr. Marcus David Vice-Reitora Profª Drª Girlene Alves da Silva Diretor da Faculdade de Comunicação Social Prof. Drº Jorge Carlos Felz Ferreira Vice-Diretora Profª. Drª. Marise Pimentel Mendes Coordenadora do Curso de Jornalismo Integral Profª Drª Cláudia de Albuquerque Thomé Chefe do Departamento de Métodos Aplicados e Técnicas Laboratoriais Profª. Drª. Maria Cristina B. de Faria Professoras Orientadoras Profª. Drª. Janaina de Oliveira Nunes Profª. Ms. Marise Baesso Tristão Repórteres Bárbara Guimarães; Cristiane Turnes; Gabriel Ferreira; Júlia Lima; Mateus Bosse; Leandro Barbosa; Lia Rezende; Luis Felipe Cardoso; Thais Mariquito; Vitória Gonçalves Edição e Diagramação Armando Júnior Enrico Monteiro Letícya Bernadete Projeto Gráfico Vitória Gonçalves Contato mergulhodiario@gmail.com facebook.com/mergulhodiario (32) 2102-3612
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CIDADE
Paralisação altera rotina na área central de Juiz de Fora Durante o dia de protestos, trabalhadores se mobilizam contra a reforma da Previdência
Luan Pedretti
Luis Felipe Cardoso
Por Nayara Carvalho e Luis Felipe Cardoso
Nesta quarta-feira, 15 de março, trabalhadores de instituições privadas e públicas pararam suas atividades e foram às ruas protestar contra a PEC 287. A Prefeitura Segundo a assessora de Comunicação da Prefeitura de Juiz de Fora, Telma Elisa de Souza, os serviços prestados à população ocorreram normalmente. Já os Centros de Referência à Assistência Social (Cras) e as creches municipais funcionaram parcialmente. Os setores do Centro de Vigilância também mantiveram somente parte dos seus serviços. Nos demais setores, a rotina de trabalho não foi afetada. Na Secretaria de Educação, 71% dos profissionais aderiram ao movimento. O transporte coletivo Apesar de o Sindicato dos Trabalhadores em Transpote Rodoviário terem afirmado que motoristas e cobradores de ônibus nao iriam aderir à greve, já que estavam com negociação salarial em andamento, muitos ônibus sentiram as consequências do
movimento. Como os manifestantes tomaram as ruas, o trânsito foi afetado gerando engarrafamento e atraso do horário dos coletivos. O momento mais conturbado se de no final da manhã e início da tarde - quando a passeata saiu da Avenida Francisco Bernardino rumo à Rio Branco. O tráfego na Marechal Deodoro precisou ser controlado por agentes de trânsito, mas ainda assim o fluxo seguia lento. Filas de ônibus se formaram, e o trânsito ficou totalmente paralisado nas vias do entorno. Consequências disso também foram sentidas por pessoas que precisavam voltar do almoço para o serviço, escola ou faculdade. “Hoje eu tenho curso na Universo, tinha que estar lá às 13h, estou há uma hora e meia no ponto e não passou nenhum ônibus ainda, não passa nenhum ônibus para o centro”, conta a estudante Sueny dos Anjos, 17 anos. Outra que sofreu com o atraso do transporte coletivo foi Giovana de Souza, 17, que precisava se deslocar do Bairro Jardim Esperança até o seu
serviço, na Sociedade Nacional Apoio Rodoviário Turístico (Sinart), que fica na Avenida Brasil. Porém, ela estava no ponto há mais de uma hora e se atrasou. Os Correios Segundo nota publicada pelos profissionais dos Correios, eles aderiram à greve porque, se as reformas propostas pelo Governo federal forem aprovadas, irá piorar a situação dos (as) trabalhadores (as) dos Correios e de todo o Brasil. Se a Reforma Previdenciária for aprovada, o tempo de contribuição para aposentadoria será de 49 anos, e, atualmente, são 35 anos para os homens, e 30 para as mulheres. Os Bancos Os bancos públicos aderiram à greve contra a PEC 287, porém alguns bancos privados funcionaram. De acordo com Watoira Antônio de Oliveira, presidente do Sindicato dos Bancários, mais importante do que trabalhar era ir para o ato naquele dia. Segundo ele, “não foi uma greve só de bancários, foi uma greve da classe trabalhadora. Deixamos claro isso nas assembleias, isso afeta toda a classe trabalhadora. O sindicato e os trabalhadores que não forem pra luta, vão pagar caro”. Watoira explica que o principal motivo para a adesão ao movimento foi que, se a PEC for aprovada, o trabalhador “só poderá se aposentar quando morrer. Você não consegue trabalhar direto no Brasil, o trabalho informal é enorme. E eles resolvem ‘plantar’ essa de aposentadoria com 65 anos, isso é um golpe na classe trabalhadora”. 3
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CIDADE
Sem destaque na grande mídia, manifestações têm apoio nas redes
Páginas do Twitter e do Facebook mantinham seus seguidores atualizados com fotos e vídeos de todo o país
Por Elias Arruda e Thaís Mariquito
Jornalistas Livres / Twitter
Desde as manifestações de 2013, quando o povo foi às ruas pedir por uma reforma política no Brasil, as redes sociais e a internet vêm sendo fundamentais no processo de organização dos protestos e de divulgação de informações em tempo real sobre o que está acontecendo. Segundo o cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, “desde que as redes sociais se instauraram no mundo como forma de comunicação, elas têm grande impacto em manifestações como a Primavera Árabe e o Ocupe Wall Street. Elas aumentam a possibiEm seus perfis no Twitter e Facebook, o lidade de pessoas desconhecidas blog Jornalistas Livres pedia a seus seguiconseguirem se comunicar e se dores que colaborassem com o conteúdo unir com um objetivo comum”. sobre os protestos em todo o Brasil
Mídia independente Na contramão de mídias tradicionais, como emissoras de TV, jornais e revistas, que, muitas vezes, insistem em menosprezar determinados movimentos e aumentar a proporção de outros, perfis na rede compartilham vídeos, fotos e manifestos que expõem a realidade das manifestações e seus objetivos. Além disso, páginas e blogs foram criados com o mesmo propósito e rapidamente ganharam seguidores e credibilidade. Aos poucos, se destacaram também por compartilhar notícias que, geralmente, passariam despercebidas pela imprensa, descobrindo uma nova forma de se fazer jornalismo independente. Para as manifestações desta última 4
quarta-feira, 15, muitos sindicatos por todo o país convocaram seus membros através de reuniões e assembleias, como há muito tempo não acontecia. Para Paulo Roberto, “os sindicatos foram fundamentais para a divulgação das manifestações, mas as redes sociais também foram importantíssimas justamente por falar com aqueles que não são sindicalizados”. Páginas como MídiaNINJA e Jornalistas Livres fizeram uma divulgação incessante através de seus perfis no Twitter, Facebook e em seus blogs. Além disso, durante os protestos, mantinham seus seguidores informados da situação em todo o Brasil, com postagens
frequentes, ilustradas com vídeos e fotos enviados, na maioria das vezes, por seus seguidores. Redes sociais Além dessas páginas, milhares de pessoas se mobilizaram através das redes sociais durante as movimentações desta quarta-feira, 15. Uma ferramenta do Google, conhecida como “Google Trends”, mostra que assuntos como impeachment, reforma da previdência, delação Odebrecht e aposentadoria foram assuntos que ganharam força no Brasil nos últimos meses e repercutiram durante as manifestações. Em 2013, apenas 6% das pessoas se interessavam por esses assuntos, de acordo com o Google. Já em 2016, o número de procuras aumentou mais de 100%. Os estados onde mais houve procura foram o Distrito Federal, Amapá, Piauí e Ceará. No Facebook, as manifestações aconteceram através de charges e memes. Em sua maioria, as críticas eram cômicas e abordavam o assunto de forma criativa. Na platatorma Twitter, os usuários se organizaram através de hashtags, meio usado para encontrar posts relacionados a um mesmo assunto. As que mais se destacaram foram #totalmentecontra, #GreveGeral e #QueroMeAposentar. Em muitos momentos, os temas foram os mais comentados da plataforma, ficando em primeiro lugar em nível nacional e mundial.
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CIDADE
QUEM FOI PRA RUA? Manifestantes presentes no Ato Contra a Reforma falam sobre os pontos que mais desagradam FOTOS: VITÓRIA GONÇALVES
Por Lia Rezende e Vitória Gonçalves
As sindicalistas, Saionara e Ana
As secundaristas, Larissa e Iara
Perda. Insegurança. Fora Temer. Frustração. Revolta, revolta, revolta e mais revolta. Quando perguntamos aos presentes no Ato Contra a Reforma da Previdência, “revoltar-se” foi, certamente, o verbo que mais se ouviu entre eles. A paralisação favoreceu a diversidade no protesto marcado para quarta-feira, 15, às 9h na Praça da Estação. Com bancos, Correios, escolas e creches fechados, milhares de aposentados, trabalhadores e estudantes puderam comparecer à manifestação. Em um grupo tão heterogêneo, o principal grito era um só: NÃO À REFORMA DA PREVIDÊNCIA. Roberta, professora da rede municipal, vê a manobra como a ponta do iceberg. “Vem coisa pior por aí: a reforma trabalhista”, diz. Dentre as medidas previstas no projeto, o ponto que mais incomoda a pedagoga são os 49 anos de contribuição
“
O universitário, Arthur
As secundaristas, Caroline e Brenda
necessários para conquistar o direito da aposentadoria integral. Armando também destaca esse mesmo item como o que mais o desagrada. O marceneiro de 49 anos é graduando em Pedagogia na UFJF e acredita que “a expectativa de vida do brasileiro não é homogênea. O Brasil é um país desigual, e parte dos brasileiros não tem uma expectativa de vida tão alta quanto a média”. Geralda, por sua vez, presidenta da Cooperativa de Portadores de Deficiência (COOPDEF) e militante há mais de 20 anos, ressalta o quão prejudicial a reforma é para as mulheres. “Nossa jornada é tripla: trabalhamos fora, em casa e na luta pelo nosso lugar na sociedade. Anos de luta se perdem em poucos minutos”, afirma. Juliana, administradora de cooperativas e mestre em Serviço Social, lembra ainda que “é uma falácia dizer que a Previdência
“ ”
Entendemos que a reforma traz prejuízos ao trabalhador. O sentimento é de insegurança política total. Os direitos serão todos cortados. Estão rasgando a Constituição para depois reformar a CLT. – Saionara
O aposentado, Walter
está em déficit. Mais uma vez, a conta passa para o trabalhador, e os bancos são os verdadeiros ganhadores da reforma: com 49 anos de contribuição, o trabalhador fica acuado e recorre às previdências privadas”. Os estudantes, secundaristas ou universitários também se fizeram presentes. Arthur, acadêmico de Direito, acredita que o pior não é a reforma em si, mas sim usá-la como um meio de combate à crise fiscal que existe no país. “Enquanto não discutirmos a reforma tributária, a reforma política e a auditoria da dívida, disparado o maior gasto do país, e enquanto não falarmos da cobrança da dívida da União, não podemos discutir a reforma da previdência da maneira como ela está sendo feita. Hoje a Previdência é superavitária, e a grande maioria das pessoas ganha menos de dois salários mínimos. É menos de 40% da renda da Previdência”, conclui.
O que mais desagrada é a falta de respeito do governo com a população. Estão desmerecendo o nosso voto e desrepeitando principalmente os estudantes. Não vamos ter oportunidade de emprego. – Brenda
” 5
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POLÍTICA
MULTIDÃO TOMA AS RUAS EM PROTESTO
FOTO:MATEUS BOSSE
Número oficial não foi divulgado, mas estimativa varia entre 15 mil e 30 mil pessoas no
Após concentração na Praça da Estação, manifestantes se dirigiram para frente da Câmara dos Vereadores Milhares de pessoas saíram às ruas de Juiz de Fora, nesta quartafeira (15), para protestar contra o projeto de lei do Governo federal que prevê mudanças na Previdência Social. Os manifestantes se concentraram na Praça da Estação, no Centro, a partir das 9h, e depois seguiram pelas ruas centrais até chegar à frente da Câmara Municipal. O protesto durou cerca de cinco horas, encerrando-se por volta das 14h, na Praça Antônio Carlos. Apesar de o número de participantes não ter sido divulgado oficialmente, variando entre 15 mil e 30 mil de acordo com as estimativas dos organizadores, esta manifestação está sendo considerada a maior da 6
cidade desde as Diretas Já. A Polícia Militar não fez nenhum balanço do número de presentes no ato. Novo protesto está sendo convocado para o próximo dia 20, com concentração no Parque Halfeld, em frente ao Palácio Barbosa Lima Sobrinho. Dentre os oradores que se pronunciaram durante a trajetória, a maioria ressaltou o caráter apartidário do movimento e lembrou que as medidas propostas pelo governo de Michel Temer colocam em risco direitos de toda a população. Uma das categorias mais presentes no ato era a dos professores de escolas públicas e particulares. A maioria dos colégios do município não teve aulas, liberando os educadores para
participar do protesto. No entanto, um dos representantes do Sindicato dos Professores (Sinpro) criticou o fato de um colégio particular do Centro ter coagido os docentes, na tentativa de impedi-los de comparecer à paralisação.
PASSEATA
Após a concentração, os manifestantes saíram pelas ruas por volta das 10h40. Eles se deslocaram da Praça da Estação até o Parque Halfeld, passando pela Avenida Francisco Bernardino, e tomaram a Avenida Rio Branco, chegando à Camara dos Vereadores. No caminho, gritavam palavras de ordem, como “Fora Temer”, “Nenhum di-
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O CONTRA A REFORMA DA PREVIDÊNCIA
o ato, que durou mais de cinco horas. Diversos setores da sociedade cruzaram os braços Por Bárbara Guimarães e Mateus Bosse
reito a menos” e convocavam a população que assistia para participar do movimento. Os participantes ficaram cerca de uma hora e meia no Parque Halfeld e, por volta das 14h, desceram o Calçadão da Halfeld em direção à Avenida Getúlio Vargas. A passeata seguiu até a frente do Centro Cultural Bernardo Mascarenhas e depois se dissipou.
durante parte do dia, assim como bancos, escolas e postos de saúde. A reivindicação de todos os setores pelo Brasil foi por conta do projeto de Lei proposto pelo governo Temer, que determina uma mudança na Previdência. Caso a reforma seja aprovada, os trabalhadores terão como idade mínima para se aposentar 65 anos e o tempo de contribuição mínima passaria a ser de 49 anos. A justificativa do goverREFORMA no é que existe um rombo nos cofres O ato na cidade se somou a outras públicos e, caso a mudança não seja manifestações em todo o país. Nas aprovada, milhares de brasileiros grandes capitais, como Belo Hori- podem perder o direito de se apozonte, Salvador, Curitiba, São Pau- sentar. Analistas debatem a questão lo e Rio de Janeiro, serviços como e, segundo a Ordem dos Advogados transporte público ficaram parados do Brasil (OAB) Nacional, não há
nenhum déficit na Previdência.
PRÓXIMO ENCONTRO
Durante o ato de ontem em Juiz de Fora, ficou decidido que os manifestantes vão manter a agenda de paralisações. Na próxima segunda-feira (20), às 15h, um novo encontro está marcado, dessa vez em frente à Câmara dos Vereadores. A ideia é reunir o maior número possível de pessoas para pressionar os dois deputados juizforanos, Margarida Salomão (PT), Marcus Pestana (PSDB) e Júlio Delgado (PSB), enquanto uma audiência pública na Câmara dos Deputados, em Brasília, discute a reforma da previdência. 7
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POLÍTICA
ESPECIALISTAS TÊM OPINIÕES DIVERGENTES SOBRE PROPOSTA Por Cristiane Turnes, Júlia Lima e Marina Urbieta Para analisar as mudanças propostas pelo Governo federal em relação à Previdência, o Mergulho Diário ouviu especialistas que falam sobre os prós e os contras da PEC 287, que está em tramitação no Congresso Nacional, em Brasília. Enquanto o Governo sustenta seus argumentos no envelhecimento da população e no aumento da expectativa de vida, o cientista político e professor da UFJF Paulo Roberto Figueira Leal critica este posicionamento e pondera que é preciso considerar o fato de que há segmentos em diferentes posições sociais. “Claramente, é uma reforma lesiva ao interesse dos trabalhadores, sobretudo das camadas mais pobres, que terão dificuldade em se aposentar. Isso contribui para a desigualdade social.” Sobre a alegação de rombo na Previdência, o professor considera haver um “superdimensionamento, uma falácia numérica, que não leva em conta outras partes”. Ele aponta que mecanismos, como a Desvinculação das Receitas da União (DRU), têm mais responsabilidade no rombo financeiro do que a Previdência. No caminho do atual momento político, Leal fala sobre os possíveis interesses envolvidos. “É uma reforma sob encomenda do mercado de previdência privada e do mercado financeiro. Há uma transferência de recursos do trabalhador para o sistema. A proposta supõe a necessidade de 49 anos de contribuição para aposentadoria integral, isso não existe em nenhum outro lugar do mundo, é um retrocesso em direitos”, conclui. Para o professor da Faculdade de Economia e membro da Conjuntura 8
e Mercados Consultoria Jr. da UFJF, Wilson Luiz Rotatori, a reforma é “inevitável”. Ele aponta que questões como a DRU não têm vínculo tão direto com a problemática. “Não podemos pensar em outras fatias orçamentárias. Só podemos considerar o dinheiro que entra por meio de arrecadação das pessoas que trabalham. As pessoas que estão trabalhando pagam a aposentadoria de quem não está. Se há redução no número de quem trabalha, que é o que está acontecendo na atual crise, há diminuição na capacidade da Previdência. É preciso uma solução de continuidade e, com essa reforma, é possível que isso ocorra”, pontua. Com as alterações, o benefício passaria a ser calculado com base em
51% de 80% das melhores contribuições mais um ponto percentual a cada ano pago. Rotatori entende que a fórmula “força a pessoa a trabalhar mais e funciona como um incentivo econômico”. Ele considera que, a partir da necessidade de contribuir 49 anos para obter integralidade da aposentadoria, “a tendência é de que a população se aposente antes e com menos. Portanto é preciso haver esse incentivo para que ela se aposente o mais tarde possível”. Outra mudança diz respeito à pensão por morte, que é integral, mas deve ser reduzida para 50%, mais 10% por dependente. “Essa medida é vantajosa para o sistema previdenciário. Para a economia, reduz-se a possibilidade de consumo da família”, observa Rotatori.
“É uma reforma lesiva ao interesse dos trabalhadores, sobretudo das camadas mais pobres, que terão dificuldade em se aposentar.”
“Essa medida é vantajosa para o sistema previdenciário. Para a economia, reduz-se a possibilidade de consumo da família”
Paulo Roberto Figueira
Wilson Rotatori
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Direitos sociais devem ser afetados por mudanças O professor de Direito da UFJF Fernando Guilhon explica que uma emenda na Constituição precisa passar pelo Senado e pela Câmara dos Deputados para ser aprovada. Depois, ela segue para ser promulgada pelo presidente da República, que realmente faz com que a lei entre em vigor. Durante essa tramitação, é possível que o projeto original, ou seja, o texto que contém as propostas da reforma que foi aprovado para discussão na Câmara sofra alterações. No momento, a lei está em discussão na Câmara, e os parlamentares podem apresentar emendas (pequenas alterações no projeto de lei) que serão votados para se-
rem adicionadas ou não. Para Guilhon, é indiscutível a necessidade de se fazer uma reforma, e a sociedade deve compreender essa carência: “Mas tem todo direito de se manifestar ao acreditar que falta transparência no processo”. Já o advogado Previdenciarista e também vereador da cidade de Bicas Rafael Aquino também acredita que é preciso ser feita uma reforma, porém discorda de algumas propostas da emenda que considera muito radicais: “O problema é que a reforma como está para ser votada seria um retrocesso em alguns direitos sociais que foram tão difíceis de conquistar. [...] A forma como ela vai afetar trabalhadores
rurais por exemplo, é uma mudança muito drástica.” Rafael ainda comenta que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) está trabalhando efetivamente no processo com envio de emendas a fim de amenizar algumas dessas propostas, como o tempo mínimo de contribuição para obter a aposentadoria integral e a idade mínima entre homens e mulheres serem iguais. Para ele, a tramitação na Câmara não será rápida e algumas das emendas serão aprovadas, mesmo que o governo esteja evitando ao máximo mudanças no projeto: “Não acredito que será aprovado como está em seu texto original”.
Representação de vários sindicatos nas ruas Foto: LEO BARBOSA
Sem uma frente única à frente dos protestos contra a reforma proposta pelo governo de Michel Temer, vários sindicatos começaram a se organizar em Juiz de Fora desde o dia 8 de março depois da assembleia que deliberou a paralisação da última quarta-feira. Entre os sindicatos que tiveram representação na manifestação da cidade estavam o dos Metalúrgicos(Sinmet), dos Professores (Sinpro), dos Trabalhadores em Educação do Estado (Sind-UTE), dos Trabalhadores de Transporte Coletivo (Sinttro), dos Trabalhadores em Telecomunicações (Sinttel), dos Servidores Públicos Municipais (Sinserpu) e dos Engenheiros, dos Auditores Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais (Sindifisco-MG), dos Bancários e dos professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (Apes), além de representantes da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Também estiveram presentes coletivos feministas, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), de catadores de papel, de partidos políticos
Flávio Vitarello foi um dos representantes do Sinpro na manifestação e dos agentes penitenciários. Ainda se juntaram ao protesto aposentados e funcionários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Alunos e professores de escolas de Lima Duarte e de Cataguases vieram à Juiz de Fora para o ato e a passeata. Os professores da rede particular e municipal produziram vídeos explicativos sobre a reforma chamando os trabalhadores para o movimento. Além disso, visitaram escolas e conversaram com os diretores das instituições. “Nós esperamos uma adesão muito forte para que possamos barrar a reforma da Previdência”,
afirmou Cléa Moreira, do Sindicato dos Professores (Sinpro). A reivindicação é geral, e, segundo a Confederação Nacional do Trabalhadores em Educação (CNTE), a adesão esperada era de mil professores nas ruas Em relação à educação estadual, a responsável pelo Departamento de Comunicação do Sindicato Único de Trabalhadores em Educação (Sind -UTE), Yara Aquino, afirma que ainda existem muitos assuntos pendentes com o Governo do Estado, “como o reajuste de 7.6% que não foi dado, e o corte de R$ 144 milhões de verba para as escolas.” 9
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movimento é estendido e tempo de greve indeterminado
Docentes e discentes se mobilizam contra a reforma da Previdência FOTO:ANNA CAROLINA CAVALCANTE
Por Anna Carolina Cavalcante e Gabriel Ferreira
Entre os milhares de manifestantes, havia centenas de docentes das redes públicas e particular “Essa foi uma das maiores assembleias dos últimos cinco anos da rede estadual de Juiz de Fora. Há alguns anos, a gente não vê isso. Por esse número, nós estamos com a maioria, mas tem uma diferença: a rede estadual, a partir de hoje, está em greve; a municipal está paralisada e vai decidir ainda pela greve em assembleia”. Lenine Reis, professor da Escola Estadual Coronel Antônio Alves Teixeira, contou que o auditório do Instituto Estadual de Educação (Colégio Normal) estava lotado em assembleia realizada pelo Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE) de Juiz de Fora na manhã de ontem. Às 10
9h46, Reis, em meio a professores da rede estadual, trabalhadores da Cemig e dos Correios, deslocava-se da Avenida Itamar Franco em direção à Praça da Estação. No local, os educadores do estado se uniram aos docentes da rede municipal e da rede particular de Juiz de Fora, que já se aglomeravam em torno do caminhão de som utilizado por membros sindicais e representantes de movimentos sociais e coletivos no ato. Afastada da multidão, a diretora do Sind-UTE e professora aposentada Victória Melo aguardava seu momento de fala. Victória explicou o movimento: “Hoje nós estamos iniciando
uma greve da rede estadual de comunicação. Na verdade, essa greve não é só dos educadores de Minas, mas sim dos educadores de todo o país. É uma greve nacional da Educação pra gente derrubar esse projeto de reforma da Previdência, que vai fazer com que os trabalhadores e as trabalhadoras trabalhem até morrer”. Victória acrescentou que, a partir de hoje, cerca de 60% dos trabalhadores da região estarão em greve. Vários alunos secundaristas se juntaram aos trabalhadores que saíram da Praça da Estação por volta das 10h40 e seguiram a Avenida Francisco Bernardino em direção
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Juiz de Fora, 16 de Março de 2017 à Câmara Municipal, no Parque Halfeld. Entre eles, Lívia Mariano, aluna do Colégio Granbery, que explicou seu engajamento: “Os professores ajudaram a gente a entender o que está acontecendo, a deixar os alunos mais participativos socialmente”. Enquanto a maioria dos trabalhadores presentes no ato voltaram nesta quinta-feira ao trabalho, os educadores das redes municipal e estadual mantêm os movimentos grevistas por tempo indeterminado. A coordenadora-geral do Sindicato dos Professores (Sinpro) de Juiz de Fora, Maria Aparecida de Oliveira, pontuou que 92% dos membros da categoria aderiram à paralisação. Questionada, nesta quinta-feira (16), sobre a situação das escolas municipais da cidade, Maria Aparecida disse que o sindicato “ainda não tem o levantamento das escolas em greve”. Os professores da rede particular paralisaram suas atividades durante todo o dia de ontem. Entretanto, voltaram normalmente às escolas a partir de hoje.
Regime especial e abonos atrasados
Atualmente, os professores do Estado de Minas Gerais trabalham sob um regime especial de aposentadoria; as mulheres devem contribuir com a Previdência Social por 25 anos e ter, no mínimo, 50 anos de idade para se aposentarem. Enquanto isso, os homens devem apresentar 30 anos de contribuição ao buscar a aposentadoria com, no mínimo, 55 anos de idade. Caso a reforma da Previdenciária seja aprovada, o regime especial deixará de existir. “O professor não tem condições de ficar em sala de aula até essa idade. Mulher muito menos. A gente já é desrespeitada em muitos âmbitos. A qualidade do serviço não vai ser boa”, afirma a professora Maria Fer-
nanda Almeida, da Escola Estadual Marechal Mascarenhas. De acordo com a assessoria do Sind-UTE, uma das reivindicações locais do movimento é o acordo firmado com o Governo de Fernando Pimentel em relação ao piso salarial. Os educadores da rede estadual têm direito a receber três abonos do estado; as datas respectivas a tais abonos correspondem aos meses de janeiro e julho de 2016 e janeiro de 2017. Somente o primeiro foi pago. E com atraso. Reis foi sucinto quando perguntado a respeito do tema: “Algumas coisas acordadas com o governo Pimentel não foram cumpridas. A principal é o piso nacional; ele prometeu que estaria cumprindo uma agenda de aumento anual para atingir o piso nacional em 2018, mas ele não cumpriu essa agenda”.
Reposição e represália
“A princípio, a grande maioria da rede municipal adere aos movimentos. Infelizmente, alguns professores têm medo de represália, têm medo de serem mandados embora porque são contratados. Mas a maioria sempre adere aos movimentos, sempre está na luta”, fala Cristian Baldi, professor da Escola Municipal Áurea Bicalho. A maioria dos professores das escolas municipais de Juiz de Fora está em greve por tempo indeterminado, ainda que, em algumas escolas, os professores que não aderiram à greve se apresentaram normalmente nesta quinta-feira. Em contrapartida, poucos alunos foram às escolas hoje. A reposição dos dias letivos perdidos devido ao movimento e o receio de represália e demissão são os principais pontos de discussão dos docentes que continuam suas atividades regularmente. Contudo, a coordenadora-geral do
Sinpro-JF, Aparecida de Oliveira, contesta tais argumentos: “Isso é uma lenda. Funcionários contratados não são demitidos. Em muitos anos de carreira como contratada e efetiva, eu nunca vi uma situação dessa. Falta disposição em repor as aulas aos professores que não participam do movimento, porque a reposição, provavelmente, será feita aos sábados.” Questionada a respeito da greve dos trabalhadores da rede municipal, a assessoria de comunicação da Secretaria de Educação de Juiz de Fora respondeu que “em princípio, a Prefeitura não vai se pronunciar a respeito, porque não se trata de um movimento ligado diretamente a ela”. Entretanto, afirmou que as aulas serão repostas.
Mobilização dos alunos
Os discentes da rede privada de Juiz de Fora foram convocados a participar do movimento nacional por seus professores, que paralisaram somente na última quarta-feira para se juntarem às demais categorias. “Os professores falaram sobre o ato e alguns convidaram a gente. Atuar é agora mesmo. Eu já estava querendo vir e, depois de um discurso inspirador de um dos meus professores, eu pensei: agora é a hora!”, afirma o estudante do Colégio Santa Catarina Guilherme França. A aluna Helena Martins, da Escola Estadual Delfim Moreira (Central), confirmou que sua escola se aderiu à greve e comentou a importância em participar do movimento: “Do mesmo jeito que o professor vai continuar por muito tempo trabalhando, a gente também. É o nosso futuro. Não tem por que só os professores virem aqui lutar pela gente. Nós, jovens, também temos que vir aqui lutar, porque esse é o nosso futuro”. 11
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Dia histórico de luta e resistência Por Leandro Barbosa
Fotos: Leo Barbosa
O 15 de março de 2017 ficará marcado como um dia de luta e resistência no país. Juiz de Fora participou do ato, levando milhares de pessoas para a Praça da Estação, palco histórico de manifestações do município. O ato seguiu como um cordão humano pela Avenida Francisco Bernardino, passando ainda pela Avenida Rio Branco, Rua Halfeld e Avenida Getúlio Vargas. Depois de mais de cinco horas, o protesto finalmente se encerrou na Praça Antônio Carlos, às 14h. A manifestação reuniu simpatizantes da esquerda e da direita, trabalhadores de diversos setores, representantes sindicais, estudantes e aposentados. Pelo futuro e pelo presente; em meio às cores das bandeiras, às frases de efeitos nos cartazes e aos gritos da multidão; crianças, jovens e idosos se uniram para marchar contra a PEC 287, que altera as regras da Previdência Social. O espaço também foi aberto para cultura. No afã do manifesto, uma roda de capoeira animava o protesto. Rostos pintados e pessoas fantasiadas denunciavam a realidade. Era a arte pulsando, como forma de luta e resistência.
Simpatizantes de esquerda e direita marcharam juntos no protesto
Manifestantes seguiram pela Av. Francisco Bernardino
Jovens contra a reforma da Previdência
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Manifestantes fantasiados denunciavam a realidade