Escola Secundária Artística António Arroio
Sobre a poesia ...
Maria Assis dos Santos Nº 15 10º H Professora Elisabete Miguel
Índice 2.
Introdução
4.
Ary dos Santos, fotografia
5-6.
Poeta Castrado, Não!, Ary dos Santos
7.
Poeta Castrado, Não !, ilustração
8.
Orlando da Costa, fotografia
9.
Trago nas mãos o calor, Orlando da Costa
10.
Alexandre O’Neill, fotografia
11-12. “Albertina” ou “O insecto-insulto” ou “O quotidiano recebido como mosca”, Alexandre O’Neil 13.
“Albertina” ou “O insecto-insulto” ou “O quotidiano recebido como mosca”, ilustração
14.
José Saramago, fotografia
15.
Não me peçam razões ..., José Saramago
16.
Carlos Drummond de Andrade, fotografia
17.
O chão é cama para o amor urgente, Carlos Drummond de Andrade
18.
Reinaldo Ferreira, fotografia
19.
Se eu nunca disse que os teus dentes, Reinaldo Ferreira
20.
Florbela Espanca, fotografia
21-22. Espera..., Florbela Espanca 23.
Espera..., ilustração
24.
Mia Couto, fotografia
25.
Para Ti, Mia Couto
26.
Aguinaldo Fonseca, fotografia
27-28. Mãe Negra, Aguinaldo Ferreira 29.
Mãe Negra, ilustração
30.
Fernando Pessoa, fotografia
31.
O Monstrengo, Fernando Pessoa
33.
Análise
35.
Explicação da ilustração
37.
Conclusão
39.
Bibliografia/webgrafia
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Introdução No âmbito da disciplina de português, num estudo sobre poesia, a Professora Elisabete Miguel propôs que eu fizesse uma seleção de dez poemas, de dez autores contemporâneos. Assim sendo, escolhi, de entre os vários poemas que li, de diversos autores, os dez de que mais gostei, para realizar o trabalho. Alguns deles eu já conhecia. Outros desconhecia e li pela primeira vez, são obras das quais fiquei grande fã e quis que constassem no meu trabalho. Foi sugerido, ainda, que criasse uma ilustração para um dos poemas presentes no trabalho. Decidi, para isso, recorrer à técnica da fotografia, utilizando um boneco articulado de desenho. Por sentir a necessidade de criar uma certa ligação entre os diferentes poemas e uma dinâmica de continuidade, vendo que a minha opção me permitia criar cenários diferentes, decidi ilustrar cinco das dez obras poéticas que compõem o meu trabalho. Fiz ilustrações para os poemas Poeta Castrado, Não !, de Ary dos Santos, “Albertina” ou “O insecto-insulto” ou “o quotidiano recebido como mosca”, de Alexandre O’Neil, O chão é cama para o amor urgente, de Carlos Drummond de Andrade, Espera..., de Florbela Espanca e, por fim, para Mãe Negra, de Aguinaldo Ferreira. Foi pedido, também, que estabelecesse a relação entre o poema e a ilustração. Escolhi, para isso, a obra Poeta Castrado, Não !, de Ary dos Santos. Pretendo que o leitor, ao ler a minha pesquisa, se demore em cada página e possa encontrar os elementos de ligação entre a palavra e a ilustração, divertindo-se, tal como eu. Por outro lado, que em cada poema não ilustrado, que coloquei intercaladamente, o leitor possa ter um tempo de pausa para imaginar o seu próprio cenário, sentindo as emoções mais aprofundadamente. Quero, ainda, ressaltar o contraste entre aquilo que são os temas mais profundos e existênciais e os temas mais triviais e , aparentemente, menos poéticos mas que, ainda assim, servem de inspiração a quem os escreve. 3
Ary dos Santos
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Poeta Castrado, Não!
Serei tudo o que disserem por inveja ou negação: cabeçudo dromedário fogueira de exibição teorema corolário poema de mão em mão lãzudo publicitário malabarista cabrão. Serei tudo o que disserem: Poeta castrado não! Os que entendem como eu as linhas com que me escrevo reconhecem o que é meu em tudo quanto lhes devo: ternura como já disse sempre que faço um poema; saudade que se partisse me alagaria de pena; e também uma alegria uma coragem serena em renegar a poesia quando ela nos envenena. Os que entendem como eu a força que tem um verso reconhecem o que é seu quando lhes mostro o reverso:
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Da fome já não se fala - é tão vulgar que nos cansa mas que dizer de uma bala num esqueleto de criança? Do frio não reza a história - a morte é branda e letal mas que dizer da memória de uma bomba de napalm? E o resto que pode ser o poema dia a dia? - Um bisturi a crescer nas coxas de uma judia; um filho que vai nascer parido por asfixia?! - Ah não me venham dizer que é fonética a poesia! Serei tudo o que disserem por temor ou negação: Demagogo mau profeta falso médico ladrão prostituta proxeneta espoleta televisão. Serei tudo o que disserem: Poeta castrado não!
Ary dos Santos, Lisboa, 1973
6
Poeta Castrado, N達o !
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Orlando da Costa
8
Trago nas mãos o calor Trago nas mãos o calor Que deponho a cada instante No teu rosto que aspira a primavera que se pisa no chão E espera o outono das folhas e dos caminhos E desce comigo ao sabor Que à terra dá cada breve estação Trago-te o calor e as mãos inteiras E nos olhos o horizonte dos nevoeiros no enredo das florestas Das vinhas colhidas pelos amantes reunidos à beira das manhãs E dos barcos e das pombas em planícies sem trincheiras Trago para nós a largura das terras e do mar Onde se perpetue o amor dos homens Na paz de cada olhar. Orlando da Costa, Lisboa, 1953
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Alexandre O’Neill
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"Albertina" ou "O inseto-insulto" ou "O quotidiano recebido como mosca"
O poeta está só, completamente só. Do nariz vai tirando alguns minutos De abstração, alguns minutos Do nariz para o chão Ou colados sob o tampo da mesa Onde o poeta é todo cotovelos E espera um minuto de beleza. Mas o poeta é aos novelos; Mas o poeta já não tem a certeza De segurar a musa, aquela que tantas vezes, arrastou pelos cabelos... A mosca Albertina, que ele domesticava, Vem agora ao papel, como um inseto-insulto, Mas fingindo que o poeta a esperava ... Quase mulher e muito mosca, Albertina quer o poeta para si, Quer sem versos o poeta. Por isso fica, mosca-mulher, por ali...
11
— Albertina!, deixa-me em paz, consente Que eu falhe neste papel tão branco e insolente Onde belo e ausente um verso eu sei que está! — Albertina! eu quero um verso que não há!... Conjugal, provocante, moreno e azulado, O inseto levanta, revoluteia, desce E, em lugar do verso que não aparece, No papel se demora como um insulto alado. E o poeta sai de chôfre, por uns tempos desalmado ... Alexandre O’Neill
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“Albertina” ou “O insecto-insulto” ou “O quotiidiano recebido como mosca”
13
JosĂŠ Saramago
14
Não me Peçam Razões... Não me peçam razões, que não as tenho, Ou darei quantas queiram: bem sabemos Que razões são palavras, todas nascem Da mansa hipocrisia que aprendemos. Não me peçam razões por que se entenda A força de maré que me enche o peito, Este estar mal no mundo e nesta lei: Não fiz a lei e o mundo não aceito. Não me peçam razões, ou que as desculpe, Deste modo de amar e destruir: Quando a noite é de mais é que amanhece A cor de primavera que há-de vir. José Saramago, 1969
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Carlos Drummond de Andrade
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O chão é cama para o amor urgente O chão é cama para o amor urgente, amor que não espera ir para a cama. Sobre tapete ou duro piso, a gente compõe de corpo e corpo a húmida trama.
E para repousar do amor, vamos à cama.
Carlos Drummond de Andrade, 1992
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Reinaldo Ferreira
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Se eu nunca disse que os teus dentes Se eu nunca disse que os teus dentes São pérolas, É porque são dentes. Se eu nunca disse que os teus lábios São corais, É porque são lábios. Se eu nunca disse que os teus olhos São d'ónix, ou esmeralda, ou safira, É porque são olhos. Pérolas e ónix e corais são coisas, E coisas não sublimam coisas. Eu, se algum dia com lugares-comuns Houvesse de louvar-te, Decerto que buscava na poesia, Na paisagem, na música, Imagens transcendentes Dos olhos e dos lábios e dos dentes. Mas crê, sinceramente crê, Que todas as metáforas são pouco Para dizer o que eu vejo. E vejo lábios, olhos, dentes. Reinaldo Ferreira, Lisboa, 1998
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Florbela Espanca
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Espera... Não me digas adeus, ó sombra amiga, Abranda mais o ritmo dos teus passos; Sente o perfume da paixão antiga, Dos nossos bons e cândidos abraços! Sou a dona dos místicos cansaços, A fantástica e estranha rapariga Que um dia ficou presa nos teus braços... Não vás ainda embora, ó sombra amiga!
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Teu amor fez de mim um lago triste: Quantas ondas a rir que não lhe ouviste, Quanta canção de ondinas lá no fundo! Espera... espera... ó minha sombra amada... Vê que pra além de mim já não há nada E nunca mais me encontras neste mundo!... Florbela Espanca
22
Espera...
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Mia Couto
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Para Ti Foi para ti que desfolhei a chuva para ti soltei o perfume da terra toquei no nada e para ti foi tudo Para ti criei todas as palavras e todas me faltaram no minuto em que talhei o sabor do sempre Para ti dei voz às minhas mãos abri os gomos do tempo assaltei o mundo e pensei que tudo estava em nós nesse doce engano de tudo sermos donos sem nada termos simplesmente porque era de noite e não dormíamos eu descia em teu peito para me procurar e antes que a escuridão nos cingisse a cintura ficávamos nos olhos vivendo de um só amando de uma só vida Mia couto, 1981 25
Aguinaldo Fonseca
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Mãe Negra A mãe negra embala o filho. Canta a remota canção Que seus avós já cantavam Em noites sem madrugada. Canta, canta para o céu Tão estrelado e festivo. É para o céu que ela canta, Que o céu Às vezes também é negro. No céu Tão estrelado e festivo Não há branco, não há preto, Não há vermelho e amarelo. - Todos são anjos e santos Guardados por mãos divinas.
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A mãe negra não tem casa Nem carinhos de ninguém... A mãe negra é triste, triste, E tem um filho nos braços... Mas olha o céu estrelado E de repente sorri. Parece-lhe que cada estrela É uma mão acenando Com simpatia e saudade... Aguinaldo Fonseca
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M達e Negra
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Fernando Pessoa
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O Monstrengo O mostrengo que está no fim do mar Na noite de breu ergueu-se a voar; À roda da nau voou três vezes, Voou três vezes a chiar, E disse: «Quem é que ousou entrar Nas minhas cavernas que não desvendo, Meus tectos negros do fim do mundo?» E o homem do leme disse, tremendo: «El-rei D. João Segundo!»
«De quem são as velas onde me roço? De quem as quilhas que vejo e ouço?» Disse o mostrengo, e rodou três vezes, Três vezes rodou imundo e grosso. «Quem vem poder o que só eu posso, Que moro onde nunca ninguém me visse E escorro os medos do mar sem fundo?» E o homem do leme tremeu, e disse: «El-rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme as mãos ergueu, Três vezes ao leme as reprendeu, E disse no fim de tremer três vezes: «Aqui ao leme sou mais do que eu: Sou um povo que quer o mar que é teu; E mais que o mostrengo, que me a alma teme E roda nas trevas do fim do mundo, Manda a vontade, que me ata ao leme, D' El-rei D. João Segundo!» Fernando Pessoa, Lisboa, 1934 31
Análise relação entre o poema de Ary dos Santos Poeta Castrado, Não! e a Ilustração
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Explicação da Ilustração O poeta encontra-se no “palco da vida”, sob as luzes da ribalta. O olhar atento dos outros sobre si. A sua participação ativa na vida política, as sessões de poesia, declamando, os poemas para canções, mais de 600. Conheceu muita gente, fez muitos amigos. No entanto, é também um homem só. Muitas vezes contestado e censurado, chegando a ver esmiuçada a sua orientação sexual. Sentiu-se por muitos incompreendido. Neste palco, o contraste expressa essa dualidade. A sala cor-de-rosa com a cadeira vazia, mostra a solidão do poeta no seu mundo mais íntimo, sentindose moralizado e condenado. Na sala azul, o poeta é o homem visível, o poeta do povo. Nunca deixa de ser homem, seja azul ou cor-de-rosa, seja homem ou mulher, “Demagogo mau profeta” , “falso médico ladrão”, o poeta assume o que pensa e di-lo, com “coragem” e com “ternura”, com a “alegria” com que só um verdadeiro poeta diz. A luz a incidir sobre o poeta no todo, simboliza, também, a luz e a clareza do seu pensamento. Por isso, o poeta dirá tudo o que sentir e ninguém o impedirá. Será “tudo o que disseram, poeta castrado não!”
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Poeta Castrado, N達o!
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Conclusão Para realizar o meu trabalho, tive de fazer um procura bastante aprofundada sobre os poetas de expressão portuguesa e sobre as suas obras. Através de livros e da internet, pude ler algumas biografias e ficar a conhecer mais daquilo que grandes autores escreveram, desde poesia de diferentes estilos, a diferentes correntes de pensamento. Com este aprofundamento, sinto que a realização do trabalho foi muito vantajosa, porque que me levou a saber mais acerca da poesia e levou-me, também, a tomar-lhe ainda mais o gosto. Notei que, com a prática da leitura, foi-se tornando cada vez menos difícil abrir um livro de poesia e lê-la. Penso que, porque a poesia nos transporta para lugares mais íntimos das nossas lembranças e do nosso pensamento, tive a ideia de usar como cenário para as ilustrações, a minha casinha das bonecas. Nela criei seis cenários diferentes, com o boneco de desenho que representa o poeta ou a sua inspiração. Para além das ilustrações dos poemas, retirei da internet os retratos dos poetas, que acrescentei, para apresentar cada um, o respetivo poema. Uma vez que me foi dada uma enorme liberdade para a realização do trabalho, porque não foi indicado um tema específico nem um tipo de técnica de ilustração obrigatório e que a poesia é um campo tão vasto, senti que as possibilidades eram ilimitadas e, por isso, não encontrei grandes dificuldades na sua execução. Penso que também seria interessante se cada aluno trabalhasse um tema diferente, pois, desde o nascimento até à morte, tudo é motivo de escrita. Porém, gostei muito da liberdade que me foi dada e do resultado final deste trabalho.
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Bibliografia •
Primeiro livro de poesia, Sophia de Mello Breyner Andresen, Caminho
•
Poesias completas, Alexandre O’Neil, Bibiloteca de autores Portugueses
•
Expressões, Pedro Silva; Elsa Cardoso; Rita Mendes; Sónia Costa; Rita Correia, Porto editora
Webgrafia http://www.citador.pt/poemas/nao-me-pecam-razoes-jose-de-sousasaramago • http://www.citador.pt/poemas/espera-florbela-de-alma-conceicaoespanca • http://www.citador.pt/poemas/o-chao-e-cama-para-o-amor-urgentecarlos-drummond-de-andrade • http://www.citador.pt/poemas/para-ti-mia-couto • http://www.citador.pt/poemas/retrato-do-povo-de-lisboa-jose-carlos-arydos-santos • http://letradearte.blogspot.pt/2009/12/poema-de-orlando-da-costa.html • http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/v184.txt •
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