Poesia j 25

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Escola Artística António Arroio Disciplina: Português

“Poemas Contemporâneos de Portugal”

Professora: Elisabete Miguel Susana Mendes das Neves N.º25 10.ºJ Ano letivo de 2014-2015


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Índice

                        

Introdução Saudades Serenata à Chuva Ao Rimar Dor com Pensamento Do Fundo da Mesa Tentação Para Ti Colhe o Dia, porque És Ele Agora que Sinto Amor Os Amantes de Novembro Mundo Retrato de Amigo Urgentemente Alheamento Não Posso Adiar O Amor É Isto o Amor Eis-me Percam Para Sempre Amei Demais Conquista Canção Poema escolhido Ilustração do poema Conclusão Webgrafia


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Introdução


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1 Saudades Saudades! Sim.. talvez.. e por que não?... Se o sonho foi tão alto e forte Que pensara vê-lo até à morte Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah, como é vão! Que tudo isso, Amor, nos não importe. Se ele deixou beleza que conforte Deve-nos ser sagrado como o pão.

Quantas vezes, Amor, já te esqueci, Para mais doidamente me lembrar Mais decididamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim: Quanto menos quisesse recordar Mais saudade andasse presa a mim!

Florbela Espanca, in Livro de Sóror Saudade Florbela Espanca (Vila Viçosa, 8 de Dezembro de 1894 — Matosinhos, 8 de Dezembro de 1930) http://pt.wikipedia.org/wiki/Florbela_Espanca [consultado em 13.3.2015


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2 Serenata à Chuva Chuva, manhã cinza, guarda-chuva. Entrar no contexto, dois pontos. Ele e ela abraçados caminham sob o teto do guarda-chuva que os guarda. Pelas ruas vão com a vontade de voltar ao branco dos lençóis. Esse objeto prosaico que às vezes se vira com o vento torna-se objeto de poema. Dizer também como a chuva é doce neste dia de verão. Como o amor altera o sentido da chuva, sim, como ela se eleva no ar e as frases se colam ao vestido. No interior da pele o poema mudou desde que entraste no guarda-chuva esquecido a um canto do armário. Talvez o amor seja tudo amar sem excepção. Eu que nunca uso guarda-chuva assino incondicionalmente este poema.

Rosa Alice Branco, in Soletrar o Dia


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3 Ao Rimar Dor com Pensamento Ao rimar dor com pensamento escrevo ternura, afeto, apenas quem me conceda um gesto, mínimo gesto

um poeta não se assassina ia dizer mas disto não entendes é a superfície que pretendes da coisa leve, pequenina

Isto é lama, são entranhas, é lixo, chama, horror, precipício que consome, enaltece, aflige

em tom maior, menor, e a verdade capriche. Que em verdade digo: de aqui em diante - apenas sigo

Helga Moreira, in Tumulto


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4 Do Fundo da Mesa O jantar já tinha sido servido. No fundo da mesa, os pratos amontoavam-se por entre restos ilesos de comida. Era para ali que nos retirávamos, para deixar de sentir por momentos, sobre os ombros, o peso da literatura. A sua incomodidade. Não seria possível dela extrair, agora, um novo uso? Nessas alturas, a filosofia consolava-nos do ruído das conversas, da própria ênfase a que recorríamos para que, sobre a mesa, o poema ficasse escrito. Porque o fazíamos? Tornar-se-ia o mundo mais limpo depois de escrito? Como as mãos que no rebordo da toalha, enxugávamos? E no entanto era esse o melhor argumento de que dispúnhamos: o das mulheres-escritoras que, noutro século, fiéis ao desvelo dos armários, reinventavam o mundo no aconchego das cozinhas.

Fernando Guerreiro, in Outono


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5 Tentação Eu não resistirei à tentação, não quero que de mim possas perder-te, que só na fonte fria da razão renasça a minha sede de beber-te.

Eu não resistirei à tentação de quanto adivinhei nesta amargura: um sim que só assalta quem diz não, um corpo que entrevi na selva escura.

Resistirei a te chamar paixão, a te perder nos versos, nas palavras: mas não resistirei à tentação de te dizer que o céu é o que rasa

a luz que nos teus olhos eu perdi e que na terra toda não mais vi.

Luís Filipe Castro Mendes, in Os Amantes Obscuros


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6 Para Ti Foi para ti que desfolhei a chuva para ti soltei o perfume da terra toquei no nada e para ti foi tudo

nesse doce engano de tudo sermos donos

Para ti criei todas as palavras

sem nada termos

e todas me faltaram

simplesmente porque era de noite

no minuto em que talhei

e não dormíamos

o sabor do sempre

eu descia em teu peito para me procurar

Para ti dei voz

e antes que a escuridão

às minhas mãos

nos cingisse a cintura

abri os gomos do tempo

ficávamos nos olhos

assaltei o mundo

vivendo de um só

e pensei que tudo estava em nós

amando de uma só vida

Mia Couto, in Raiz de Orvalho e Outros Poemas

Mia Couto, pseudónimo de António Emílio Leite Couto ComSE (Beira, 5 de Julho de 1955), é um biólogo e escritor moçambicano

http://pt.wikipedia.org/wiki/Mia_Couto [consultado em 13.3.2015]


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7 Colhe o Dia, porque És Ele Uns, com os olhos postos no passado, Vêem o que não vêem: outros, fitos Os mesmos olhos no futuro, vêem O que não pode ver-se.

Por que tão longe ir pôr o que está perto A segurança nossa? Este é o dia, Esta é a hora, este o momento, isto É quem somos, e é tudo.

Perene flui a interminável hora Que nos confessa nulos. No mesmo hausto Em que vivemos, morreremos. Colhe O dia, porque és ele.

Ricardo Reis, in Odes

Ricardo Reis (19 de setembro de 1887) é um dos quatro heterónimos mais conhecidos de Fernando Pessoa.[…] Na sua biografia não consta a sua morte, no entanto José Saramago faz uma intervenção sobre o assunto em seu livro O Ano da Morte de Ricardo Reis, situando a morte de Reis em 1936. http://pt.wikipedia.org/wiki/Ricardo_Reis [consultado em 13.3.2015]


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8 Agora que Sinto Amor Agora que sinto amor Tenho interesse no que cheira. Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro. Agora sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova. Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia. São coisas que se sabem por fora. Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça. Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira. Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.

Alberto Caeiro, in O Pastor Amoroso

Alberto Caeiro da Silva (Lisboa, 16 de Abril de 18892 ou Agosto de 18873 – Junho de 19154 ) foi uma personagem ficcional (heterónimo) criada por Fernando Pessoa, sendo considerado o Mestre Ingénuo dos restantes heterónimos (Álvaro de Campos e Ricardo Reis) e do seu próprio autor, apesar de apenas ter feito a instrução primária. http://pt.wikipedia.org/wiki/Alberto_Caeiro [consultado em 13.3.2015]


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9 Os Amantes de Novembro Ruas e ruas dos amantes Sem um quarto para o amor Amantes são sempre extravagantes E ao frio também faz calor

Pobres amantes escorraçados Dum tempo sem amor nenhum Coitados tão engalfinhados Que sendo dois parecem um

De pé imóveis transportados Como uma estátua erguida num Jardim votado ao abandono De amor juncado e de outono.

Alexandre O’Neill, in No Reino da Dinamarca


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10 Mundo Tenho um amor nas Honduras e tenho outro no Nepal que o terceiro negro seja se for chinês não faz mal

me falta ainda da Austrália quem sabe do Polo Norte me não virá mais algum se houver foca que dê sorte

até o centro da terra dará por quem me apaixone por quem nunca me atormente com falas ao telefone

mas de verdade o que eu amo é o do nada do mundo que até duvido que exista tanto se acolhe ao profundo.

Agostinho da Silva, in Poemas


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11 Retrato de Amigo Por ti falo. E ninguém sabe. Mas eu digo meu irmão

minha amêndoa

meu tropel de ternura meu jardim de carência

meu amigo

minha casa minha asa.

Por ti morro e ninguém pensa. Mas eu sigo um caminho de nardos empestados uma intensa e terrífica ternura rodeado de cardos por muitíssimos lados.

Meu perfume de tudo meu lume

minha lava

minha essência meu labéu

como é possível não chegar ao cume de tão lavado céu?

Ary dos Santos, in Fotografias


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12 Urgentemente É urgente o amor É urgente um barco no mar

É urgente destruir certas palavras, ódio, solidão e crueldade, alguns lamentos, muitas espadas.

É urgente inventar alegria, multiplicar os beijos, as searas, é urgente descobrir rosas e rios e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz impura, até doer. É urgente o amor, é urgente permanecer.

Eugénio de Andrade, in Até Amanhã


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13 Alheamento Meu corpo estiraçado, lânguido, ao longo do leito.

O cigarro vago azulando os meus dedos.

O rádio... a música...

A tua presença que esvoaça em torno do cigarro, do ar, da música...

Ausência!, minha doce fuga!

Estranha coisa esta, a poesia, que vai entornando mágoa nas horas como um orvalho de lágrimas, escorrendo dos vidros duma janela,

numa tarde vaga, vaga...

Fernando Namora, in Mar de Sargaços


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14 Não Posso Adiar O Amor Não posso adiar o amor para outro século não posso ainda que o grito sufoque na garganta ainda que o ódio estale e crepite e arda sob montanhas cinzentas e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço que é uma arma de dois gumes amor e ódio

Não posso adiar ainda que a noite pese séculos sobre as costas e a aurora indecisa demore não posso adiar para outro século a minha vida nem o meu amor nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

António Ramos Rosa, in Viagem Através de uma Nebulosa


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15 É Isto o Amor

voz que abre as fontes de todos os rios, mesmo

Em quem pensar, agora, senão em ti? Tu, que me esvaziaste de coisas incertas, e trouxeste a manhã da minha noite. É verdade que te podia dizer: «Como é mais fácil deixar que as coisas não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos apenas dentro de nós próprios?» Mas ensinaste-me a sermos dois; e a ser contigo aquilo que sou, até sermos um apenas no amor que nos une, contra a solidão que nos divide. Mas é isto o amor: ver-te mesmo quando te não vejo, ouvir a tua

esse que mal corria quando por ele passámos, subindo a margem em que descobri o sentido de irmos contra o tempo, para ganhar o tempo que o tempo nos rouba. Como gosto, meu amor, de chegar antes de ti para te ver chegar: com a surpresa dos teus cabelos, e o teu rosto de água fresca que eu bebo, com esta sede que não passa. Tu: a primavera luminosa da minha expectativa, a mais certa certeza de que gosto de ti, como gostas de mim, até ao fim do mundo que me deste.

Nuno Júdice, in Pedro, Lembrando Inês


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16 Eis-me Eis-me Tendo-me despido de todos os meus mantos Tendo-me separado de adivinhos mágicos e deuses Para ficar sozinha ante o silêncio Ante o silêncio e o esplendor da tua face

Mas tu és de todos os ausentes o ausente Nem o teu ombro me apoia nem a tua mão me toca O meu coração desce as escadas do tempo em que não moras E o teu encontro São planícies e planícies de silêncio

Escura é a noite Escura e transparente Mas o teu rosto está para além do tempo opaco E eu não habito os jardins do teu silêncio Porque tu és de todos os ausentes o ausente

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Livro Sexto


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17 Percam Para Sempre Percam para sempre as tuas mãos o jeito de pedir. Esqueça para sempre a tua boca O que disse a rezar. E os teus olhos nunca mais, nunca mais saibam chorar Porque é inútil.

Faz como os outros fizeram Quando chegou o momento De perder o medo à morte Por ter muito amor à vida.

Raúl de Carvalho, in As Sombras e as Vozes


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18 Amei Demais Madruguei demais. Fumei demais. Foram demais todas as coisas que na vida eu emprenhei. Vejo-as agora grávidas. Redondas. Coisas tais, como as tais coisas nas quais nunca pensei.

Demais foram as sombras. Mais e mais. Cada vez mais ardentes as sombras que tirei do imenso mar de sol, sem praia ou cais, de onde parti sem saber por que embarquei.

Amei demais. Sempre demais. E o que dei está espalhado pelos sítios onde vais e pelos anos longos, longos, que passei

à procura de ti. De mim. De ninguém mais. E os milhares de versos que rasguei antes de ti, eram perfeitos. Mas banais.

Joaquim Pessoa, in Ano Comum


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19 Conquista Livre não sou, que nem a própria vida Mo consente. Mas a minha aguerrida Teimosia É quebrar dia a dia Um grilhão da corrente.

Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino. E vão lá desdizer o sonho do menino Que se afogou e flutua Entre nenúfares de serenidade Depois de ter a lua!

Miguel Torga, in Cântico do Homem


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20 Canção Hoje venho dizer-te que nevou no rosto familiar que te esperava. Não é nada, meu amor, foi um pássaro, a casca do tempo que caiu, uma lágrima, um barco, uma palavra.

Foi apenas mais um dia que passou entre arcos e arcos de solidão; a curva dos teus olhos que se fechou, uma gota de orvalho, uma só gota, secretamente morta na tua mão.

Eugénio de Andrade


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Poema escolhido: Saudades Saudades! Sim.. talvez.. e por que não?... Se o sonho foi tão alto e forte Que pensara vê-lo até à morte Deslumbrar-me de luz o coração!

Esquecer! Para quê?... Ah, como é vão! Que tudo isso, Amor, nos não importe. Se ele deixou beleza que conforte Deve-nos ser sagrado como o pão.

Quantas vezes, Amor, já te esqueci, Para mais doidamente me lembrar Mais decididamente me lembrar de ti!

E quem dera que fosse sempre assim: Quanto menos quisesse recordar Mais saudade andasse presa a mim!

Florbela Espanca, in Livro de Sóror Saudade


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Ilustração:


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Explicação da imagem:


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Conclus찾o:

Com este trabalho percebi a import창ncia da poesia nas pessoas e no mundo. Apesar de ter custado um bocado a fazer, consegui conclui-lo. Gostei muito de realizar este trabalho, aprendi mais um pouco daquilo que sabia sobre poesia contempor창nea e talvez me tenha levado a gostar mais de ler poesia no meu quotidiano.


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Webgrafia: http://www.citador.pt/

http://revistacult.uol.com.br/home/2010/03/poesia-portuguesa-do-seculo-20/

https://humanasblog.wordpress.com/2009/09/09/poesia-portuguesa-contemporanea/


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