Poesia j 7

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Dossiê de Poesia Disciplina de Português

Professora Elisabete Miguel Trabalho realizado por: Carlota Porto, n.º7 – 10.ºJ

Ano lectivo 2014/2015


Índice

Introdução Fernanda de Castro Miguel Torga Eugénio de Andrade Judith Teixeira Sophia de Mello Breyner Andersen Manuel Alegre Fernando Namora António Gedeão Carlos de Oliveira Alexandre O’Neill Teixeira de Pascoaes Jorge de Sena Ary dos Santos José Régio Ruy Belo Vitorino Nemésio José Gomes Ferreira Natália Correia António Ramos Rosa David Mourão Ferreira Conclusão Bibliografia Anexos


Introdução Neste trabalho, solicitado pela professora de português, após vasta pesquisa e posterior seleção, escolhi vinte poemas de vinte poetas contemporâneos, posteriormente, como havia sido proposto, elegi, de entre eles, o meu favorito, que ilustrei. Optei por, em anexo, inserir ainda outros poetas do meu particular aprazimento. Que a leitura desta minha pequena antologia seja do vosso agrado.


Distância Não vás para tão longe! Vem sentar-te Aqui na chaise-longue, ao pé de mim... Tenho o desejo doido de contar-te Estas saudades que não tinham fim.

Não vás para tão longe; Quero ver Se ainda sabes olhar-me como d'antes, E se nas tuas mãos acariciantes, Inda existe o perfume de que eu gosto.

Não vás para tão longe! Tenho medo Do silêncio pesado d'esta sala... Como soluça o vento no arvoredo! E a tua voz, amor, como se cala!

Não vás para tão longe! Antigamente, Era sempre demais o curto espaço Que havia entre nós dois... Agora, um embaraço, Hesitas e depois, Com um gesto de tédio e de cansaço, Achas inconveniente


O meu abraço.

Não vás para tão longe! Fica. Inda é tão cedo! O vento continua a fustigar Os ramos sofredores do arvoredo, E eu ponho-me a pensar E tenho medo!

Não vás para tão longe! Na sombra impenetrada, Como se agita e se debate o vento!... Paira nas velhas ruínas do convento

Que além se avista, A alma melancólica d'um monge Que a vida arremessou àquela crista...

Céu apagado, negro, pessimista, E tu sempre mais longe!...

Fernanda de Castro, in Antemanhã


Dies Irae

Apetece cantar, mas ninguém canta. Apetece chorar, mas ninguém chora. Um fantasma levanta A mão do medo sobre a nossa hora.

Apetece gritar, mas ninguém grita. Apetece fugir, mas ninguém foge. Um fantasma limita Todo o futuro a este dia de hoje.

Apetece morrer, mas ninguém morre. Apetece matar, mas ninguém mata. Um fantasma percorre Os motins onde a alma se arrebata.

Oh! maldição do tempo em que vivemos, Sepultura de grades cinzeladas, Que deixam ver a vida que não temos E as angústias paradas!

Miguel Torga, in Cântico do Homem


Até Amanhã Sei agora como nasceu a alegria, como nasce o vento entre barcos de papel, como nasce a água ou o amor quando a juventude não é uma lágrima.

É primeiro só um rumor de espuma à roda do corpo que desperta, sílaba espessa, beijo acumulado, amanhecer de pássaros no sangue.

É subitamente um grito, um grito apertado nos dentes, galope de cavalos num horizonte onde o mar é diurno e sem palavras.

Falei de tudo quanto amei. De coisas que te dou para que tu as ames comigo: a juventude, o vento e as areias.

Eugénio de Andrade, in Até Amanhã


Mais Beijos Devagar... outro beijo... ou ainda... O teu olhar, misterioso e lento, veio desgrenhar a cálida tempestade que me desvaira o pensamento!

Mais beijos!... Deixa que eu, endoidecida, incendeie a tua boca e domine a tua vida!

Sim, amor.. deixa que se alongue mais este momento breve!... — que o meu desejo subindo solte a rubra asa e nos leve!

Judith Teixeira, in Antologia Poética

Judite dos Reis Ramos Teixeira ou Judith Teixeira (Viseu,

Lisboa,

17

de

25

de Maio

Janeiro de

de

1880 -

1959).

http://pt.wikipedia.org/wiki/Judite_Teixeira [consultado em 9.3.2015]

Aqui:


Assim o Amor Assim o amor Espantado meu olhar com teus cabelos Espantado meu olhar com teus cavalos E grandes praias fluidas avenidas Tardes que oscilam demoradas E um confuso rumor de obscuras vidas E o tempo sentado no limiar dos campos Com seu fuso sua faca e seus novelos Em vĂŁo busquei eterna luz precisa

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Obra PoĂŠtica


Balada de Lisboa Em cada esquina te vais Em cada esquina te vejo Esta é a cidade que tem Teu nome escrito no cais A cidade onde desenho Teu rosto com sol e Tejo

Caravelas te levaram Caravelas te perderam Esta é a cidade onde chegas Nas manhãs de tua ausência Tão perto de mim tão longe Tão fora de seres presente

Esta e a cidade onde estás Como quem não volta mais Tão dentro de mim tão que Nunca ninguém por ninguém Em cada dia regressas Em cada dia te vais

Em cada rua me foges Em cada rua te vejo Tão doente da viagem Teu rosto de sol e Tejo Esta é a cidade onde moras Como quem está de passagem


Às vezes pergunto se Às vezes pergunto quem Esta é a cidade onde estás Com quem nunca mais vem Tão longe de mim tão perto Ninguém assim por ninguém

Manuel Alegre, in Babilónia


Um Poema Que Se Perdeu Hoje o dia é um dia chuvoso e triste amortalhado Naquela monotonia doente dos grandes dias.

Hoje o dia... (a pena caiu-me das mãos)

Acabou-se o poema no papel. Cá por dentro Continua...

Oh! este marulhar das almas no silêncio!

Fernando Namora, in Relevos


Poema da Memória Havia no meu tempo um rio chamado Tejo que se estendia ao Sol na linha do horizonte. Ia de ponta a ponta, e aos seus olhos parecia exactamente um espelho porque, do que sabia, só um espelho com isso se parecia.

De joelhos no banco, o busto inteiriçado, só tinha olhos para o rio distante, os olhos do animal embalsamado mas vivo na vítrea fixidez dos olhos penetrantes. Diria o rio que havia no seu tempo um recorte quadrado, ao longe, na linha do horizonte, onde dois grandes olhos, grandes e ávidos, fixos e pasmados, o fitavam sem tréguas nem cansaço. Eram dois olhos grandes, olhos de bicho atento que espera apenas por amor de esperar.

E por que não galgar sobre os telhados, os telhados vermelhos das casas baixas com varandas verdes e nas varandas verdes, sardinheiras? Ai se fosse o da história que voava com asas grandes, grandes, flutuantes,


e poisava onde bem lhe apetecia, e espreitava pelos vidros das janelas das casas baixas com varandas verdes! Ai que bom seria! Espreitar não, que é feio, mas ir até ao longe e tocar nele, e nele ver os seus olhos repetidos, grandes e húmidos, vorazes e inocentes. Como seria bom!

Descaem-se-me as pálpebras e, com isso, (tão simples isso) não há olhos, nem rio, nem varandas, nem nada.

António Gedeão, in Poemas Póstumos


Infância Sonhos enormes como cedros que Ê preciso trazer de longe aos ombros para achar no inverno da memória este rumor de lume: o teu perfume, lenha da melancolia.

Carlos de Oliveira, in Cantata


Os Amantes de Novembro Ruas e ruas dos amantes Sem um quarto para o amor Amantes são sempre extravagantes E ao frio também faz calor

Pobres amantes escorraçados Dum tempo sem amor nenhum Coitados tão engalfinhados Que sendo dois parecem um

De pé imóveis transportados Como uma estátua erguida num Jardim votado ao abandono De amor juncado e de outono.

Alexandre O'Neill, in No Reino da Dinamarca


Elegia do Amor Lembras-te, meu amor, Das tardes outonais, Em que íamos os dois, Sozinhos, passear, Para fora do povo Alegre e dos casais, Onde só Deus pudesse Ouvir-nos conversar? Tu levavas, na mão, Um lírio enamorado, E davas-me o teu braço; E eu, triste, meditava Na vida, em Deus, em ti... E, além, o sol doirado Morria, conhecendo A noite que deixava. Harmonias astrais Beijavam teus ouvidos; Um crepúsculo terno E doce diluía, Na sombra, o teu perfil E os montes doloridos... Erravam, pelo Azul, Canções do fim do dia. Canções que, de tão longe, O vento vagabundo Trazia, na memória...


Assim o que partiu Em frágil caravela, E andou por todo o mundo, Traz, no seu coração, A imagem do que viu.

Olhavas para mim, Às vezes, distraída, Como quem olha o mar, À tarde, dos rochedos... E eu ficava a sonhar, Qual névoa adormecida, Quando o vento também Dorme nos arvoredos. Olhavas para mim... Meu corpo rude e bruto Vibrava, como a onda A alar-se em nevoeiro. Olhavas, descuidada E triste... Ainda hoje escuto A música ideal Do teu olhar primeiro! Ouço bem tua voz, Vejo melhor teu rosto No silêncio sem fim, Na escuridão completa! Ouço-te em minha dor. Ouço-te em meu desgosto E na minha esperança


Eterna de poeta! O sol morria, ao longe; E a sombra da tristeza Velava, com amor, Nossas doridas frontes. Hora em que a flor medita E a pedra chora e reza, E desmaiam de mágoa As cristalinas fontes. Hora santa e perfeita, Em que íamos, sozinhos, Felizes, através Da aldeia muda e calma,

Mãos dadas, a sonhar, Ao longo dos caminhos... Tudo, em volta de nós, Tinha um aspecto de alma. Tudo era sentimento, Amor e piedade. A folha que tombava Era alma que subia... E, sob os nossos pés, A terra era saudade, A pedra comoção E o pó melancolia. Falavas duma estrela E deste bosque em flor; Dos ceguinhos sem pão,


Dos pobres sem um manto. Em cada tua palavra, Havia etérea dor; Por isso, a tua voz Me impressionava tanto! E punha-me a cismar Que eras tão boa e pura, Que, muito em breve — sim! Te chamaria o céu! E soluçava, ao ver-te Alguma sombra escura, Na fronte, que o luar Cobria, como um véu. A tua palidez Que medo me causava! Teu corpo era tão fino E leve (oh meu desgosto!) Que eu tremia, ao sentir O vento que passava! Caía-me, na alma, A neve do teu rosto.

Como eu ficava mudo E triste, sobre a terra! E uma vez, quando a noite amortalhava a aldeia, Tu gritaste, de susto, Olhando para a serra: — Que incêndio! — E eu, a rir,


Disse-te — É a lua cheia!... E sorriste também Do teu engano. A lua Ergueu a branca fronte, Acima dos pinhais, Tão ébria de esplendor, Tão casta e irmã da tua, Que eu beijei sem querer, Seus raios virginais. E a lua, para nós, Os braços estendeu. Uniu-nos num abraço, Espiritual, profundo, E levou-nos assim, Com ela, até ao céu Mas, ai, tu não voltaste E eu regressei ao mundo.

Teixeira de Pascoaes, in Prosa e Poesia

Teixeira de Pascoaes, pseudónimo literário de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, (Amarante, 8 de novembro de 18771 — Amarante, Gatão, 14 de dezembro de 1952). http://pt.wikipedia.org/wiki/Teixeira_de_Pascoaes [consultado em 9.3.2015]


Ser Cansada expectativa tão ansiosa que ser só eu na minha vida espalha! Na longa noite em que se tece a malha do que não serei nunca, fervorosa

minha presença rútila e curiosa arde sombria como um arder de palha, curiosa apenas de saber se goza o voar das cinzas quando o vento calha

lá onde o levantá-las é verdade. Inutilmente se mistura tudo, que a mesma ansiedade, já esquecida,

de novo recomeça. Mas quem há-de contrariá-la? Eu não, que não me iludo: Viver é isto, quando se é só vida.

Jorge de Sena, in Post-Scriptum


Estrela da Tarde Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia Era tarde, tão tarde, que a boca tardando-lhe o beijo morria. Quando à boca da noite surgiste na tarde qual rosa tardia Quando nós nos olhámos, tardámos no beijo que a boca pedia E na tarde ficámos, unidos, ardendo na luz que morria Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia.

Meu amor, meu amor Minha estrela da tarde Que o luar te amanheça E o meu corpo te guarde. Meu amor, meu amor Eu não tenho a certeza Se tu és a alegria Ou se és a tristeza. Meu amor, meu amor Eu não tenho a certeza!

Foi a noite mais bela de todas as noites que me adormeceram Dos nocturnos silêncios que à noite de aromas e beijos se encheram Foi a noite em que os nossos dois corpos cansados não adormeceram E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram. Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam


Era a noite mais clara daqueles que à noite se deram E entre os braços da noite, de tanto se amarem, vivendo morreram.

Meu amor, meu amor Minha estrela da tarde Que o luar te amanheça E o meu corpo te guarde. Meu amor, meu amor Eu não tenho a certeza Se tu és a alegria Ou se és a tristeza. Meu amor, meu amor Eu não tenho a certeza!

Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso se é pranto É por ti que adormeço e acordado recordo no canto Essa tarde em que tarde surgiste dum triste e profundo recanto Essa noite em que cedo nasceste despida de mágoa e de espanto Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto!

Ary dos Santos, in As Palavras das Cantigas


Poema do Silêncio Sim, foi por mim que gritei. Declamei, Atirei frases em volta. Cego de angústia e de revolta.

Foi em meu nome que fiz, A carvão, a sangue, a giz, Sátiras e epigramas nas paredes Que não vi serem necessárias e vós vedes.

Foi quando compreendi Que nada me dariam do infinito que pedi, - Que ergui mais alto o meu grito E pedi mais infinito!

Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas, Eis a razão das épi trági-cómicas empresas Que, sem rumo, Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...

O que buscava Era, como qualquer, ter o que desejava. Febres de Mais. ânsias de Altura e Abismo, Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.


Que só por me ser vedado Sair deste meu ser formal e condenado, Erigi contra os céus o meu imenso Engano De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!

Senhor meu Deus em que não creio! Nu a teus pés, abro o meu seio Procurei fugir de mim, Mas sei que sou meu exclusivo fim.

Sofro, assim, pelo que sou, Sofro por este chão que aos pés se me pegou, Sofro por não poder fugir. Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!

Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação! (Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...) Senhor dá-me o poder de estar calado, Quieto, maniatado, iluminado.

Se os gestos e as palavras que sonhei, Nunca os usei nem usarei, Se nada do que levo a efeito vale, Que eu me não mova! que eu não fale!

Ah! também sei que, trabalhando só por mim, Era por um de nós. E assim, Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade, Lutava um homem pela humanidade.


Mas o meu sonho megalómano é maior Do que a própria imensa dor De compreender como é egoísta A minha máxima conquista...

Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros, E o meu Silêncio, como incenso, atingir-te-á, E sobre mim de novo descerá...

Sim, descerá da tua mão compadecida, Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida. E uma terra sem flor e uma pedra sem nome Saciarão a minha fome.

José Régio, in As Encruzilhadas de Deus


Povoamento No teu amor por mim há uma rua que começa Nem árvores nem casas existiam antes que tu tivesses palavras e todo eu fosse um coração para elas Invento-te e o céu azula-se sobre esta triste condição de ter de receber dos choupos onde cantam os impossíveis pássaros a nova primavera Tocam sinos e levantam voo todos os cuidados Ó meu amor nem minha mãe tinha assim um regaço como este dia tem E eu chego e sento-me ao lado da primavera

Ruy Belo, in Aquele Grande Rio Eufrates


Que Bem Sabe o Amor Constante Até no carro te canto, Fala a fala, seio a seio, Espantado de um encanto Que mais parece receio

De te perder à partida Pra te ganhar à chegada, Pois tu és a minha vida Na ida e volta arriscada.

Vai o Godinho ao volante Com seu ar de conde antigo Que bem sabe o amor constante Que me aparelha contigo.

Poupado na gasolina, Discreto na confidência, Navegador à bolina Dos rumos da nossa ausência.

Leva-me à Embaixada, ao almoço: Travou, mas não sei que tenho: Um resto de ardor de moço Contigo no meu canhenho.

Vitorino Nemésio, in Caderno de Caligraphia e outros Poemas a

Marga


Dá-me a tua mão Dá-me a tua mão. Deixa que a minha solidão prolongue mais a tua — para aqui os dois de mãos dadas nas noites estreladas, a ver os fantasmas a dançar na lua. Dá-me a tua mão, companheira, até o Abismo da Ternura Derradeira.

José Gomes Ferreira, in Poeta Militante I


Os Namorados Lisboetas Entre o olival e a vinha o Tejo líquido jumento sua solar viola afina a todo o azul do seu comprimento

tendo por lânguida bainha barcaças de bacia larga que possessas de ócio animam o sol a possuí-las de ilharga.

Sua lata de branca tinta vai derramando um vapor precisando a tela marinha debuxada com os lápis de cor

da liberdade de sermos dois a máquina de fazer púrpura que em todas as coisas fermenta seu tácito sumo de uva.

Natália Correia, in O Vinho e a Lira


É por Ti que Vivo Amo o teu túmido candor de astro a tua pura integridade delicada a tua permanente adolescência de segredo a tua fragilidade acesa sempre altiva

Por ti eu sou a leve segurança de um peito que pulsa e canta a sua chama que se levanta e inclina ao teu hálito de pássaro ou à chuva das tuas pétalas de prata

Se guardo algum tesouro não o prendo porque quero oferecer-te a paz de um sonho aberto que dure e flua nas tuas veias lentas e seja um perfume ou um beijo um suspiro solar

Ofereço-te esta frágil flor esta pedra de chuva para que sintas a verde frescura de um pomar de brancas cortesias porque é por ti que vivo é por ti que nasço porque amo o ouro vivo do teu rosto

António Ramos Rosa, in O Teu Rosto


Noite Apressada Era uma noite apressada depois de um dia tão lento. Era uma rosa encarnada aberta nesse momento. Era uma boca fechada sob a mordaça de um lenço. Era afinal quase nada, e tudo parecia imenso!

Imensa, a casa perdida no meio do vendaval; imensa, a linha da vida no seu desenho mortal; imensa, na despedida, a certeza do final.

Era uma haste inclinada sob o capricho do vento. Era a minh'alma, dobrada, dentro do teu pensamento. Era uma igreja assaltada, mas que cheirava a incenso. Era afinal quase nada, e tudo parecia imenso!


Imensa, a luz proibida no centro da catedral; imensa, a voz diluída além do bem e do mal; imensa, por toda a vida, uma descrença total!

David Mourão-Ferreira, in À Guitarra e à Viola


Ilustração do poema

Um Poema Que Se Perdeu Hoje o dia é um dia chuvoso e triste amortalhado Naquela monotonia doente dos grandes dias. Hoje o dia... (a pena caiu-me das mãos) Acabou-se o poema no papel. Cá por dentro Continua... Oh! este marulhar das almas no silêncio!

Fernando Namora, in Relevos



Explicação da ilustração


Conclusão Gostei muito de fazer este trabalho pois adoro poesia, apesar de não a ler muito. O poema que escolhi para ilustrar foi o de Fernando Namora, “Um Poema Que Se Perdeu”, por ser diferente dos outros, fora do comum. Porém o texto de que mais gostei foi o da poetisa Fernanda de Castro, “Distância”.


Webgrafia

→ http://parquedospoetas.cm-oeiras.pt/?page_id=1313 → http://www.citador.pt/poemas/ate-amanha-eugenio-de-andrade → http://www.citador.pt/poemas/fremito-do-meu-corpo-a-procurarteflorbela-de-alma-conceicao-espanca → http://www.citador.pt/poemas/dies-irae-miguel-torga → http://www.citador.pt/poemas/intervalo-fernando-pessoa → http://www.citador.pt/poemas/assim-o-amor-sophia-de-mello-breynerandresen → http://www.citador.pt/poemas/balada-de-lisboa-manuel-de-melo-duartealegre → http://www.citador.pt/poemas/intersonho-mario-de-sacarneiro → http://www.citador.pt/poemas/poema-da-memoria-antonio-gedeao → http://www.citador.pt/poemas/infancia-carlos-de-oliveira → http://www.citador.pt/poemas/os-amantes-de-novembro-alexandreoneill → http://www.citador.pt/poemas/elegia-do-amor-teixeira-de-pascoaes → http://www.citador.pt/poemas/ser-jorge-de-sena → http://www.citador.pt/poemas/nao-sei-se-isto-e-amor-camilo-pessanha → http://www.citador.pt/poemas/poema-do-silencio-jose-regio → http://www.citador.pt/poemas/povoamento-ruy-belo → http://www.citador.pt/poemas/que-bem-sabe-o-amor-constantevitorino-nemesio → http://www.citador.pt/poemas/dame-a-tua-mao-jose-gomes-ferreira → http://www.citador.pt/poemas/os-namorados-lisboetas-natalia-correia → http://www.citador.pt/poemas/e-por-ti-que-vivo-antonio-ramos-rosa → http://www.citador.pt/poemas/noite-apressada-david-mouraoferreira → http://www.citador.pt/poemas/distancia-maria-fernanda-teles-decastro-e-quadros-ferro → http://www.citador.pt/poemas/estrela-da-tarde-jose-carlos-ary-dossantos → http://www.citador.pt/poemas/o-segredo-e-amar-maria-fernanda-telesde-castro-e-quadros-ferro → http://www.citador.pt/poemas/mais-beijos-judith-teixeira → http://www.citador.pt/poemas/um-poema-que-se-perdeu-fernandonamora


Anexos


Intervalo Quem te disse ao ouvido esse segredo Que raras deusas têm escutado — Aquele amor cheio de crença e medo Que é verdadeiro só se é segredado?... Quem te disse tão cedo?

Não fui eu, que te não ousei dizê-lo. Não foi um outro, porque não sabia. Mas quem roçou da testa teu cabelo E te disse ao ouvido o que sentia? Seria alguém, seria?

Ou foi só que o sonhaste e eu te o sonhei? Foi só qualquer ciúme meu de ti Que o supôs dito, porque o não direi, Que o supôs feito, porque o só fingi Em sonhos que nem sei?

Seja o que for, quem foi que levemente, A teu ouvido vagamente atento, Te falou desse amor em mim presente Mas que não passa do meu pensamento Que anseia e que não sente?


Foi um desejo que, sem corpo ou boca, A teus ouvidos de eu sonhar-te disse A frase eterna, imerecida e louca — A que as deusas esperam da ledice Com que o Olimpo se apouca.

Fernando Pessoa, in Cancioneiro


Frémito do Meu Corpo a Procurar-te Frémito do meu corpo a procurar-te, Febre das minhas mãos na tua pele Que cheira a âmbar, a baunilha e a mel, Doído anseio dos meus braços a abraçar-te,

Olhos buscando os teus por toda a parte, Sede de beijos, amargor de fel, Estonteante fome, áspera e cruel, Que nada existe que a mitigue e a farte!

E vejo-te tão longe! Sinto tua alma Junto da minha, uma lagoa calma, A dizer-me, a cantar que não me amas...

E o meu coração que tu não sentes, Vai boiando ao acaso das correntes, Esquife negro sobre um mar de chamas...

Florbela Espanca, in A Mensageira das Violetas


Inter-Sonho Numa incerta melodia Tôda a minh'alma se esconde Reminiscencias de Aonde Perturbam-me em nostalgia...

Manhã d'armas! Manhã d'armas! Romaria! Romaria!

...............

Tacteio... dobro... resvalo...

...............

Princesas de fantasia Desencantam-se das flores...

...............

Que pesadêlo tão bom...

...............

Pressinto um grande intervalo, Deliro todas as côres, Vivo em roxo e morro em som...

Mário de Sá-Carneiro, in Dispersão


Não Sei se Isto é Amor Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar, Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo; E apesar disso, crê! nunca pensei num lar Onde fosses feliz, e eu feliz contigo. Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito. E nunca te escrevi nenhuns versos românticos. Nem depois de acordar te procurei no leito Como a esposa sensual do Cântico dos cânticos. Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo A tua cor sadia, o teu sorriso terno... Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso Que me penetra bem, como este sol de Inverno. Passo contigo a tarde e sempre sem receio Da luz crepuscular, que enerva, que provoca. Eu não demoro a olhar na curva do teu seio Nem me lembrei jamais de te beijar na boca. Eu não sei se é amor. Será talvez começo... Eu não sei que mudança a minha alma pressente... Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço, Que adoecia talvez de te saber doente.

Camilo Pessanha, in Clepsidra


O Segredo é Amar O segredo é amar. Amar a Vida com tudo o que há de bom e mau em nós. Amar a hora breve e apetecida, ouvir os sons em cada voz e ver todos os céus em cada olhar.

Amar por mil razões e sem razão. Amar, só por amar, com os nervos, o sangue, o coração. Viver em cada instante a eternidade e ver, na própria sombra, claridade.

O segredo é amar, mas amar com prazer, sem limites, fronteiras, horizonte. Beber em cada fonte, florir em cada flor, nascer em cada ninho, sorver a terra inteira como o vinho.

Amar o ramo em flor que há-de nascer, de cada obscura, tímida raiz. Amar em cada pedra, em cada ser, S. Francisco de Assis.


Amar o tronco, a folha verde, amar cada alegria, cada mรกgoa, pois um beijo de amor jamais se perde e cedo refloresce em pรฃo, em รกgua!

Fernanda de Castro, in Trinta e Nove Poemas


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