Escola Secundária Artística António Arroio 2010/2011
Luís de Sousa
Disciplina de Português Professora Elisabete Miguel
Sara Sofia Ribeiro Martins 11º N nº20
Índice Acto I
pág.3
Acto II
pág.13
Acto III
pág.17
Pessoas Luís de Sousa Margarida Leonor Doroteia Sofia Médica
Acto Primeiro
Quarto contemporâneo, ornado com todo o luxo, de uma elegância inigualável portuguesa dos princípios do século XXI. Porcelanas, chaise longs1, sedas, plantas robustas incorporadas em grandes jarros, etc. No fundo, três grandes janelas rasgadas, dando para uma varanda que olha sobre o Sado, de onde se vê toda a Arrábida; entre as janelas, uma tela impressa com um retrato de um casal num dos dias mais importantes das suas vidas, ela vestida de branco e ele de preto. De frente, no centro do palco uma poltrona, coberta de rico veludo azul esmeralda; sobre uma mesa de apoio de lado da poltrona, alguns livros de obras célebres, um tabuleiro com um bule e uma chávena de chá, e um pequeno apontamento de vivacidade com uma rosa branca. Alguns móveis antigos, outros modernos, o típico de uma decoração completa do século XXI. Da direita do espectador a porta de comunicação para o interior da casa, à esquerda para o exterior. É no fim da tarde.
1 Também conhecida como “Espreguiçadeiras ou Namoradeiras”, incorpora uma grande variedade de estilos do Renascimento Francês ao Art Deco, do Vitoriano ao Modernismo e também uma grande variedade de materiais – do alumínio ao vime, da seda ao couro
Cena 1 Margarida, só, sentada na poltrona, as pernas cobertas por uma manta de lã pura, um livro aberto no colo, e as mãos caídas uma sobre a outra por cima do livro, como quem entrou em meditação da leitura.
Margarida (repetindo maquinalmente e devagar o que acabara de ler) “Naquele engano d’alma ledo e cego Que a fortuna não deixa durar muito…”2
2 Versos de Os Lusíadas, episódio de Inês de Castro; nos quais se caracteriza o amor como um engano de alma que o destino não deixa durar muito tempo
Cena 2 Margarida, Doroteia
Doroteia (chegando ao pé de Margarida, que não a sentiu entrar) - A minha senhora está a ler? Margarida (despertando) - Ah! Doroteia… Não, já não leio. Há pouca luz de dia e já confundia a vista. É uma grande obra esta, que ainda hoje se estuda nas escolas deste país! Quer levá-la para ler num tempinho que tiver, após as tarefas cá de casa? Doroteia - Se a minha senhora o permitir, terei todo o gosto, que em tempos não lhe dei muita importância e não me apercebi da dimensão desta obra para os meus estudos, nem da sua influência para o meu próprio futuro, que hoje é presente… Margarida - Levai-o, que também tenho aí algumas notas, que retirei em aulas, daquela sábia professora… que poderá observar. Verá que compreenderá melhor o que antes não conseguiu. É sempre tempo de aprender mais… “A melhor maneira de melhorar o padrão de vida está em melhorar o padrão de pensamento”3 Doroteia - Assim o espero, bem preciso de melhorar os meus conhecimentos através dos pensamentos destes grandes homens da nossa história! Margarida (esboçando um sorriso) - Agora vá preparar o jantar e veja se meu marido já chegou da empresa!
3 Frase Andersen
de
Uell
Stanley
Cena 3 Margarida, Leonor
Leonor (entrando com uns desenhos na mão, encontra-se com Doroteia, que mais tarde a vai fazer voltar a cena) - Mamã, olha os desenhos que eu fiz! Tu és a rainha, o pai o rei, eu a princesa e o mano, que daqui a uns tempos vou ter… o bebé! Margarida (pegando nos desenhos e beijando a filha na testa) - Que lindos desenhos, filha! Que bonitas que nós estamos! Leonor - Mamã, pedi à Doroteia para hoje fazer a minha comida preferida. Ela disse que daqui a nada vinha cá perguntar-te se podia ser. Sabes, ela levava um livro na mão e ia toda sorridente para o quarto. Margarida (sentada na poltrona, esboçando um sorriso, coloca a filha sobre o colo) - Sei, minha princesinha. Foi a mamã que lho emprestou para ela ler. Leonor - Deste-lhe mais um conto de fadas para ela me ler à noite, antes de adormecer? Margarida - Não meu amor, é um livro para crescidos. Leonor - Oh, não posso vê-lo?
Margarida - Podes Nônor4, daqui a uns anos, quando já souberes ler, depois vês.
Cena 4 Margarida, Leonor, Doroteia
Doroteia (que entra, acelerada, no entanto mantendo o sorriso como quem ainda não esqueceu o que lhe acabara de acontecer) - Senhora, senhora… o Sr. Luís avisou que ia chegar mais tarde. Disse também para assim que o jantar estiver pronto começarem a comer, para não esperarem por ele. Margarida (sussurrando) - É sempre a mesma coisa, desde que anda com aquelas manias de falar com a “amiguinha”, esquece-se de tudo, nunca está a horas! Doroteia - Por falar em jantar, a menina Leonor pediu-me para fazer o seu prato preferido, dá-me licença senhora? Margarida (responde baixinho, como quem está com outro pensamento em mente) - Sim, pode… Doroteia (com olhos esbugalhados de quem reconhece todo aquele ciúme, sai da sala devagarinho, sempre de olhos postos em Margarida) - Então, vou adiantando o jantar, minha senhora!
4 Abreviatura do nome Leonor
Margarida (Com olhos postos na foto do dia do casamento e pegando nos desenhos que a filha fizera durante a tarde) - Vá, vá… Leonor (olhando admiradamente para a mãe com um tom de preocupação) - Mamã, estás triste? Querias que te tivesse feito o vestido maior como o que tens ali na foto com o papá? Margarida (como quem cai em si) - Não meu anjo, o teu desenho está lindíssimo! A mãe gosta de tudo! (Leonor sorri, dá a mão à mãe e vão andando para a sala de jantar)
Cena 5 Margarida, Leonor, Doroteia
Margarida (puxando uma cadeira para sentar a filha e colocando por cima uma almofada) - Nônor, senta-te para começarmos a comer! Doroteia - Posso começar a servir, minha senhora? Margarida (sentando-se e colocando o guardanapo por cima das suas pernas) - Pode sim, Doroteia! Leonor - Mamã, não dizes nada?
Margarida - Filha, a mãe já te disse que à mesa não se fala! Leonor - Oh! ...mas isso é quando estão cá os vossos amigos importantes! Margarida (esboça um pequeno sorriso) - Tens razão filhota, mas a mamã já estava com fome. Queres falar sobre o quê? Leonor - Não sei! Só te quero feliz! Margarida (sorri para a filha e continua a jantar)
Cena 6 Margarida, Leonor, Doroteia, Luís de Sousa
Doroteia (abre a porta, após o som da campainha) Luís de Sousa (posando as suas pastas e retirando o casaco) - Boa noite, minhas princesinhas! Leonor (a correr para o colo do pai e dando-lhe um beijinho na face) - Papá! Hoje a Doroteia fez a minha comida preferida! Luís de Sousa (sentando-se à mesa) - Uhm, que bom!
Margarida - Então o que é que se passou hoje? Luís de Sousa - Distraí-me nas horas, fiquei algum tempo a falar com a Sofia. Ela anda um pouco triste por não ter ninguém ao lado dela, a fazer-lhe companhia. Margarida - Para não variar! Luís de Sousa - Eu já te disse que ela é só minha amiga. Preocupo-me com ela. Já a conheço há mais anos até do que a ti! Margarida (murmurando) - Pois, já sei! Leonor (puxando os desenhos do lado da mesa onde está Margarida) - Papá, olha o desenho que eu fiz hoje à tarde! Luís de Sousa - Está muito bonito! Margarida (olhando para Leonor, sorri) Luís de Sousa (falando baixinho, como que em segredo para Margarida) - Vês, é por isto que a Sofia anda triste, porque não tem um príncipe para lhe dar também um conto de fadas, com uma família. Margarida - Eu sei, … mas ela tem tempo para o arranjar, … ela é bem bonita, tem é de ter calma e dar tempo ao tempo... Tu é que escusavas de te preocupar tanto com ela!
Frei Luís - Estamos sempre a falar no mesmo! Margarida (revirando os olhos para baixo) - Desculpa! Não te queria chatear! Leonor - Mamã, já contaste ao pai a notícia do mano? Margarida - Ah! Não! É verdade, … esta manhã fui a uma consulta e a médica diz que o parto está para breve! Frei Luís - Então vamos ter um menino cá em casa, muito em breve! Leonor (sorri)
Acto Segundo
É no hall de entrada da casa dos Sousa, na Arrábida; divisão contemporânea, no entanto com um ar mais pesado, repuxando os tons escuros do vermelho com toques de preto, com grandes retratos de família e de amigos. Portas do lado direito para o exterior, do esquerdo para o interior, cobertas por uma moldura de preto. Na mesa de apoio, na entrada da mansão, vários objectos. Uma rosa de tom vermelho claro, quase corde-rosa bebé, com uns veios avermelhados, sobre os documentos de saúde, pastas e uma fotografia de casamento.
Cena 1 Margarida, Doroteia
Margarida (apresada, contraída com dores, retirando as chaves e os documentos) - Doroteia, sabe onde foi o Sr. Luís? Doroteia (que vinha da cozinha com um avental) - Ah senhora! Vai ter a criança? Já lhe rebentaram as águas?... Está com uma cara de quem passou mal a noite! O Sr. Luís saiu ainda de madrugada, penso que foi ter com a sua amiga… a Sofia, que pelos vistos passou a noite toda a chorar! Margarida - Oh… sim… estou a ver!... Creio que não tardará muito para ter o menino, vou andando para o hospital. Peço-lhe que tome conta da Leonor, que ainda dorme e assim que puder ligue ao Sr. Luís e diga-lhe que fui para a maternidade. Doroteia (com um ar desconsolado de quem não pode acompanhar a sua senhora por ter deveres a fazer em casa) - Esteja descansada, minha senhora! Assim que a menina Leonor acorde e tome o pequeno-almoço irei ter consigo à maternidade; e agora vou já ligar ao Sr. Luís. Não se preocupe! Margarida - Obrigada, Doroteia!
Cena 2 Margarida, Leonor
Margarida (regressa ao quarto onde a filha dorme profundamente e beija-lhe a testa) Leonor (acorda) - Mamã, … vais onde? ... Margarida (disfarçando as dores para que a filha não se aperceba) - Desculpa filha a mãe não te queria acordar! A mamã vai agora ao médico! Hoje se calhar já temos o maninho! Leonor - Boa, mamã! Margarida - Agora dorme mais um bocadinho, minha princesinha, para depois teres forças para brincar com o maninho! Leonor - Está bem, mamã. Gosto muito, muito, muito de ti. Até logo! Margarida - A mãe também gosta muito de ti, meu anjo! (Leonor adormece, como quem mal tinha acordado do sono. Margarida beija-lhe novamente a testa e sai)
Acto Terceiro
Parte baixa da maternidade, é um espaço vasto, sem ornato algum. Arrumados às paredes somente alguns produtos medicinais, alguns recantos com salas de parto, e um balcão na recepção onde há somente um jarro com uma rosa vermelha. É já alta noite!
Cena 1 Margarida, Médica
Margarida (que esteve em trabalho de parto desde manhã, com cada vez mais, mais contracções, já deitada numa maca de parto) - Acha que ainda vai demorar muito, doutora? Médica - Não sei, você parece-me bastante nervosa, tente descontrair-se um pouco. Margarida - Pode chamar-me a minha empregada, a Doroteia, se me fizer favor? Médica - Vou já passar o pedido ao balcão.
Cena 2 Margarida, Doroteia Margarida - Como está a Leonor? Doroteia - Está bem minha senhora, …não se preocupe! Está toda entusiasmada com a ideia de ter um irmão! Margarida (apesar das contracções, faz um sorriso) - Ainda bem! E o Sr. Luís? Ainda não chegou?
Doroteia (gaguejando) - O Sr. Luís… ligou-me há pouco. Disse que… houve um problema urgente a resolver na empresa e teve de regressar. Margarida - Diga-me a verdade, Doroteia! Eu já sei que você só vacila nas suas respostas quando está a mentir! Foi ter com a menina Sofia? Doroteia - Oh minha senhora, não a quis preocupar, porque não há motivo para tal, e já sei como reage aos seus ciúmes! Margarida (contraindo-se mais, após uma grande dor) - Com que então era verdade! Nem no dia do nascimento do filho é capaz de trocar as choradeiras dela pela sua própria família! Chame o meu anjo pequenino que quero aproveitar agora que as contracções pararam para ainda lhe dar um beijo antes do irmão nascer!
Cena 3 Margarida, Doroteia, Leonor (Doroteia entra com Leonor ao colo que traz uma rosa vermelha) Leonor (esticando o braço para dar a rosa à mãe) - Toma, mãe, é como as tuas lá de casa de que tanto gostas. Eu também gosto muito de ti!
Margarida (sorrindo) - Que bonita que é minha filha, obrigada! Dás sempre as melhores prendas do mundo à mamã! Leonor - Tu hoje também me vais dar a melhor prenda do mundo! Vais dar-me um mano para brincar comigo quando não tens tempo! Doroteia (sorrindo, dizendo baixinho) - A ternura desta criança! Tão pequenina e tão querida e preocupada com sua mãe! Margarida (tentando disfarçar recomeçavam a aparecer)
as
dores
que
- Minha princesinha, agora tens de ir lá para fora com a Doroteia, senão a médica zanga-se… que daqui a nada ela vem aí! Leonor (inclinando-se para dar um beijo à mãe) - Está bem, mãe! Diz ao mano para não demorar muito a vir que eu quero estar contigo! (ambas sorriem e abraçam-se)
Cena 4 Margarida, Médica (Margarida com contracções dá à luz o seu filho. A médica de seguida coloca-o no peito de Margarida. Esta sorri ao olhar para o filho, que por sua vez olhava fixamente a rosa vermelha.) Margarida (Beija o filho pela primeira vez) - É linda, não é? Vais ter uma mana muito querida, que vai cuidar maravilhosamente de ti!
Médica (retirando o bebé do seio de Margarida) - Você perdeu demasiado sangue! (Nesse momento, Margarida muito zonza olha para a fotografia do seu casamento, que tinha trazido junto com os documentos que tinha ao seu lado, meio desfalecida, pega nela, olha-a, deixa-a cair logo de imediato. Morre.)
Cena 5 Margarida, Luís de Sousa
Luís de Sousa (entra apressado e depara-se com a esposa morta e a fotografia no chão caída, pega na fotografia e observa-a…começa a chorar) - Pobre Margarida, tu que és minha esposa não me tiveste aqui. Andava eu preocupado com um conto de fadas que Sofia não vivera e esqueci-me de dar maior importância ao teu, … ao nosso, … desculpa-me, …se ainda puderes! … És tu o meu amor…só tu… Vou amar-te sempre!
Cena 6 Luís de Sousa, Leonor, Doroteia
(Luís de Sousa entra com a filha pela mão, todos ficam especados a olhar para a criança. Doroteia olha para todos os lados e não vê Margarida, observa bem Luís de Sousa, que tem os olhos cheios de um brilho que não era o de felicidade. Volta a olha para Leonor, e cai de joelhos no chão)