4 minute read
Novos comunicados: a dissolução
Lamarca não voltaria a responder e esclarecer os pontos considerados pouco políticos na sua carta. Mesmo que não tenha havido a formalização, a VPR concordou em transferi-lo ao MR-8, o que naquele momento foi um alívio para os problemas concretos da organização. Alfredo Sirkis relata em suas memórias que permaneceu na organização até conseguir fazer essa transferência de Lamarca e Iara para “a kombi do MR8”, que faria o transporte para sua nova e triste fase, no sertão da Bahia.
Novos comunicados: a dissolução
O Centro de Inteligência do Exército dá conta de um estouro de aparelho realizado na Guanabara onde teriam sido encontrados dois documentos, datados de 7/8/1971, “que esclarecem a situação da Organização no País”. O CISA faz um resumo do Comunicado n.1:
O Comando só existe efetivamente no BRASIL; O novo comando assume a O. praticamente extinta e vai tentar salvar o que sobrou; exige-se que todos os militantes obedeçam ao centralismo e que mantenham a frieza diante da situação caótica.18
Já sobre o Comunicado n.2, apresenta-se uma autocrítica:
Os últimos acontecimentos provaram com sangue e fogo a inviabilidade dos grupos armados tais quais se encontram atualmente... Para isto, o comando [de]termina de forma imediata: a) a Organização está desmobilizada; b) Está convocado o II Congresso Nacional - Por desmobilização entendemos: a) suspensão de ações armadas; b) suspensão de reuniões com condições de segurança precárias; c) redução ao mínimo indispensável da circulação dos militantes; d) estabelecimento de contatos de frente apenas para encaminhamentos urgentes e comunicações; e) comunicação imediata às outras organizações da atual perspectiva política da VPR. Isto é, que a Organização está politicamente extinta no Brasil e que estamos desmobilizados definitivamente.
18 Informação n. 285/71/B2/ID-4. Situação da VPR. CIR – I Ex. 4º RN, 15/10/1971, Arquivo Nacional BRDFAN, BSB ZD.1C.6, p.1/2.
f) criar excepcionais condições de segurança para todos os quadros queimados.19
O documento traz uma síntese dos problemas que os militantes estavam vivenciando, e é expressão dos elementos presentes no documento de Herbert Daniel:
Por se atrasar na adoção desta perspectiva hoje, quando a adotamos, reconhecemos claramente a extinção total da Organização, tal como a conhecíamos no BRASIL. A O. vai tentar se remontar com os recursos que conta em todo o mundo e vai ser um trabalho árduo e demorado. E por fim, indica a formação de um novo comando: 4. O ‘NOVO COMANDO’, após a morte de JOSÉ RAIMUNDO DA COSTA (‘MOISÉS”). (‘CARLOS”) e a queda de ZENAIDE MACHADO (“RAQUEL NÚRIA) deve ser, provavelmente, constituído de HERBERT EUSTÁQUIO DE CARVALHO (“EXEQUIEL”, “DAVID”) e TEREZA ANGELO (“CHICA”, “HERGA”)20
A avaliação que a repressão faz dessas informações é de que a VPR iria se reordenar, seja no Chile ou em Cuba. O documento segue dizendo que “desses documentos, podem ser levantadas várias hipóteses relativas às medidas que serão adotadas”, e expõe:
Realização do II Congresso Nacional no exterior. Essa medida satisfaria às condições atuais de segurança e permitiria a participação dos banidos e exilados. Retorno de quadros que encontram no exterior (CUBA e CHILE), a fim de preencher, pelo menos em parte, os claros abertos pelos últimos quadros. Retorno de elementos de cúpula, que se encontram em CUBA, a fim de assumirem o Comando da O. CHIZUO OZAWA, ONOFRE PINTO e DIÓGENES JOSE CARVALHO DE OLIVEIRA parecem ser os elementos mais indicados para esta missão. Fuga dos quadros restantes para o Chile e outros países Absorção dos quadros restantes por outra organização
19 Idem, Comunicado n.2. 20 Idem.
Nesse caso, a hipótese mais viável é que essa organização seja a ALN.21
Em anexo seguem os próprios comunicados, que conferem com a síntese. Expressam a posição do grupo que acabaria se mantendo na VPR no Brasil, com fins de acabar com a organização. O Comunicado n.3 se destina “aos companheiros da VPR no Exterior”:
A Organização no Brasil chegou agora ao esgotamento total. Estamos sem as mínimas condições de atuação e sem possibilidades por mais remotas de tirar uma definição consequente, que sirva de guia para uma prática revolucionária. Lentamente a O, foi sendo destruída, não restando senão alguns quadros, muito poucos, que não tem a mínima segurança e dos quais a ínfima minoria tem uma experiência maior. A crise política da O. que se seguiu a ação do embaixador suíço levou a uma aguda crise no Comando em abril/maio deste ano, tendo como consequência o desligamento inusitado dos companheiros do CN. Um destes companheiros caiu a 5 de maio, outro pediu ingresso numa outra Organização, a VPR não consegue discutir suficientemente com tal companheiro para entende a posição por ele assumida.22
A morte de Moisés e a saída de Lamarca deixam a organização, de fato, com reduzidas possibilidades de ação. A estratégia imaginada de que os militantes que estavam no exterior voltassem ao Brasil para seguir a luta era cada vez mais irreal. Apenas alguns poucos tentariam tal ousadia, animados pela fidelidade, cairiam, vítimas de profunda traição, pois a infiltração estava presente. Portanto, a estratégia de retirar militantes via sequestros mostrou seu peso. Sendo a ação de um único grupo, não conseguiu somar as lutas dos que ainda resistiam. Salvaram-se vidas, mas acabou a revolução a qual acreditavam estar em curso. E aqueles que se reuniam no Chile, viviam outro contexto. O Comunicado informa ainda que mesmo o Comando Provisório criado se desmanchou, pois em 12 de maio caíram 2 membros. O Comando da Guanabara perdeu quase todos os seus membros, sendo que em SP, que estava em compasso de espera, ficou igualmente desfocado. Os compa-
21 Idem. 22 Comunicado n. 3. Aos companheiros no exterior. Arquivo Nacional. 2D.2c.100P4.