31 minute read

AO LEITOR

Next Article
ÍNDICE DE LUGARES

ÍNDICE DE LUGARES

Após o falecimento de Plinio Corrêa de Oliveira, em 1995, seus aniversários têm sido ocasião para a publicação, pela Editora Artpress, de diversos livros que dão a conhecer ao público aspectos pouco conhecidos de sua personalidade e de sua obra. Em outubro de 2005, no 10° aniversário de seu passamento, veio à luz a obra Plinio Corrêa de Oliveira, dez anos depois, contendo relatos e resenhas escritos por 17 personalidades que tinham privado com Dr. Plinio – como seu primo Dr. Adolpho Lindenberg, o Príncipe Dom Luiz de Orleans e Bragança, ou seu secretário, Sr. Fernando Antúnez – ou que tinham podido apreciar à distância a repercussão de sua ação contra-revolucionária – como o Prof. Roberto de Mattei, o Conde de Proença-a-Velha, o embaixador Armando Valladares, o Sr. Morton Blackwell ou o recentemente falecido líder católico italiano Giovanni Cantoni1 . Em dezembro de 2008, por ocasião do 100° aniversário de seu nascimento, foi publicado o livro A Inocência primeva e a contemplação sacral do universo no pensamento de Plinio Corrêa de Oliveira, contendo uma coletânea de textos inéditos, de caráter filosófico e psicológico, que desvendam a matriz de sua obra intelectual e o mostram como um grande contemplativo. O 20° aniversário de sua morte foi ocasião para o lançamento, em outubro de 2015, do denso trabalho “Minha Vida Pública – Compilação de relatos autobiográficos de Plinio Corrêa de Oliveira”. Como o título o indica, a obra relata o bom combate travado ao longo de setenta anos em prol da causa da Igreja e da civilização cristã pelo grande homem de ação que foi ele, a ponto de ser merecidamente galardoado por dois professores universitários, em obras escritas a seu respeito, com o título de “Cruzado do Século XX”2, e por outro como o “Arauto da Contra-Revolução”3 .

1 Além das pessoas citadas, escreveram artigos o Pe. David Francisquini e os Srs. Mario

Navarro da Costa, Leo Daniele, Alejandro Ezcurra, Carlos Schaffer, John Horvat, Benoît

Bemelmans, Antanas Racas, Bett Decker e Jacek Bartyzel. 2 ROBERTO DE MATTEI, “O Cruzado do século XX”, com prefácio do Cardeal Alfons

Maria STICKLER S.D.B., Livraria Civilização Editora, Porto 1997. LIZANIAS DE

SOUZA LIMA, “Plinio Corrêa de Oliveira. Um cruzado do século XX, Universidade de São Paulo, 1984 3 LUÍS FELIPE LOUREIRO FORESTI , “O Arauto da Contra-Revolução: O pensamento conservador de Plinio Corrêa de Oliveira” (1968 – 1976), Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, 2013

A excelente acolhida que tiveram esses empreendimentos editoriais, assim como o crescente interesse pela personalidade de Plinio Corrêa de Oliveira despertado por elas, levou a alguns leitores a solicitar a elaboração de um trabalho, nos moldes dos precedentes, que expusesse sua vida espiritual. A proximidade do 25° aniversário do chamado de Deus a esse grandíssimo devoto de Nossa Senhora servia-lhes de grande argumento para insistir nessa publicação. Numa primeira abordagem, tal empreitada pareceu quase impossível de ser assumida, e isso por vários motivos. O primeiro deles é que todo homem tem uma grande parte de mistério, até para seus mais íntimos; e isso não somente do ponto de vista natural – quem pode discernir os refolhos mais recônditos da psicologia de uma pessoa? – mas também do ponto de vista sobrenatural, posto que mais misteriosas ainda são as relações de uma alma humana com Deus – ao ponto de dar fundamento ao adágio “de internis nec Ecclesia judicat”. Se isso é válido para os homens comuns – muitos dos quais são “almas sem reservas nem nobreza, abertas a todos os ventos, a todos os olhares, a todos os passos, como uma vulgar praça pública”4 – quanto mais é verdadeiro para os homens fora do comum, para não dizer extraordinários, cuja alma é como uma montanha tão alta que o seu cimo se perde atrás das nuvens! No caso específico de Plinio Corrêa de Oliveira, esse lado misterioso de todo homem era reforçado pelo fato de ele ser, pelo lado materno, profundamente paulista e, pelo lado paterno, profundamente pernambucano. E, apesar de sua loquacidade nordestina, herdada de seu pai, ele considerava muito aquela forma de solenidade que caracterizava as famílias tradicionais de São Paulo e Recife. Traço psicológico esse que nele era acrescido do fato de que se formou numa época em que todo homem que se prezava tinha de ter uma nota de senhorio, o que comportava, por sua vez, saber colocar distância com os interlocutores5. Tanto mais quanto, naqueles idos do início do último século (que não conheciam Twitter, Facebook nem Instagram) levantava-se uma barreira infranqueável entre a vida pública e a vida privada das pessoas, esta última ficando em uma área acessível apenas aos mais íntimos. O mais difícil, sem dúvida, era o fato de que, após a leitura de “A alma de todo apostolado” de Dom Chautard6, Dr. Plinio tinha feito um esforço

4 “Pater non mea voluntas, sed tua fiat”, “Catolicismo”, n° 40, abril de 1954 5 Ver “Meu primo Plinio – Aportes biográficos de Adolpho Lindenberg”. 6 Livro de autoria de Dom Jean-Baptiste Chautard (1858-1935), sacerdote e religioso na

Abadia de Aiguebelle, da Ordem de Cister, e mais tarde Abade da Trapa de Sept-Fons (França). A obra tem como pressuposto o princípio de que a ação apostólica nasce do

especial para combater toda forma de vaidade, de onde uma tendência a não falar de si mesmo, nem de suas obras, e de ser muito reservado quando era forçado a fazê-lo, minimizando seu significado ou dimensão. Dessa maneira, pode-se dizer que, por mais de duas décadas, o mundo interior de Plinio Corrêa de Oliveira permaneceu praticamente desconhecido para aqueles que constituíram o primeiro círculo de seus discípulos e que são conhecidos internamente como o “grupo da Pará”7 (com a exceção, relativa, de seu primo Adolpho Lindenberg, por razões fáceis de intuir). Várias circunstâncias, porém, o obrigaram, ao longo de sua vida, a sair dessa reserva que se tinha imposto – e são elas que permitem hoje apresentar aos leitores este trabalho. O primeiro fator que levou Plinio Corrêa de Oliveira a falar de si mesmo foi a necessidade de formar no espírito contra-revolucionário aqueles que integraram o círculo dos discípulos remanescentes daquele primeiro grupo. Posto que as duas Guerras Mundiais haviam derrubado a sociedade tradicional, não era suficiente ensinar a esses novatos os princípios teóricos da doutrina católica e da doutrina gnóstica da Revolução, mas era necessário descrever como tais princípios eram vividos pelos indivíduos e pelas sociedades e por que mecanismos psicológicos eles tinham passado do campo das tendências profundas para aquele das ideias e dessas para os fatos. O que impunha a Dr. Plinio, para melhor se fazer entender, utilizar das descrições de pessoas e de ambientes culturais onde se tinha dado tal embate entre a sociedade tradicional europeizada e a nova sociedade segundo o modelo de Hollywood. Obviamente que, tendo sido catedrático de História, ele se servia de muitos exemplos históricos para descrever as personalidades, os ambientes e as instituições até o fim do século XIX. Mas, quando se tratava de descrever as mudanças havidas no próprio século XX, era forçado a recorrer às suas próprias recordações, nas quais, necessariamente, ocupavam o primeiro lugar sua família, seus círculos sociais e os ambientes que ele tinha frequentado. E como ele mesmo tinha sido frequentemente protagonista dos casos que ele contava, isso redundava não poucas vezes em breves alusões às suas próprias reações interiores, as quais desvendavam ou faziam sair da penumbra alguns cantos de sua alma até então pouco conhecidos ou de todo em todo desconhecidos. Outro fator que forçou Plinio Corrêa de Oliveira a sair da reserva a respeito de si mesmo foi a mudança havida na psicologia da geração

transbordamento de uma intensa vida interior, sem a qual qualquer obra de apostolado é estéril e até contraproducente. 7 Ver “Minha Vida Pública”, Parte V, c. XIII, “Estruturação e consolidação do pequeno grupo”, p. 316 e ss.

que chegou à idade adulta após a Segunda Guerra Mundial, mudança que se acentuou ainda mais nas gerações posteriores. Se até 1945 a atenção das pessoas voltava-se preponderantemente para o que acontecia fora delas, focalizando os acontecimentos externos de ordem político-social ou religioso, a partir dos anos 1950 o interesse da geração rock‘n roll foi se centrando cada vez mais nos próprios problemas interiores e nos tipos humanos que essa geração poderia imitar (as correntes de esquerda também foram afetadas por esse fenômeno, com o aparecimento de novos militantes desinteressados pela ortodoxia marxista de cunho econômico e focalizados na liberação sexual e temas conexos). Dr. Plinio percebia que os auditórios ou círculos aos quais se dirigia eram cada vez mais apetentes de exposições pondo em foco a dimensão psicológica do confronto entre a Revolução e a Contra-Revolução e os respectivos tipos humanos. Naquela época, tal confronto exprimia-se na opção entre ser um varão católico ou um hippie,o que importava em dar maior atenção às questões de vida espiritual. Sendo visto ele próprio pelos seus ouvintes como um modelo de contra-revolucionário, pouco a pouco foi aumentando o número de perguntas envolvendo sua própria pessoa: como ele via as coisas, como reagia diante das situações, quais eram suas preferências pessoais em tais e tais áreas, como se tinha formado sua mentalidade etc.8 Vendo que esse interesse não era fruto de uma curiosidade frívola ou malsã, mas tinha como fundamento último a procura de um modelo espiritual, e notando que seus relatos despertavam nos jovens auditores desejos de aperfeiçoamento espiritual e de maior dedicação à causa da Contra-Revolução, Plinio Corrêa de Oliveira considerou seu dever entreabrir para eles o “horto fechado” de seu mundo interior e do trabalho que a graça tinha desenvolvido na sua alma. Na última década de sua vida, ele teve até que submeter-se, nas reuniões com os juveníssimos, ao exercício dos “fatinhos”: terminada sua exposição sobre um tema geral, pediam para ele relatar algum episódio de sua vida. Em geral, uma pessoa mais antiga na TFP que estivesse ali

8 Por vezes, Dr. Plinio era obrigado a fazê-lo simplesmente para conservar a atenção dos circunstantes: “Na geração da maior parte dos senhores e nas gerações anteriores, fixou-se o princípio de que sempre que a atenção se detém longamente num assunto, isso gera tédio. E a necessidade de variar, variar, variar, tornou-se um vício. Eu não posso corrigir esse vício agarrando as pessoas, metendo um joelho no peito e obrigando a prestar atenção. E, portanto, preciso entrar numa espécie de combinação com o tédio, de maneira a mudar de assunto tão logo o tédio se apresenta. Quase que minhas reuniões são duelos – às vezes bem sucedidos, muitas vezes mal sucedidos – contra o tédio. Dou um fatinho, conto uma coisa, mudo um pouco de tema etc., para ver se eu ventilo o tédio, para voltar depois ao assunto a respeito do qual acho necessário tratar” (SD 31/10/79).

presente sugeria algum aspecto de sua vida ou de sua alma relacionados com o que tinha sido tratado9 . Finalmente, uma consideração de ordem teológica levou Dr. Plinio a contrariar a tendência natural de sua geração a não franquear o interior da alma a pessoas alheias ao círculo dos mais íntimos. Tendo a Revolução se desenvolvido prioritariamente na esfera temporal – no campo artístico, com a Renascença; no campo sofístico com o Iluminismo; no campo político com a Revolução Francesa; no campo econômico e social com o Comunismo, reciclado em Revolução cultural e ecológica a partir de Maio de 1968 – com a única exceção do Protestantismo (que, aliás, foi uma derrota, na medida em que a Contra-Reforma e o Concílio de Trento revigoraram o catolicismo), ele desenvolveu organicamente, como antídoto à Revolução, uma espiritualidade que pôs em relevo o papel da criação natural e da sociedade humana para o conhecimento de Deus e a reta formação das almas. Com a preocupação de preservar o espírito de seus discípulos de qualquer influência revolucionária, e de formá-los para que pudessem ser eficazes instrumentos da Contra-Revolução na esfera temporal, Plinio Corrêa de Oliveira acabou por transformar-se, sem nenhum intuito prévio nesse sentido, no fundador e no guia espiritual de uma nova espiritualidade, e de uma família de almas congregada, como uma estirpe, em torno dela. Uma espiritualidade que põe em relevo os aspectos temporais e metafísicos da realidade como trampolim para subir até Deus. Em sua obra “O Cruzado do século XX”, publicada pouco depois do falecimento de Dr. Plinio, o historiador Roberto de Mattei já comentava que “não se pode negar a Plinio Corrêa de Oliveira as características de um fundador. Fundador, não porque quis impor-se neste papel, mas porque assim o veem espontaneamente milhares de católicos em todo o mundo. Fundador em sentido lato, não tanto de uma ordem específica como, mais amplamente, de uma escola espiritual e intelectual e de um estilo de vida de luta aberta contra a Revolução”, escola espiritual esta que “se caracterizou, de maneira cada vez mais profunda, como uma ‘família de almas’ não isenta de analogias com uma ‘família religiosa’”. O conhecido historiador fundamenta essa asserção no verbete “Fundadores” do Pe. Michel Olphé-Galliard S.J. do “Dictionnaire de spiritualité” que afirma o seguinte: “Tenham sido canonizados ou não, os fundadores são os portadores de um carisma que os habilita a suscitar uma família espiritual destinada

9 Salvo uma pesquisa mais aprofundada, o mais antigo pedido nesse sentido, registrado nos arquivos, data do SD de 14/02/81.

a perpetuar a seiva da sua própria santidade. A autenticidade desta última reconhece-se, quer pela fecundidade da sua fundação, quer pelo exemplo da sua experiência pessoal. [...] A imitação do fundador nada tem a ver com o culto da personalidade que certas ideologias modernas adotam. Ela provém do princípio de mediação segundo o qual toda a paternidade vem de Deus (Ef 3,5).”10 Conta-se do humilíssimo São Francisco de Assis que, um dia em que se esquentava junto com seus frades em torno do fogo, um noviço picado pela mosca da ciência livresca pediu-lhe licença para possuir um exemplar dos Salmos de Davi. O santo respondeu: “Querido filho, se hoje você possui uma Salmódia, amanhã quererás possuir um breviário”. E, tomado de uma paixão ardente, pegou cinzas nas suas mãos e, esfregando-as na cabeça do noviço letrado como se a lavasse, repetia enfaticamente: “Eu é quem sou teu breviário, eu é quem sou teu breviário!”11 Outro exemplo eloquente foi-nos fornecido por São Pedro Julião Eymard, o fundador dos Sacramentinos, que chegou a queixar-se diante de seus filhos espirituais: “Não compreendeis o favor, a graça que o Senhor vos faz ao colocá-los junto da própria nascente do Instituto. Não me perguntais nada, não vos valeis disso. Eu também sou mortal, e quando não estiver mais aqui, nenhum outro terá as graças do fundador”12 . Ciente de sua paternidade espiritual, também Plinio Corrêa de Oliveira sentiu-se na necessidade de desvendar as graças sobrenaturais que tinha recebido ao longo de sua vida (assim como as provações que as tinham motivado, na maioria dos casos) para que seus discípulos pudessem compreender e haurir o carisma fundacional que a Providência lhe tinha concedido, fazendo dele um paladino da Contra-Revolução. Disso tudo resultou que, nas milhares de páginas extraídas das gravações de reuniões e conversas, há uma quantidade ponderável de textos que abordam, às vezes circunstanciadamente, às vezes somente de passagem, o interior da alma de Plinio Corrêa de Oliveira, fornecendo elementos que ajudam a construir o grande edifício de sua espiritualidade e de sua trajetória espiritual. Esse acervo permitia, então, assumir a empreitada solicitada pelos leitores dos volumes precedentes.

10 Colunas 102-103. 11 Johannes Joergenssen, “Saint François d’Assise, sa vie et son oeuvre”, Ed. Perrin, Paris, 1920, p. 346. 12 Francis Trochu, “Le Bienhereux Pierre-Julien Eymard, d’après ses écrits, son Procès de béatification et de nombreux documents inédits”, Librairie Catholique Emmanuel

Vitte, Paris, 1949.

Mas apareceu o problema oposto: não tendo Dr. Plinio apresentado uma síntese geral de sua vida espiritual, como fazer a seleção e em que ordem apresentá-la, de modo a fornecer aos leitores que não o conheceram uma ideia global e objetiva de sua espiritualidade, posto que ela se manifestava tão profunda, variada e rica em aspectos até mesmo harmonicamente opostos? Pareceu que o melhor seria buscar inspiração nos manuais tradicionais de vida espiritual13, à procura de uma “grelha de interpretação” adequada. Essa intuição foi boa. Mas para que o resultado seja compreendido pelos leitores, torna-se necessário fornecer um breve sumário desses manuais.

A santidade consiste na perfeição da caridade, ou seja, no amor a Deus e no amor ao próximo que dele decorre. Ela pode encontrar-se em três graus fundamentais: incipiente, proficiente e perfeito14, o que supõe, naturalmente, um desenvolvimento da vida espiritual, uma trajetória. Daí o título que foi dado a esta obra: “A minha trajetória espiritual”. “Em toda vida”, ensina Tanquerey, “há um tríplice elemento: um princípio vital, que é por assim dizer a fonte da vida; algumas faculdades que permitem produzir atos vitais; e, por fim, os atos que são seu desenvolvimento e contribuem para seu crescimento. Na ordem sobrenatural, ao viver Deus em nós, Ele produz em nossas almas esses três elementos. Primeiro, Ele nos comunica a graça habitual, que desempenha em nosso interior o papel de princípio vital sobrenatural, como que divinizando a própria substância de nossa alma e tornando-a capaz, ainda que de maneira longínqua, à visão beatífica e aos atos que a preparam. Desta graça, decorrem as virtudes infusas e os dons do Espírito Santo que aperfeiçoam nossas faculdades e nos dão o poder imediato de fazer atos deiformes, sobrenaturais e meritórios. Para pôr em marcha essas faculdades, Deus nos concede graças atuais que iluminam nossa inteligência, fortalecem nossa vontade, nos ajudam a agir de maneira sobrenatural e a aumentar dessa maneira o capital de graça habitual que nos foi outorgada”.

13 Dois manuais serviram especialmente para isso: o famoso “Compêndio de Teologia

Ascética e Mística” do Pe. Adolphe Tanquerey PSS e “Teologia da Perfección Cristiana” do Pe. Antonio Royo Marín OP. Ambos autores têm a vantagem de fundarem sua teologia espiritual em Santo Tomás de Aquino. 14 “Caritas cum fuerit nata, nutritur; cum fuerit nutrita, roboratur; cum fuerit roborata, perfecitur”, diz Santo Agostinho, assim glosado por Santo Tomás na “Summa”: “A caridade, uma vez nascida, cresce, o que é próprio dos incipientes; uma vez crescida, fortifica-se, o que é próprio dos que progridem; uma vez fortificada, aperfeiçoa-se, o que é próprio dos perfeitos. Logo, há três graus de caridade” (II-II, art. 24, 9).

Se tal é o papel da graça, resta algum rol para a natureza? Ainda é o Pe. Tanquerey que responde: “Esta vida da graça, mesmo que distinta da vida natural, não é simplesmente superposta a esta última, mas a penetra por inteiro, a transforma e a diviniza. Ela assimila tudo que há de bom na nossa natureza, nossa educação, nossos hábitos adquiridos, e aperfeiçoa e sobrenaturaliza todos esses elementos e os orienta rumo ao fim último, quer dizer, para a possessão de Deus pela visão beatífica e o amor que a acompanha”15 . Sendo a graça divina um dom gratuito, que Deus dispensa conforme os desígnios insondáveis de sua infinita Sabedoria, cabe a nós apenas colaborarmos para o aumento e o desenvolvimento da vida sobrenatural na nossa alma. Principalmente pela recepção dos sacramentos, pela prática progressiva das virtudes e dos dons, e pelo desenvolvimento da vida de oração. E, do ponto de vista negativo, pela luta contra o pecado e seus fomentadores: o demônio, o mundo e a carne, assim como pela purificação ativa das paixões e das potências da alma. E isso nos traz de volta ao papel desempenhado pela natureza na vida espiritual, pela parte que nela jogam o caráter e as paixões. Segundo o Pe. Royo Marín, o caráter pode definir-se como “a resultante habitual das múltiplas tendências que se disputam na vida do homem. É como a síntese de nossos hábitos. É a maneira de ser habitual de um homem, que o distingue de todos os demais e lhe dá uma personalidade moral própria. É a fisionomia ou ‘marca moral’ de um indivíduo”. O caráter é distinto, mas muito influenciado pelo temperamento, o qual pode ser definido como “o conjunto das inclinações íntimas que brotam da constituição fisiológica dos indivíduos, enquanto que o caráter é o conjunto das disposições psicológicas que nascem do temperamento enquanto modificado pela educação e pelo trabalho da vontade e é consolidado pelo hábito”. Três fatores influenciam principalmente o caráter: o nascimento, o ambiente exterior e a vontade. O menino “traz a marca de fábrica que lhe foi impressa pelos pais”, as ondas vitais que circulam pelas suas veias “ressentem-se de todas as gerações que têm percorrido sua estirpe antes de chegar até ele, umas boas, outras más, e, dessas inumeráveis influências do passado há por vezes uma que predomina, que o caracteriza, que é a proprietária e dona do temperamento. Mas o conjunto é tão complexo na sua composição como múltiplo na sua origem. [...] Uma sábia terapêutica na formação do caráter

15 Verbete “Vie et voie spirituelles”, em J. Bricout (dir.), Dictionnaire pratique des connaissances religieuses, vol. 6 col. 883.

pode chegar a modificar profundamente as tendências inatas e mantê-las perfeitamente controladas pela razão e a vontade”16 . O ambiente externo influencia nosso caráter – tanto o físico, quanto o clima, quanto o moral, no qual o ambiente familiar e social ocupam o primeiro lugar – e, em alguma medida, cada qual é tributário do seu entorno e é filho de sua época (ainda que seja para opor-se a seus traços dominantes!). A principal influência externa é exercida, obviamente, pelos bons ou maus exemplos recebidos e pelas amizades escolhidas. Se o sangue e o ambiente são duas forças formidáveis, “uma vontade enérgica e tenaz pode chegar a contrapesá-las e inclinar definitivamente a balança em seu favor”. Para isso, insiste o Pe. Royo Marín, “não basta um indolente ‘eu quereria’, mas um enérgico ‘eu quero’”. Do ponto de vista psicológico, o caráter ideal é aquele que é perfeitamente equilibrado, no qual “a inteligência é clara, penetrante, ágil, capaz tanto de amplitude quanto de profundeza”, a vontade “é firme, tenaz e perseverante” e a sensibilidade “é fina, delicada, serena, perfeitamente controlada pela razão e a vontade própria”. Como resulta óbvio, “ordinariamente só conseguem aproximar-se desse ideal aqueles que têm sabido perseverar anos a fio no rude labor de ir adquirindo tal caráter pouco a pouco”. Do ponto de vista moral, um grande caráter deve caracterizar-se: 1. pela retidão de consciência: “um homem sem consciência é um homem sem honra, sem a qual todas as demais qualidades se desmoronam”, e, pelo contrário, o homem reto “diz e faz em cada caso o que tem que dizer e fazer, sem se importar com aplausos ou vitupérios dos homens; não conhece a escravidão e a vilania do ‘respeito humano’”; 2. pela força de vontade pela qual se chega “à possessão de si próprio, ao domínio e emancipação das paixões e à plena libertação das influências exteriores malsãs”; 3.pela bondade do coração que faz da pessoa um ser “generoso, magnânimo, desinteressado”, que “não se cansa de fazer o bem”; e 4. pela perfeita compostura em suas maneiras, posto que “é preciso que as maneiras exteriores estejam de acordo com a beleza do mundo interior [...] convenham ao decoro da pessoa e se acomodem às suas circunstâncias, estado e situação, de maneira que não desentoem, mas em tudo resplandeça a mais perfeita harmonia”17 . Posto que a Teologia ascética e mística é uma ciência ao mesmo tempo especulativa – porque baseada fundamentalmente nos dados da

16 Guibert, “El carácter”, cap. 4, n. 1, p. 80, cit. por Royo Marín, vol. 2 p. 704-705. 17 Todas as citações precedentes provêm da obra “Teologia de la perfección cristiana”, do Pe. Antonio Royo Marín, vol. 2, p. 704-708.

Revelação – e prática – porque deve assumir a experiência das diferentes vias espirituais percorridas pelos iniciadores das diferentes escolas de espiritualidade – cremos que os futuros manuais deverão incluir, entre os elementos naturais que favorecem um grande caráter e o progresso na santificação acima enumerados, a inocência primeva, ou seja, aquela que, mesmo antes de ser enriquecida pelo Batismo, se maravilha com a Criação e procura instintivamente o Ser Absoluto. Esse aporte é, sem lugar a dúvidas, uma das grandes novidades da espiritualidade pliniana. Todavia, é preciso não perder de vista que, mesmo se a parte da natureza na vida espiritual é de inegável importância, ela empalidece se comparada com o papel da graça divina. O que é a pobre natureza quando confrontada com o mistério da predestinação? Pois é desta que resulta o grau de caridade de uma alma (ou seja, o grau de perfeição do amor divino e de inabitação da Santíssima Trindade numa alma), a qual, por sua vez, depende fundamentalmente da vontade libérrima de Deus: “Deus distribui suas graças entre suas criaturas em graus diferentíssimos, sem outro conselheiro que sua vontade onímoda: prout vult, como lhe apraz, diz o apóstolo São Paulo. São mistérios insondáveis que escapam em absoluto à pobre razão humana”. Mas, na medida em que nos é permitido descortinar esses horizontes, a razão mais profunda foi insinuada por São Paulo na Epístola aos Efésios, na qual ensina que “a cada um de nós foi dada a graça, segundo a medida do dom de Cristo [...] para o desempenho da tarefa que visa à construção do corpo de Cristo” (4, v. 7 e 12). A desigualdade de dons é portanto necessária para “obter a beleza suprema, a grandiosa sinfonia do conjunto total”, posto que a finalidade última da Criação é que “o Cristo total – a Cabeça e os membros – esteja subordinado e orientado para a glória de Deus, finalidade suprema, alfa e ômega dos planos de Deus nas suas operações ad extra”18 . Todos somos chamados à santidade de uma maneira remota e suficiente, por uma vontade remota e suficiente de Deus. Mas alguns predestinados foram escolhidos e encaminhados por uma vontade próxima e eficaz, pelo que são enriquecidos, não apenas com graças suficientíssimas, mas com uma torrente de graças incomuns para atingir um grau de perfeição eminente da caridade. Um ponto que merece ser destacado – pois serve para explicar certo tipo de graças que Plinio Corrêa de Oliveira desde a infância e ao longo da vida – é que a perfeição cristã implica necessariamente a vida mística. Segundo explica o Pe. Royo Marín, “as virtudes infusas [as quais, como

18 Royo Marín, op. cit. vol. 1 p. 217. O resto é um resumo das eruditas explicações do Pe.

Royo Marín no vol. 1, p. 211-222 da obra citada.

foi visto acima, decorrem da graça habitual que todo fiel recebe no Batismo] não podem alcançar a perfeição [à que todos estamos chamados] senão sob a influência dos dons do Espírito Santo agindo ao modo divino e sobre-humano”. Acontece que tal atuação “constitui a própria essência da mística; logo, é impossível a perfeição das virtudes – e, por conseguinte, a perfeição cristã – fora da mística”19 . Essa ação mística do Espírito Santo pode começar muito cedo na vida espiritual de uma pessoa: “Não devemos jamais imaginar que esses três graus fundamentais [de desenvolvimento da caridade] sejam como outros tantos compartimentos fechados a chave, de tal maneira que os principiantes não tenham jamais participação alguma, sequer fugaz e transitória, nas graças do segundo e ainda do terceiro grau. Acontece com frequência que Deus dá até aos principiantes graças particulares que são como relâmpagos da via unitiva própria dos santos e arras da perfeição da caridade. [...] A psicologia humana é demasiadamente complexa para emoldurá-la em quadros demasiadamente concretos e rígidos”.20 Já que mencionamos acima os “escolhidos de Deus”, seja-nos permitido acrescentar uma palavra a respeito do carisma daqueles que foram predestinados pela Divina Providência para serem fundadores. Como foi dito, uma família de almas que trilha uma nova via espiritual recebe sua vida de um dom original – o carisma fundacional – que o Espírito Santo concede, através dela, a toda a Igreja. Como seu divino Fundador, a Igreja cresce em graça e santidade e, por meio desses novos sopros do Espírito Santo, Ela pode revelar novos traços do rosto sagrado de Cristo e participar de modo mais profundo na sua missão salvífica. Como é sabido, os carismas são graças concedidas gratuitamente (sem mérito daquele que os recebe) para benefício de terceiros. E, mesmo que eles possam indiretamente servir para a santificação pessoal, situam-se muito abaixo da caridade e da graça santificante21. Em outras palavras, a possessão do carisma de fundação não implica necessariamente num alto grau de virtude. “O carisma do Fundador”, escreve a Irmã Silvia Recchi, que obteve um doutorado summa cum laude na Universidade Gregoriana de Roma com uma tese sobre a vida consagrada, “pode ser figurativamente comparado a uma ‘chave’ que abre uma porta de acesso ao mistério do Senhor, percebido, na sua globalidade, sob uma luz especial; dela decorre uma iluminação

19 Idem. p. 222. 20 Ibid. p. 212. 21 Ver Tanquerey, op. cit. p. 947

que se traduz num chamado, primeiro pessoal e mais tarde coletivo, assim como numa missão para se exercer dentro da Igreja”. Dito carisma marcará “como um código genético, a vida dos membros da nova família, seu estilo apostólico, seu espírito e as estruturas comunitárias”. Pela sua dimensão profética, o carisma do Fundador “cria sempre uma ‘novidade’ na vida da Igreja”, “transtorna as opiniões correntes e os critérios estabelecidos – nós diríamos as “opiniões religiosamente corretas” –, suscitando dificuldades, porque não é fácil reconhecer nele imediatamente a ação do Espírito Santo”. Essa é a grande cruz da vida dos Fundadores: serem incompreendidos. Não se deve crer, porém, “que esse sofrimento seja causado apenas pelas dificuldades para o reconhecimento do carisma ad extra, quer dizer, ao exterior do grupo, da parte dos meios sociais e eclesiásticos que, por vezes, antes de aceitá-lo, lhe colocam obstáculos. Frequentemente, há também uma dificuldade para ‘engendrar’ ad intra, quer dizer, entre os próprios membros da nova família, a plena acolhida do dom do Espírito e de todas as dinâmicas que o projeto suscitado exige”. É do impacto da vida do Fundador e de seu carisma original com seu entorno externo, e com a vida interna do primeiro grupo de discípulos “chamados a interagir com ele, que nasce a experiência fundante da nova família de vida consagrada, destinada a deixar uma marca profunda no seu desenvolvimento futuro e a constituir o fundamento de seu patrimônio carismático”22 . Essas citações podem parecer um pouco longas e distantes deste trabalho. Na realidade, elas nos ajudam a compreender que Deus é como um ourives que toma delicadamente nas suas mãos uma gema bruta – os dados da natureza – e a transforma num diamante pelos seus certeiros golpes do martelo. Isso que é válido para qualquer alma, é sobremaneira válido em se tratando daqueles que Ele predestinou para serem o princípio de uma estirpe espiritual. Daí que os “fatinhos” de sua vida sejam relevantes para se conhecer não somente os traços de sua rica personalidade, mas sobretudo o desígnio providencial de sua ocorrência, enquanto meio de formação e motivação de uma graça. Tanto os sucessos quanto as aflições são uma ocasião de que a Providência Divina se serve para uma iluminação da inteligência ou o fortalecimento da vontade do futuro Fundador, ou mesmo para a expiação que Deus requer dele como preço a pagar para

22 Ir. Silvia Recchi, “Hommes et femmes de l’esprit - Le charisme des Fondateurs”,http:// fr.missionerh.com/content/view/4487/457/

o desenvolvimento do carisma fundacional no seu interior e na obra que ele é chamado a fundar. É por esse motivo que, para dar um quadro amplo e tanto quanto possível objetivo da vida espiritual de Plinio Corrêa de Oliveira, tornou-se necessário apresentá-la como uma trajetória disseminada de fatos, com suas respectivas repercussões espirituais. O que, por sua vez, explica o esquema de apresentação dos textos autobiográficos que se seguem. Na 1ª Parte do vol. I, “O Menino Plinio”, será apresentada a gema bruta, ou seja, os elementos naturais de seu temperamento e de sua psicologia – com especial destaque para a inocência – sobre os quais incidiram depois a graça do Batismo e suas virtudes infusas e dons, assim como as graças atuais que lhe sucederam, como aquelas ligadas à sua vocação contra-revolucionária. A 2ª Parte do vol. I, “A atmosfera primaveril da vida espiritual”, discorrerá sobre as primeiras moções da graça e os primeiros combates espirituais – sobre si mesmo e contra os aspectos revolucionários de seu ambiente –, rematando com a graça mística que recebeu de Nossa Senhora Auxiliadora. Na 1ª Parte do vol. II, intitulada “A travessia do deserto e os frutos do encontro com o Movimento Católico”, cobre o amadurecimento de sua vocação no meio da solidão de sua juventude, até o primeiro florescimento externo dela no seio das Congregações Marianas. A 2ª Parte do vol. II, “Novas provações no limiar da realização da própria vocação”, relata os grandes avanços espirituais que ele fez graças à leitura de alguns livros e muito notadamente do “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”, de São Luís Grignion de Montfort. Já a 3ª e 4ª Partes do vol. II versam sobre “A intuição de uma missão universal de caráter profético” e “A mentalidade do paladino da Contra-Revolução”, nas quais aparece o diamante já inteiramente lapidado pela Santíssima Virgem e os principais fulgores que ele emite e são captados pelos seus discípulos. A 5ª Parte do vol. II o apresenta enquanto “Pai e fundador de uma família de almas e de uma estirpe espiritual” e a 6ª e última Parte, intitulada “Missão cumprida – ‘As vozes não mentiram’”, relata seus temores de não ter correspondido às graças recebidas e a confirmação sobrenatural que recebeu com a chamada “graça de Genazzano” de que, quaisquer que fossem as circunstâncias, cumpriria a sua missão. Como é inevitável num esquema sob a forma de um percurso espiritual, há algumas repetições, posto que as mesmas visualizações e graças da infância foram se desenvolvendo ao longo da vida e chegaram à sua plenitude na idade madura. Na medida em que o próprio relato o permitia,

elas foram colocadas na seção onde pareciam mais relevantes, procurando apresentá-las sob outro ângulo e com novo sabor.

São estes os traços gerais deste livro, que queríamos de início salientar. Cabe assinalar que, ao longo desta compilação, optamos deliberadamente por manter tanto quanto possível a linguagem coloquial, informal mesmo, empregada por Plinio Corrêa de Oliveira nas reuniões e conversas com os seus discípulos. Esta opção se prende ao desejo de introduzir o leitor no ambiente de autenticidade quase familiar em que tais reuniões e conversas se desenvolveram, preservando assim o charme e a vivacidade próprios a uma linguagem não literária, a qual seria prejudicada se a adaptássemos às regras acadêmicas. Não obstante, deparamo-nos muitas vezes com a necessidade, a bem da clareza e da fluidez da leitura, de adequar essa linguagem falada à linguagem escrita. Essa licença editorial em nada diminui ou prejudica a fidelidade aos originais que serviram de base a esta compilação. Pelo contrário, é total o compromisso com a reprodução autêntica do sentido da narração feita por Plinio Corrêa de Oliveira. Toda a vastíssima e valiosíssima documentação utilizada é meticulosamente indicada em notas que poderão ser encontradas ao pé de cada página. Convém ter presente o significado de algumas siglas que se repetem nessas indicações. Para tal, ver o quadro Siglas das fontes bibliográficas, logo adiante. Também ao pé da página virão as notas de esclarecimento de responsabilidade do Compilador. Sublinhamos ainda que não tivemos a pretensão de esgotar os múltiplos aspectos que caracterizam a espiritualidade e a Weltanschauung de Plinio Corrêa de Oliveira. Tal não seria viável, quer pela complexidade da matéria, quer pela riqueza de conteúdo e de aspectos dela. Foram destacados apenas os elementos que permitem ao leitor formar uma ideia, a um tempo fiel, substancial e clara, de sua marcante espiritualidade e personalidade.

No curso da leitura, poderá acontecer que pessoas não afetadas por preconceitos revolucionários – e especialmente as infensas a preconceitos religiosos originados no Modernismo – verão nesse ou naquele lance, ou ainda nesse ou aquele comentário de Plinio Corrêa de Oliveira, laivos mais ou menos translúcidos de santidade ou, pelo menos, da prática heroica dessa ou daquela virtude.

Os que tiveram a graça de conhecê-lo, e mais ainda os que tiveram o privilégio de partilhar sua intimidade, não hesitam em considerá-lo como um santo. E rezam para que, uma vez superada a imensa crise que hoje afeta a Igreja, Plinio Corrêa de Oliveira seja inscrito entre seus santos. Mas seus discípulos não se adiantam ao julgamento d’Ela e, mesmo que invocando a proteção celeste de seu Pai espiritual a título exclusivamente individual, eles se abstêm absolutamente de render-lhe qualquer forma de culto público. Nessa expectativa de uma futura glorificação, e qualquer que seja a decisão final da Santa Igreja, uma coisa seus filhos espirituais afirmam com toda convicção e sem temor de serem contraditados: que Plinio Corrêa de Oliveira realizou inteiramente o perfil moral do contra-revolucionário que ele mesmo descreveu sucintamente na sua obra magna, “Revolução e Contra-Revolução”:

“Em estado atual, contra-revolucionário é quem:

“– Conhece a Revolução, a ordem e a Contra-Revolução em seu espírito, suas doutrinas, seus métodos respectivos.

“– Ama a Contra-Revolução e a ordem cristã, odeia a Revolução e a ‘anti-ordem’.

“– Faz desse amor e desse ódio o eixo em torno do qual gravitam todos os seus ideais, preferências e atividades.”

Enquanto realização plena desse modelo ideal, Plinio Corrêa de Oliveira é, para a estirpe dos seus discípulos e daqueles que os sucederão no futuro, um verdadeiro paladino e o guia espiritual da Contra-Revolução na sua plenitude. Se a presente narrativa em forma autobiográfica permitir uma melhor compreensão da amplitude, riqueza e, de modo especial, grandeza da obra realizada por Nossa Senhora na alma desse “varão católico, todo apostólico e plenamente romano” – é esta a inscrição que se encontra em sua lápide no Cemitério da Consolação, em São Paulo –, daremos por bem pagos os esforços que nos custaram este trabalho – que foi sobretudo ocasião de muitas graças e alegrias. A Ela oferecemos este livro, que é uma homenagem a um varão da sua destra e a um filho que lhe foi tão querido e amado, e que A amou extremosamente.

São Paulo, 8 de setembro de 2021 Festa da Natividade da Santíssima Virgem

INSTITUTO PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA

28 MEU ITINERÁRIO ESPIRITUAL

This article is from: