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As duas formas de auxílio de Nossa Senhora

Tudo isto junto constituiu a trama da minha vida espiritual. Mais tarde vim a conhecer São Luís Maria Grignion de Montfort534. Os senhores compreendem como tudo isto estava preparado para eu me agarrar em São Luís Grignion de Montfort inimaginavelmente. Depois entrou, também, a “A alma de todo apostolado”535, as encíclicas papais que li torrencialmente. Tudo isto se pôs normalmente536 .

As duas formas de auxílio de Nossa Senhora

Em suma, o auxílio de Nossa Senhora se deu em minha vida de duas formas diferentes. Uma foi a intercessão d’Ela, a proteção especial d’Ela para que todas as coisas corram de maneira a realizarmos a nossa vocação. Mas isto deve ser entendido no sentido de que nos aconteçam coisas boas, mas também coisas doloridas necessárias para a realização dessa vocação. Então, muitas vezes o auxílio se manifesta paradoxalmente no infortúnio, na tristeza, sem o que teríamos andado mal, ou pelo menos não nos teríamos aperfeiçoado tanto quanto era do desejo d’Ela. E a isto devemos chamar de auxílio, muito embora possa não parecer auxílio. O auxílio, nessas horas, pode parecer consistir em nos vermos livres daquele infortúnio, daquela tristeza. Mas, na verdade, o auxílio consiste em termos que passar por essas provações. Há outro modo de entender o auxílio, que é ao mesmo tempo compreendermos ser intenção de Nossa Senhora que soframos determinada coisa, mas que, por sentirmos que o sofrimento está forte demais, tenhamos a possibilidade de dizer: “Minha Mãe, dai um jeito de eu ficar igualmente bom sem sofrer tanto”. São, portanto, duas formas de auxílio. Posso dizer que no curso de minha vida fui largamente auxiliado por esses dois modos. Mas não saberia determinar se fui auxiliado mais por um modo do que por outro. Santa Teresinha tem a este respeito uma comparação muito bonita. Ela afigura uma criança andando pela mão do pai, e o pai vê no caminho uma pedra na qual ela pode tropeçar. E então, na presença da filha, afasta

534 A obra-princeps de São Luís Maria Grignion de Montfort, o “Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem”, teve papel marcante na vida espiritual de Dr. Plinio. (v. página 25). 535 Sobre este livro, ver nota 6 da página 14. 536 MNF 12/4/89

aquela pedra. Vendo aquele gesto de proteção paterna, a criança fica agradecida ao pai. Mas poderia ter acontecido que este mesmo pai, passando antes, sem a criança, pelo mesmo trajeto, e vendo a pedra, fizesse a seguinte previsão: “Homem, minha filha bem pode tropeçar nesta pedra. Vou afastá-la do caminho para que isto não aconteça”. A criança, neste caso, foi favorecida de antemão pela providência paterna, mas, por ignorar o fato, não teria como agradecer. Pode ser que essa criança nunca venha a conhecer o cuidado prévio do pai. E não terá condições de manifestar seu agradecimento. Mas o que fica devendo ao pai é mais ainda. Achei muito fina essa comparação de Santa Teresinha. Então, a gratidão nossa a Deus, portanto também a Nossa Senhora, deve estender-se inclusive em relação às graças que nós não sabemos que recebemos. Ninguém presuma conhecer todas as graças que recebeu, porque não conhece. E devemos agradecer as graças que não percebeu, que às vezes foram maiores do que as percebidas. Agora, não posso nem de longe, em uma vida longa como a minha, fazer o balanço de todos esses auxílios. Mas tenho obrigação de saber que há essa variedade de auxílios, e de ser muito grato por todos eles. Então, a minha gratidão deve envolver os auxílios que não sei se recebi, mas de fato recebi. Em todas as etapas da realização de minha vocação, o assunto auxílio foi sempre o mesmo, não se caracterizou por coisas diferentes. Surgia um caso que parecia uma parede fechada e que não havia caminho; de repente, a parede se abre e surge um magnífico caminho. Anda-se mais um pouco, a parede se fecha de novo e sai uma catástrofe. É-se ajudado em vários pontos, e acaba-se saindo vivo da catástrofe e com a possibilidades de se mexer. E daí sai outra epopeia. Em todos os campos de minha vida – quer dizer, no apostolado, que é minha vida; o resto são os acessórios de minha vida – dá-se a mesma coisa: catástrofe, esperança, inviabilidade, realização, vitória; nova catástrofe, dentro dessa catástrofe uma pequena vitória; no fim um cambaleio, no cambaleio um golpe, e no golpe uma vitória537 .

537 Chá SB 24/5/84

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