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Trato cerimonioso e cortês

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ÍNDICE DE LUGARES

ÍNDICE DE LUGARES

Trato cerimonioso e cortês

Sou, por temperamento, por natureza, uma pessoa muito cerimoniosa. É meu modo de ser. Mesmo com mamãe, com quem eu tinha uma união de alma enorme, eu era muito cerimonioso. Aliás, ela também era muito cerimoniosa. Dentro da intimidade absoluta que existe entre mãe e filho, éramos muito cerimoniosos um com o outro. E nos sentíamos nisto inteiramente à vontade, como outro se sentiria à vontade num trato sem cerimônia. A cerimônia é o modo das pessoas se sentirem à vontade umas com as outras. Com Deus eu sou muitíssimo cerimonioso também. Quer dizer, eu me deleito em considerar a superioridade infinita d’Ele sobre mim, em considerar inclusive a severidade com que Ele me olha. Eu me encanto considerando essa severidade. E o trato como uma pessoa que está sendo acolhida com severidade. Daí o recurso a Nossa Senhora. O recurso a Nossa Senhora provém da convicção de que só assim que eu posso preencher as distâncias siderais que separam Deus de mim. As pessoas hoje em dia, tratadas com cerimônia, se sentem afastadas. Não sinto isto. Acho que a cerimônia é exatamente a regra própria da caridade cristã e as pessoas se sentem bem diante dela266 . *

Procuro ser cortês com todas as pessoas com quem tenho de tratar. Essa cortesia não é um esconderijo. É uma manifestação do bem que no fundo se tem para com as pessoas. Não é dizer que eu escondo a minha ira atrás de uma fórmula e que por detrás está a cobra. É o contrário. Podemos ora mostrar o fundo de alma no que ela tem de benévolo, ora mostrar outro aspecto no que tem de iracundo e de zeloso pela glória de Deus. Não é escondendo. É pondo em realce. Quando eu sorrio para uma pessoa, isto não quer dizer que eu não tenho reservas em relação a ela, mas que eu a trato com toda a amabilidade que é o caso, e tenho boa disposição em relação a ela. Isto se tem em relação a qualquer um. Mas quando à pessoa que anda mal deixo ver que me encoleriza aquele defeito que ela tem, ponho em relevo outro aspecto de minha alma e dou isto a entender: “Olha, não se deixe desviar pelo meu mero sorriso. Há outra coisa”.

266 CSN 31/7/82

O que indica a perfeita regularidade disso é o procedimento de Deus para com os homens. Vamos imaginar uma pessoa que tenha vivido a vida inteira em estado de graça, mas tinha o hábito da mentira. Ela morre com 90 anos, recebe os sacramentos da Igreja, morre com sentimentos edificantes de piedade, com alguma graça sensível de confiança na Providência. Mas ela irá para o Purgatório, onde passará, digamos, cem anos na fogueira. Deus escondeu algo quando fez ver àquele moribundo a sua paciência e a sua bondade? Não267 .

Sou portador, provavelmente, de velhos padrões de cortesia. Esses velhos padrões merecem atrair, realmente. Mas a minha cortesia atrai quando a pessoa está sendo fiel à graça. Quando passa a ser infiel à graça, a cortesia começa a parecer insípida. Aliás, já houve quem me dissesse isto de minha cortesia. A minha cortesia não é feita com intenção de agredir, mas o revolucionário se sente agredido por ela. Ela deixa indiferente um mundo de pessoas que consideram que a cortesia não vale nada, porque, segundo elas, tudo isso é insincero. Uma das coisas que eu admiro no Ancien Régime é justamente a cortesia. A cortesia do Ancien Régime era muito aplicada no trato entre as pessoas. Mas, exceto casos muito excepcionais, eu não tenho noção de que a cortesia do Ancien Régime difundisse uma maneira verdadeiramente nobre de se referir aos temas mais sérios, mais santos, mais profundos e mais cacetes, de maneira a torná-los objeto de salão. Certamente nos salões se falava de coisas dessas, mas num certo froufrou superficial. Não se entrava a fundo no assunto. Acho que os oradores sacros, os professores, os homens importantes não chegaram a aprender a fazer dessas coisas temas de salão. E nós queremos fazer. Por exemplo, fazer neste salãozinho uma conversa de íntimos e que trata dessas coisas a fundo, e num ambiente de salão, é o que era preciso para completar um circuito que a paganização da nobreza impediu que fosse completo268 .

267 SD 21/10/87 268 CSN 23/8/86

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