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O espírito aristocrático

Quem é puro, tem o espírito feito de tal maneira que tem horror ao impuro, é claro; o impuro é o sujo, o sórdido, o monstruoso, o arrevesado, o torto, o contrário do grande.

Então, quando o puro incide sobre o impuro, incide sobre a coisa como não deve ser, e como não pode estar em função da grandeza.

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Portanto, a corte perfeita seria a corte que teria no seu mais alto grau a grandeza, e no seu mais alto grau a pureza346 .

O espírito aristocrático

O amor ao aristocratismo entrou em minha alma fundamentalmente pelo lado família. Mas também pela consideração do meio de famílias que a minha família frequentava, que eu conhecia e que era muito modelado segundo aquele velho aristocratismo paulista de que falou Clemenceau quando visitou São Paulo347 .

Isto me entrou muito na alma. Mas muito. Admirei muito, gostei muito, entendi muito como se deveria ser348 . *

O conhecimento do mundo externo e interno é simultâneo. A pessoa vai tomando conhecimento de si na medida em que nota que as outras coisas não são ela. No núcleo dessa noção, estava a noção de que eu era um aristocrata.

Parecia-me que, em tudo que fosse aristocrático, deveria haver uma coesão, uma harmonia, um encaixe. E que, nesse encaixe entre aristocrata e aristocrata, há torrentes de semelhança e diversidade, produzindo uma torrencial forma de amor. Por exemplo, entre um nobre francês e um nobre austríaco, se fossem retos, deveria haver um mundo de coesões.

Também parecia-me haver uma coesão metafísica entre a aristocracia reta e o povo reto.

346 CSN 8/8/92 347 MNF 13/9/89 – Clemenceau viajou por vários países. Ele conta que em nenhum lugar do mundo fora da França, ele se sentiu tão francês quanto em São Paulo; ele sentia que aqui tinha um prolongamento da cultura francesa (EVP 24/8/86). 348 MNF 13/9/89

A condição aristocrática, por analogia e diversidade, cria um intercâmbio de amor enorme, que é um reflexo do amor de Deus.

Essa condição traz uma forma de amor a seus pares, a quem é mais e a quem é menos, dando, portanto, uma noção global do amor de Deus.

Nesta via, Deus quer que sejamos a sociedade ordenada dirigindo-se a Ele349 .

Há certo equilíbrio que procuro manter entre a plebeidade – pela qual todo o homem é homem – e o aristocratismo, pelo qual o homem se angeliza um tanto, de maneira a não perder nenhum dos dois elementos.

Ter o pé no chão e saber compreender o valor e o sabor da coisa popular, tonifica certo elemento do nosso próprio equilíbrio. Se ficarmos só nas coisas aristocráticas, não vai. Por outro lado, ficar só na coisa popular, também não vai.

Então, é preciso saber voar assim: comer vatapá, cuscuz e essas comidas populares brasileiras – aliás, gosto muito de comidas de qualquer lugar do mundo, para comer um prato ou dois, e depois subir – entenda-se que digo isto de modo figurado – para o éter. Mas de vez em quando imergir na comida popular também. É o modo de ser de cada um350 .

Por exemplo, um aristocrata à mesa, por mais que ele seja um homem de bom apetite (ele pode ser e deve ser), ele deve dar a impressão de que não está comendo como um glutão. E se estiver saboreando uma comida, ele deve saboreá-la muito mais com o espírito do que com o corpo.

Tudo quanto o aristocrata faz dá a impressão de que o corpo está em segundo lugar, e a alma está em primeiro lugar.

Por exemplo, um aristocrata descansará com estilo e linha. Um burguês mundano, quando descansa, ele se desabotoa e fica gozando aquele seu repouso, embora isto, de si, não quero dizer que seja pecado351 . *

A distinção é como a inteligência ou o bom gosto artístico: antes de tudo uma coisa inata. Mas é um inato que pode nascer onde ela então não havia. Pode haver gente muito distinta – notem a palavra “muito” – que tenha um berço popular.

349 CSN 29/7/78 350 Chá SRM 26/11/91 351 MNF 12/12/90

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