MÓDULO I
A NATUREZA DOS CONFLITOS
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Gestão de Conflitos – Módulo I
FICHA TÉCNICA Título: Gestão de Conflitos – A Natureza dos Conflitos
Autoria, Coordenação Geral e Pedagógica e Conceção Gráfica: Nova Etapa – Consultores em Gestão e Recursos Humanos, Lda
Nova Etapa Rua da Tóbis Portuguesa, nº 8 – 1º Andar, Escritório 5 – 1750-292 Lisboa Telefone: 21 754 11 80 – Fax: 21 754 11 89 Site: www.nova-etapa.pt • E-mail: Info@nova-etapa.pt
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Gestão de Conflitos – Módulo I
ÍNDICE I. OBJETIVOS PEDAGÓGICOS GERAIS ......................................................... 4 II. CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS GLOBAIS ............................................... 5 III. INTRODUÇÃO .............................................................................................. 6 IV. DESENVOLVIMENTO DE CONTEÚDOS .................................................... 8 MÓDULO I – A NATUREZA DOS CONFLITOS ................................................. 8 OBJETIVOS PEDAGÓGICOS ........................................................................... 8 CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS .................................................................... 8 1. MECANISMOS PSICOLÓGICOS DO CONFLITO ......................................... 9 2. DEFINIÇÃO DE CONFLITO ......................................................................... 13 3. DESVANTAGENS DOS CONFLITOS .......................................................... 14 4. VANTAGENS DOS CONFLITOS ................................................................. 15 5. TIPOS DE CONFLITOS ............................................................................... 16 6. CARACTERÍSTICAS DOS CONFLITOS INTRAPESSOAIS ........................ 18 7. CAUSAS DOS CONFLITOS INTERPESSOAIS ........................................... 21 8. FATORES SUBJETIVOS DOS CONFLITOS ............................................... 24
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I.
OBJECTIVOS PEDAGÓGICOS GERAIS
• Identificar os mecanismos psicológicos associados ao conflito; • Definir conflito; • Reconhecer as principais vantagens e inconvenientes dos conflitos; • Identificar tipos de conflitos; • Distinguir as principais características dos conflitos intrapessoais; • Identificar as causas dos conflitos interpessoais; • Distinguir as causas objetivas das subjetivas nos conflitos interpessoais; • Identificar os princípios básicos da estrutura organizacional; • Reconhecer a estrutura organizacional como fonte privilegiada dos conflitos; • Identificar as principais causas dos conflitos nas organizações; • Associar a mudança e as resistências pessoais como fontes de conflito; • Relacionar stress com conflito; • Identificar os pressupostos básicos para uma gestão eficaz dos conflitos; • Aplicar formas de comunicação assertiva; • Identificar as etapas do processo de gestão dos conflitos; • Selecionar estratégias de acordo com a situação e a análise prévia; • Reconhecer alguns dos princípios fundamentais da negociação.
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II.
CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS GLOBAIS
• Mecanismos psicológicos associados ao conflito; • Noção de conflito; • Vantagens e inconvenientes dos conflitos; • Tipos de conflitos; • Características dos conflitos intrapessoais e interpessoais; • Principais causas dos conflitos interpessoais; • Fatores subjetivos nos conflitos; • Princípios básicos da estrutura organizacional; • A estrutura organizacional como fonte privilegiada dos conflitos; • Principais causas dos conflitos nas organizações; • A mudança e a resistência à mudança nas organizações; • Implicações do stress nos conflitos organizacionais; • Pressupostos básicos para uma gestão eficaz dos conflitos; • Formas de comunicação assertiva; • Etapas do processo de gestão dos conflitos; • As estratégias de acordo com a situação e a análise prévia; • Princípios fundamentais da negociação.
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III.
INTRODUÇÃO
Tudo o que é fácil, já foi difícil. Falar sobre a natureza dos conflitos é, no fundo, falar sobre a natureza das pessoas: os conflitos
fazem
parte
da
História do Homem e das histórias dos homens. Sem conflitos, provavelmente ainda estaríamos a trabalhar de sol a sol e só alguns de nós teriam acesso a este manual.
No entanto, falar de conflito continua a ser para muitas pessoas uma questão difícil, quase tabu. As pessoas, as empresas, os governos, têm horror de falar de conflito ou, pelo menos, de reconhecer a sua existência.
Procuraram-se outras palavras para minorar a conotação negativa da palavra: diz-se que existem desacordos, desentendimentos, diferenças de pontos de vista, divergências – conflitos é que não.
Cada vez que encontramos alguém cujas opiniões divergem das nossas, proporciona-se um potencial de fricção, de perda de tempo, de sentimentos feridos e de comportamentos insensatos. Centramo-nos no subjetivo - a emoção, e esquecemos aquilo que verdadeiramente interessa, a resolução do problema.
Gerir conflitos não é fácil. Sinais dessa dificuldade estão por todo o lado, em todas as dimensões da vida social. No seio da família, os conflitos mal geridos já são um tema recorrente.
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No mundo do trabalho, as rivalidades, as desavenças entre colegas de equipa ou entre departamentos, a intriga, são ainda os sintomas mais frequentes de conflitos abertos ou latentes mal geridos. Não tratar convenientemente os conflitos, ignorá-los ou pura e simplesmente negá-los, deixa cicatrizes emocionais e provoca o desperdício da energia que deveria ser aplicada onde é efetivamente necessária.
O segredo está em identificar os mecanismos associados aos conflitos, as suas principais causas e origens e, sobretudo, em adquirir uma grande capacidade negocial, o que, para além de estar relacionado com as aptidões e os recursos de vida de cada um de nós, tem muito a ver com a aprendizagem de algumas técnicas negociais e de metodologias de autocontrolo. E, apesar do risco de algum desagrado ou irritação, a recompensa por se tratarem construtivamente os conflitos é gratificante. Alguém dizia que “é mais caro dizer que não há conflitos do que reconhecer a sua existência e aprender a lidar com eles”.
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IV.
DESENVOLVIMENTO DE CONTEÚDOS
Módulo I – A Natureza dos Conflitos
OBJETIVOS PEDAGÓGICOS No final deste módulo deverá ser capaz de: • Identificar os mecanismos psicológicos associados ao conflito; • Definir conflito; • Reconhecer as principais vantagens e os inconvenientes dos conflitos; • Identificar tipos de conflitos; • Distinguir as principais características dos conflitos intrapessoais; • Identificar as causas dos conflitos interpessoais; • Distinguir as causas objetivas das subjetivas nos conflitos interpessoais.
CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS • Mecanismos psicológicos associados ao conflito; • Noção de conflito; • Vantagens e inconvenientes dos conflitos; • Tipos de conflitos; • Características dos conflitos intrapessoais e interpessoais; • Principais causas dos conflitos interpessoais; • Fatores subjetivos nos conflitos.
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A Natureza dos Conflitos “O conflito faz parte da nossa vida.” Esta é uma frase sobejamente conhecida e sem contestação. Talvez por isso mesmo fosse bom procurarmos saber por que razão isso acontece. Serão então inevitáveis as discussões, as zangas, os desentendimentos no local de trabalho ou na família?
1. MECANISMOS PSICOLÓGICOS DO CONFLITO
Muitos têm sido os especialistas a tentar encontrar uma explicação para este comportamento do homem. Até ao século passado, era uma preocupação maioritariamente dos filósofos, que punham a questão: “Será que os homens são tendencialmente bons, e existem causas externas que os levam aos conflitos, como uma imposição externa? Ou será que o homem é tendencialmente agressivo, envolvendo-se em conflitos como tentativa de dominação do outro?” Jean Jacques Rousseau, Schopenhauer, Nietzsche, podem ser citados como exemplos dessa preocupação que está patente nas suas obras. Já no século XX, dadas as consequências do tema na vida dos indivíduos, a preocupação estendeu-se a psicólogos, sociólogos, psicanalistas, gestores de recursos humanos, enfim, uma panóplia de agentes interessados em encontrar uma explicação para este fenómeno comportamental.
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Sem nos querermos alongar em explicações teóricas, diremos sinteticamente que existem pelo menos duas correntes que, parecendo distintas, se podem complementar:
Uma que refere que o comportamento humano é dinâmico e é explicável pelas suas interações1, ou seja, que é a consequência do meio onde se vive e da forma como cada um perceciona a realidade. Cada pessoa é um ser único, com valores e quadros de referência distintos, com padrões mentais (imagens e conjuntos de imagens) formados a partir das suas experiências de vida, dos seus conhecimentos, da sua formação, enfim, de todo o conjunto de estímulos a que foi sujeita ao longo da vida e que selecionou e armazenou na sua memória. Assim, é impossível existirem duas formas de pensamento e de comportamento iguais. Logo, de cada vez que duas pessoas se encontram numa relação face a face, ficam frente a frente não apenas duas pessoas, mas dois padrões de pensamento diferentes, dois padrões de comportamento distintos, em que cada um pretende impor a sua perspetiva ao outro. Os conflitos nascem desse confronto.
1 Kurt Lewin, “Psycholie dynamique. Les relations humaines”, PUF, Paris
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Outra perspetiva diz que existe uma tendência natural dos seres humanos para a agressividade, como tentativa de dominação do outro. Konrad Lorenz, sustenta mesmo que “a agressividade é um instinto natural do homem, que leva à sua realização. A força que nos carrega dessa forma é tão poderosa quanto todos os processos vitais: é ela que nos incita a nascer, que incita a criança a afastarse da mãe e a participar na aventura humana, a enfrentar o ambiente, a competição, o conflito com irmãos, pais, pares, para se realizar enquanto pessoa”2. O desejo de dominar foi reconhecido como um poderoso fator de motivação social por vários pensadores3, que o consideraram como a necessidade mais fundamental do homem: lutar pela posição social, para ser “dominante”, querer impor-se ao outro. Crer-se ou fazer-se “superior” é uma tendência constante nas intenções e preocupações humanas. Contudo, parece também evidente que esta tendência natural à afirmação pessoal, à realização de si, comporta necessariamente uma diferenciação ativa em relação aos outros, uma oposição e uma contestação positivas, que podem ser transformadas em vontade de construir, de evoluir, sem implicar a sua transformação em violência ou agressão ao outro.
De salientar que os conflitos estão muitas vezes associados a alterações emocionais, como sejam explosões de ira, de raiva, irritação ou outra forma que lhe queiramos chamar, que proporcionam ao indivíduo
uma
desconforto,
sensação sobretudo
de
mal-estar,
pelas
de
alterações
fisiológicas que provoca. Depois de uma discussão é frequente ficarmos cansados, abatidos, como se tivéssemos estado numa luta corpo a corpo. Na verdade, é mais ou menos isso que se passa na nossa cabeça.
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Citado por R. Ardrey, “La loi naturelle", Stock, Paris Exemplos são Schopenhauer, Nisrzsche, Adler, filósofos alemães do século XIX
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Todas as emoções têm uma função. Existem por uma razão: assegurar-nos mecanismos de defesa em relação à nossa
integridade,
seja
física
ou
psicológica. Quando, no meio de um confronto de ideias, numa discussão acesa, aumentamos o tom de voz, levantamos mais os ombros e cerramos os punhos, estamos a preparar-nos para a ação e, inconscientemente, estamos a dar ao outro sinais de que estamos preparados, procurando intimidá-lo. Se ele os entender dessa forma, melhor para nós: a contenda terminou e saímos vitoriosos. Evidentemente que todo este processo se passa de forma inconsciente, como um mecanismo automático de defesa, do qual nem nos damos conta. Ou, melhor dizendo, não nos dávamos conta, porque a partir do momento em que temos consciência dos mecanismos de defesa associados ao conflito temos a possibilidade de os controlar e passar a adotar uma outra forma de comportamento alternativo, mais eficaz para ambas as partes. Num conflito, nunca há um vencedor e um vencido, mas apenas dois perdedores, pelas consequências que a situação vai ter no futuro da relação entre os indivíduos.
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2. DEFINIÇÃO DE CONFLITO Quando pedimos a alguém para referir palavras ou expressões associadas à ideia de conflito, é vulgar mencionarem coisas como: agressão, fricção, perda de tempo, discussão, zanga, dispêndio de energia, mau ambiente, mau humor, irritação, raiva, entre outras.
Na verdade, existe implícita em todas estas expressões ou palavras uma ideia negativa de conflito, associada a sentimentos e comportamentos essencialmente negativos e prejudiciais às pessoas e às organizações, por isso mesmo, um alvo a abater.
Por outro lado, se procurarmos
o
significado da palavra num
dicionário, encontraremos
qualquer coisa como: “Divergência
de
opinião; Confronto de opiniões
e
ideias;
Desacordo”.
Visto assim desta forma, já não parece tão negativo, pois não?
Porque não adotar uma destas definições, sem a carga negativa associada?
Conflito é uma situação de confronto de opiniões, divergência de ideias ou pontos de vista entre duas entidades individuais ou coletivas.
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3. DESVANTAGENS DOS CONFLITOS É evidente que muitos conflitos têm efeitos negativos e prejudiciais e que o conflito pode ser potencialmente negativo e destrutivo de uma relação porque consome demasiada energia individual, impedindo a pessoa de investir no trabalho ou na relação.
As disputas e as discussões permanentes reduzem a motivação para a relação e para o empenhamento pessoal.
Eis algumas das principais desvantagens dos conflitos: • Degenerar em disputas e desavenças de caráter pessoal; • Contribuir para a instabilidade emocional dos indivíduos e das equipas de trabalho; • Desenvolvimento de ideias pré-concebidas acerca dos outros; • Criação de clima negativo.
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4. VANTAGENS DOS CONFLITOS Contudo, a visão do conflito como potencialmente negativo e destrutivo das relações humanas é uma visão que urge combater. Os conflitos têm efetivamente um lado positivo que é preciso realçar e que é muitas vezes ainda esquecido nas nossas memórias.
Atentemos nas palavras de Heraclito de Éfeso, escritas há cerca de 2500 anos atrás: “A oposição dos contrários é condição da transformação das coisas e, ao mesmo tempo, princípio e lei. O estado de estabilidade, de concórdia, de paz, é apenas a confusão das coisas no abrasamento geral... O que é contrário é útil, e é daquilo que está em luta que nasce a mais bela harmonia; tudo se faz por discórdia... O combate é o pai e o rei de todas as coisas; de alguns ele fez deuses, de outros homens; de uns escravos, de outros homens livres.”4 Eis algumas das principais vantagens dos conflitos: • Permite o desenvolvimento de ideias criativas e inovadoras; • Permite encontrar novas formas de organização de trabalho; • Permite manter um determinado nível de inconformismo, indispensável ao desenvolvimento e evolução; • Permite também um certo nível de vitalidade ao nível dos indivíduos, das equipas e das organizações.
4 Heráclito de Éfeso, citado por Michier Fustier, OConflito na Empresa, Martins Fontes, S. Paulo, 1989
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5. TIPOS DE CONFLITOS A forma de classificar os conflitos varia muito de acordo com cada autor que se debruçou sobre o assunto. Contudo, parece consensual que existem três grandes grupos de conflitos, cada um com as suas características específicas: • Intrapessoais, isto é, aqueles que ocorrem no interior do indivíduo, apenas na dimensão cognitiva, mas com consequências comportamentais para o próprio e para as relações com os outros;
• Interpessoais que, conforme o nome indica, referem-se a todos os conflitos ocorridos na esfera interpessoal, seja ela pessoal ou profissional; • Organizacionais, ou seja, os conflitos que estão direta e especificamente relacionados com as interações específicas ocorridas dentro das organizações, donde se destacam a interação indivíduo - indivíduo, indivíduo - organização, organização - cliente e indivíduo - cliente.
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Podemos ainda referir tipos de conflitos, de acordo com as condições e o momento: • Conflito latente: este é o tipo de conflito mais frequente, mas também o mais reprimido. Corresponde ao momento ainda inconsciente do conflito, que se expressa por sensibilidade extrema, irritabilidade, mal-estar, deceção, ou mesmo frustração. Até certo ponto, estes fenómenos não são sentidos ou são considerados superficialmente e atribuídos à distração, ao nervosismo, ao cansaço, até ao dia em que assumem dimensões enormes, absurdas e explodem em conflito aberto; • Conflito aberto ou declarado, isto é, o que coincide com o momento da tomada de consciência da existência do conflito. Uma das partes intervenientes no processo sente-se afetada, injustiçada ou confrontada e tem de agir para mudar a situação. Neste momento do conflito, podem surgir emoções alteradas e comportamentos insensatos, em que as causas objetivas do conflito são negligenciadas em favor das causas subjetivas; • Conflito assumido, isto é, o momento em que o conflito degenera em problema. Este é o momento em que não se pode deixar de o resolver. Tanto melhor, deixamos de ter um conflito com toda a carga de subjetividade a ele associada, para necessitar de resolver um problema que, pela sua natureza objetiva, necessita de ser resolvido de forma direta e específica.
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6. CARACTERÍSTICAS DOS CONFLITOS INTRAPESSOAIS Os conflitos intrapessoais são os que ocorrem no interior de cada um de nós. São os conflitos que temos
connosco
próprios,
sempre que temos de fazer uma escolha
entre
duas
opções,
sempre que somos confrontados com a necessidade de fazer qualquer coisa que vai contra os nossos valores, mas que é imperioso fazer, enfim, todos os dias nos deparamos com um sem número de conflitos internos que somos obrigados a resolver, desejavelmente, sempre da melhor forma.
Leon Festinger, um psicólogo de meados do século XX, desenvolveu uma teoria em que todo o comportamento humano se baseia nesta necessidade de equilíbrio entre consonância e dissonância cognitiva. É designada por Teoria da Dissonância Cognitiva e “baseia-se na premissa de que um indivíduo se esforça para estabelecer um estado de consistência com ele mesmo. Se uma pessoa tem cognições (pensamento/convicções) sobre si mesmo e sobre o meio envolvente que são inconsistentes entre si, isto é, se um pensamento implica o oposto do outro, então ocorre um estado de dissonância cognitiva”5.
Segundo Festinger, as pessoas não suportam este tipo de inconsistência, e ele é mesmo um dos princípios dos conflitos intrapessoais, a não ser que não tenha um grande impacto sobre o seu pensamento e comportamento, tornando-se irrelevante.
5
Leon Festinger, A theory of Cognitive Dissonance, 1957
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Assim, podemos falar em subdivisões6 no que se refere aos conflitos intrapessoais: • Conflito de Atração-Atração que ocorre quando uma pessoa se encontra perante dois objetivos ou situações atraentes e ao escolher uma terá, obrigatoriamente, de renunciar à outra, uma vez que as duas alternativas não podem ser realizadas simultaneamente. É famosa a representação do burro que morreu de fome entre dois fardos de palha equidistantes. Um dos exemplos de conflito atração-atração típico da atual sociedade, é a tentativa de conciliação entre carreira profissional e vida pessoal. A necessidade de trabalhar e de realização profissional pode entrar em conflito com o desejo de ter um filho ou com o desejo de ficar a tomar conta dele. • Conflito de Repulsão-Repulsão. O indivíduo está colocado entre duas alternativas
desagradáveis
dificuldade
de
e
tem
escapar,
simultaneamente, das duas. Trata-se de uma escolha difícil porque, não optar, implica automaticamente que qualquer uma das situações se imponha. Por exemplo, o funcionário não tolera o seu chefe, mas não pode deixar de ir trabalhar. Se optar por ir trabalhar, sentirá um conflito interno por ter de suportar um chefe autoritário; se optar por não ir trabalhar, acabará por perder o emprego. Neste caso, o conflito intrapessoal
está
relacionado
com
os
valores
pessoais
e
com
os
comportamentos que o indivíduo exige e teme de si mesmo, porque envolve uma clarificação dos seus valores pessoais. Como é que uma pessoa que se considera íntegra e sincera, consegue vender um produto cuja qualidade sabe 6 Fachada, O., A Psicologia das Relações Interpessoais, Rumo, Lisboa, 1998
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ser duvidosa? Como é que um engenheiro do ambiente consegue trabalhar numa indústria poluente? Enfim, podíamos dar inúmeros exemplos de conflitos de repulsão-repulsão com que todos temos de lidar. • Conflito de Atração-Repulsão. Neste caso, o indivíduo encontra-se perante dois aspetos de uma situação em que ambas as decisões apresentam vantagens e inconvenientes. Estes talvez sejam os conflitos mais comuns, porque se referem à existência de um objeto ou situação que tem características positivas e agradáveis, mas que também tem características negativas e desagradáveis. Por exemplo, uma pessoa que sabe que fumar faz mal à saúde, mas que obtém prazer na manutenção desse hábito. Outro exemplo poderá ser a vontade de comer doces: por um lado engordam mas, por outro, satisfazem um desejo.
Em resumo, os conflitos intrapessoais resultam de uma dissonância cognitiva, que ocorre sempre que o indivíduo tem de optar por uma de duas opções.
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7. CAUSAS DOS CONFLITOS INTERPESSOAIS Os conflitos interpessoais, ou seja, decorrentes da relação entre duas pessoas ou entidades, surgem em geral por três ordens de razões:
a) Diferenças individuais b) Limitações dos recursos c) Diferenciação dos papéis
Conforme já afirmámos atrás, cada pessoa é um ser único, com características próprias e visões da realidade distintas. As diferenças de idade, sexo, atitudes, crenças, valores e experiências de vida, são fatores que fazem com que as pessoas vejam e interpretem as situações de múltiplas formas. Pais e filhos, idosos e jovens, subordinados e superiores hierárquicos, clientes e funcionários, têm pontos de vista divergentes em relação à mesma realidade. Sempre que isso acontece, ou seja, em todas as situações onde se demarque a diferença individual, as situações de conflito são inevitáveis.
Por outro lado, todos sabemos quanto é verdade a expressão popular “Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão” ou, melhor dizendo, todos têm razão. A falta de recursos ou a necessidade de partilha dos mesmos são, muitas vezes, das principais causas dos conflitos interpessoais. Numa família, empresa ou entidade, mesmo possuindo todos os recursos de que necessita (ou 21
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julga necessitar), existe quase sempre a necessidade de várias pessoas ou grupos partilharem alguns desses recursos, sejam eles financeiros, técnicos ou humanos. A dificuldade está em encontrar a fórmula de partilha justa e imparcial, sendo que cada uma das partes envolvidas considera sempre que a sua necessidade é maior ou mais importante que a do outro. A unanimidade e a satisfação de todas as partes é extremamente difícil de conseguir, na medida em que cada uma das partes não pretende ceder naquilo que considera ser um direito seu.
A diferenciação de papéis é também uma das principais causas de conflito entre as pessoas, seja porque uma das partes não aceita o papel desempenhado pela outra,
seja
indivíduo
porque não
o
aceita
desempenhar aquele papel que lhe querem atribuir. Por detrás desta causa está, muitas vezes, um problema de autoridade real ou presumida.
Vejamos ao que nos referimos com alguns exemplos:
Imagine que uma equipa foi sobrecarregada de trabalho de forma inesperada. Um dos elementos decide de imediato começar a distribuir tarefas, mesmo antes de chegar o chefe, porque percebe o grau de urgência da tarefa. Os restantes membros da equipa podem entrar em conflito com ele, recusando-se a aceitar que ele assuma o papel de chefe.
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O facto de alguém exercer um cargo de chefia, mas os seus subordinados não lhe reconhecerem competência técnica para o papel é, necessariamente, uma fonte de conflitos.
Também no domínio pessoal, podemos falar de conflitos em consequência da diferenciação de papéis quando, muitas vezes, o indivíduo não aceita o papel que lhe querem atribuir. O exemplo típico é o conflito entre mulheres e homens no que se refere à realização das tarefas domésticas. O homem pode considerar que esse é um papel que cabe à mulher desempenhar, enquanto ela pode não querer assumi-lo por achar que não lhe cabe necessariamente. Este conflito pode também ter origem nas três ordens de fatores referidas: as diferenças individuais (educação, valores, experiências, que levam cada um dos membros do casal a ver o problema de forma distinta), a falta de recursos (por exemplo, falta de tempo para a partilha de tarefas ou falta de recursos financeiros para contratar uma empregada), ou ainda a diferenciação de papéis.
Em resumo, existem várias causas associadas aos conflitos interpessoais, donde se destacam os relacionados com as diferenças individuais, a falta ou partilha de recursos e ainda a diferenciação de papéis.
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8. FATORES SUBJETIVOS DOS CONFLITOS Já vimos algumas das principais causas objetivas dos conflitos, internos e no relacionamento interpessoal. Contudo, todos sabemos também como a nossa perceção dos outros influencia o modo como nos comportamos com eles. Se temos uma ideia positiva acerca de uma pessoa, se a achamos simpática, colaborante e se consideramos esse sentimento recíproco, a nossa expectativa em relação ao seu comportamento também é favorável. Teremos mais hipótese de manter um relacionamento franco e aberto, com menor número de conflitos. Pelo contrário, se temos uma ideia pré-concebida negativa acerca do outro, então consideramos que “daquele lado nunca vem nada de bom”, ou seja, predispomo-nos para o conflito. De facto, muitos dos conflitos decorrem apenas de fatores subjetivos, ou seja, de ideias pré-concebidas que temos na nossa cabeça e que nos induzem a assumir comportamentos igualmente negativos e, quase como uma bola de neve que vai rolando, o problema torna-se cada vez maior. Veja agora um pequeno excerto de um filme que preparámos para si:
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Em resumo, os conflitos interpessoais, mesmo quando têm causas objetivas, têm sempre associadas causas subjetivas que condicionam a nossa forma de atuação. As alterações emocionais drásticas estão muitas vezes relacionadas com esta perceção individual do outro, havendo à partida uma presunção da incompatibilidade com o outro e com os seus pontos de vista, reduzindo de forma óbvia a possibilidade de resolução do conflito de forma negocial.
Capítulo
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