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Influências do aleitamento materno no cuidado e desenvolvimento de indivíduos com Síndrome de Down
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RESUMO: Tendo em vista os benefícios do aleitamento materno, a formação orgânica e a desenvoltura de indivíduos com Síndrome de Down, o presente estudo objetivou revisar na literatura por meio das bases de dados LILACS, SCIELO, PubMed e literatura cinzenta, a influência do aleitamento materno no cuidado e no desenvolvimento desses indivíduos a partir da primeira via oral de alimentação, evidenciando a importância do aleitamento materno como a primeira ação estimulatória promovida; a importância de uma rede de apoio efetiva; a necessidade do levantamento de pesquisas sobre a amamentação no contexto da Síndrome de Down; e a necessidade do aperfeiçoamento e da difusão de diretrizes sobre cuidados na Síndrome de Down com um alcance substancial.
ABSTRACT: In view of the benefits of breastfeeding, the organic formation and resourcefulness of individuals with Down Syndrome, this study aimed to review the literature through the LILACS, SCIELO, PubMed and gray literature databases, the influence of breastfeeding on the care and development of these individuals from the first oral feeding route, highlighting the importance of breastfeeding as the first stimulatory action promoted; the importance of an effective support network; the need to survey research on breastfeeding in the context of Down Syndrome; and the need for improvement and dissemination of guidelines on care in Down’s Syndrome with a substantial reach.
................. Introdução ..................
No século XIX a Síndrome de Down foi erroneamente descrita como idiotia mongoloide (MOREIRA; EL-HANI; GUSMÃO, 2000) e somente em 1965 foi reconhecida pela OMS como síndrome (SILVA; DESSEN 2002), precedida pela descoberta de sua causa genética, caracterizada pela trissomia do cromossomo 21 (SCHWARTZMAN, 1999). Sendo essa uma exceção cromossômica interferente nas características morfológicas do indivíduo, independentemente de sexo, raça ou classe social (KOZMA, 2009). Segundo dados do Ministério da Saúde a Síndrome de Down representa aproximadamente 25% de todos os casos existentes de atraso intelectual e estima-se que no Brasil a cada setecentos nascidos vivos, um possua a síndrome, enquanto no mundo a cada mil nascidos vivos, um possua a síndrome (BRASIL, 2019). A Síndrome de Down é considerada um dos distúrbios genéticos mais comuns e uma condição definitiva e sem cura mas que se intervinda de forma precoce e em
pediatria
ambiente adequado torna-se possivelmente interferente na melhora da qualidade de vida desses indivíduos (LIMONGI, 2002) que embora apresentem limitações voltadas para seu desenvolvimento motor ou intelectual são capazes de se desenvolverem positiva e significativamente (PORTO, 2018), além do que, segundo González (2002), hábitos alimentares criados durante a infância podem contribuir para uma melhor qualidade de vida de indivíduos com Síndrome de Down. Uma característica comum diretamente ligada às implicações da Síndrome de Down é a hipotonia muscular; uma diminuição do tônus e da força, que corrobora para a má formação do sistema estomatognático, quando não estimulado precocemente e de forma adequada (HENDGES; GRAVE; PÉRICO, 2021). O sistema estomatognático é composto por estruturas ligadas com atividades da cavidade oral, propostas por nervos, glândulas, ossos, músculos e articulações, que têm como alcance funções como, respiração, sucção, mastigação e deglutição; todas elas funcionalmente específicas, porém com ações síncronas, demonstrando que alterações e estimulações inadequadas dessa estrutura podem interferir e defasar o desenvolvimento do indivíduo sindrômico (CASTRO et al., 2012). O aleitamento materno é a primeira ação importante que a mãe pode promover a seu filho de modo natural através do seu leite, fazendo com que a criança receba o aporte adequado para um bom desenvolvimento nutricional, físico e emocional (WIECZORKIEVICZ; SOUZA, 2009), sendo o leite materno a primeira via de alimentação ideal para todas as crianças, por conferir proteção e promoção à saúde e reunir características nutricionais essenciais, assim como benefícios imunológicos que vão auxiliar na redução da mortalidade e morbidade infantil (NETO, 2015), além de ser amplamente recomendado e indicado (BENEDETTI, 2012). Como preconizado por órgãos de saúde, o aleitamento materno deve ser administrado de forma única e exclusiva até os seis primeiros meses de vida da criança, podendo ser extensível a esse período em conjunto a introdução alimentar, uma vez que o leite materno em exclusividade já não supre o aporte nutricional adequado na continuidade do desenvolvimento da criança após os seis meses de vida (BRASIL, 2015). É também importante ressaltar que neste período de amamentação a rede de apoio familiar e de profissionais capacitados da área da saúde se torna essencial para promover à criança uma alimentação adequada e saudável e oferecer à mãe a assistência devida desde a gestação. Levando em conta os benefícios do aleitamento materno, a formação orgânica e a desenvoltura de indivíduos com a Síndrome de Down, o presente estudo objetivou revisar na literatura a influência do aleitamento materno no cuidado e no desenvolvimento desses indivíduos.
Para a composição de revisão bibliográfica foram utilizados artigos científicos e livro, compreendendo os anos de 2009 a 2020, nos idiomas inglês e português, através das bases de dados, LILACS, SCIELO, PubMed e literatura cinzenta, com os descritores, Síndrome de Down aleitamento materno sistema estomatognático e hipotonia.
Como critério de inclusão foram utilizados temas como: Síndrome de Down e as implicações que a acompanham, a composição do sistema estomatognático, a importância do aleitamento materno e sua influência no desenvolvimento de indivíduos com Síndrome de Down e o cuidado multidisciplinar integrado. E como critério de exclusão, os temas que não se enquadram aos já citados e comorbidades associadas à Síndrome de Down impeditivas do aleitamento materno.
............... Métodologia ....................
........ Resultados e Discussão ...........
Tendo em vista a importância do aleitamento materno e a melhora do desenvolvimento de indivíduos com Síndrome de Down, o presente estudo teve como proposta elencar trabalhos que apresentassem dados sobre a possível relação do desenvolvimento do indivíduo sindrômico a partir do aleitamento materno. Entre as características associadas à síndrome, estão as interferências no sistema estomatognático ocasionadas pela hipotonia muscular, uma vez que indivíduos com Síndrome de Down têm dificuldade em realizar o exercício de sucção devido a fragilidade de músculos orofaciais (GLIVETIC et al., 2015). Provocadas por achados de outros autores na literatura, Evangelista e Furlan (2019), buscaram identifi-
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car em seu estudo, pontos facilitadores e dificultadores do processo de amamentação, assim como meios utilizados para aprimorar o aleitamento materno de indivíduos com Síndrome de Down. As autoras apontaram em seu estudo a importância da amamentação para esses indivíduos como fator primordial para a evolução do sistema estomatognático, pois além de todos os benefícios conferidos pelo aleitamento materno, ao sugar o seio a criança aplica uma força que contribui para o bom desenvolvimento e funcionamento de órgãos fonoarticulatórios, demonstrando que independente dos obstáculos enfrentados no mecanismo de sucção é necessário o contato com o exercício de estimulação promovido pela amamentação a fim da melhora da musculatura e do desempenho funcional desses indivíduos. Fazendo um comparativo entre indivíduos com e sem a Síndrome de Down em relação ao estudo estrutural do palato duro (estrutura óssea de separação das cavidades oral e nasal) Andrean et al. (2013) provocaram uma discussão acerca de anomalias oclusivas passíveis de acometimento do sistema gastrointestinal serem uma característica genética ou adquirida dos indivíduos sindrômicos, levando em conta critérios como, amamentação, funcionalidade respiratória, sistema estomatognático, tipo de alimentação e hábitos orais deletérios. O estudo identificou que modificações ósseas e musculares podem ocorrer a partir da estimulação, da transição e da adequação de hábitos correlacionados à fundamentalidade do aleitamento materno e entre as considerações apontadas estava a essencialidade e importância da amamentação para indivíduos com Síndrome de Down, tendo em vista a fragilidade e suscetibilidade a infecções, assim como o desenvolvimento e estimulação correta da musculatura orofacial, uma vez que respiração, sucção, mastigação, deglutição e fonoarticulação dependem da integridade operacional e anatômica do sistema estomatognático para uma boa funcionalidade. Além de pontualidades acerca de desenvolvimento estrutural, os autores constataram ainda que indivíduos sem a Síndrome de Down, quando entre outros critérios
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pediatria
não forem amamentados de forma adequada, também podem apresentar alterações estruturais ditas como características de indivíduos com a Síndrome de Down, reforçando assim a importância do estímulo. Ainda em comparação entre crianças com e sem a Síndrome de Down, Aguilar-Cordero et al. (2019) realizaram uma pesquisa abordando a periodicidade do aleitamento materno e o método utilizado no processo, demonstrando que o aleitamento materno pode ser prolongado quando as mães recebem orientações corretas por parte de profissionais da área de saúde. Os autores apresentaram em seu estudo que as dificuldades apontadas acerca da amamentação tanto na literatura quanto em relatos de prática, são razões relevantes para a interrupção precoce da amamentação. A pesquisa de Aguilar-Cordero et al. (2019) foi composta por 80 indivíduos, sendo 40 sindrômicos e 40 não sindrômicos, e apontou que 47,5% dos indivíduos com a Síndrome de Down obtiveram o aleitamento materno exclusivo por mais de três meses, enquanto o grupo sem a síndrome obteve exclusividade em 60% da amostra, demonstrando que a pequena diferença entre as amostras evidencia o fato de que a prática do aleitamento materno é possível para indivíduos com a Síndrome de Down, mas para que isso aconteça de forma positiva é importante que os profissionais da área da saúde estejam capacitados a auxiliar as mães a superarem as dificuldades em torno da amamentação. Ainda em relação aos cuidados prestados aos indivíduos com Síndrome de Down e sua rede de apoio, o estudo de Wieczorkievicz e Souza (2009) teve como objetivo propor temas subjetivos como: “O querer da mulher/ mãe; A mulher e sua rede de apoio efetiva; e o (re)conhecimento da Síndrome de Down como facilitador do aleitamento materno”; a fim de provocar relatos experienciais de mães de crianças com Síndrome de Down como forma de analisar as ocorrências no processo do aleitamento materno.
Diante dos temas citados, os autores exaltaram relatos maternos sobre a importância da persistência no processo do aleitamento materno e as consequências geradas na melhora do desenvolvimento da criança sindrômica, além da contribuição na relação afetiva entre mães e filhos, promovendo o aumento das chances de sucesso na amamentação e ainda a importância de se conhecer técnicas adequadas sob acompanhamento prévio ao nascimento do filho de forma a sobrepor aceitação à fases de culpa e/ou negação. Entre outras observações feitas no estudo de Wieczorkievicz e Souza (2009) associadas aos relatos coletados, a rede de apoio formada pela família e pelos profissionais de saúde no processo de amamentação de indivíduos sindrômicos foi um ponto valiosamente levantado como fundamental para a superação dos desafios enfrentados pelas mães em suas vivências. Por fim, estudando as interferências no estado nutricional de indivíduos com a Síndrome de Down, Haack, Vieira e Santos (2020) realizaram uma pesquisa com lactentes acompanhados em um centro público de Brasília-DF, especializado no atendimento à Síndrome de Down. O estudo apontou que todos os indivíduos pesquisados foram alimentados via oral, sendo 50% amamentados de forma complementar e os outros 50% de forma exclusiva, mas não ultrapassando o período de 5 meses de aleitamento materno. Em relação às doenças e as interferências associadas à síndrome, o estudo apontou que a maioria dos pacientes viviam com alguma doença associada à Síndrome de Down e que quase metade da amostra foi classificada com déficit ponderal sob avaliação em curva específica. Possibilitando a percepção de que além da carência de uma intervenção nutricional precoce para melhora estrutural e qualitativa desses indivíduos, se faz necessário o aperfeiçoamento de protocolos sobre a assistência prestada no cuidado desse público.
................. Conclusão .....................
Diante do exposto, ficou evidenciada a importância do aleitamento materno como a primeira ação estimulatória promovida a essas crianças, beneficiando-as em qualidade de vida e de desenvolvimento. A importância de uma rede de apoio efetiva e da necessidade de informações sólidas e adequadas por parte de profissionais capacitados da área de saúde, de forma integrada e multidisciplinar, com a exaltação da fundamentalidade da amamentação para formação estrutural da criança sindrômica através do correto direcionamento de prática, assim como a necessidade do levantamento de pesquisas sobre a amamentação no contexto da Síndrome de Down e do aperfeiçoamento e difusão de diretrizes sobre os cuidados
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prestados a indivíduos sindrômicos, com alcance substancial.
Sobre os autores
Camila Marques Araujo; Maria Verônica Cirino da Silva - Acadêmicas de nutrição pelo Centro Universitário de Brasília (CEUB), Brasília, Brasil. Profa. Dra. Dayanne da Costa Maynard - Docente do Centro Universitário de Brasília (CEUB), Brasília, Brasil. Nutricionista (UFS), Pós graduada em Obesidade e Emagrecimento (UGF). Mestre em Educação Física (UFS). Doutora em Nutrição Humana (UnB).
PALAVRAS-CHAVE: Síndrome de Down; Aleitamento materno; Sistema estomatognático; Cuidado multidisciplinar. KEYWORDS: Down’s syndrome; Breastfeeding; Stomatognathic system; Multidisciplinary care.
RECEBIDO: 9/8/21 – APROVADO: 29/9/21
REFERÊNCIAS
AGUILAR-CORDERO, M. J. et al. Assessment of the technique of breastfeeding in babies with down syndrome. Aquichan, v. 19, n. 4, p. 1–12, 2019. ANDREAN, C. M. A. et al. Descrição do palato duro em crianças com Síndrome de Down. Distúrb. Comun., v. 25, n. 3, p. 347–358, 2013. BENEDETTI, F. J. Atualidades em aleitamento materno. Revista Nutrição em Pauta, p. 1–5, 2012. BRASIL, Ministério da Saúde; Secretaria De Atenção À Saúde; Departamento De Atenção Básica. Saúde, M. DA. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação complementar. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. BRASIL, Ministério da Saúde. “Não deixe ninguém para trás”: Dia Internacional da Síndrome de Down 2019. Biblioteca Virtual em Saúde. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/ultimas-noticias/2916-nao-deixe-ninguem-para-tras-dia-internacional-da-sindrome-de-down-2020>. Acesso em: 07 de abril de 2021. CASTRO, M. S. J. DE et al. Avaliação das funções orofaciais do sistema estomatognático nos níveis de gravidade de asma. J. Soc. Bras. Fonoaudiol., v. 24, n. 2, p. 119–124, 2012. EVANGELISTA, L. G.; FURLAN, R. M. M. M. Fatores facilitadores, principais dificuldades e estratégias empregadas no aleitamento materno de bebês com síndrome de Down: uma revisão sistemática. Audiol., Commun. Res., v. 24, p. 1–5, 2019. GONZÁLEZ, I.C.M. Nutrição nos escolares e adolescentes. Nutrição em Pauta, São Paulo, v. 10, n. 53, p. 23-26, mar./abr. 2002.
GLIVETIC, T. et al. Prevalence, prenatal screening and neonatal features in children with Down syndrome: A registry- based national study. Ital. J. Pediatr., v. 41, n. 1, p. 1–7, 2015. HAACK, A.; VIEIRA, D. D.; SANTOS, A. C. DA S. Lactentes e Síndrome de Down: Aspectos Nutricionais. 1a ed. Brasília (DF): Editora JRG, p. 1-55, 2020. HENDGES, V. M.; GRAVE, M. T. Q.; PÉRICO, E. Avaliação do desenvolvimento psicomotor de crianças com Síndrome de Down. Rev. Neurociênc., v. 29, p. 1-26, 2021. KOZMA, C. Crianças com Síndrome de Down. Aspectos médicos y psicopedagógicos, p. 16–42, 2009. LIMONGI, S. C. O. Linguagem na Síndrome de Down. 2002. 13 f. TCC (Graduação) - Curso de Fonoaudiologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, cap. 1, 2002. MOREIRA, L.M.A.; EL-HANI, C.N.; GUSMÃO, F.A.F. A síndrome de Down e sua patogênese: considerações sobre o determinismo genético. Rev. Bras. Psiquiatr., v. 22, n. 2, p. 96-99, 2000. NETO, C. M. Manuel de Aleitamento Materno. 3a ed. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2015. PORTO, K. C. O. SÍNDROME DE DOWN: estudo de caso de uma aluna do ensino fundamental da Escola César Almeida, Distrito de Moraes Almeida/Itaituba-PA. p. 1-76, 2018. SCHWARTZMAN, J. S. Síndrome de Down. São Paulo: Mackenzie, 1999. SILVA, N. L. P.; DESSEN, M. A. Síndrome de Down: etiologia, caracterização e impacto na família. Interação Psicol., v. 6, n. 2, p. 166–174, 2002. WIECZORKIEVICZ, A. M.; DE SOUZA, K. V. O Processo de Amamentação de Mulheres Mães de Crianças Portadoras de Síndrome de Down. Cogitare Enferm., v. 14, n. 3, p. 420–427, 2009.