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Architecture
A story of stone and heart
The Hospício Princesa Dona Maria Amélia is a place waiting to be discovered and the subject of a book by researcher Rui Campos Matos O Hospício Princesa DonaMaria Amélia é um lugar à espera de ser descoberto e o tema de um livro do investigador Rui Campos Matos
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TEXT PAULO SANTOS* • PHOTOS MIGUEL NÓBREGA
Behind the white painted walls, there is a garden paved with pebbles and a building that tells several stories. Any who passes by Avenida do Infante, in Funchal, hardly notices these buildings, but the Hospício da Princesa Dona Maria Amélia is one of the city's most important places, since the second half of the 19th century.
The name is that of a princess, daughter of the King of Portugal and Emperor of Brazil, who died of tuberculosis in Madeira. The hospice, a hospital for lung diseases, was commissioned by the princess's mother, Empress Amélia.
The tragic nature of this story gave rise to a bold architectural project, which has interested architect and researcher Rui Campos Matos for many years, who holds a doctorate in therapeutic tourism, which was so important in 19th-century Madeira.
The result of this interest is the book Hospício da Princesa Dona Amélia - Um Livro de Pedra. The work, written in Portuguese and English, was published by the Madeira Archive and Library Regional Directorate. The 172 pages contain blueprints, architectural sketches and photographs. The book also helps to understand not only the history of the building, but also the importance of therapeutic tourism in the 19th century in Madeira. "The Hospice was fundamental in establishing Madeira as a renowned therapeutic resort," explains Rui Campos Matos. "It was important that the sick who sought the island for the cure of the air knew that there was a hospital there that specialised in the treatment of diseases of the chest." The author considers that "the book is thus an invitation to travel through the physical and historical space of this important building, to be delighted by unique and delightful details".
Por detrás dos muros pintados de branco escondem-se um jardim pavimentado a calhau rolado e um edifício que conta várias histórias. Quem passa na Avenida do Infante, no Funchal, quase nem dá por estas edificações, mas o Hospício da Princesa Dona Maria Amélia é um dos lugares de destaque da cidade, desde a segunda metade do século XIX.
O nome é o de uma princesa, filha de um rei de Portugal e Imperador do Brasil, falecida na Madeira, vítima de tuberculose. O hospício, um hospital, para doenças dos pulmões, foi mandado erguer pela mãe da princesa, a Imperatriz D. Amélia.
Do caráter trágico desta história nasceu um arrojado projeto de arquitetura, que há muitos anos interessa ao arquiteto e investigador Rui Campos Matos, com doutoramento no turismo terapêutico, tão marcante na Madeira do século XIX.
O resultado deste interesse é o livro Hospício da Princesa Dona Amélia – Um Livro de Pedra. A obra, escrita em português e inglês, foi editada pela Direção Regional do Arquivo e Biblioteca da Madeira. Nas 172 páginas podem ser vistas plantas, esquiços de arquitetura e fotografias. O livro ajuda ainda a compreender não só a história do edifício, mas também a importância do turismo terapêutico no século XIX, na Madeira.
“O Hospício foi fundamental para estabelecer a Madeira como uma estância terapêutica de renome”, explica Rui Campos Matos. “Era importante que os enfermos que procuravam a ilha para a cura de ares soubessem que nela existia um hospital especializado no tratamento das doenças do peito.” O autor considera que “o livro é, assim, um convite a viajar pelo espaço físico e histórico deste importante edifício, para se deixar deliciar com pormenores únicos e deliciosos”.
The idea for this book arose 10 years ago in the context of research for his doctoral thesis. "The Hospice is a building whose importance, in that context, was decisive for 19th century Madeira. It is, no more and no less, the first Portuguese sanatorium and the second in Europe", says the architect, pointing out that the building "has kept in perfect state of conservation all the original compartments and finishing, a very rare fact in Hospital Architecture".
From here arose a passion for the narrative of this building. He soon realised that the Princesa Dona Maria Amélia Foundation "had a very valuable collection of documents about its history, and English historiography had nothing about this important work that the architect Buckton Lamb had carried out in Madeira".
Rui Campos Matos states that the Hospice and the Baltazar Dias Municipal Theatre, which was built 20 years later, "are the two great architectural works that the constitutional monarchy built in Madeira". "The façades of the Hospice still reflect the dilemmas of 19th century architecture, with a Neoclassical style, very much in the style of Buckton Lamb. Curiously, the use of some of the materials, such as basalt stonework, the whitewash on the façades, the cladding of the roofs in barrel tiles, also lend a local character".
A curious fact about the building was that "it was designed to house a garden", says Rui Campos Matos. "For the medicine of the time, the ventilation and airing of the hospital played a part in the process of
A ideia deste livro surgiu há 10 anos no contexto da investigação para a tese de doutoramento. “O Hospício é um edifício cuja importância, nesse contexto, foi decisiva para a Madeira oitocentista. Trata-se, nem mais nem menos, do primeiro sanatório português e o segundo na Europa”, afirma o arquiteto, salientando que o edifício “manteve em perfeito estado de conservação toda a compartimentação e acabamentos de origem, um facto muito raro na Arquitetura Hospitalar”.
Daqui surgiu a paixão pela narrativa deste edifício. Rapidamente percebeu que a Fundação Princesa Dona Maria Amélia “conservava um valiosíssimo acervo documental sobre a sua história, sendo que na historiografia inglesa nada constava sobre esta importante obra que o arquiteto Buckton Lamb levara a cabo na Madeira”.
curing the so-called chest patients. It was therefore essential for the hospital to be surrounded by a garden." Rui Campos Matos adds that the widowed Empress, D. Amélia, "made a point of sending the design and defining the species of this eclectic garden whose blueprint is published in this book".
Although this property and the garden are of incalculable wealth, they require more attention. According to Rui Campos Matos, the administration of the Princesa Dona Maria Amélia Foundation has plans to create "a visitable area inside the building so that the public can learn about its history".
Also underway is "the recovery of the old porter's house, which will be transformed into a small tea house", thus opening up even more the space to society, points out the architect, stressing that "the Hospice continues to be an institution that serves the community, as was the wish of its founder Dona Amélia, and nothing is more important for a work of architecture than to preserve its function while keeping it alive and useful".
Rui Campos Matos also highlights the words of the journalist Januário de Nóbrega, who closely followed the building's construction: "the Hospício da Princesa Dona Maria Amélia is a great book of stone in which everyone will know how to read".
In this sense, the passionate Architect points out that "19th century architecture is like Latin, that is, a dead language that we have difficulty reading. My main objective was to translate into Portuguese that beautiful book of stone that is the Hospice, so that everyone can know how to read, respect,
Rui Campos Matos afirma que o Hospício e o Teatro Municipal Baltazar Dias, que foi construído 20 anos depois, “são as duas grandes obras arquitetónicas que a Monarquia constitucional ergueu na Madeira”.
“As fachadas do Hospício refletem ainda os dilemas da arquitetura oitocentista, com um estilo Neoclássico, de cunho muito vincado do Buckton Lamb. Curiosamente, a utilização de alguns dos materiais como as cantaria basálticas, a caiação das fachadas, o revestimento dos telhados em telha de canudo, confere também um carácter local”.
Um facto curioso sobre o edifício foi ”ter sido concebido para habitar um jardim”, conta Rui Campos Matos. “Para a medicina da época o arejamento e ventilação do hospital participavam no processo de cura dos chamados doentes do peito. Era então essencial que o hospital estivesse rodeado por um jardim.” Rui Campos Matos acrescenta que a Imperatriz-viúva, D. Amélia, “fez questão de enviar o desenho e definir as espécies desse jardim eclético cuja planta está publicada neste livro”.
Embora este imóvel e o jardim sejam de uma riqueza incalculável, procuram mais atenção. A administração da Fundação Princesa Dona Maria Amélia tem planos, segundo Rui Campos Matos, para criar “uma zona visitável no interior do edifício para que o público possa tomar conhecimento da sua história”.
Está também em curso “a recuperação da antiga casa do porteiro, que será transformada numa pequena casa de chá”, abrindo assim ainda mais o espaço à sociedade, assinala o arquiteto, sublinhando que “o Hospício continuaa ser uma instituição que serve a comunidade, conforme era o desejo da sua fundadora Dona Amélia, e nada mais importante para uma obra de arquitetura do que preservar a sua função mantendo-a viva e útil”.
Rui Campos Matos realça ainda a frase do jornalista Januário de Nóbrega que acompanhou de perto a construção do edifício: "o Hospício da Princesa Dona Maria Amélia é um grande livro de pedra em que todos hão-de saber ler".
Nesse sentido, o apaixonado Arquiteto salienta que a “arquitetura do século XIX é como o Latim, ou seja, uma língua morta que temos dificuldade em ler. O meu principal objetivo foi traduzir para português esse belo livro de pedra que é o Hospício, para que todos o possam saber ler, respeitar e proteger".
* COM CLÁUDIA CAIRES SOUSA