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O futuro dos partidos políticos
José Carlos Lima Marcelo de Moura Bluma
é diretor-executivo da Fundação Verde Herbert Daniel, assessor da Presidência para Meio Ambiente e Clima no BNDES e presidente do PV-PA.
Em novembro de 1965, o regime militar editou o Ato Institucional nº 2, que dissolveu os partidos políticos brasileiros e criou, artificialmente, o bipartidarismo no país.
Foi criada a figura da organização que, para existir, necessitava ter 120 deputados federais e 20 senadores em uma Câmara Federal composta por 350 deputados.
Assim, por força da regra, matematicamente era possível a existência de apenas duas organizações, sendo elas a Aliança Renovadora Nacional (Arena) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
Na Arena, ficaram as lideranças da direita, conservadores e ex-udenistas, enquanto no MDB se inscreveram aqueles que não foram convidados para participar da organização governista, bem como comunistas e trabalhadores.
é presidente do PV-MS, secretário de Administração do PV e conselheiro da Fundação Verde Herbert Daniel.
O bipartidarismo permaneceu no Brasil até 1979, quando o Congresso Nacional aprovou a Lei Orgânica dos Partidos Políticos, incluindo o substitutivo que extinguiu a Arena e o MDB e permitiu o retorno da liberdade partidária.
De lá para cá, o universo dos partidos políticos brasileiros se alterou significativamente, uma vez que sofreu um processo de intensa fragmentação, passando, atualmente, por um processo de forte compactação.
Nas eleições de 1982, primeira eleição após o seu retorno, somente cinco partidos políticos possuíam representantes na Câmara dos Deputados: o PDS com 235 deputados; o PMDB com 200; o PDT com 23; o PTB com 13 e o PT com oito.
Oito anos mais tarde, nas eleições de 1990, 19 partidos elegeram representantes para a Câmara Fe- deral, chegando ao máximo de fragmentação em 2018, quando 29 partidos elegeram deputados federais para a Câmara.
Apesar da fragmentação atingir o seu mais alto patamar, nesse ano entraram em vigência as denominadas cláusulas de desempenho, aprovadas por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) em 2016, que passaram a operar para diminuir a quantidade de partidos políticos representados no Parlamento.
Juntou-se a essa inovação o fim das coligações proporcionais, a partir das eleições municipais de 2020.
Os efeitos dessas inovações foram sentidos na última eleição, quando apenas 18 agremiações (federações e partidos) conseguiram eleger representantes para a Câmara Federal, e somente 12 continuarão a mantê-los no Parlamento.
Considerando o aumento no patamar de votação exigido para as eleições federais de 2026, projeta-se que restará no Congresso Nacional em torno de oito agremiações, entre federações partidárias e partidos políticos.
Assim, a redução do número de partidos no país está sendo uma imposição da legislação eleitoral brasileira, que, eleição a eleição, força a diminuição das agremiações partidárias, sendo a redução quantitativa operada por mecanismos legais, acompanhada por uma ressignificação qualitativa operada pela sociedade brasileira.
É incontroverso que esse processo de enxugamento do quadro partidário iniciou-se como um antídoto à proliferação de legendas e com a judicialização da política, sendo o fundamento do discurso evitar as legendas de aluguel e aumentar a legitimidade, tomando por base dois parâmetros: o número percentual de votos e as cadeiras conquistadas para o cargo de deputado federal.
Sem recursos, tempo de rádio e televisão e sem poder se coligar, o partido termina sem votos e sem eleitos, deixando de ter importância política, o que lhe dificulta o crescimento e, por fim, a própria existência, pois não atrai candidatos com chances e nem suporta os custos da sua própria manutenção – como o pagamento de advogado, contador, publicitário, funcionário, espaço físico, presença nas redes sociais, atividades junto aos seus representados etc.
Manifestação do MDB contra a reforma partidária, no centro do Rio de Janeiro Fonte: Memorial da Democracia/Rogério Reis - CPDoc JB
Legendas de aluguel vão desaparecer
Para existir, sem esses mecanismos oficiais, o partido precisaria ser sustentado por um forte movimento e desejo de parte da sociedade para que representasse suas causas, mas é notório no Brasil que os partidos que se propõem a abraçar os anseios populares encontram outras barreiras a serem transpostas.
Isso porque a sociedade civil organizada em pautas, cansada de bater em portas fechadas, perdeu o interesse de ser representada pelos partidos políticos e passou a vê-los apenas como instrumentos eleitorais, porta de entrada para cargos eletivos.
As redes de organizações livres, democráticas e legítimas da sociedade são porta-vozes de suas causas e pelas quais interagem com o público e defendem suas bandeiras.
Movimento negro, de mulheres, de causas ambientais, de causas animais, de cultura alternativa, de indígenas se relacionam com as instituições e cobram dos eleitos diretamente, sem a intermediação das direções partidárias.
Sem dúvida, as legendas de aluguel vão desaparecer, alcançadas pelas imposições do sistema eleitoral atual, mas é preocupante o desaparecimento de várias agremiações partidárias de vanguarda que são porta-vozes de causas legítimas da sociedade, mas que ainda não conseguiram alçar grandes voos junto ao eleitorado.
Mantida a legislação atual, a perspectiva para o sistema partidário brasileiro é de forte compactação, restando poucos partidos com representação no Congresso Nacional.
A considerar que no modelo brasileiro os partidos políticos possuem o monopólio para a condução do processo eleitoral, uma vez que não se permite candidaturas independentes, é necessário manter aceso o debate quanto ao pluripartidarismo tupiniquim sob pena de se produzir graves danos à democracia brasileira.
Nesse contexto, os principais desafios que o governo Lula terá pela frente serão: