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POS-OBRA
BRIEFING DE PÓS-OBRA Uma publicação da P.I.G.S. Plataforma Integrada de Geração de Startups
REALIZAÇÃO
Ana Regina Pedrosa - Redatora Paula Soares - Design
ENTREVISTADOS Angelo Just Franklin Borges Anselmo Leite Anselmo Leite Jr.
IMAGENS
Folha de Pernambuco Alexandre Godim - El País
REFERÊNCIAS
A Revolução do Design - Victor Falasca Comece sua Startup Enxuta - Ash Maurya Agradecimentos Toda equipe PIGS, CESAR Labs e Sebrae PE
PARA BONS ENTENDEDORES UM BOM CASO...
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A escada em espiral causa certa vertigem. São 17 andares até o pavimento mais alto do edifício Holiday, no bairro de Boa Viagem, Zona Sul do Recife. A subida sobrecarrega os joelhos, os pulmões e o coração. Estou preocupada com Josiane Miranda, moradora do condomínio há dez anos. As breves paradas que fazemos não são suficientes para que ela recupere o fôlego, entrecortado pelo choro e por relatos sobre a situação dos moradores. Mesmo cansada, Josiane, que é presidente da Associação dos Barraqueiros de Coco de Boa Viagem, insiste em me levar até os andares mais altos do prédio. Quer que eu conheça os idosos, as gestantes, as crianças e as pessoas doentes que estão literalmente ilhadas desde que o fornecimento de energia foi cortado. A manhã da quinta-feira (14) passada foi minha primeira visita aos moradores do Holiday, feita nas horas iniciais do prazo de cinco dias úteis determinado pela Justiça para desocupação total do prédio. Embora os culpados e fatores envolvidos sejam muitos, a respon-
sabilidade pela recuperação do Holiday está hoje apenas sobre os ombros dos mais vulneráveis. O condomínio e os seus moradores foram postos sozinhos na linha de frente de uma batalha pela sobrevivência do prédio, que acumula uma pilha de problemas e de dívidas, incluindo processos trabalhistas de funcionários. As obras de recuperação têm um orçamento milionário. Somente a parte elétrica custaria aproximadamente R$ 400 mil, dinheiro que o condomínio, com cerca de 70%de inadimplência e muitos moradores de baixa renda, dependentes de benefícios como o Bolsa Família, já disse não ter. Se a Justiça não reconsiderar a decisão, os moradores que não deixarem residências até esta quarta-feira poderão ser retirados à força. A intenção, diz a ordem judicial, é evitar uma tragédia iminente, com potencial “dez vezes maior do que a Barragem de Brumadinho” em número de vítimas, segundo a Prefeitura do Recife. A conclusão se baseia em vistorias dos Bombeiros, da Defesa Civil e da Celpe, que detectaram pelo menos sete graves problemas estruturais.
A petição da prefeitura para a interdição em “tutela de urgência” leva em conta o alto risco de incêndio, em razão de problemas elétricos como gambiarras. Vários pontos de venda clandestina de gás de cozinha também foram registrados, além de problemas de oxidação na estrutura metálica de vigas.
Esses e outros aspectos levaram a Defesa Civil a classificar o prédio no nível de risco estrutural 3, em uma escala que vai de 1 a 4. Mas os problemas elencados no processo de interdição do Holiday já eram conhecidos dos órgãos de fiscalização há pelo menos 20 anos. Em 1996, segundo os autos do processo, uma comissão formada por Defesa Civil, Celpe,
Bombeiros e outros órgãos realizou uma vistoria no condomínio. Naquela época já foram encontrados problemas nas instalações elétricas (...). A Prefeitura do Recife garantiu, por nota, que “após os reparos realizados pelo condomínio, que devolvam a segurança aos moradores, eles poderão voltar às residências normalmente”. Apesar disso, os moradores não estão seguros de que poderão retornar. Também não há garantias sobre a segurança dos seus pertences, caso o condomínio seja realmente interditado e nem a possibilidade de concessão de auxílio moradia, permitido apenas para casos de incidentes, como incêndios, deslizamentos ou enchentes, ou quando a residência está comprometida e precisa ser demolida, segundo a prefeitura.
Enquanto colchões, móveis e bagagens são carregados escadas abaixo do Holiday, eu e Josiane continuamos a subida. Ela para no meio do caminho para mostrar o seu apartamento. “Olha a vista para o mar. É um privilégio que querem tirar da gente. Dizem que o Holiday só tem ladrão e prostituta. Aqui tem muita gente de bem, trabalhadora, que paga suas contas”, frisou. Alguns andares acima chegamos ao apartamento de Josefa Regina da Conceição. Uma bela vista e uma brisa fresca nos recebem no corredor. A moradora de 63 anos, que mora sozinha em uma quitinete no 16º andar, mostra uma visão privilegiada para o mar de Boa Viagem, que se esconde entre os arranha-céus. “Se deixar meu apartamento, quem garante que vou voltar? Quem vai cuidar das minhas coisas?”, indagou. (...) Dona Regina já sofreu dois AVCs, é hipertensa e diabética. Anda com dificuldade, também por uma artrose no joelho. É impossível, para ela, descer os 16 pavimentos sozinha para buscar água, remédios e comida. Quando cheguei, restava apenas uma dose utilizável de insulina no apartamento. Ela precisa tomar duas por dia.
“Morei de aluguel muitos anos até conseguir comprar esse imóvel. Trabalhei de doméstica, de babá para pagar as prestações. Acho que se a gente sair, não volta mais. Querem derrubar o prédio todo”, argumentou.
“O valor desse terreno é incalculável. A gente está no metro quadrado mais caro da cidade” comentou o síndico José Rufino, quando perguntado sobre as motivações da determinação de saída emergencial dos moradores. Ele reconhece os problemas do prédio, mas discorda de que as falhas oferecem um risco iminente de incêndio e/ou de desabamento. Desde que a energia foi cortada, Rufino tenta conseguir apoio para resolver a situação financeira e os dramas sociais do condomínio. “Quando a gente finalmente estava conseguindo apoio da Câmara dos Vereadores, de voluntários, a Justiça veio e determinou a saída. Sempre que a gente consegue dar um passo em direção à uma melhor organização, somos puxados para trás. Não sei a quem essa situação interessa, com certeza alguém está lucrando com isso”, sugeriu.
“Faz tudo” do condomínio, Vicente Soares mora no Holiday há 13 anos. Vive da renda de R$ 1 mil por mês que recebe para fazer todos os tipos de reparos, de reboco à manutenção elétrica no prédio.
“Conheço todos os fios daqui. Se precisa fazer uma obra é só comprar as coisas que a gente faz. Não precisava expulsar ninguém” argumentou, mostrando as melhorias mais recentes que fez, como a recuperação do hall de entrada e das marquises. Pai e mãe do filho de 12 anos, Vicente não tem para onde ir caso realmente precise deixar o apartamento alugado. O filho dele estuda do outro lado da rua em uma escola pública. “Onde vou encontrar um aluguel barato? A gente paga aproximadamente R$ 500 aqui, onde tudo custa mais de R$ 1 mil.
O que querem é tirar os pobres de Boa Viagem, jogar pra bem longe” argumentou. Até agora, quase 200 moradores deixaram os apartamentos, segundo o síndico do prédio. Apenas quatro deles tinham aceitado ir para o abrigo da Prefeitura do Recife até o domingo passado.
“Defendemos que as pessoas fiquem porque estamos lutando para reverter essa decisão”, argumentou. O síndico ainda diz que até agora não recebeu um laudo detalhado da Celpe sobre que estruturas precisam ser recuperadas. “Como a gente vai fazer uma obra sem nem saber o que precisamos organizar?”, questionou. “Os laudos que existem não foram feitos com aparelhos específicos, se baseiam apenas na visão dos técnicos que tiraram algumas fotos.
A gente é tratado como lixo, as pessoas pensam que somos ratos”, desabafou. (...)
Desocupação do edifício Holiday, quem se responsabiliza? POR MARIAMA CORREIA em 19/03/2019 FONTE: http://marcozero.org/desocupacao-do-edificio-holiday-quem-se-responsabiliza/#prettyPhoto
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Quando Recife era chamada de Veneza brasileira e a praia de Boa Viagem um paraíso tropical livre de tubarões, o Edifício Holiday era o supra-sumo das residências de verão da classe média pernambucana. Construído entre 1957 e 1959, foi um dos primeiros arranha-céus da capital, junto com o Acaiaca e o Califórnia – erguidos no mesmo bairro também no final da década de 1950. É um marco na arquitetura modernista da cidade, onde as obras dos arquitetos pernambucanos ganha a cena no Brasil e no mundo. A situação atual do edifício é uma expressão clara de diversos aspectos econômicos e sociais extremamente relevantes, mas vamos nos deter a decadência estrutural causada pela ausência de manutenção e gestão pós-obra. Todo edifício possui um ciclo de vida:
1.PROJETO 2.LICITAÇÃO 3.OBRA 4.USO E OPERAÇÃO. É justamente para essa última fase que voltaremos nossa atenção, a fase de uso e operação é a etapa que toma a maior parte do ciclo de vida dos edifícios. Para que o edifício possa desempenhar perfeitamente suas funções para preservar a qualidade da intervenção e o conforto dos usuários é necessário avaliar, identificar e acompanhar necessidades de intervenção. É preciso prestar atenção nas condições de uso e conservação do edifício. Após o término da reforma, o profissional técnico responsável deve orientar os usuários a respeito de todos cuidados a serem tomados. Cada tipo de serviço necessita de cautelas específicas por parte dos moradores, funcionários ou frequentadores do imóvel. As funcionalidades (elevador, caixa dʼágua, bomba, gerador, etc.) possuem um cronograma de Manutenção (Preventiva, Preditiva ou Corretiva)¹ que deve ser seguido. Para isso, espera-se que essas manutenções possuam orientação adequada e que os moradores montem uma estrutura financeira direcionada para esse tipo de ação. ¹
Manutenção preventiva: é toda a ação sistemática de controle e monitoramento, com o objetivo de reduzir ou impedir falhas no desempenho de equipamentos. Manutenção preditiva: é o acompanhamento periódico de equipamentos ou máquinas, através de dados coletados por meio de monitoração ou inspeções. Manutenção corretiva: consiste em substituir peças ou componentes que se desgastaram ou falharam e que levaram a máquina ou o equipamento a uma parada, por falha ou pane em um ou mais componentes.
Briefing de Pós-Obra
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O EDIFICIO COMO UM ORGANISMO VIVO O funcionamento de um edifício em muito se assemelha ao funcionamento do corpo humano. Se enxergamos a estrutura de vigas e pilares
capaz de sustentar o prédio uma espécie de estrutura óssea, paredes que protegem o espaço interno do vento, sol, chuva, poeira é como a pele e uma bomba capaz de conduzir água através de tubulações até as torneiras correspondem ao sistema circulatório. No entanto, são extremamente raros os edifícios que possuem o sistema que instrumentaliza o funcionamento e manutenção de todos os outros, tornando todas essas ações quase que imperceptíveis: o sistema nervoso. Na grande maioria dos edifícios construídos os moradores só sentem a necessidade de intervir e fazer a manutenção dos sistemas prediais diante de um caso emergencial, poucos lugares do mundo tem a cultura de fazer manutenções preventivas e as manutenções corretivas são muito mais caras por ser um trabalho mais urgente. Muitos edifícios acabam por não fazer um fundo reserva para manutenções porque os moradores nem sempre estão dispostos a pagar mais uma taxa para isso.
“os condomínios, por exemplo, não
dimensionam taxa condominial para manutenção e às vezes eles chegam para gente - quero fazer uma obra quanto é que custa?. Aí a gente diz 400 mil. E a resposta é - ai meu deus do céu vou ter que passar um ano juntando dinheiro para fazer uma obra. Não dimensionam aquela taxa e vai entrando uma bola de neve.” Franklin Borges Engenheiro Douro Engenharia Briefing de Pós-Obra
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“A manutenção serve como elemento de conserva-
ção. Como a gente não tem costume de fazer manutenção as pessoas acham caro, inclusive em edifícios de alto padrão, mas não é uma coisa tão cara assim. Já fiz laudo que era muito mais complicado que eram laudos de prédios populares de habitação social numa condição muito pior do que um prédio de alto padrão. O custo para você fazer o ensaio é o mesmo e no prédio Habitacional Popular vai ser dividido por famílias que não têm uma condição social favorável. Então, aí você fica com problema porque geralmente esses são os apartamento que mais precisam, não fazem muita manutenção geralmente (...) eles não tem como custear isso. Eles tem muitos outros problemas para pensar, as vezes só querem um lugar para morar, claro.” Franklin Borges Engenheiro Douro Engenharia
Existe uma questão social e cultural forte na falta de manutenção de edifícios, mas é claro que esse é um problema atravessa de uma ponta a outra, não são somente moradores em situação de maior vulnerabilidade social que deixam de tomar medidas preventivas de manutenção, mas também moradores de edifícios de alto padrão. As pessoas sentem que o prédio funciona e só diante de uma situação emergencial é que buscam tomar medidas de manutenção, na grande maioria das vezes não faz parte do cotidiano dos moradores se preocupar com o funcionamento perfeito do edifício que estão instalados. Esses dois fatores apontam para uma questão de extrema relevância: Briefing de Pós-Obra
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Pós-Obra
Onde o pós-obra acontece
Aspectos de manutenção começam a ser considerados na escolha dos materiais.
Projeto
Elaboração do manual de uso, operação e manutenção do edifício.
Entrega do manual no momento de pré-ocupação. Vistoria técnica de pré-ocupação.
Licitação
Obra *Esse manual inclui
o cronograma de manutenção e as medidas que devem ser tomadas para assegurar o usufruto dos termos de garantia
Uso e Operação * Manutenções preventivas e corretivas. Manutenção preventiva: é toda a ação sistemática de controle e monitoramento, com o objetivo de reduzir ou impedir falhas no desempenho de equipamentos. Manutenção corretiva: consiste em substituir peças ou componentes que se desgastaram ou falharam e que levaram a máquina ou o equipamento a uma parada, por falha ou pane em um ou mais componentes.
Briefing de Pós-Obra
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Manutenções Prediais Problemática *Raramente os usuários tomam medidas preventiva
Manutenção Preventiva
Manutenção Corretiva
Alerta de cronograma de manutenção
Alerta de emergência
Aciona aparato técnico
Problemática Nem sempre o condomínio recebe um laudo ou diagnostico.
Laudo com especificações de possíveis soluções
Problemática Nem sempre tem dinheiro para bancar a obra
Assembléia condominial para definir solução e atividades prioritárias
Problemática Construtoras demoram para dar o preço e enviam valores distorcidos
Licitação de contratação das empresas
Problemática Demora na decisão de contratação
Assembléia condominial para definir empresa
Acompanhamento da obra
Entrega Briefing de Pós-Obra
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