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Selecionadores apostam na venda da

Martelo em xeque?

Criadores buscam eficiência comercial em novas modalidades de venda pela televisão

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Venda de animais pela TV a preço fixo abre novas possibilidades para mercado de genética

Precisamos testar modelos, arriscar novos formatos”

Carlos Viacava, dono da grife CV

carol ina rodrigues

carol@revistadbo.com.br

De janeiro a maio de 2020, os leilões virtuais (eventos transmitidos pela TV) venderam 20.045 bovinos de corte, segundo o banco de dados da DBO, incluindo touros, matrizes, bezerras e embriões. A adesão a esse modelo cresceu 97% nesses cinco meses do ano, em relação a igual período de 2019, confirmando uma tendência, seguida por várias atividades comerciais de buscar alternativas para driblar a atual crise econômica causada pela Covid-19. O mercado de leilões tornou-se 100% virtual, com novas modalidades surgindo. Uma delas será adotada pela grife CV, de Carlos e Ricardo Viacava, que, pela primeira vez em décadas, fará 100% de suas vendas pela TV, porém, sem a tradicional presença do martelo (disputa de lances em leilão). Toda a safra 2018 será vendida, em setembro, por meio do projeto “De Olho na Fazenda”, lançado no final de 2018, pelo Canal do Boi. Os animais serão ofertados a preços fixos, com “aparições” na grade de programação da emissora em horários alternativos da semana, por um período de 7 a 10 dias. O objetivo do criador é ampliar a presença da marca CV na televisão e estruturar seu tão sonhado e-commerce.

Viacava, que vendeu cerca de 600 touros Nelore Mocho em 2019, acredita que a nova modalidade é o primeiro passo para o comprador se familiarizar com o preço fixo na TV, dispensando, futuramente, a venda por lances. “Nos últimos anos, realizamos de três a quatro leilões anuais e dificilmente conseguimos vender mais de 300 animais por evento, seja ele virtual ou presencial com TV. O presencial é ainda mais caro, devido à necessidade de buffet e decoração, além de aluguel de circo, bombeiro, ambulância, segurança etc. Já vendemos mais de 300 animais nesses leilões, mas é um verdadeiro atropelo. No final, sempre somos forçados a apressar a venda, pois o horário vai acabando, o que nos obriga a fazer rapidamente concessões de prazo ou preço”, conta Viacava. Essas concessões, segundo ele, têm aumentado também a taxa de inadimplência nos leilões CV nos últimos anos.

A mesma preocupação tem Luciano Borges, titular do Rancho da Matinha, em Uberaba, MG, que produz 700 reprodutores por ano e já começa a pensar na estruturação de seu site para a venda de animais. “A maneira de comercialização hoje é muito cara, tanto para quem vende, quanto para quem compra. Temos parcelamento estendido e frete, o que reduz a margem de lucro. Vamos precisar vender touros pela internet nos próximos anos. Não tem outro jeito”, salienta.

Como funciona

Na nova modalidade de venda, os animais são ofertados a preços fixos informados durante a exibição das filmagens. A leiloeira apenas fecha os negócios, providenciando a papelada necessária. Caso, no último dia da programação, ainda haja animais para venda, faz-se um remate virtual. A percepção de Florêncio Lemos Neto, diretor comercial do Canal do Boi, é que esse modelo comercial irá crescer nos próximos anos. Atualmente, o “De Olho na Fazenda” mantém uma média de quatro programas por mês, cerca de 40 por ano.

Metade desses eventos já dispensa o leilão no último dia de programação. “Hoje, apenas 20% dos animais ofertados são vendidos no martelo. Os outros 80% são fechados durante o período de transmissão”, informa Neto. Isso ocorre, segundo ele, porque a grade disponível é bastante extensa. Os lotes são exibidos em blocos diários de 30 minutos cada, nos programas Bom Dia Produtor e Agenda de leilões, ambos no período da manhã, e no Agricultura BR e Mais Pecuária (esses a tarde), totalizando duas horas diárias de transmissão, por um período de sete a 10 dias. Também são realizadas chamadas em diversos programas da emissora. No caso de Viacava, serão 20 horas de venda.

O criador paulista reconhece o desafio de liquidar toda sua safra (1.000 animais) em 10 dias, mas faz um comparativo com o tempo de 4-6 horas de uma única transmissão (leilão virtual). “A projeção na nova modalidade é maior, além de excluir o efeito da venda por impulso, que é um grande problema de quem vende em quantidade”. Sua estreia no “De Olho na Fazenda”, em setembro, será feita diretamente da fazenda, com entrevistas, apresentações sobre o modelo de seleção CV, participação de convidados e comentários sobre os animais.

Unidade móvel do Canal do Boi...

Criadores durante a transmissão...

Venda a preço fixo pelo De Olho na Fazenda.

O pagamento será realizado em até 10 parcelas, seguindo o modelo já instituído nos leilões CV do ano passado.

Para Paulo Horto, diretor da Programa Leilões, modelos como o “De Olho na Fazenda”, com o qual ele já trabalha, podem mudar a dinâmica do mercado virtual. “Por muito tempo, a venda de genética ficou restrita ao final de semana, nos chamados horários nobres, mas há dois anos venho tentando mudar isso, fazendo leilões nas tardes de sexta-feira. Precisamos avançar para os demais dias da semana. Bolsa de valores não opera aos sábados e domingos. Por que tem que ser diferente para a bolsa do boi?”, diz Paulo Horto. Ele transmite 90% de sua grade de leilões pelo Canal Rural, empresa que também tem um sistema de venda similar ao “De Olho na Fazenda”, o “Balcão do Boi”, que reúne informação, conhecimento técnico, prestação de serviços e comercialização de animais. “A quarentena tem nos permitido nos reinventar. Hoje, temos clientes na TV em horários

Frete e definição de preços

Algumas das vantagens do novo formato de venda são a flexibilização do frete e a melhor logística de entrega. Nos leilões, as rotas de frete são estipuladas antes do evento, sem possibilidade de alterações após as batidas iniciais do martelo. No “De Olho na Fazenda”, o vendedor pode definir os trajetos à medida que os lances são fechados e adequar o valor do frete ao longo do período de transmissão. “Muitas vezes, o vendedor garante uma rota de entrega para determinado lugar e ninguém compra lá”, diz Florêncio Neto. Viacava pretende estipular um valor de frete para determinadas regiões e fazer uma “espécie” de promoção para outras, dependendo da negociação, já que os animais serão vendidos a preços fixos. “Como a oferta é grande, posso equalizar o frete, porque o caminhão sai cheio e vai distribuindo os animais”, observa o criador.

Para definir os preços fixos, Viacava utilizará uma fórmula que considera o peso do animal e suas avaliações genéticas, com diferencial para aqueles acima de TOP 1% no Programa Nelore Brasil, da ANCP. “Em uma condição normal de mercado, temos obtido média de R$ 8.000/cab, mas acredito que faremos lotes com valores entre R$ 7.000 e 10.000, e outros que podem chegar até R$ 40.000. Mas mercado é mercado, né? Nunca sabemos o que vai dar”, reconhece o criador, reforçando o caráter de “aposta” na nova modalidade.

que não tínhamos antes. Não existe mais o horário nobre para venda de genética”, avalia Paulo Horto.

Internet ainda é futuro

Quanto ao uso da internet como ferramenta exclusiva de venda a preço fixo, o diretor da Programa Leilões acredita que o mercado ainda não está preparado para essa migração. A Central Leilões, outra gigante do setor, é da mesma opinião. “Nós vendemos para muitos clientes que não têm internet de qualidade na fazenda, por isso eles não conseguem acompanhar os leilões nessa plataforma. Esses produtores assistem o evento pela televisão e fazem o lance pelo whatsapp ou aplicativo da leiloeira, porque confiam no modelo convencional”, opina Lourenço Campo, diretor da Central.

Dados do “De Olho na Fazenda” validam a tese dos dois empresários em relação à internet. Atualmente, apenas 5% das vendas pela modalidade são concretizadas por quem as acompanha on-line. A maioria esmagadora dos negócios são fechados por produtores que acompanham a emissora pela TV, grande parte deles por parabólica (sinal analógico), pontua Neto, do Canal do Boi. “Faz parte da cultura do pecuarista ver o lote na TV, conversar com o assessor antes de efetivar a compra, ligar para a leiloeira”, diz ele, salientando que juntas, as duas ferramentas (TV e internet) garantem um “plus” à venda.

Quem comprovou isso na prática foi a Cabanha Pitangueiras, criatório de Pedro Monteiro Lopes, que aderiu ao “De olho na Fazenda” em dezembro de 2019. Para Clarissa Rohde Lopes Peixoto, diretora da empresa, a internet teve papel potencializador na divulgação do criatório, que queria atingir um novo público para sua produção de Braford. A aposta deu certo. Apenas dois clientes reincidentes. Os restantes eram novos compradores, de oito Estados da Federação. “O alcance da internet é muito grande. Associada à exposição diária na TV por período prolongado, ela nos garantiu excelente resultado”, avalia Clarissa, que repetiu a dose neste mês de maio, com mais 400 matrizes e ótima liquidez. Além da Pitangueiras já participaram do programa a Fazenda Camparino, Nelore do Golias, Tabapuã G4, Senepol Tamar e Ita, além do Grupo Genética Aditiva. Para Viacava, que aguarda ansioso sua vez, o mercado precisa ter mais eficiência comercial. “Talvez ainda não estejamos totalmente preparados para vender exclusivamente com preço fixo pela internet, mas um dia estaremos. Precisamos testar modelos, arriscar novos formatos”, conclui. n

Não existe mais horário nobre para venda de genética”

Paulo Horto, diretor da Programa Leilões

Internet associada à TV garante ótimo resultado”

Clarissa Rohde, diretora da Cabanha Pitangueiras

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