![](https://assets.isu.pub/document-structure/200611220704-df9c0630f274bf31e55bbe7ece7b3716/v1/eb2e3332aa4adaa44e3cc638514dcccb.jpg?width=720&quality=85%2C50)
4 minute read
Sabor da Carne
from DBO Junho de 2020
by portaldbo
Marcelo Corrêa
Bastos é chefe de cozinha e proprietário dos restaurantes Jiquitaia e Vista, de São Paulo, especializados em cozinha brasileira, e autor, junto com Carlos Alberto Dória, do livro “Culinária Caipira da Paulistânia”.
Advertisement
Miúdos: nutritivos e deliciosos, mas pouco utilizados.
Durante uma pesquisa que eu fazia a esmo, sobre escritores ligados à gastronomia, me deparei, em um blog de literatura espanhola, com uma foto de Manuel Vasquez Montálban, pensador e escritor espanhol, criador de uma série de romances noir, cujo protagonista, Pepe Carvalho, nos intervalos entre uma investigação e outra, preparava e degustava iguarias das cozinhas catalã e espanhola. Estava sentado à mesa com amigos, diante de um prato de callos a la catalana con judías (tripas à catalã com feijão branco). A foto me remeteu de imediato ao Mercado de la Boquería, em Barcelona, onde anos atrás provei, em uma manhã gelada de dezembro, os melhores callos de minha vida. Gostei tanto daquele bucho cozido e bem temperado com páprica, alho e um pronunciado perfume de zimbro, que me inspirei naquelas texturas e aromas para chegar à receita da dobradinha que servimos hoje no Jiquitaia.
Dessa viagem a Barcelona, em que visitei diversos restaurantes badalados, o que me marcou a memória com incrível vivacidade foi esse café da manhã em um botequim chamado Pinotxo, onde provei também um não menos delicioso cozido de cabeça de vitelo e um almoço feito em um estabelecimento muito simples, chamado Bar Casi, próximo ao Parque Guell, onde comi umas botifarras (embutido de carne suína) com batatas, que me enchem a boca d´água só de mencioná-las aqui.
Embora sejam preciosas fontes de sabores e texturas, as vísceras (ou miúdos) e mesmo alguns cortes de carne menos convencionais, como o músculo e a rabada, por exemplo, são relegadas ao exotismo e causam estranheza a boa parte dos comensais. À medida que nos tornamos mais eficientes nas produções pecuárias, essa estranheza parece aumentar. No Reino Unido, por exemplo, de acordo com o National Food Survey (estatísticas do governo britânico sobre alimentação), o consumo per capita de miúdos (offall, como eles dizem), em 1974, era de 50 g por semana; 40 anos depois (2014) não chegava a um décimo disso. No Brasil, essa queda talvez seja ainda mais drástica, já que a oferta de tais produtos ‒ no passado, a cargo de um profissional específico, o bucheiro ‒ hoje é quase nula.
Difíceis de encontrar
Salvo raras exceções, não é fácil encontrar miúdos de qualidade no varejo brasileiro. Em São Paulo, o açougue Pascale, no Mercado Municipal da Cantareira, oferece produtos excelentes, frescos e bem cuidados, e no Mercado da Lapa ainda existem algumas lojas que ofertam miúdos. Eles também podem ser encontrados nas feiras livres. Normalmente, a oferta visa a um nicho de mercado bastante específico: restaurantes típicos do sertão nordestino e os especializados na culinária chinesa. É lamentá
i Fotos: Bronko/Arquivo Jiquit
Inspirada em receita espanhola, a dobradinha do Jiquitaia ressalta a textura e o sabor do bucho bovino.
vel que se despreze ingredientes tão valiosos. Os miúdos são fonte riquíssima de nutrientes indispensáveis à nossa alimentação. Seriam o que chamamos hoje de “superalimentos”. Dizem até que o consumo de vísceras, sangue e gordura ‒ uma dieta significativamente mais rica do que apenas os tecidos musculares que o ser humano aproveitava da carcaça deixada por outros predadores ‒ foi o que viabilizou o salto evolutivo dos nossos ancestrais....
Hoje, boa parte das vísceras vai direto dos frigoríficos para as indústrias de rações para aves e suínos. Por isso, não seria exagero dizer que esses animais, por meio das rações, ficam com a parte mais nutritiva dos abates. O consumo de cabo a rabo (nose-to-tail, como dizem os britânicos) pode ser um instrumento cultural bastante eficiente, também, para se reduzir o desperdício (que, além de cruel, é economicamente custoso) e minimizar o impacto ambiental da nossa produção de alimentos. Enquanto chefes de cozinha quebram a cabeça buscando técnicas modernas e ingredientes raros para oferecer experiências que surpreendam seus comensais, existe um universo de sabores e texturas sendo desprezado ou mal utilizado.
Um caldo de mocotó bem-feito pode “mudar o mundo” (o gastronômico, pelo menos), como bem sabe o chefe Rodrigo Oliveira. Uma língua bem-feita pode causar deleite, seja ela fatiada fina, como faz o chefe e lutador de sumô Fernando Kuroda, seja ela braseada, até adquirir maciez e untuosidade. Uma rabada, uma dobradinha, quando bem-feitas, podem ser transcendentais. Um fígado acebolado com jiló; uma torta de rins; timos (glândulas localizadas junto à traqueia e o coração) grelhados ou fritos, como fazem argentinos e uruguaios; intestinos recheados; coração de boi na brasa... São infinitas as possibilidades. O que precisamos fazer é deixar aflorar nossos instintos, enfrentar nossos preconceitos e aproveitar essas riquezas nutritivas e deliciosas. n
![](https://assets.isu.pub/document-structure/200611220704-df9c0630f274bf31e55bbe7ece7b3716/v1/4c2d5fe894dd4fdd201f2437034d2204.jpg?width=720&quality=85%2C50)
A MAIOR TECNOLOGIA DE FERTILIZANTES DESENVOLVIDA ESPECIALMENTE PARA PASTAGEM.
MAIS QUALIDADE PARA A PASTAGEM. MAIOR RENTABILIDADE PARA O PECUARISTA.
![](https://assets.isu.pub/document-structure/200611220704-df9c0630f274bf31e55bbe7ece7b3716/v1/dc64955eb0c00b84b339dfd5c2c7f231.jpg?width=720&quality=85%2C50)
N - P - S
Tecnologia Fusion ® (nitrogênio, fósforo e enxofre em um único grânulo) Minimiza perdas por volatilização, garantindo melhor rendimento de aplicação Melhor aproveitamento de água e nutrientes