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Indicação para exodontia de terceiros molares impactados: estudo transversal
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CAIO GONÇALVES SILVA 1 | VICTOR HUGO FERREIRA 2 | EVERALDO PINHEIRO LIMA 3 | SUZANA CELIA CARNEIRO 2 | JEFFERSON FIGUEIREDO LEAL 1 | BELMIRO CAVALCANTI VASCONCELOS 1
RESUMO
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Introdução: a remoção de terceiros molares impactados assintomáticos tem sido objeto de considerável controvérsia. Diante disso, o presente estudo tem o propósito de verificar a indicação da remoção de terceiros molares inferiores por cirurgiões bucomaxilofaciais, após avaliarem imagens radiográficas. Métodos: trata-se de um estudo observacional do tipo transversal desenvolvido com profissionais participantes do XXIII Congresso Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (COBRAC 2015) realizado em Salvador/BA, no qual os participantes foram divididos em grupos de acordo com o nível de formação. Resultados: os resultados mostram que a maior parte dos cirurgiões bucomaxilofaciais tende a indicar a remoção dos terceiros molares impactados (TMIs) assintomáticos, sendo que essa tomada de decisão independe do nível de formação e não é influenciada pelo número de anos de experiência. Conclusões: pode-se concluir que não há evidências suficientes na literatura atual para determinar a remoção profilática de rotina de TMIs assintomáticos. A indicação ou não de remoção de TMIs assintomáticos deve levar em consideração a aceitação dos pacientes, bem como o conhecimento clínico do profissional para orientar a tomada de decisão.
Palavras-chave: Dente serotino. Dente impactado. Cirurgia bucal.
1 Universidade do Pernambuco, Faculdade de Odontologia, Setor de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (Camaragibe/PE, Brasil). 2 Hospital da Restauração, Departamento Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (Recife/PE, Brasil). 3 Sindicato dos Odontologistas de Pernambuco, Curso de Especialização em Implantodontia (Recife/PE, Brasil).
Como citar este artigo: Silva CG, Ferreira VH, Lima EP, Carneiro SC, Leal JF, Vasconcelos BC. Indication for extraction of impacted third molars: Cross-sectional study. J Braz Coll Oral Maxillofac Surg. 2019 Sept-Dec;5(3):24-8. DOI: https://doi.org/10.14436/2358-2782.5.3.024-028.oar
Enviado em: 17/02/2019 - Revisado e aceito: 26/06/2019
» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.
» O(s) paciente(s) que aparece(m) no presente artigo autorizou(aram) previamente a publicação de suas fotografias faciais e intrabucais, e/ou radiografias.
Endereço para correspondência: Caio Gonçalves Silva Av. Gal. Newton Cavalcanti, 1.650, Tabatinga – Camaragibe/PE CEP: 54.753-220 – E-mail: caiocgsilva@gmail.com
INTRODUÇÃO
A remoção cirúrgica de um dente impactado é um dos procedimentos mais comuns realizados por um cirurgião bucomaxilofacial no consultório odontológico 1,2 . Os terceiros molares são os dentes mais comumente impactados, com uma taxa média mundial de impactação de 24% 3 . Terceiros molares impactados (TMI) podem estar associados a alterações patológicas, como pericoronarite, reabsorção radicular, gengivite, periodontite, cárie e desenvolvimento de cistos e tumores 4 . A remoção profilática proposta por alguns autores 5,6 busca evitar o desenvolvimento dessas lesões, além de evitar esse procedimento numa fase mais avançada da vida, quando o risco de complicações pós-operatórias é maior 4 . A cirurgia de remoção do TMI é, geralmente, um procedimento simples e realizado sob anestesia local em ambiente ambulatorial. No entanto, por uma variedade de razões, alguns pacientes necessitam de atendimento hospitalar sob anestesia geral ou sedação intravenosa para realizar essas exodontias 1,4,5 . Todo procedimento para a remoção do TMI apresenta riscos para o paciente, incluindo lesão nervosa temporária ou permanente, alveolite, infecção, hemorragia, edema, dor e trismo. Além disso, essa cirurgia é frequentemente percebida pelos pacientes como uma situação intensamente assustadora, sendo, em alguns casos, um procedimento cirúrgico desnecessário, pois o dente apresenta-se completamente irrompido na cavidade bucal e não tem sinais clínicos e radiográficos de lesão associada 1,7,8 . A remoção de TMIs assintomáticos tem sido objeto de considerável controvérsia. Alguns autores defendem a remoção como benéfica para os pacientes, por prevenir o risco de futura lesão óssea 5,6 . Por outro lado, a remoção do terceiro molar pode resultar em vários tipos de morbidades, sendo, então, recomendado o monitoramento clínico do TMI 7 . Diante disso, o objetivo do presente trabalho é verificar a indicação da remoção de terceiros molares inferiores por parte dos cirurgiões bucomaxilofaciais após avaliarem imagens radiográficas.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo observacional do tipo transversal, realizado durante o XXIII Congresso Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (COBRAC-2015) em Salvador/BA, no período de 25
25 a 29 de agosto de 2015, no qual alguns profissionais da área de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial que estavam presentes foram abordados durante o evento e responderam a um questionário sobre indicação da remoção de terceiros molares inferiores, após avaliarem imagens radiográficas.
O estudo foi conduzido de acordo com o estabelecido pela resolução número 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde, referente à ética em pesquisa envolvendo seres humanos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital da Restauração (parecer #2.753.179).
Com a finalidade de coletar os dados, foi construído um questionário incluindo idade, sexo, titulação (residente/especializando, especialista, mestre, doutor), tempo de formação na área e uma série de quatro casos clínicos hipotéticos, por meio dos quais cada profissional avaliou imagens radiográficas com diferentes tipos de inclusões dentárias na mandíbula e manifestou sua indicação ou não para exodontia (Fig. 1). Para aquisição das imagens radiográficas, foi utilizado o banco de dados de uma clínica radiológica da cidade do Recife/PE.
Para coleta dos dados, a equipe foi calibrada para o uso do questionário e para aquisição de uma amostra aleatória de participantes durante o evento. Após a coleta dos dados, foi utilizada a planilha Microsoft Excel para tabulação dos dados e cálculos estatísticos.
RESULTADOS
Foram analisados 170 questionários que se enquadraram nos critérios de inclusão da pesquisa. Dos profissionais participantes da pesquisa, 71,1% eram do sexo masculino e, na maioria, especialistas. O percentual de participantes em relação ao estágio de formação na especialidade de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial consta na Figura 2.
Sessenta e quatro por cento optaram pela remoção do dente incluso como uma medida profilática, já que a maioria dos casos apresentados era de pacientes jovens. Entretanto, esse percentual de indicação de exodontia variou de acordo com a situação clínica apresentada. O total de indicações por caso pode ser observado na Tabela 1.
O total de indicações de exodontias em cada situação clínica não variou significativamente entre os profissionais com diferentes níveis de formação, como pode ser observado na Figura 3.
A
B
C
D
Figura 1: Imagens radiográficas para avaliação de exodontia do terceiro molar inferior incluso: A) paciente jovem, sem comorbidades, assintomático (caso 1); B) paciente idoso, sem comorbidades, assintomático (caso 2); C) paciente jovem, sem comorbidades, assintomático (caso 3); D) paciente jovem, sem comorbidades, assintomático (caso 4).
Figura 2: Percentual de participantes, segundo o nível de formação.
Figura 3: Percentual de indicações de remoção dos terceiros molares inclusos, por nível de formação, em cada caso clínico.
Tabela 1: Percentual de indicações ou contraindicações de remoção dos terceiros molares inclusos, por caso clínico.
Sim Não Caso 1 62% 38% Caso 2 15% 85% Caso 3 93% 7% Caso 4 85% 15%
DISCUSSÃO
A conduta frente à remoção de TMIs sintomáticos é bem descrita nos mais diversos livros de cirurgia bucomaxilofacial. Entretanto, ainda permanece um dilema para o cirurgião como deve proceder diante de um caso de elemento dentário incluso assintomático 7,8 . Os TMIs podem estar associados a alterações patológicas, como pericoronarite, reabsorção radicular, problemas periodontais, cárie e desenvolvimento de cistos e tumores 1,4,9 . Outras razões para justificar a remoção profilática de TMIs assintomáticos incluem a prevenção do apinhamento dos incisivos inferiores, em preparação para cirurgia ortognática ou para radioterapia 4 . Muitos dentistas e seus pacientes acreditam que a remoção de TMIs assintomáticos é justificada para evitar futuras complicações em uma fase mais avançada da vida, em que o manejo terapêutico e cirúrgico é mais complexo, e o risco de complicações pós-operatórias aumenta 4,9 . Segundo estudos de Metts et al. 7 e Huang et al. 10 , os pacientes são bastante influenciados pelas recomendações dos seus cirurgiões-dentistas que indicam a remoção dos TMIs por razões profiláticas. Dessa forma, a indicação de exodontia profilática deve ser baseada na literatura, tanto para oferecer o melhor tratamento para o paciente, como, também, para um respaldo legal diante de possíveis complicações no pós-operatório, que podem gerar ações judiciais.
O Congresso Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (COBRAC) é o maior evento da especialidade no Brasil, participando grandes nomes da especialidade no Brasil, como também personalidades com reconhecimento mundial, devido ao trabalho que desenvolvem dentro do campo da cirurgia bucal e maxilofacial. Nesse sentido, podemos inferir a relevância do presente estudo, pois foi realizado com profissionais de alto nível, com elevado conhecimento científico e que trabalham com base no que de melhor existe na literatura.
27 Nesse estudo, foi incluído um total de 170 questionários de profissionais, os quais eram participantes do mencionado congresso. Do total de avaliados, 49 possuíam doutorado (29% do total), 40 eram mestres (24% do total), 60 eram especialistas (35% do total) e 21 eram residentes ou especializandos (12% do total). Por meio da análise dos dados obtidos, observa-se que a maioria dos profissionais pesquisados tende a indicar a exodontia dos TMIs assintomáticos. Entretanto, quando se compara a conduta frente a um paciente jovem com um paciente idoso, observa-se que os profissionais tendem a ser mais conservadores em relação ao paciente idoso, mas indicam com maior frequência a exodontia profilática em pacientes jovens.
Essa tendência segue o que diz a pesquisa transversal realizada por Petrosyan e Ameerally 11 , na qual foi descrito um critério para remoção profilática dos terceiros molares. Segundo os autores, em pacientes jovens, deve ser realizada a exodontia do TMI e do seu contralateral de maneira profilática, caso esse último apresente-se parcialmente irrompido. Os autores justificam sua conduta argumentando que pacientes jovens têm mínimas possibilidades de complicações graves pós-operatórias, além de apresentarem uma recuperação mais rápida. Do mesmo modo, Talwar et al. 12 afirmam que pacientes jovens submetidos à exodontia dos terceiros molares possuem pouca morbidade, com baixa prevalência de complicações pós-operatórias e mínimo impacto na qualidade de vida, concluindo que a indicação desse tipo de cirurgia em pacientes com essa idade traria mais benefícios do que malefícios ao paciente.
A indicação de remoção de TMI na faixa etária mais elevada também foi diminuída no estudo de Ethunandan et al. 13 Fatores como diminuição da elasticidade óssea, risco de osteoporose, atrofia óssea e maior potencial de anquilose dentária apoiaram a decisão.
O estudo de Camargo et al. 14 avaliou a tomada de decisão entre cirurgiões bucomaxilofaciais em relação à cirurgia do TMI e observou que o grupo com menor tempo de experiência tendia a recomendar as exodontias com maior frequência. A conclusão desses autores difere dos dados observados no presente estudo, pois não houve diferença significativa na conduta frente aos casos clínicos apresentados nos diferentes estágios dentro da especialidade.
Não há evidências suficientes na literatura atual para determinar a remoção profilática de rotina do TMI assintomático 4,7 . O manejo de TMIs assintomáticos e livres de doenças permanece controverso. A abordagem atual ao lidar com os TMIs é baseada no julgamento clínico, avaliação periódica por alguns profissionais e extração precoce por outros, não existindo um consenso por parte dos cirurgiões no manejo do TMI 1,4,15,16 . Diante da escassez de evidências, a indicação ou não de remoção de TMIs assintomáticos deve levar em consideração a aceitação dos pacientes, bem como o conhecimento clínico do profissional para orientar a tomada de decisão.
CONCLUSÃO
A tomada de decisão quanto à remoção cirúrgica de terceiro molar impactado assintomático independe do nível de formação do profissional.
Existe insuficiência de provas para apoiar ou refutar a remoção de terceiros molares inclusos assintomáticos.
ABSTRACT Indication for extraction of impacted third molars: Cross-sectional study Introduction: Removal of third impacted asymptomatic molars has been the subject of considerable controversy. Therefore, this study aims to verify the indication of removal of lower third molars by oral and maxillofacial surgeons after evaluating radiographic images. Methods: This was an observational cross-sectional study developed with professionals participating in the XXIII Brazilian Conference on Oral and Maxillofacial Surgery (COBRAC-2015) held in Salvador, Bahia, Brazil, in which the participants were divided into groups according to the level of training. Results: The results show that most oral and maxillofacial surgeons tend to indicate the removal of asymptomatic impacted third molars (ITMs), and this decision-making is independent of the level of training, and the number of years of experience does not influence it. Conclusions: It can be concluded that there is insufficient evidence in the current literature to determine routine prophylactic removal of asymptomatic ITMs. The indication or not of removal of asymptomatic ITMs should take into account the patients acceptance as well as the clinical knowledge of the professional to guide the decision making. Keywords: Molar, third. Tooth, impacted. Surgery, oral.
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