Legislação
Lista Pet: o uso de animais silvestres como animais de estimação DEPUTADO FEDERAL RICARDO IZAR
A criação de animais silvestres mostrou-se presente desde a chegada dos portugueses à Terra de Santa Cruz, isto é, ao Brasil
Texto: Deputado Federal Ricardo Izar (Progressistas – SP)
S
Economista, coordenador para o Sudeste da Frente Parlamentar em Defesa do Consumidor de Energia Elétrica e membro da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara Federal, Presidente da Frente Parlamentar de Habitação e Desenvolvimento Urbano, Presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Animais, Membro do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados
abe-se que indígenas nativos já possuíam em seu voca-
bem pertencente ao Estado. A partir de então, a posse de espécies como
bulário um termo denominado xerimbabo, que significa
papagaios, araras, entre outros, estaria condicionada a ter sua origem vin-
“animal de criação ou estimação”. Tal comportamento - o
culada a criadouros autorizados. Essa foi uma tentativa do Estado brasileiro
de manter animais silvestres sob cativeiro e proximidade
de acabar com a captura indiscriminada de animais na natureza e oferecer
- parece ter sido desde então hábito assimilado pelos bra-
ao cidadão a opção de adquiri-los legalmente. Agora, no ano 2021, passa-
sileiros. De lá para cá, papagaios e outros animais foram
dos mais de 50 anos, temos a prova concreta de que a proposta não foi su-
levados para o resto do mundo e seu aprisionamento, infelizmente, tem per-
ficiente para coibir a guarda ilegal de animais, haja vista o tráfico de animais
durado. É preciso que se diga que este hábito (ter animais silvestres como
silvestres ter prosperado frente à possibilidade de compra desses mesmos
animal pet) envolve invariavelmente a captura de animais da natureza, sua
animais em criadouros e lojas autorizadas.
manutenção em condições precárias e o fomento do comércio de espécies excêntricas que despertem interesse num público alvo.
Podemos afirmar sem medo de errar que a política de ofertar animais de origem legal como alternativa ao tráfico falhou de forma colossal. Aliás, não
Devemos repetir à exaustão que a persistência histórica de um fato ou
apenas falhou, como muitas vezes apresenta uma incômoda relação com
comportamento não chancela, por si só, a moralidade do ato propriamente
o tráfico de animais que assola o país. Essa relação se verifica na curiosa
dito. Se assim fosse, deveríamos referendar a destruição da mata atlântica,
coincidência entre as espécies mais traficadas da atualidade com aquelas
o massacre de indígenas, o tráfico negreiro no oceano atlântico, o massacre
mais criadas pelo segmento amadorístico de reprodução de passeriformes,
das baleias, o antissemitismo, o regime de apartheid na África do Sul, as
por exemplo. Além disso, a lavagem de animais capturados na natureza,
ações nazistas, entre inúmeras outras atitudes humanas deploráveis per-
mediante fraude de seus documentos de origem e seu sistema de marca-
petuadas ao longo de sua história. Fiz questão de colocar ações cometidas
ção, tem se mostrado prática corrente.
contra a natureza ao lado de ações contra a humanidade como forma de
Esta falência da política de criação comercial de animais não deve, po-
lembrar que, passados os anos, usualmente nos arrependemos de atos
rém, acobertar a real e necessária discussão sobre o tema: é correto manter
que foram cruéis ou injustos com nossa espécie – mas somos lenientes
em cativeiro animais da fauna silvestre? A resposta é claramente não. Não
quando o crime é cometido contra não-humanos. Não raro, comportamen-
existe lógica em manter em cativeiro animais que podem viver em liber-
tos considerados legítimos e legais, praticados em determinado local ou
dade. À fauna doméstica devemos proporcionar abrigo, proteção, adoção
momento da história, uma vez submetidos a uma reflexão ética, acabam por
e guarda responsável, mas para a fauna silvestre podemos propiciar algo
ser relegados à vergonha e ao esquecimento.
ainda melhor: a sua liberdade. Pensando nesse cenário, protocolei projeto
A livre captura de animais silvestres no Brasil era liberada até o advento
de lei de minha autoria (PL nº 4.705/2020) que proíbe a criação de animais
da Lei nº 5.197/67, momento este em que a fauna silvestre passou a ser
silvestres com objetivo comercial. Porém, até que este projeto de lei tramite
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