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CAP 5: CONTO: RENOVANDO A AUTO-ESTIMA, A MULHER QUE EXISTE EM VOCÊ
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CONTO: RENOVANDO A AUTO-ESTIMA, A MULHER QUE EXISTE EM VOCÊ.
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Chovia. Lucilenne estacionou o carro na Unidade Básica de Saúde na qual sua equipe se encontrava. Pensava nos seus pacientes de re-habilitação. Que a essa hora já deveriam estar esperando. Ou devido à chuva, achavam que elas não iriam mais. “Essa chuva atrasa tudo.” Era fonoaudióloga. Sua equipe constava de uma médica, duas psicólogas, duas fisioterapeutas, uma enfermeira, duas terapeutas ocupacionais. “As garotas super poderosas” ela brincava, por serem todas mulheres. Naquele dia, as visitas teriam de ser reduzidas. Algumas ruas estavam alagadas. Infelizmente alguns pacientes não seriam atendidos. Exercer sua profissão lhe dava tanto prazer... atender aqueles pacientes, em sua grande maioria acamados, tirando a sonda, fazendo exercícios para voltarem a comer sem a incômoda borracha pelo nariz, era extremamente libertador. Era como se ela própria, a cada paciente que ajudava, redescobrisse o prazer de comer. Lu, como a chamavam, era uma “elegante balzaquiana” com ela gostava de se chamar, mesmo sem saber direito o significado. Sabia que era bonita, “mais ou menos”, e que já não era um brotinho... então lhe parecia que a palavra lhe caia bem. Morena, apesar dos seus 51 anos, se sentia jovem e sexy. Tinha dois filhos e uma netinha e seguia firme no seu casamento com “Seu” Jua, o Juarez Antunes, contador. Ano passado, completam 25 anos de casados, mas não puderam comemorar devido ao nascimento de Yasmin, sua neta, fruto de um
namoro conturbado de Tiago, o filho caçula. Esse ano não! Não iria deixar passar em brancas nuvens os seus 26 anos de união com Juarez. Era feliz. Apesar das dificuldades, sentia-se feliz no seu mundo. E ajudava muitas pessoas com seu exemplo. A fonoaudiologia veio mais como necessidade do que como opção. Já estava casada há 5 anos e nada de filhos. “Minha filha, na hora certa Deus manda, tenha paciência”, dizia a mãe. E veio. Uma menina com Síndrome de Down. No início foi um choque, mas logo Lucilenne juntou forças para se adaptar às necessidades de Laura. Logo depois veio Tiago. Os primeiros cinco anos foram voltados para as crianças. Em uma das consultas de Laura, se encantou com a Fono. Viu como uma possibilidade de integrar uma criança especial no mundo, esse nosso mundo louco. Uma criança que não estivesse preparada para ele, teria a comunicação como um meio. Após as crianças crescerem, ingressou na faculdade e logo após seu término, integrou essa equipe na qual está até o momento. Assim levava sua vida. Estava conversando com as meninas na copa um dia sobre o que faria para a comemoração de casamento. Ela não queria uma festa... queria algo entre ela e o esposo. Algo que ele sempre se lembrasse, que os unisse mais e que acendesse a tal “chama da paixão”. Será? - Por que você não faz umas fotos produzidas? Sugeriram. O que? Nunca tinha ouvido falar. Mas quando deu por si, já tinha sido seduzida pela ideia. Auto-estima para isso ela tinha. As fotos ficaram um sucesso! Juarez que o diga! Ela o levou para um motel próximo e o presenteou com as fotos. Depois disso, Lu jura que não foi mais a mesma mulher. Não só pela noite que foi “ma-ra-vi-lho-sa” segundo ela, mas pela mulher que se tornou depois da sessão fotográfica. Se ver naquelas fotos, com “plumas e paetês “, toda maquiada e produzida, teve um efeito que ela não contava. - Gente, essa foto aqui de close de você rindo e jogando a cabeça pra trás está linda! Disse uma.
- E essa com colar de pérolas e camisola preta tipo melindrosa, um arraso! Disse outra. Ela levava seu álbum e mostrava para as amigas que como um rastilho de pólvora estavam se animando! Em meio ao burburinho teve uma ideia. E se ela fizesse um estúdio em sua casa e chamasse as amigas para fotografar? Ela queria que as amigas passassem por essa experiência também! - Tem certeza Lucilenne que você não tirou a roupa? Olha lá... No que ela respondia rindo: - Gente, tudo é muito profissional MESMO. O Paulinho fotógrafo fica conversando conosco, com a maquiadora, contam piadas, rimos o tempo todo. É tudo uma grande brincadeira. Um clima ótimo! Afinal somos todas mulheres e essa foto vai ser para nos lembrarmos desse momento tão legal. Completava entusiasmada. Quando Luana, a Assistente Social que casaria dali há 30 dias, fez seu ensaio para presentear o noivo, foi a gota. Com seus cabelos cacheados chegando até as costas, fazendo as vezes de vestido, Luana posou sentada em uma cadeira somente com meias arrastão e scarpin de salto agulha preto. As garotas super-poderosas enlouqueceram. E decidiram. Queriam também ser ver bonitas! A conversa agora girava nas tais fotos na casa da Lucilenne. Todas queriam ver os álbuns. Quem tinha se vestido do que, qual pose ficava melhor, se estava rindo ou séria, enfim... A agitação foi tanta que Patrícia, a jovem médica vinda do interior, não conseguiu ficar de fora. Patrícia tinha acabado de ter seu bebê. Seu esposo, outro jovem médico tão (ou mais) inexperiente quanto ela, descobriu que não era aquilo que ele queria da vida. Um belo dia, o sonho da família feliz acabou. Leandro foi embora. A médica foi acolhida naquele grupo de mulheres com idades e pensamentos diferentes. Era uma estranha, mas ao mesmo tempo fazia sim parte do grupo. A cada história um aprendizado. Ali formavam uma equipe. Uma irmandade. Estavam todas no mesmo barco chamado Vida. Mesmo não querendo ou não sabendo.
Patrícia se sentia um trapo. Ainda com os peitos cheios de leite, aceitou fotografar mais para pararem de encher seu saco, do que por vontade mesmo. E amou! Para disfarçar a barriguinha, deitava de bruços em meio a almofadas de plumas brancas em volta de uma gigantesca renda preta que contrastou com seu cabelo loiro e olhos verdes. Todas, absolutamente todas, concordavam que foi ela a melhor modelo. Ela sabia que não, mas mesmo assim aceitou o título. Se ver bonita, resgatou aquilo que estava adormecido, sua feminilidade. Independente de estar acompanhada ou não, de ser mãe ou não, era ela quem estava ali. Era ela de novo. Lucilenne estava feliz. “Como é que pode essas fotos nos balançar tanto?” Pensava. Lembrou de um comentário feito pela maquiadora: “As mais tímidas chegam aqui todas quietinhas. Quando entram pra fotografar elas já jogam o roupão no chão. Você nem as reconhece. Encarnam mesmo a personagem.” - Isso é uma terapia e tanto. Continuou a Fonoaudióloga. - É como se em algum momento da vida, a gente se perdesse e basta um sinal para que voltemos a nos encontrar. Para algumas o sinal precisa ser mais forte, para outras pode ser mais discreto. Mas, uma hora ou outra, a magia acontece e você se redescobre. Pode ser mais velha, com os cabelos brancos, ou mais nova, com uns quilinhos a mais. Não importa. Uma hora você se vê como é. E gosta. Daí ninguém te segura. Quando você se assume do jeito que é você se torna poderosa. Sobe no salto!