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nº12 out/nov/dez 2013
outdoor Revista
Torna-te fã
AVENTURAS PROFUNDAS Dupla In Silence
Entrevista
com Tiago Costa
os mitos
da Sobrevivência
O pioneiro do alpinismo Rui Gomes da Silva
MONTANHA
Kazbek por Luísa Tomé
descobrir
16 Caminhadas em Portugal
Diretrizes EDITORIAL
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GRANDE REPORTAGEM In silence - aventuras profundas
06
em família Passeio no Caramulo
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Curso de escalada em Família
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aventura MONTANHA - Kazbek com Luísa Tomé
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DESAFIO — Viver a Lenda do Tour
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nº12 Outubro a Dezembro
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entrevista Tiago Costa — Ser guia de trekking
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POR TERRA 16 Caminhadas em Portugal
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INDOOR - Preparação Indoor para Trekking
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INDOOR - Crossfit
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INDOOR - Entrevista Susana Henriques
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UMA VIDA DE AVENTURA - O pioneiro do Alpinismo
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AVENTURA - Makbut
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ÁGUA DESPORTO - O que é o Mergulho
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Armando Ribeiro e José Marques formam desde 2004 a equipa In-Silence para explorar naufrágios profundos contemporâneos na costa portuguesa e participar em expedições internacionais de mergulho.
FOTOGRAFIA PORTFOLIO DO MÊS — Carlos Tiza
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SOS SAÚDE DO VIAJANTE - Jet Leg
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Os mitos da sobrevivência
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DESCOBRIR Pequenas Rotas em Nisa
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RECEITA OUTDOOR
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LIVRO AVENTURA — Vagabundo de Mares
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PROJETO - Vagamundos
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ATIVIDADES OUTDOOR
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DESPORTO ADAPTADO O mergulho não é para super-homens
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ESPAÇO APECATE Turismo Subaquático
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EQUIPAMENTO
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a fechar
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Tiago Costa, é uma amante de Outddor. Explorar, viajar e conhecer são algumas das bases da sua vida, mas ser guia de viagens é uma das suas grandes paixões.
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Os textos e imagens presentes na Revista Outdoor são da responsabilidade dos seus autores. Não é permitido editar, reproduzir, duplicar, copiar, vender ou revender, qualquer informação presente na revista.
Sentir-se completamente perdido numa situação de sobrevivência é perigoso. Mas ainda é mais perigoso acreditar em mitos que se forem colocados em prática podem trazer-lhe problemas...
Editorial Ficha técnica
cHEGOU O NÚMERO 12!
C
hegaram os dias de Outono e com eles a nova edição da Outdoor!
www.portalaventuras.clix.pt Edição nº12
Com as primeiras chuvas e frio, muitos perdem a vontade de sair para a rua e partir à aventura. Com esta nova edição queremos desafiá-lo a sair de casa e descobrir um imenso mundo de aventuras dentro e fora de portas. Ficar no sofá não é a solução! Iniciamos a nossa viagem pelas aventuras em profundidade da dupla In Silence. Já ouviram falar da descoberta dos restos do avião suíço que se despenhou na Ilha da Madeira em 1977? A não perder esta e outras fascinantes descobertas na Grande Reportagem. Ainda pela água convidamo-lo a saber um pouco mais sobre mergulho e como se iniciar na modalidade.
Deixando a água e partindo para Terra, aceitem o nosso convite e venham caminhar no nosso país… são 16 sugestões de percursos que não o vão deixar indiferente. Ainda a pé, estivemos à conversa com Tiago Costa e descobrimos algumas curiosidades sobre uma das suas grandes paixões… ser guia de trekking! Lá por fora, Luísa Tomé levou-nos até ao Kazbek, numa grande aventura na montanha. Estas são algumas das sugestões de leitura deste número 12, mas há mais. São mais de 100 páginas de aventuras, descobertas e sugestões… Aproveitamos este espaço para agradecer a todos os que continuam a colaborar connosco e a lançar um desafio aos nossos seguidores. São fãs de atividades outdoor? Gostavam de ver a vossa aventura na Revista Outdoor? Vão ao nosso site e no formulário contactem-nos com a vossa proposta. Venham daí, libertem o vosso espirito aventureiro e combatam o sedentarismo! Até janeiro e já sabem, continuem a acompanhar as ultimas novidades do mundo outdoor no Portal Aventuras. ø
WPG – Web Portals Lda NPC: 509630472 Capital Social: 10.000,00 Rua Melvin Jones Nº5 Bc – 2610-297 Alfragide Telefone: 214702971 Site internet: www.revistaoutdoor.pt E-mail: info@revistaoutdoor.pt Registo ERC n.º 126085 Editor e Diretor Nuno Neves | nuno.neves@portalaventuras.pt Marketing, Comunicação e Eventos Isa Helena | isa.helena@portalaventuras.pt Revisão Cláudia Caetano EVENTOS info@portalaventuras.pt Colaboraram neste número: ana barbosa, ANA FAIAS, ALEXANDRE, ANABELA, ARMANDO RIBEIRO, Aurélio Faria, artur pegas, BRUNO MILITÃO, CARLOS TIZA, FILOMENA GOMES, JOÃO RODRIGUES, JOSÉ ALBERTO, JOSÉ MARQUES, LUÍS SÁ COUTO, luís varela, luísa tomé, PAULO GUERREIRO, RICARDO MENDES, rui dantas, SÉRGIO CEBOLA, SUSANA HENRIQUES, TIAGO COSTA, VANDA PINTO som Isa helena Design Editorial Inês Rosado Fotografia de capa in silence Desenvolvimento Ângelo Santos
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Grande Reportagem
Fotos: In-Silence
AVENTURAS PROFUNDAS, DUPLA IN SILENCE
MERGULHO NA II GUERRA Na quase década já partilhada de aventuras extremas, a dupla testou os limites técnicos e humanos numa expedição a norte do Círculo Polar Ártico. Em Narvik, no mar da Noruega, Armando e José mergulharam em águas frias (5º C) e na história de uma das maiores batalhas navais da Segunda Guerra Mundial. Em abril de 1940, a Marinha britânica lançou a operação Wilfred, e atacou a frota nazi fundeada nos fiordes do norte da Noruega. O alvo principal foi o porto de embarque do minério da Lapónia sueca, fundamental para os esforços nazis de guerra. «A 70 m de profundidade, afundado de lado, no seu interior ainda existem restos mortais, todas as munições no interior, há cargas explosivas de profundidade e minas em redor dos destroços dos navios bombardeados e afundados.» Na expedição a Narvik, houve um mergulho que ainda hoje traz vívidas recordações aos 2 portugueses.«O ex-libris foi termos descoberto o
símbolo do navio, - do destroyer Erich Geise -, que é uma águia com metro e meio de envergadura, e nas garras da águia, estar uma coroa de louros com o símbolo nazi, em bronze». Além da profundidade, Armando recorda a escuridão: «A visibilidade máxima é de 10 a 15 metros, há sempre partículas em suspensão, a água é leitosa e nunca totalmente clara, parece que anda sempre uma poeira no ar, é como se estivéssemos no nevoeiro!» OS REBREATHERS «Tem um ambiente incrível, especialmente nos À espera do melhor mas preparados para o pior podia ser o lema destes mergulhadores. Para ultrapassar a cota dos 100 metros e alcançar profundidades atingidas por poucos mergulhadores, Armando e José utilizam “rebreathers” e realizam um tipo de mergulho técnico com equipamento de circuito fechado. Por oposição ao mergulho com garrafas de ar, e tal como num ventilador de um hospital ou num avião, o equipamento reaproveita o gás respirado «Respiremos devagar ou depressa, o volume de consumo é sempre constante, podemos fazer um mergulho de 10 horas. Traz grandes vantagens para mergulhos mais profundos e mais longos; e tem ainda outra vantagem: faz otimização de gases que respiramos, permite-nos patamares de descompressão mais curtos e eficientes porque estamos a respirar mistura mais apropriada para as profundidades a que estamos.» O regresso à superfície desde os 100 metros de profundidade demora normalmente mais de 2
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Grande Reportagem Aventuras Profundas
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rmando Ribeiro e José Marques formam desde 2004 a equipa In-Silence para explorar naufrágios profundos contemporâneos na costa portuguesa e participar em expedições internacionais de mergulho. Em Portugal, ficaram conhecidos pela descoberta do cargueiro grego Agios Nikolaos, afundado ao largo de Peniche e pela localização dos destroços do avião suiço que se despenhou em 1977, na costa sul da Madeira.
Fotos: In-Silence
Grande Reportagem horas. Registado no computador, o gráfico típico de um mergulho destes mostra uma descida rápida, e pouco mais de 15 minutos no fundo, para uma subida muita lenta que permita a descompressão adequada. A única desvantagem, reconhecida por ambos, são os custos: o preço de um “rebreather” nunca é inferior a dez mil euros. Em termos de mergulho, «levamos ainda camadas extra de roupa porque mergulhos são mais longos, e podemos estar até 4 horas dentro de água, e ficar muito tempo parados nos patamares de descompressão». Máscaras, luvas e computadores são outras redundâncias praticadas a nível de equipamento.«Não queremos que haja falhas, mas vamos sempre a pensar nelas». E para o caso de uma “dor de barriga” a grande profundidade, os mergulhadores usam habitualmente fraldas sob os fatos de mergulho, um truque que evitará problemas adicionais no regresso lento à superfície. AVIÃO A 100M «No início da descida não parecia ser um avião, aos 85m começámos a avistar vulto que parecia antes uma rocha... Com a aproximação, o vulto foi-se definindo, e aí, sim, começámos a ver a cauda do avião, e nadámos em direção aos motores que tem 2 jatos». Só novos mergulhos ainda não planeados podem confirmar oficialmente a descoberta de 2011, mas na Madeira, José Marques e Armando Ribeiro podem ter encontrado os destroços do avião suiço que se despenhou a 18 de dezembro de 1977, a sul da ilha. O alegado destroço do Super Caravelle da já extinta companhia suiça de charters SATA foi localizado a 100 metros de profundidade, a uma milha da costa do Porto Novo, nas imediações do aeroporto de Santa Cruz.
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Em dois mergulhos, José e Armando não encontraram as caixas negras que podiam ainda explicar o acidente que matou 36 pessoas. Sobreviveram 21 passageiros e tripulantes, incluindo os pilotos a quem foram atribuídas responsabilidades pela aterragem falhada. «Há primeira sensação de bastante alegria de encontrar destroço, depois há segunda sensação mais estranha, quando olhamos para avião quebrado ao meio, na parte das asas... A parte das asas ainda não encontramos... A haver corpos, já estarão desfeitos entre os estofos...» SILÊNCIO E ESCURIDÃO Em termos físicos e de personalidade, Armando e José não têm quase nada em comum, e só os une a falta de cabelo e o gosto pelo mergulho de expedição. «Costumo dizer que o Zé é 80 e eu sou 8. Ele é um pouco mais expansivo e eu sou mais reservado. Acho que fazemos equipa fantástica!», explica o calmo Armando. O extrovertido José prefere antes contar as 2 razões para a escolha do nome In-Silence: «A primeira razão, é o tipo de mergulho profundo que realizamos, e o mergulho em naufrágio, muitas vezes é como mergulhar num túmulo. Alguns destroços são mesmo sepulturas de guerra, nota-se ali algum silêncio sepulcral, e sentimos respeito pela História. Somado a este silêncio, a segunda razão, temos o silêncio dos rebreathers». AGIOS NIKOLAOS Antes do mergulho nos destroços do avião suiço, José e Armando tinham já partilhado outras descobertas em águas portuguesas. «A norte de Lisboa, mergulhámos já no porta-contentores Kassamba, e na zona de Peniche, estivemos no vapor Selir (75m), e no Dago
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“O Agios Nikolaos, (66-70m) foi descoberto por nós em 2006 e foi um naufrágio virgem que ninguém sabia que existia aqui em Peniche». ”
Fotos: In-Silence
Grande Reportagem
(50m)...» Foi, aliás, ao largo de Peniche que os In-Silence tiveram a sensação única de serem os primeiros mergulhar num naufrágio. «O Agios Nikolaos, (66-70m) foi descoberto por nós em 2006 e foi um naufrágio virgem que ninguém sabia que existia aqui em Peniche». A localização do cargueiro grego que transportava minério, e se afundou há mais de quarenta anos nas imediações das ilhas Berlengas, obrigou os dois mergulhadores a muito trabalho em terra. Testemunhas ainda vivas do acidente e investigação histórica deram as pistas certas para a descoberta. «Começámos por ouvir falar, mas não saber nada do naufrágio. Pouco a pouco, fomos conhecendo a história do cargueiro grego, e obtivemos inclusive o relato da companhia de seguros. Há pouco tempo descobrimos que até existem fotos do naufrágio.» ANDREA DORIA A nível internacional, a primeira expedição de Armando e José foi realizada no Atlântico Norte. «Foi a primeira vez que mergulhadores portugueses estiveram no Andrea Doria», recordam à Outdoor. Esta foi uma aventura em que logisticamente tudo correu mal. «O comandante americano do barco que alugámos para nos levar ao “spot” do mergulho tratou-nos “abaixo de cão”, nunca
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nos deu apoio nenhum, mas desenrascámo-nos, à boa maneira portuguesa». Em águas gélidas, as dificuldades com o caprichoso capitão foram compensadas pelas descidas à cota dos 90m e ao destroço do paquete italiano Andrea Doria, naufragado, em 1956, ao largo da costa leste dos Estados Unidos. PORQUÊ ? Se é escuro e mais difícil que o mergulho recreativo, perguntam-lhes muitas vezes, porque é que arriscam mergulhar tão fundo? Responde José Marques:« Não há essa coisa dos tesouros porque mergulhamos em naufrágios da I e II Guerra, mas somos fundamentalmente motivados pela parte da Arqueologia». Opinião semelhante tem Armando que relembra a desconfiança com que são encarados « Quando falamos destes mergulhos, perguntam-nos logo se vamos à caça de tesouros... O nosso objetivo é simplesmente reviver o passado e depois divulgar essas experiências!» Em Portugal e no estrangeiro, a dupla tem sido chamada regularmente a dar conferências em centros de mergulho e já participou em encontros de internacionais de mergulhadores para relatar as expedições In-silence. VIMINALE E BENGAZI De mergulhos a naufrágios históricos no mar Mediterrâneo, Armando e José guardam recordações diferentes. José Marques tem vívidas memórias do mergulho no Benghazi, um navio italiano que está afundado a sul da Sardenha «Num dos porões tem milhões de objetos de vidro, chamamos-lhe Naufrágio dos Cristais... É ambiente escuro e quando entramos e apontamos os focos, tudo brilha, desde jarros a cristais...» Já Armando, conta o deslumbramento sentido depois de mergulhar no Viminale, o último paquete construído pelo ditador Mussolini e afundado pela aviação Aliada, em 1943. «Foi no estreito de Messina, o Viminale, está na casa dos 115m, naufragou e ficou completamente direito no fundo. Consegue aceder-se à casa das máquinas através de clarabóia no topo do navio. O ambiente é sinistro porque é escuro, e com muito lodo por causa dos motores, mas é interessante!...» José Marques resume em poucas palavras os 9 anos de aventuras partilhadas e arriscadas da dupla In-Silence «As pessoas perguntam-nos sempre se compensa os riscos? E eu respondo sempre que sim... Vemos coisas que pouca gente consegue ver e é espetacular!» ø Aurélio Faria Jornalista
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Em Família Aventura
PASSEIO NO Caramulo
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Serra do Caramulo é uma elevação com alinhamento montanhoso orientado de NNE para SSO. Ocupa os concelhos de Vouzela, Tondela, Oliveira de Frades, Anadia, Águeda e Viseu. Encontra-se a 280 km de Lisboa e a 120 km do Porto. O seu ponto mais alto denomina-se de Caramulinho com 1076,57, seguido do Cabeço da Neve, estando a 995 m de altitude, segundo o marco geodésico. No passado a serra era conhecida como Alcoba. De origem árabe significa Cúpula ou Zimbório. Poderá entender-se que a toponímia está associada aos aglomerados de Rocha (Caos de Blocos) ou às suas construções megalíticas que datam do neolítico, como as antas, vestígios de castros junto às nascentes dos rios, estradas medievais, cavernas e abrigos nas rochas. A atracão que esta Serra produz sobre turistas, visitantes ou veraneantes está diretamente relacionada com o seu enquadramento natural, com 12
a sua envolvência ambiental, os seus megalitos e as suas árvores frondosas. A sua formação é o resultado de uma convulsão geológica num passado remoto. O substrato da montanha é constituído por granitos (rocha magmática intrusiva), paleozóicos (compreendida entre 540 milhões e 245 milhões de anos atrás, aproximadamente) e xistos ante-ordovícicos. Possui ainda minérios como a galena, a volframite, a pirite de ferro, entre outros que atraíram em tempos remotos o povo romano. A sua cobertura vegetal é variada: O pinheiro-bravo (Pinus pinaster), carvalho negral (Quercus Pyrenaica) e alvarinho (Quercus robur), castanheiros (Castanea Sativa), sobreiros (Quercus Suber), loendros (Nerium oleander), teixo(Taxus baccata) entre outras árvores, dividem o espaço desta serra com paisagens de pradaria, que apascenta o gado bovino ainda criado pelos habitantes das aldeias e com os pequenos núcleos urbanos rústicos. Nas espécies arbustivas predomina a urze, em-
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Em família Aventura no Caramulo
bora nas áreas graníticas seja substituída pelo tojo e pela giesta. Encontramos belas plantas silvestres como abrótea-da-primavera (Asphodelus albus), orquidea selvagem (Serapias cordigera) e açafrão-bravo (Crocus serotinus). Relativamente à fauna facilmente se encontra o coelho bravo (Oryctolagus cuniculus), as aves pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), tentilhão-comum (Fringilla coelebs), o reptil cobra-rateira (Malpolon monspessulanus), os insetos aranha-carangueijo (Misumena vatia), gorgulho (Lixus angustatus) e a borboleta (Melanargia lachesis). Desta montanha brotam diversos rios que pelo seu percurso alimentam a agricultura e as florestas até chegarem ao seu destino. São eles o rios Agadão, Alcofra, Águeda, Alfusqueiro, Criz, Dinha, Barreiro, Castelões, Múceres, Campo de Besteiros, Mau, Ribeira da Fraga. Nesta serra localizam-se dois grandes mananciais de água mineral comercializadas e conhecidas por todo o país e além fronteiras. São elas a Água do Caramulo, em Varzielas, vertente que pertence a Oliveira de “A Serra do CaFrades e a Água Serraramulo sofreu uma na cujas instalações se encontram em Algrande alteração na sua cafaz, localizadas no paisagem, tendo esta sido concelho de Águeda. devastada por um incênDurante o mês de Agosto de 2013 todos dio de enormes propornós ouvimos falar do ções que atingiu esta Caramulo através da montanha (...)” Comunicação social e das redes sociais pelas piores razões. A Serra do Caramulo sofreu uma grande alteração na sua paisagem, tendo esta sido devastada por um incêndio de enormes proporções que atingiu esta montanha numa grande extensão. Restam porém alguns redutos verdes visitáveis onde é possível realizar atividades para os amantes da natureza. A C.M. de Tondela, ao longo dos últimos anos, sempre demonstrou grande dinâmica no que às caminhadas do Caramulo diz respeito. Foram homologadas 6 Pequenas Rotas sendo elas as Rotas de Santiago, dos Moinhos, do Linho, dos Laranjais, dos Caleiros e das Cruzes. Estas caminhadas estão sinalizadas e é possível fazê-las em autonomia. Por outo lado existem várias empresas que exploram a Serra com fins turísticos sendo possível realizar outras caminhadas que não estão marcadas, onde é necessário haver um guia, pois são visitados outros recantos escondidos onde só é possível ir com ajuda de quem conhece. Destacamos aqui duas caminhadas interessantes são elas 13
Em Família a Rota das Calçadas e dos Caleiros e uma Rota infantil, comercializadas pela Aventuris, empresa de animação turística sedeada em Mortágua. A Rota das Calçadas e dos Caleiros é uma caminhada que se inicia no Caramulinho passando por algumas aldeias típicas do Caramulo, nomeadamente Jueus, Laceiras e Pedrógão. Por lá podemos encontrar as calçadas medievais, os caleiros que são pequenas condutas escavadas na pedra, por onde corre a água desde as ribeiras e que serviam para alimentar os moinhos e a agricultura. Cruzamo-nos com alminhas, moinhos de rodízio e de cuba de aruba, espigueiros, casas rústicas antigas e uma vida rural visível, que perdura apesar dos novos tempos. Fora das aldeias veremos megalitos em granito, minas de água, pastagens, onde é possível avistar rebanhos de vacas e cabras. Passar entre bosques verdejantes constituídos por carvalhos negrais, castanheiros, fetos, bétulas e outros arbustos endémicos, sempre acom“A inovadora panhados pelo chilrear de aves e por cursos de água. caminhada dirigida
ao público infantil tem apenas 5 km de extensão onde podemos encontrar todos os principais ícones que caracterizam o ambiente serrano do Caramulo”
Tem a extensão de 12 km, é de tipologia circular, com a duração de 4h00/4h30, de dificuldade média-alta, sendo pré-requisitada alguma resistência física.
A inovadora caminhada dirigida ao público infantil tem apenas 5 km de extensão onde podemos encontrar todos os principais ícones que caracterizam o ambiente serrano do Caramulo: Os penedos de granito, as aldeias típicas, as alminhas, os prados a vida rural e muito mais! Apropriado para crianças a partir de 4-5 anos sem idade máxima limitada! É de tipologia Circular com a duração de 1h30/2h00 e de dificuldade baixa. Os percursos incluem acompanhamento por guia especializado, seguros de acidentes pessoais e de responsabilidade civil. Há a possibilidade de haver degustação de produtos regionais se comunicado previamente à organização. Para estas caminhadas são necessárias botas e calças de caminhada e resto do vestuário adaptado à estação do ano. Levar água e lanche individual constituído entre outros por sandes, fruta ou barras energéticas. Porém, nem só de natureza se faz o Caramulo. Na vila com o mesmo nome sucederam-se acon-
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A estância sanatorial do Caramulo teve a sua época áurea nos anos 40 e 50 e encerrou no final dos anos 70 aquando do aparecimento das vacinas da BCG e dos antibióticos, provindos dos E.U.A. Abel Lacerda, filho do Dr. Jerónimo Lacerda ini-
ciou em 1953 uma extraordinária obra de mecenato, conseguindo em 4 anos entusiasmar e congregar centenas de personalidades nacionais e estrangeiras, que após a sua morte em 1957 criaram a fundação Abel Lacerda, proprietária hoje do Museu do Caramulo. O edifício planeado por Abel Lacerda, para albergar as preciosas antiguidades doadas, foi inaugurado em 1959, tendo sido o primeiro museu em Portugal com todos os requisitos modernos da museologia. Numa ala desocupada João Lacerda, irmão do fundador e continuador da sua obra, decide criar o primeiro museu do automóvel em Portugal, expondo a sua coleção de veículos antigos, consagrando-os como objetos de arte, numa altura em que na Europa os Museus de automóveis eram raros. Neste museu estão expostas coleções desde objetos pré-históricos até arte do século XX, como quadros de Dali e Picasso. Agora mais que nunca a Serra do Caramulo, palco de tanta história, que tanto curou e tanto deu, necessita da nossa visita da nossa estadia da presença de todos para a ajudar a renascer. ø Cláudia Almeida Aventuris www.aventuris.com.pt
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tecimentos importantes no âmbito da medicina, economia, turísmo e tecnologia nos meados do século XX que deixaram marcas ainda visíveis. Tudo começou com Dr. Jerónimo Lacerda o criador da estância Sanatorial do Caramulo A sua data de início foi em 1920, criou dinâmica e aumentou o desenvolvimento social, económico e urbanístico do Caramulo e Tondela, através da criação, na vertente oriental da serra, de mais de 20 sanatórios para a cura da tuberculose e demais problemas do foro pulmonar. Era a estância mais importante da Península Ibérica com uma grande equipa de especialistas internacionais, para onde se iam tratar pessoas da política, aristocracia e alta-finança. Foi no edifício de um desses grandes sanatórios que surgiu o atual Hotel do Caramulo com 4 estrelas. Paralelo ao desenvolvimento da Estância do Caramulo, o resto do país estava a viver miséria social, religiosidade primária, sociedade ultraconservadora e guerras mundiais. A vida pululava no Caramulo, foi nesta vila que apareceu o 2º posto de turismo de Portugal ainda nos anos 30, logo a seguir ao do Estoril.
Em Família Aventura
CURSO DE ESCALADA EM FAMÍLIA
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2 fins-de-semana sem estarem com os filhos, quando as crianças e jovens adoram estar na natureza e, com mais de 8 anos, têm todas as capacidades, físicas e mentais, para aprenderem um desporto. Os cursos de escalada são uma grande aposta, Esta aposta inovadora tem dado os seus frutos, pela nossa experiência prévia, ampla formação sendo que, dos 6 cursos de escalada que já tivemos este ano, tivemos o prazer de contar com jonessa área e pelo potencial imenso que o nosvens entre os 8 e os 13 anos em 4 deles. so país tem para a prática da escalada Tivemos participações de pais que desportiva. trouxeram os mais novos, com o “Um dos nossos intuito de passarem umas férias Neste Curso de Iniciação à objetivos é propordiferentes em família e casos Escalada os participantes de mães e filhos que nunca se aprendem a escalar em cionar a prática de tinham imaginado a escalar, segurança e adquirem os desportos de montanha mas que aceitaram o desaconhecimentos técnicos independentemente da idafio pelas vantagens óbvias indispensáveis para escaque este desporto apresenta larem em autonomia, no de, e foi a pensar nos mais para ser praticado em famímenor tempo possível, senpequenos que abrirmos lia. A escalada é um desporto do a formação estruturada novos cursos dedicaacessível a todos, independende forma a obter os melhores temente da idade ou prepararesultados. É utilizado um médos aos miúdos.” ção física. Há vias para todos e potodo em que é garantido que ao dem praticar em conjunto, passando 2º dia o participante já está a abrir o dia em contacto com a natureza. vias, aperfeiçoando a técnica nos dias seguintes. A importância das crianças e jovens passarem Um dos nossos objetivos é proporcionar a prática regularmente tempo a explorar o meio natural, de desportos de montanha independentemente longe da televisão e outros entretenimentos eleda idade, e foi a pensar nos mais pequenos que trónicos, está descrita em vários estudos cientíabrirmos novos cursos em que os miúdos podem ficos. Da nossa experiência, a prática de escalaparticipar. Não queríamos que os pais passassem da e rapel com crianças, é muito importante… á se imaginou a escalar com os seus filhos? Venham aprender a escalar e tenham momentos em família inesquecíveis.
Em Família 1º Testemunho: ”A sorte esteve do nosso lado quando encontramos a 7 Cumes, a formação de escalada foi dada de forma a que todos se sentissem confortáveis e com um ênfase na segurança que nos deixou a todos com confiança e conhecimento para o podermos fazer em autonomia. Com um formador que nasceu para ensinar crianças e tirar os medos aos pais, a 7 Cumes é sem dúvida a escolha acertada para quem quer sair de casa em família e garantir que todos vão de sorriso no rosto.” Ana Proença, mãe do Tiago de 8 anos 2º Testemunho: “Gostei muito desta experiência. Pensei que fosse mais assustador, mas depois de experimentar tornou-se completamente o oposto.” Matilde Santos, 13 anos
novas datas
É notório o aumento da confiança, a auto-estima e a capacidade de aprender e reter conhecimentos. Este é um desporto desafiante, que nos obriga a dominar os medos, que nos ajuda a ganhar confiança em nós próprios e nos nossos conhecimentos, e também muito divertido. Os cursos estão abertos a maiores de 8 anos em família (seja com o pai, mãe, avô/avó, tio, primo) que aprendem a escalar e fazer rapel em autonomia, e a dar segurança, de forma a poderem escalar com o adulto que está a aprender com eles. Os maiores de 14 aprendem também a abrir vias, sendo que alguns com menos idade também aprendem, no entanto, são casos avaliados individualmente. A escalada para crianças e jovens não é algo novo, sendo que noutros países é comum ver crianças muito pequenas (3 anos) a escalarem com confiança com os pais, e crianças de 8 anos que escalam já em autonomia. Aventurem-se em família! ø
O Curso de escalada é já em Novembro/Dezembro
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Teresa Jesus General Manager 7Cumes.pt www.7cumes.pt
Aventura Montanha de Luísa Tomé
Kazbek
Fotos:Luísa Tomé e João Garcia
Aventura Kazbek
Fotos:Luísa Tomé e João Garcia
Aventura
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Sobrolho franzido, olho atenta para todas as portas que se encontram no meu raio de visão. O bairro é feio e degradado, arquitetura soviética. As ruas têm o alcatrão remendado. Começo a perder a esperança de encontrar o hostel. - Opera, opera… - o taxista repete o nome do hostel, como que se repetir algo o pudesse guiar até ao local. É o único ainda com esperança de o encontrar. Nós os três já começamos a murmurar que o melhor é regressar, paciência, temos que pensar noutro plano para encontrar botijas de gás. Desde que chegámos perto da estação de metro de Ghrmaghele que perguntamos onde fica o hostel Opera, mas até ao momento ninguém nos sabe dizer. Afastamo-nos cada vez mais da estação e, pelo aspeto do bairro, começamos seriamente a duvidar da informação dada pelo backpacker que o João interpelou no centro de Tbilisi. Não sabemos o que nos espera na pequena aldeia de Stepantsminda e, uma coisa é certa, vamos ter que cozinhar no refúgio, o que sem gás será impossível. Arriscar sair daqui sem pelo menos uma botija é algo que nenhum de nós está com vontade de fazer. No entanto, nunca pensamos que seria tão difícil de encontrar. Acabamos de regressar de uma loja de artigos outdoor bastante longe do centro e que tinha apenas uma, mas que não se ajustava ao sistema de encaixe do nosso fogão. O taxista encontra um colega e apercebemo-nos que lhe pergunta se é do bairro. Para nossa sorte, é mesmo, e a uns escassos metros encon22
tramos o hostel Opera. Os sorrisos regressam às nossas caras, o nosso amigo taxista persistente também sorri, noto um certo orgulho no seu olhar pelo dever cumprido. Acho que nunca tinha pensado visitar a Geórgia, mas a vida traz-nos estas surpresas. Traz-nos também a felicidade de encontramos pessoas excecionais que, partilhando os mesmos gostos que nós, quase como anjos da guarda, nos aliciam e entusiasmam para que nunca deixemos cair no esquecimento as nossas paixões. Assim é a Inês, que, com a sua doçura, procura montanhas onde mais ninguém o faz, e quando encontra alguma que a fascina envia-me um email que eu abro sempre com um nervosismo infantil, um formigueiro na barriga, uma alegria genuína; para onde me levará a minha amiga desta vez! Pesquisei um pouco. Não era a minha primeira vez no Cáucaso, há uns anos tinha subido o monte Elbrus, na Rússia, e desde o seu cume pude apreciar aquela maravilhosa cordilheira, admirar as montanhas da Geórgia. O Kazbek, a montanha que nos propomos subir, é um estrato vulcão, ou seja, tem aquela típica forma de cone, que foi ganhando após numerosas erupções, formada pelo magma libertado. É uma das maiores montanhas do Cáucaso, atingindo os 5033 m de altitude. É a terceira montanha mais alta da Geórgia e a sétima mais alta do Cáucaso. Foi em 1868 que uma equipa de britânicos o escalou pela primeira vez; seguiu-se a russa
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Aventura Kazbek
Maria Preobrazhenskaya, que, a partir de 1900, o escalou 9 vezes. Tbilisi, a capital, foi uma surpresa. Numa fusão entre o antigo e o moderno, Tbilisi oferece-nos a frescura das margens do rio Kura, a beleza da arquitetura tradicional georgiana, as estátuas espalhadas pela cidade, as igrejas ortodoxas e as mesquitas, a subida e as vistas da Fortaleza Narikala, os passeios pelo centro histórico repleto de esplanadas. A caótica estação de camionagem encontra-se dissimulada no meio da desordem do mercado Didube. De mochila às costas, facilmente somos reconhecidos e o motorista da marshrutka aproxima-se gritando: “Kazbegi, Kazbegi!”. Semelhante ao autocarro, a marshrutka leva normalmente até 12 pessoas e o que a diferencia são as paragens aleatórias que vai fazendo sempre que houver pessoas pelo caminho, não havendo obrigatoriamente paragens ou locais definidos para o fazer. O motorista direciona-nos para o porta-bagagens, onde tentamos a custo encafuar as nossas mochilas. Sentamo-nos no fundo da carri“Kazbek, a nha com as mochilas de dia ao montanha que nos colo, apertados e ensonados propomos subir, é um observamos o corrupio na praça. Foram 4 horas duma estrato vulcão, ou seja, tem condução louca pela estrada aquela típica forma de cone, militar até chegar a Stepantsque foi ganhando após minda, ou Kazbegi, como foi
conhecida outrora. Não se pode dizer que a aldeia tenha muito que visitar e numerosas erupções, forrapidamente damos uma volta e sentamo-nos numa mada pelo magma esplanada a almoçar. O temlibertado.” po está muito nublado e ainda não conseguimos ver as montanhas circundantes. Só ao final do dia a belíssima silhueta da Igreja Tsminda Sameba se mostra timidamente. Estamos na varanda do hostel familiar onde tomamos as refeições e vamos tirando fotos à paisagem à medida que as nuvens dançam sobre as montanhas como que num jogo. O dia seguinte, reservado à aclimatação, está muito chuvoso e resolvemos descansar e fazer os preparativos para as restantes jornadas que vamos passar na montanha. Temos que comprar outra botija de gás e comida para três dias e levar apenas o essencial para o refúgio. A mochila vai estar pesada e a subida é longa. Não vale a pena carregar com o que não é estritamente necessário. Salada de tomate e pepino, de feijão verde, pastéis de carne, pão, queijo, o nosso pequeno-almoço neste modesto hostel é ótimo! Ganhamos energia para o dia que se espera longo. A OUTDOOR Outubro_Novembro_Dezembro 2013
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Aventura chuva abrandou e é com entusiasmo que iniciamos a subida para o refúgio Bethlemi, teremos que vencer um desnível de cerca de 1900 m. As nuvens amenizam um pouco o calor e a primeira tirada leva-nos à igreja da Santíssima Trindade - Tsminda Sameba - que fica a 2200 m de altitude. Símbolo da determinação do povo georgiano ao realizar esta construção num local tão inacessível e isolado, rendemo-nos à sua beleza e percorremos o trilho observando como a sua silhueta parece suspensa num manto de nuvens. As flores dão cor às pastagens e o trilho serpenteia entre elas, subindo até um miradouro de onde temos o primeiro vislumbre dos glaciares desta zona. Devido ao degelo no Verão, a passagem do rio torna-se um desafio, o caudal está maior e temos que procurar um local adequado onde possamos atravessar em segurança. Com a ajuda dos bastões, alguma concentração, equilíbrio e, principalmente, a confiança no João, que me está a ajudar, passo saltitando pedra a pedra para a margem oposta. Gosto destes momentos, em que nos unimos e ajudamo-nos mutuamente a passar obstáculos.
Fotos:Luísa Tomé e João Garcia
O dia já ia longo e a mochila, apesar de nada de novo ter entrado nela, parecia cada vez mais pesada. Entramos no glaciar e avistamos finalmente o refúgio ao longe. A passagem do glaciar leva-me para um novo registo e isso agrada-me. É com entusiasmo que atravesso aquela gigantesca massa de gelo. Um pequeno trilho leva-nos até ao refúgio, uma enorme construção de 1941 que servia simultaneamente de refúgio a alpinistas e estação meteorológica. Cansados, entramos no edifício e tentamos habituarmo-nos à escuridão. Tudo no seu interior é sujo e caótico. A recepção por parte do guarda não é das mais calorosas, mas arranja-nos três lugares num beliche superior num quarto e três noutro. Somos um grupo curioso, três portugueses e três americanos. Olham-nos com espanto e não deixam de perguntar como nos conhecemos. - Na Turquia, quando fomos subir o monte Ararat – responde a Inês sem hesitar. Para mim era a primeira vez que os conhecia, simpatizei com os novos amigos.
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As cores garridas com que está pintado contrastam com o pó e lixo espalhado pelo quarto. Trepo para o beliche e tento limpar o melhor possível o colchão. Coloco as garrafas e sacos de plástico num canto, limpo a generosa camada de pó instalada provavelmente no Inverno e começo a estender saco-cama para marcar lugar. Os nossos companheiros de quarto olham desconfiados para nós. Têm as mochilas e todo o material espalhado pelo chão, não nos resta
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Aventura Kazbek senão transportar tudo para cima. Parecem entender pouco de inglês. Respondem-nos em russo, são ucranianos.
uma sopa de tomate ao jantar. Antes de irmos descansar temos que esterilizar água. O Jason trouxe um “A passagadget para esse efeito, que se gem do glaciar Dirigimo-nos à sala comum. assemelha a uma caneta que Demasiado pequena para emite uma luz fluorescente. leva-me para um uma lotação de 50 pessoas, Peço-lhe para experimennovo registo e isso agratem duas mesas e um pequetar e quase toda a gente da-me. É com entusiasmo no espaço para cozinhar. na sala fica estupefacta A prioridade agora é beber a olhar para o cantil iluque atravesso aquela gilíquidos, conseguimos lugar minado. De repente ouvigantesca massa de gelo. e sentamo-nos a apreciar mos a Inês dizer com um Um pequeno trilho leas bandeiras penduradas na sotaque russo: “ It’s from va-nos até ao refúparede. Russos, ucranianos, America!” – Foi a risota total! lituanos, polacos, iranianos, os Ainda por cima porque ao fim gio, (...) “ países de Leste estão sem duvida do quarto cantil o aparelho emimuito bem representados neste local. O tiu uma luz vermelha e nunca mais apetite não é muito e ficamos satisfeitos com funcionou.
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Aventura À noite tentamos descansar, mas o bater das portas a abrir e a fechar, gente a conversar, a entrar e sair do quarto não nos deu muitas hipóteses. Com expetativa saímos do refúgio no dia seguinte, dia de aclimatação, o que quer dizer que vamos dar tempo ao nosso organismo para se habituar a esta altitude. O ar mais rarefeito, a pressão atmosférica menor, uma menor percentagem de oxigénio, tudo isto faz com que nos cansemos facilmente. Faz parte do processo de aclimatação subir um pouco e regressar à altitude inicial. Mas o dia estava desagradável, chuvoso, o vento forte, o que nos levou a permanecer “em casa” e descansar. O tempo passa lento, há quem converse, leia, jogue xadrez ou simplesmente observe o tempo através da janela da sala.
aquece lentamente. Foram assim as primeiras horas da nossa caminhada. Ao chegarmos ao colo a 4600m colocamos os crampons que nos vão ajudar a progredir na neve. As mãos e a cara arrefecem, a passada é regular. Envolvo-me na tranquilidade da paisagem. A neve e as nuvens, com toda a sua brancura, transmitem-me a sensação de calma e pureza, e talvez por isso siga confiante em direção ao cimo desta maravilhosa montanha. É com grande alegria que festejamos a nossa chegada ao cume, a paisagem é arrebatadora! Não conseguimos ver o vizinho Elbrus devido à nebulosidade, mas deliciamo-nos com as vistas deste país onde podemos encontrar paisagens de montanha notáveis e um povo orgulhosamente hospitaleiro. ø
É quase impossível descansar nas horas que antecedem o dia de cume, especialmente neste refugio tão barulhento, e é por isso que às 3 h da manhã estamos despertos e prontos para nos equiparmos. A mochila ficou preparada na noite anterior. Vestir, comer qualquer coisa, ir à casa de banho antes de colocar o arnês. De frontal ligado, observo a noite calma que contrasta com a ventania do dia anterior. Adoro sair à noite, não consigo ter a noção do que me falta percorrer, tudo me parece mais tranquilo e introspetivo. Posso ver o dia nascer, maravilhar-me com as cores do céu e sentir o calor quando o sol nos
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Luísa Tomé Papa-Léguas
RevistaObistiundicim eos aut ipsapitias as doloribus verum erit ipsapici blatur, odita quaero berum eumquiam, nit, soluptur sequis cus, ideliquibus ped ute volorer itatia nonsedit e
Aventura  Desafio
Viver a lenda do Tour de France a pedalar
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Aventura Tour de France a Pedalar Gostar de andar de bicicleta é das melhores coisas que tenho. Eleva a minha alma e afeta positivamente tudo o que gira em meu redor. Ser contagiado pela paixão e quase ser tocado pelo pelotão no Tour de France, era – mais – um dos meus sonhos que realizei. Os sonhos não devem ficar na gaveta e muito menos presos à carteira. Um dia percebi que, vivendo assim, os pesadelos andavam de mãos dadas comigo. Encontro mais facilmente a felicidade nos pedais do que dentro dos bolsos. É por isso que pedalo e escrevo para não esquecer e para ir buscar o meu chão cada vez que encosto a bicicleta. É neste momento, nestas palavras e neste local que sou como pedalo: Livre, autêntico e intenso. Tão natural como as paisagens que surgem diante do que consigo alcançar. Como alguém disse “ A bicicleta é uma lição permanente de humildade.”
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Aventura A primeira semana no Tour visto de carro com a bicicleta na bagageira Já ando nesta região de França há alguns dias e só quando observo as formas titânicas das montanhas que me rodeiam, eu percebo:
das para ver a prova mais famosa e mediática do mundo. De lycra, à beira da estrada eu vejo o pelotão a passar mesmo quando é preciso estar um dia inteiro parado para ter uns minutos de prazer.
- Estou nos Altos Alpes e vou ter mais um desafio à minha medida. Cada vez que saio de casa e vou à procura de um trilho novo, a experiência que vivo é transcendente. - As montanhas não têm fim. Eu sempre quis o que é meu por direito, conquistado com a bravura de um guerreiro e a humildade de um peregrino. Neste caminho, a bicicleta tem sido uma lição permanente e é sobre ela que tenho passado alguns dos melhores anos da minha vida.
A paisagem lunar do Monte Ventoux Foi na 16ª etapa, a caminho de Gap que vi os ciclistas passarem. A caravana publicitária que os antecede é enorme. É uma festa ver a forma como os patrocinadores embelezam os carros, passam música e lançam surpresas para quem lhes acena. A meus pés caem diversos souvenirs. Um grupo de fugitivos aproxima-se, vêm tão rápido que só dá tempo para tirar uma foto. Mais atrás vem o pelotão a preencher 2 faixas de rodagem pintando-as de várias cores. Quando passam, tudo abana. No dia anterior tinha experimentado a famosa subida ao Monte Ventoux, cuja pendente começa nos 2.5% e aos poucos vai chegando aos 10%. Dista apenas 21,5 quilómetros desde Bedoin, mas não deixa de ser desafiante atingir 1500 metros de acumulado num curto espaço de tempo.
Desde a Patagónia e a Islândia que a minha bicicleta tem o peso da saudade de olhar o mundo, saudade que se esvanece quando toco em outro ponto do meu planisfério pessoal. Adoro contemplar um ponto no mapa e poder falar sobre ele, é por isso que quando avisto um determinado local do planeta, ele diz, pedala até mim. Escolhi celebrar os 100 anos do Tour de France e pedalar em autonomia nos Altos Alpes, cruzando as lendárias subidas do Alpe d´Huez e Col Galibier.
Na etapa de contra-relógio Novo dia e já estou em Chorges para assistir a uma etapa de contra-relógio. As faixas de rodagem começam a amontoar-se com a pesada logística que o Tour movimenta. São camiões e camiões, carros, homens.
Joaquim Agostinho, Contador, Armstrong, muitos foram os heróis que por Adorei estar em vários pontos da proEscolhi aqui passaram, chegou a altura de va de hoje, especialmente numa celebrar os escrever mais uma parte da micurva tão fechada, onde os atlenha história. São palavras que tas tinham obrigatoriamente de 100 anos do Tour abraço, que vêm no dicionário, abrandar. Era um excelente lode France e pedalar que têm vida porque lhes dou cal para ter uma boa foto de alem autonomia nos Alo meu suor e me ajudam a viaguns ciclistas que admiro. Injar nos dias em que estiver em felizmente não podia observar tos Alpes, cruzando as casa. Quando o fizer sem sair a prestação de todos porque lendárias subidas do do sofá é porque já pedalei tudo necessitava seguir cedo para Alpe d´Huez e Col o que tinha para pedalar. mais perto do Alpe D´Huez onde Milhões de televisões estão ligaestariam milhares de pessoas. Galibier.
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Aventura Tour de France a Pedalar
Numa das muitas subidas do Alpe d´Huez Como imaginar a 100ª edição sem a subida a este topo lendário? Este ano o pelotão passará aqui 2 vezes, são momentos que se guardam para sempre. A multidão, em número parecem formigas; em cores, representam todo o espetro. Sobem a pé e de bicicleta para, antes das 12h00, estarem numa curva deste mítico local e acima de tudo, para sentirem no corpo o esforço que é necessário a um ciclista para vencer uma montanha. Parece um paradoxo, mas mesmo parado, não dá para estar quieto. Quem consegue resistir a tanta diversidade humana e material?! A segunda semana nos Altos Alpes com a bicicleta e o atrelado Bourg d´Oisans - Lat. e Long. (Secret) altitude 2500 mts Gosto de matemática simples, especialmente quando o oxigénio já não chega com frequência a esta zona do cérebro (as curvas da estrada subtraem-se e à altitude soma-se mais uns metros). O resultado são 21 curvas, eu estou do avesso, sinto os pulmões e o coração do lado de fora com tantas voltas para atingir o topo do Alpe d´Huez. Num instante saio desta estância de esqui para o “outro lado”. Mais uma coletânea de curvas, não deu para as contar, a velocidade faz voar qualquer número da minha cabeça. Hoje não vai dar para chegar a Chalezet, a chuva quer fazer-me companhia mas eu sei que pelo desnível do terreno que tenho pela frente, ela vai ser muito incómoda e de certeza que me vai tocar nos ossos. Não quero, só necessito do que faz bem ao coração. Estar num estábulo rodeado de animais, moscas e cheiros a condizer, não é propriamente a melhor receita. Escrever…muda tudo. Virei a página, o dia é o mesmo, só passaram algumas horas e a chuva parou. Decidi continuar. A linha sinuosa do track que o ecrã do gps mostrava para os quilómetros seguintes até Chazelet não era animadora. Passei horas no caminho, em determinada altura, dei comigo desviado da GR-54. Tinha entrado em terreno privado, estava aos 2500 mts de altitude, 2 homens gritavam “privé, privé” e mandavam-me para trás. Com uma mão no ar (outra no guiador, pés e a cabeça a girarem), fui avançando dizendo “un moment”, “un moment…” A conversa fluía mas não era com o meu francês de há 25 anos da escola. Os aperitivos que a caravana publicitária (que precede o Tour), lançou naquelas etapas onde estive, foram quanto baste para entrar no refúgio e começar a beber cerveja.
Quase bati o meu record em consumo de álcool. Felizmente tinha convite para passar ali a noite, só tinha de ir à “fiesta” com eles. De viatura, encosta abaixo durante largos quilómetros, deparei-me com outro refúgio mesmo em frente a um glaciar. Super!!! O Collin e o Berger curtiam a música intercalando com Pastis de Marseile, marijuana e tiro ao alvo. Um deles bem que tentava acender o forno a lenha com acendalhas, cavacos, gasolina mas sempre sem sucesso. Era uma vez um jantar e era hora de regressar ao abrigo. Sei que eles estão habituados a este tipo de divertimento por isso, já no Toyota, pensava “ os homens são mais perigosos que os Alpes” Lat. e Long. (Secret) – algures em Le Vigneaux Às 07h00 da manhã já tinha enfrentado duras
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Aventura convida-nos a descer. São vários os raios que se unem numa roda. Parti um, “pas de probleme”, a roda está empenada, só preciso de andar mais devagar para chegar a mais um pedaço de terra boa para montar a tenda, oficina e cozinha. Foram 12h a pedalar. É verdade que tenho suado muito e nesses momentos, alguns são doloroso e não os repetiria, no entanto, tenho passado bons anos da minha vida em cima de uma bicicleta. Le Vigneaux- Châtearaux Les Alpes As rotas de btt estão muito bem marcadas no ParAs rotas de btt estão muito bem marcadas no Parque Nacional Les Écrin, existem muitos percursos e todos parecem exigentes. O meu périplo cruza grande parte deles e é normal subir até vários topos (col) no mesmo dia. Nessas alturas, o suor está para o meu corpo como o orvalho para a tenda. Ele desprende-se da pele e cai em gotas Hoje não vai deixando um vasto rasto pelo cadar para chegar minho. descidas por single-tracks. Deixei o corpo, deixei a bicia Chalezet, a chuva Eram autênticos caminhos cleta, deixei esta montanha e quer fazer-me compade cabra, só acessíveis a pé subi mais além. Estava cheio, nhia mas eu sei que pelo ou de bicicleta. preenchido pela plenitude de Julgo que naquele momento desnível do terreno que descobrir que o tamanho do a beleza e a adrenalina supeque sou está intimamente relatenho pela frente, ela raram o perigo e a sensação cionado com o tamanho do que vai ser muito incóde estar, mais uma vez, comquero. moda (...) pletamente sozinho nos Alpes. Preciso deixar os ninhos e ir até No col du Lautaret (2058 mts), senonde habitam os homens para me tado numa esplanada, decido que não abastecer em Argentiere La Besse. O úniirei ao col du Galibier. A estrada de alcatrão co problema é que cada vez que o faço, tenho de não é o meu território, subo mais alto e vou mais descer 1000 mts em altitude. longe em cada que caminho de terra que faço. Um supermercado aberto passou de necessidaGrande parte da tarde limitei-me a seguir o curso de a mimo. Para trás foram ficando locais que se do rio com água glaciar onde tentei tomar banho resumem a 3 ou 4 chalets de madeira até que, mas os joelhos tremiam e tive de parar esta expe- comparando a curva do track no gps com o vale riência radical. que tinha à minha frente, cedo percebi que, exisInevitavelmente, as pequenas vilas nos Alpes es- tindo um caminho do outro lado do rio, não iria tão assentes nos cumes como ninhos de águia. ser fácil lá chegar. Aqui pode abastecer-se com água pura da mon- A escassos quilómetros de distância de Châteaux tanha … É pena que o ar puro não alimente pois des Alpes, sobre um escarpado, conseguia ver a não existe mesmo mais nada. ponte de madeira. Nem com um passo de giganNo início desta aventura, ainda durante a etapa te lá chegava e nem o Obélix conseguia mover do Tour, disse a um italiano que levava comida aquelas pedras que a natureza fez rolar encosta para 4 dias. abaixo e que aniquilavam a passagem na GR e a Espantado, balbuciou - “they have food in Fran- minha continuação até ao destino. A única alterce, did you know it?” nativa seria descer, continuar a descer e contorAhhhh!!! Se ele um dia pegasse numa bike de nar toda a montanha pela N94. montanha e viesse comigo, passava muita fome Os Alpes são tão grandes que mais uma vez ar– pensei. ranjo facilmente espaço para montar tenda e pasContinuo a rolar perto dos 2000 mts e mesmo sar a 3ª noite a ouvir os insectos e a água a correr. assim surgem quilómetros de single-tracks, autênticos parapeitos na montanha. Ali não há rails Châtearaux Les Alpes - Chorges de proteção, basta uma desatenção e a ravina Até agora os dias têm sido passados em quase 32
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Da tranquilidade de uma manhã de sol numa esplanada a escrever mails e a postar no facebook, à realidade de uma chuva forte em escassos mi-
Aventura Tour de France a Pedalar
isolamento. Excetuando as paisagens, poucos são os lugares onde podemos gozar aquilo a que vamos sendo habituados na vida moderna. Ebrun é assim. Uma vila típica dos Alpes com um centro histórico maravilhoso (a partida do contra-relógio do Tour foi aqui), onde se pode ver os mercados de rua e a vida a passar estando simplesmente sentado numa esplanada. Há dias assim, mais tranquilos. O que tenho pela frente, continua lá, tenho a certeza de vir a ter longos momentos de vento pela cara. É bom ir escrevendo por partes. Se fosse no final da etapa não se iria notar o contraste e o quanto tudo pode ser completamente diferente de um momento para o outro quando viajamos em 2 rodas. Foi horrível sair de Ebrun. Pedra sobe pedra, caminhos íngremes para serem feitos a pé seja qual for o sentido e muitas cascatas a cada curva do caminho. Precisava relaxar, saí do track e desci aos 1500 mts para ir ao lago Saint Apollinaire, uma atracão turística inserida num cenário único de montanha. Enquanto nadava,olhei para a mancha verde de árvores bem acima de mim e compreendi que havia ali uma dobra do terreno imprópria para carregar uma bicicleta com atrelado. Nos Alpes, um atalho pode significar ter que fazer escalada. Definitivamente, a única alternativa foi seguir a N94. Nesta estrada mantinha-se gravado o nome dos atletas do Tour quando aqui percorreram a 17ª etapa de contra-relógio. Os sons da trovoada já ecoavam desde a hora em que estivera no lago, o mau tempo vinha aí e só agora me sentia satisfeito porque,sem querer, evitei os trilhos de montanha e só tinha uma preocupação, montar tenda rapidamente.
nutos, é simplesmente normal em cenários assim. Chorges - Bourg d´Oisans Com chuva ou não, as noites dentro da tenda demoram sempre muito a passar. A etapa de hoje é brindada com sol e praticamente todo o percurso vai ser finalizado por estradas secundárias (alguns tramos são coincidentes com os do Tour). Este “pormenor” permitir-me-á, se as pernas tiverem a força da intenção, percorrer os 100 kms que me separam de Bourg d´Oisans, o meu ponto inicial de há 5 dias atrás. Enquanto estava a acompanhar o Tour a semana passada e aqui passei de carro, é óbvio que me assustei ao ver o ponteiro da temperatura a subir, a estrada ser diminuta e a mudança engrenada ser quase sempre a 1ª. Conhecia bem o que se escondia entre as folhagens.Para enfrentar este Golias só tinha mesmo um grande coração para bombear a bicicleta..ø
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Ricardo Mendes
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Entrevista
Fotos: Nomad
 Tiago Costa
SER GUIA DE TREKKING... 34
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por Isa Helena
Outdoor: Como surgiu esta vontade de conhecer o Mundo? Tiago costa: Com a curiosidade de querer saber o que ele “escondia”... Com que idade fizeste a tua primeira viagem? Desde muito pequeno que passava grande parte das férias de verão a viajar com o meu pai. Mas foi nos escuteiros que a paixão pelo ar livre se revelou. Mais tarde o gosto pela fotografia trouxe as viagens. Qual a viagem mais marcante da tua vida? Ainda adolescente realizei o Caminho Francês de Santiago, o meu primeiro “trekking” de longa duração. Foi avassalador! A experiência, o sacrifício e a aprendizagem que tive com esta caminhada mudou a minha vida. Naquele momento, ainda sem saber, algo mudou dentro de mim. Ser guia de Trekking estava nos teus planos de vida? Passou a estar quando decidi trocar um curso de engenharia por uma vida ao ar livre. Quando decidi que ia dedicar a minha vida a fazer aquilo que mais gostava, que incluía passar o máximo de tempo possível ao ar livre. Guiar trekkings acabou por ser a concretização de
conseguir mostrar sítios que adoro e um estilo de vida que me apaixona. Quais os maiores desafios nesta profissão? Lidar com os receios das pessoas. Em montanha as condições podem variar muito rapidamente. Um dia quente e solarengo pode ficar escuro e tempestuoso. Por vezes temos de forçar, continuar apesar da dor, apesar do receio, do desconforto. As dificuldades que para uns são intransponíveis, para outros são invisíveis. Avaliar onde está esse patamar em cada pessoa que acompanho e ajuda-la a superar-se é um dos maiores desafios. Tens algum episódio que te tenha marcado particularmente enquanto guia de trekking? Nem por isso... Quando saio para a montanha com os grupos da Nomad vou com um programa muito bem delineado e com opções de recurso para os imprevistos que possam ocorrer. Claro que já fomos apanhados por alterações repentinas da meteorologia, mas nada que se tenha tornado numa história épica. Agora, sem estar com grupo... Quais são as principais tarefas de um Guia de viagens aventura? São bastante abrangentes. Saber a rota no terreno é apenas uma pequena parte. Há que preparar a viagem, pensar na experiência que queremos proporcionar no terreno. Pesquisar itinerários, fazer reconhecimento de rotas, idealizar programas. Depois organizar a logística: hotéis, transportes, mulas, refúgios, iaques, acampamentos, alimentação, voos... Depois no terreno é uma mistura entre amigo, guia, técnico hotelaria e tudo o que seja preciso para fazer daquela viagem um sucesso. Entre organizar viagens e ser guia no terreno, o que te dá mais prazer? As duas andam par a par. Uma trata-se da antecipação, de planear a coreografia perfeita. Depois é executa-la no terreno. Se tudo correu como planeado, ver o resultado e a transformação das pessoas ao conhecerem uma nova realidade. Tens alguma preparação física específica para realizar estas viagens? Sigo um plano semanal para estar na forma possível e tenho atenção com a alimentação. Muito do meu treino assenta na corrida, com algum trabalho muscular. Depois, faço tudo
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Entrevista Tiago Costa
Tiago Costa é um amante de Outdoor. Explorar, viajar, conhecer são algumas das bases da sua vida, mas ser guia de viagens é uma das suas grandes paixões! A Outdoor esteve à conversa com Tiago Costa e revela-lhe agora alguns segredos deste aventureiro! Nós já nos rendemos às viagens aventura.
Fotos: Nomad
Entrevista
por passar o maior tempo possível em montanha. Não há melhor treino que esse! Para ti, quais os maiores benefícios de fazer viagens aventura? Simplicidade. Conquista. Aprendizagem. Só para nomear alguns. Para além do trekking, tens outras paixões desportivas? Interessam-me quase todos os desportos de montanha. Adoro percorrer trilhos numa bicicleta ou descer rios de kayak; mas a minha maior paixão é o alpinismo e a escalada. Diz-nos 5 dos teus locais de eleição no Mundo para praticar trekking. É uma pergunta sem resposta possível, pois a lista seria interminável. Mas, aqui fica um top 5 que tenta ser abrangente. Picos de Europa: uma montanha perto de nós, que por vezes passa despercebida, e que é um paraíso para o trekking. Parque Nacional Glaciares (Patagónia): Menos conhecido que o seu “irmão” chileno (as Torres del Paine), mas que tem uma cultura de montanha 36
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Entrevista Tiago Costa
única. E um dos melhores trilhos de trekking de alta dificuldade do mundo: a travessia do campo de gelo sul. Alpes: Fazer o Circuito do Monte Branco é um marco obrigatório para qualquer pessoa que goste de montanha. Santuário dos Annapurnas: Pela sua diversidade de paisagens, pelo amanhecer no campo base dos Annapurnas. Este trekking é imperdível! Yosemite: um destino icónico para quem gosta de escalada e quer caminhar por entre paredes gigantes. Quais os próximos destinos que pretendes explorar? No próximo mês de janeiro parto numa viagem com o António Luís Campos, fotógrafo da National Geographic, e a dupla Inácio Rozeira/Helena Pimentel, do Dar a Volta, numa viagem apoiada pela Nomad,que nos levará a documentar uma das regiões mais isoladas da Amazónia. Quais são os teus projetos para o futuro? Sem dúvida continuar a fazer da Nomad algo de que nos orgulhamos, um ponto de encontro de viajantes. Há também um grande projecto do qual não posso falar muito, mas que adianto tratar-se de criar soluções que facilitem a vida em viagem. E para finalizar o recém Coletivo Indus Doc – uma media house especializada em conteúdos de viagem, aventura e exploração. Que conselhos dás a quem nunca realizou uma expedição aventura? Arrisque e vá! Afinal de contas, aventura é isso mesmo... Quais os requisitos necessários para ser guia de trekking? Tens alguns conselhos para quem se pretende iniciar neste mundo de aventuras? Acima de tudo é fundamental ser-se apaixonado pelo estilo de vida (sim, isto é muito mais que um trabalho). Ter jeito/gosto em lidar com pessoas e a formação adequada: primeiros socorros, metrologia, montanhismo/escalada. É também essencial estar à vontade no terreno. Ter experiência de escalada e montanhismo é quase obrigatório. ø Sabe mais sobre a Tiago Costa em
Nomad
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Por Terra
16 CAMINHADAS EM PORTUGAL
Foto: Caminhos da Natureza
Por Terra Caminhar
A fechar
CONTInue A LER A REVISTA oUTDOOR 12 EM WWW.REVISTAOUTDOOR.PT/12
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